Acórdão Nº 0900279-68.2017.8.24.0018 do Quinta Câmara de Direito Público, 16-12-2022

Número do processo0900279-68.2017.8.24.0018
Data16 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0900279-68.2017.8.24.0018/SC

RELATOR: Desembargador HÉLIO DO VALLE PEREIRA

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELADO: 3MRC EVENTOS E DECORACOES LTDA. (RÉU) E OUTROS INTERESSADO: MUNICÍPIO DE CHAPECÓ-SC (INTERESSADO) INTERESSADO: JOSÉ ANTÔNIO DATONI (INTERESSADO) INTERESSADO: R2 CALCADOS E CONFECCOES EIRELI (INTERESSADO)

RELATÓRIO

Adoto o relatório da sentença proferida pelo Juiz de Direito Rogério Carlos Demarchi:

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA ajuizou a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA contra LUCIANO JOSE BULIGON, ROSELAINE BARBOZA VINHAS, RIQUELMO BEDIN FILHO, 3MRC EVENTOS E DECORAÇÕES LTDA. ME, ROBERTO DA SILVA CLAUSSEN e MARIO MARCIO MONTEIRO DA SILVA, alegando, em síntese, que: os réus Luciano, Roselaine e Riquelmo, na condição, respectivamente, de prefeito do Município de Chapecó, secretária de cultura e presidente da comissão de licitação, contrataram irregularmente a empresa 3MRC Eventos, de propriedade dos réus Roberto e Mario; causaram dano ao erário ao realizar contratação verbal e posterior formalização ilegal e direcionada de inexigibilidade de licitação; o objeto do contrato, no valor de R$ 330.000,00 (trezentos e trinta mil reais), consistia na confecção de três esculturas de bronze de personalidades locais para as comemorações do centenário do Município; após a assinatura do contrato, não havia documentos autuados de acordo com o procedimento da lei de licitação; o contrato foi assinado no dia 1º/06/2017, a procuração do representante legal é datada de 06/06/2017, e conforme dados cadastrais, desde abril daquele ano a empresa era gerida por dois outros sócios que não o réu Roberto, de modo que ele não poderia assinar o contrato; não há pesquisa para confirmar que o preço é compatível com o praticado no mercado; o prefeito apresentou o Projeto de Lei n. 62/2017 à Câmara de Vereadores, que foi objeto de requerimentos de informações e esclarecimentos, o que levou à retirada do projeto e a edição do Decreto n. 34.234 de 31/05/2017, dispondo sobre a edificação dos monumentos; o Conselho de Cultura manifestou-se pela ausência de discussão acerca do mérito do monumento; por ocasião da edição do Decreto, o réu Roberto já tinha apresentado os protótipos das esculturas, o que confirma a negociação anterior ocorrida nos meses de janeiro e fevereiro; o Decreto foi editado no dia anterior à assinatura do contrato; o interesse do prefeito era de realizar a contratação com Roberto de qualquer forma; os réus devem ser responsabilizados por ato de improbidade administrativa que causou dano ao erário e violou os princípios da administração pública, nos termos dos arts. 10, inciso VIII, e 11, inciso I, ambos da Lei n. 8.429/1992, e, assim, devem ser condenados às sanções do art. 12, incisos II e III, da Lei n. 8.429/1992. Requereu a concessão de liminar para proibição dos pagamentos referentes ao contrato n. 363/2017 e a indisponibilidade dos bens dos requeridos. Ao final, formulou requerimento de produção ampla de provas e procedência do pedido (evento 2).

Decisão deferindo a liminar e determinando a notificação dos réus (evento 9).

Notificados, os réus apresentaram defesas (eventos 66, 67 e 69).

Os requeridos interpuseram Agravos de Instrumento n. 4023886-24.2017.8.24.0000 e n. 4023759-86.2017.8.24.0000, nos quais obtiveram decisão de concessão do efeito suspensivo e de liberação dos bens e valores constritos (eventos 74 e 75).

O Município de Chapecó foi cientificado, mas não se manifestou (evento 82).

O Ministério Público manifestou-se (evento 94).

Decisão recebendo a petição inicial e determinando a citação dos réus do réu para resposta (evento 100).

Citados, os réus apresentaram contestação.

Luciano José Buligon alegou que: os fatos foram objeto, na esfera criminal, da notícia n. 01.2017.00022145-5, que foi arquivada pela Procuradoria-Geral de Justiça por não apresentar indícios de ato ilegal; a decisão do Agravo de Instrumento foi no sentido de que não há prova do dano ao erário, má-fé ou má-gestão; a contratação de obra artística pode ser feita por inexigibilidade; não pode haver a compreensão de dano financeiro presumido; a origem da ação está relacionada a interesses políticos de partidos da oposição; não houve violação aos princípios; a primeira proposta do artista no valor de US$ 250.000,00 foi recusada e a segunda orçada em US$ 100.917,44 foi aceita por ser coerente e proporcional; houve o compartilhamento das informações com o Conselho e a apresentação inicial do projeto de lei dando publicidade e transparência ao ato; o artista e a empresa que o representa são reconhecidos internacionalmente, trazendo acréscimo patrimonial e cultural das obras ao Município; o Ministério Público não provou o prejuízo ao erário, não podendo ser aceito o dano presumido; há distinção entre processo licitatório, processo seletivo para celebração de parcerias, dispensa e inexigibilidade de licitação; o inciso VIII do art. 10 da Lei de Improbidade não inclui a hipótese de inexigibilidade; a conduta é de boa-fé e, portanto, não há dolo. Por fim, postulou a improcedência dos pedidos iniciais (evento 121).

