Acórdão Nº 0900213-38.2017.8.24.0067 do Quinta Câmara Criminal, 27-02-2020

Número do processo0900213-38.2017.8.24.0067
Data27 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemSão Miguel do Oeste
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Criminal n. 0900213-38.2017.8.24.0067, de São Miguel do Oeste

Relator: Desembargador Luiz Neri Oliveira de Souza

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. ARTIGO 2º, INCISO II, DA LEI N. 8.137/90. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA.

PREJUDICIAL DE MÉRITO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL. PRETENSO RECONHECIMENTO DE TERMO INICIAL EM DATA ANTERIOR À DA DENÚNCIA. IMPOSSIBILIDADE. ILÍCITO COMETIDO SOB A ÉGIDE DA LEI 12.234/2010. PROIBIÇÃO EXPRESSA NO ART. 110, § 1º, DO CÓDIGO PENAL. PREFACIAL AFASTADA.

PLEITO ABSOLUTÓRIO. ATIPICIDADE DA CONDUTA. AUSÊNCIA DE DOLO. INVIABILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA DEVIDAMENTE DEMONSTRADOS. ACUSADO QUE, NA QUALIDADE DE SÓCIO-ADMINISTRADOR DA EMPRESA, DEIXA DE REPASSAR, NO PRAZO LEGAL, VALOR DOS TRIBUTOS DESCONTADOS OU COBRADOS. DOLO CONFIGURADO. CRIME DE NATUREZA FORMAL QUE DISPENSA RESULTADO. FATO TÍPICO CARACTERIZADO. DIFICULDADE FINANCEIRA QUE, ADEMAIS, NÃO AFASTA A EXIGÊNCIA DO TRIBUTO. PRECEDENTES DESTA CORTE. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0900213-38.2017.8.24.0067, da comarca de São Miguel do Oeste Vara Criminal em que é Apelante Volmir Flores dos Santos e Apelado(s) Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Quinta Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Desembargador Luiz César Schweitzer, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Desembargador Antônio Zoldan da Veiga.

Compareceu à sessão pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Aurino Alves de Souza.

Florianópolis, 27 de fevereiro de 2020

Luiz Neri Oliveira de Souza

Relator


RELATÓRIO

Na Comarca de São Miguel do Oeste, o representante do Ministério Público ofereceu denúncia contra Volmir Flores dos Santos, dando-o como incurso nas sanções do art. 2º, inciso II da Lei 8.137/90, na forma do art. 70 do Código Penal, conforme os seguintes fatos descritos na inicial acusatória, in verbis (fls. 1-7):

I DOS FATOS E FUNDAMENTOS JURÍDICOS:

O ICMS (Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação) tem como fato gerador as operações relativas à circulação de mercadorias e serviços, o que obriga que sejam escrituradas em livros próprios todas as suas entradas e saídas no estabelecimento do contribuinte, a qualquer título.

Assim, deve o contribuinte remeter à Repartição Fazendária de seu domicílio uma via da GIA (Guia de Informação e Apuração do ICMS), na qual, a partir do movimento econômico, informa o saldo apurado em cada período e procede ao recolhimento do imposto até o 21º (vigésimo primeiro) dia do mês seguinte que ocorreram os fatos geradores. Destarte, a consumação deste delito ocorre no dia seguinte àquele em que o ICMS deveria ter sido recolhido ao Estado.

Nesta linha, na empresa AG Madeiras Ltda - EPP., CNPJ n. 04.553.535/0001-40 e Inscrição Estadual n. 25.428.287-3, com sede na na Rua José Bernardi, n. 428, Bairro Progresso, CEP 89.900-00, nesta cidade e Comarca de São Miguel do Oeste-SC, na época dos fatos administrada pelo denunciado Volmir Flores dos Santos conforme expressamente previsto na Cláusula Quinta do Sétimo Aditivo ao Contrato Social da Empresa (fl. 17)3, e usufruindo dos poderes a ele conferidos, escriturou em Livro de apuração o tributo incidente sobre as operações tributáveis que realizou no período de janeiro, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2011 janeiro, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2012, janeiro, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2013, de acordo com o demonstrativo do cálculo do Termo de Inscrição em Dívida Ativa n. 16010714665, inscrita em 15.12.2016.

Entretanto, apesar de devidamente escriturado, o sócio-administrador acima relacionado não realizou e nem determinou o pagamento do tributo no vencimento, deixando de efetuar no prazo legal o recolhimento do ICMS relativo às operações tributáveis que cobrou na venda das mercadorias colocadas em circulação e dos tomadores dos serviços de transporte, correspondente ao valor apurado e declarado (escriturado) pelo próprio contribuinte na Declaração Anual do Simples Nacional (DASN) e por meio do Programa Gerador do Documento de Arrecadação do Simples Nacional - Declaratório (PGDAS-D).

Ademais, qualquer vantagem obtida pela respectiva empresa beneficia em especial e diretamente o denunciado Volmir flores dos Santos, pois à época dos fatos que originaram o Termo de Inscrição em Dívida Ativa n. 16010714665, era ele quem exercia o mister de administrá-la, com ciência e controle das transações e negócios realizados, inclusive obtendo lucro ou minimizando prejuízos com o não recolhimento do tributo devido.