Riquelmo Bedin Filho e Roselaine Barboza Vinhas sustentaram que: os fatos foram arquivados no âmbito criminal; o Tribunal de Justiça, no julgamento do Agravo de Instrumento, considerou que é possível a contratação de artista por inexigibilidade e que não se pode presumir o dano ao erário; a ação foi motivada por interesses políticos de vereadores da oposição; não houve violação aos princípios e a contratação foi formalizada; a conduta não teve dolo ou culpa; os pedidos devem ser julgados improcedentes (evento 130).

Roberto da Silva Claussem, Mario Marcio Monteiro da Silva e 3MRC Eventos e Decorações Ltda. ME defenderam que: a celebração do contrato não dependia de autorização da Câmara de Vereadores; o art. 25, inciso III, da Lei 8.666/1993 autoriza a inexigibilidade de licitação na contratação de profissional do setor artístico; foi realizado procedimento com a justificativa do preço, que foi reduzido por insistência da Administração, o decreto e outros documentos que revelam a escolha do artista, pois se trata de profissional consagrado; a escolha do artista não é viciada ou afronta o princípio da impessoalidade, mas está na esfera de discricionariedade do administrador; o Ministério Público não comparou as obras dos artistas pesquisados na internet com as de Roberto Claussen; não houve conduta dolosa ou culposa; a pretensão inicial deve ser julgada improcedente; em eventual condenação, as penas aplicadas devem ser razoáveis e proporcionais (evento 131).

Houve réplica (evento 146).

Os Agravos de Instrumento foram julgados para restabelecer a decisão que decretou a indisponibilidade de bens (eventos 150-151).

Aportou aos autos a certidão de óbito de Mario Marcio Monteiro da Silva (evento 185).

Decisões reconhecendo a indisponibilidade de valores bloqueados nas contas bancárias de Luciano Buligon e Mario Marcio Monteiro da Silva, bem como determinou a notificação da convivente do falecido Mario (eventos 186 e 197).

A convivente do falecido Mario Marcio Monteiro da Silva, Penha Izar dos Santos Marreira, foi notificada e não se manifestou (evento 215).

O Ministério Público manifestou-se sobre as alterações na Lei de Improbidade provocadas pela Lei n. 12.230/2021, requerendo: o reconhecimento da proteção deficiente gerada pela nova lei à improbidade administrativa por ofender tratados internacionais incorporados ao ordenamento nacional; o exercício do controle de convencionalidade pelo Poder Judiciário a fim de atribuir efeito paralisante à Lei n. 14.230/2021 e afastar sua aplicação ao caso concreto; o afastamento da tese que conduza à prescrição, pela inconstitucionalidade material do § 5º do art. 23 da Lei 8.429/1992; a realização de exame de convencionalidade exclusivamente do art. 10, caput, incisos VIII e XII, e do art. 11, inciso I, e do art. 23, § 5º, todos da Lei n. 8.429/1992, com a redação que lhes foi dada pela Lei n. 14.230/2021; alternativamente, o reconhecimento do termo inicial da prescrição intercorrente como a data da entrada em vigor das Lei n. 14.230/2021; sucessivamente, a irretroatividade da Lei n. 14.230/2021 aos fatos ocorridos antes da sua vigência, em respeito ao princípio tempus regit actum, em razão da distinção entre direito administrativo sancionador e direito penal, este último somente alcançado pela retroação benéfica ao réu; o prosseguimento da ação pela condutas irregulares dolosas praticadas pelos demandados prevista no art. 10, inciso VIII, da Lei n. 8.429/1992 (evento 258).

Instados, os réus deixaram transcorrer o prazo in albis (eventos 269-273).

Acrescento que Sua Excelência julgou improcedentes os pedidos.

O recurso, claro, é do autor, que insiste na condenação dos réus.

Alega que a Lei 14.230/21 não pode retroagir pois, além de inconstitucional, nem mesmo ela previu essa possibilidade. Ressalta que a jurisprudência vai nesse sentido. Quanto aos fatos em si, pondera que os réus Luciano Buligon, Roselaine Barboza e Riquelmo Bedin se aproveitaram dos cargos públicos que ocupavam para contratação ilegal da empresa 3MRC Eventos a fim de que o codemandado Roberto, artista, confeccionasse três esculturas destinadas a homenagear personalidades locais. Além de pactuação que não observou uma série de formalidades, principiando-se o ajuste de forma verbal - só havendo regularização posterior, com intuito de dar ares de legalidade -, houve direcionamento e perda patrimonial efetiva aos cofres municipais, haja vista o valor vultoso repassado (R$ 330.000,00). "Outrossim, ao praticar os atos descritos na inicial, os apelados sabiam que estavam praticando atos de improbidade administrativa, uma vez que suas condutas eram voltadas ao favorecimento da empresa 3MRC e de Roberto da Silva Claussem e Mário Márcio Monteiro da Silva por meio de contratação pretérita, posteriormente levada a efeito...

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