Na qualidade de sócio e administrador, era o denunciado que mantinha o domínio do fato sobre as operações comerciais e empresariais, sendo o responsável pela regularidade das escriturações fiscais daquela pessoa jurídica, que assim atuava na condição de garantidor em relação à conduta de seus funcionários, contadores e prepostos, além de ser o responsável pela apuração e recolhimento do ICMS (imposto estadual) devido.

Cabe consignar ainda que, mediante dolo e ardil, o denunciado Volmir Flores dos Santos não adimpliu a obrigação tributária e deixou de recolher os tributos devidos pela cobrança dos valores correspondentes à circulação mercantil e aos serviços de transporte rodoviário efetuados pela referida empresa e consequentemente lesou os cofres do Estado.

O débito decorrente do Termo de Inscrição em Dívida Ativa n. 16010714665, tem o valor histórico de R$ 176.595,09 (cento e setenta e seis mil, quinhentos e noventa e cinco reais e nove centavos) cujo valor atualizado, alcança o montante de R$ 185.184,21 (cento e oitenta e cinco mil, cento e oitenta e quatro reais e vinte e um centavos), atualmente inscrito em "dívida ativa", não quitada.

Oportuno esclarecer que os períodos de janeiro a dezembro do ano de 2011, janeiro a dezembro do ano de 2012 e, janeiro a agosto do ano de 2013, apontados no Termos de Inscrição em Dívida Ativa n. 16010714665, encontram-se abarcados pela prescrição da pretensão punitiva do Estado, porquanto a pena máxima aplicada ao crime em testilha, desde a data do fato, já transcorreu prazo superior a 4 (quatro anos), a teor do que prevê o art. 109, inciso V, do Código Penal, mais detalhadamente demonstrado no item III desta denúncia.

Encerrada a instrução, a magistrada a quo proferiu sentença, nos seguintes termos (fls. 95-104):

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido condenatório inserido na denúncia para condenar Volmir Flores dos Santos, dando-o como incurso no art. 2º, inciso II, da Lei n. 8.137/90 c/c art. 71, "caput", por quatro vezes, do Código Penal, à pena privativa de liberdade de 7 meses e 15 dias de detenção, em regime aberto, e ao pagamento de 12 dias-multa, cada qual no valor de 1/30 do salário-mínimo vigente à época dos fatos.

Substituo a reprimenda corporal por uma pena restritiva de direitos, consistente em prestação pecuniária, no valor de 10 salários-mínimos, em favor do Fundo de Transações Penais da Comarca de São Miguel do Oeste, parcelados em 10x.

Inconformado, o réu interpôs apelação criminal por intermédio de defensor constituído (fl. 110).

Nas razões recursais, requer o reconhecimento da ausência de dolo específico, tendo em vista que a burla ao recolhimento do tributo deveu-se à "grave crise enfrentada pelo Brasil", pelo que "não teve condições de honrar com os pagamentos dos tributos estaduais porque faliu, quebrou, fechou as portas do estabelecimento". Ao final, defende a ocorrência da prescrição em relação ao recolhimento do tributo referente ao mês de setembro de 2013, reduzindo-se, em razão dela, a fração de aumento relativa à continuidade delitiva (fls. 111-116).

Em contrarrazões, o Ministério Público manifestou-se pelo desprovimento do recurso, mantendo-se incólume a sentença prolatada (fls. 121-133).

A Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Sr. Dr. Jorge Orofino da Luz Fontes, manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do recurso (fls. 163-169).

Este é o relatório.


VOTO

Presentes os pressupostos legais de admissibilidade, conhece-se do recurso.

1. Tratam os autos de recurso de apelação interposto por Volmir Flores dos Santos contra decisão de primeira instância que lhe condenou ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 7 meses e 15 dias de detenção, em regime aberto, e ao pagamento de 12 dias-multa, cada qual no valor de 1/30 do salário-mínimo vigente à época dos fatos, a qual foi substituída por uma pena restritiva de direitos consistente em prestação pecuniária no valor de 10 (dez) salários mínimos, pela prática do delito tipificado no artigo 2º, inciso II, da Lei n. 8.137/90, na forma do artigo 71, caput, do Código Penal (por 4 vezes).

2. Ab initio, pretende a defesa o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva estatal relativa ao delito praticado no mês de setembro de 2013, ao argumento do transcurso do lapso prescricional de 4 (quatro) anos entre aludido fato e o recebimento da denúncia.

Pois bem.

Tendo em mente que a sentença condenatória de primeiro grau já transitou em julgado para o Ministério Público, a prescrição regula-se pela pena aplicada na sentença, conforme disposto no artigo 110, do Código Penal (com redação anterior à Lei nº 12.234/2010), in verbis:

Art. 110 - A prescrição depois de transitar em julgado a sentença condenatória regula-se pela pena aplicada e verifica-se nos prazos fixados no artigo anterior, os...

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