Acórdão Nº 0900389-37.2016.8.24.0007 do Primeira Câmara de Direito Público, 17-04-2020

Número do processo0900389-37.2016.8.24.0007
Data17 Abril 2020
Tribunal de OrigemBiguaçu
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão

Apelação Cível n. 0900389-37.2016.8.24.0007, de Biguaçu

Relator: Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ALUGUEL SOCIAL CONCEDIDO ÀS PESSOAS EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE (LOAS, ART. 22). FAMÍLIA QUE ATENDE AO REQUISITO SALARIAL. RESOLUÇÃO QUE IMPÕE LIMITE TEMPORAL. IMPOSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA HIERARQUIA DAS NORMAS. BENEFÍCIO DEVIDO ENQUANTO PERDURAREM AS CONDIÇÕES QUE ENSEJARAM SEU PAGAMENTO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0900389-37.2016.8.24.0007, da comarca de Biguaçu 2ª Vara Cível em que é Apelante Município de Biguaçu e Apelado Ministério Público do Estado de Santa Catarina:

A Primeira Câmara de Direito Público decidiu, à unanimidade, negar provimento ao recurso. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Pedro Manoel Abreu e Jorge Luiz de Borba. Presidiu a sessão virtual o Excelentíssimo Senhor Desembargador Luiz Fernando Boller.

Florianópolis, 17 de abril de 2020.


Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva

Relator


RELATÓRIO

Ministério Público de Santa Catarina propôs ação civil pública em face do Município de Biguaçu.

Alegou que a Defesa Civil solicitou a desocupação da residência de Lucas Alves da Silva depois de verificar risco iminente de desabamento. A família foi morar em imóvel alugado no valor de R$ 500,00, custeado pela municipalidade (aluguel social), e foi inserida no Programa Minha Casa Minha vida com previsão de entrega do imóvel popular em março/2017.

A renda familiar era provida exclusivamente por Lucas, que ficou desempregado em setembro/2016. A Secretaria de Assistência Social, no entanto, informou que o auxílio seria pago somente até janeiro/2017, pois não havia situação de vulnerabilidade.

Postulou:


f) a procedência integral do pedido, confirmando-se os efeitos da tutela antecipatória (item "b") cujo deferimento se espera, para determinar ao Município de Biguaçu que mantenha o pagamento do auxílio moradia/aluguel social à família de Lucas Alves da Silva até que lhes seja efetivamente entregue as chaves de imóvel em condições dignas de moradia por meio de qualquer projeto/programa habitacional ou que a família consiga, por esforço próprio, sair da condição de vulnerabilidade social, sendo capaz de garantir por si, o pagamento de aluguel ou aquisição de casa própria; (f. 11)


Em contestação, o réu sustentou que: 1) Lucas teve uma modificação na sua renda, pois declarou que recebe R$ 1.200,00 para o programa Minha Casa Minha Vida e 2) a lei autoriza que o aluguel social seja pago por três meses, sendo possível renová-lo até quatro vezes, isto é, o beneficiário tem direito a mais uma renovação, mas não poderá ultrapassar o prazo de 12 meses de recebimento (f. 65/68).

Foi proferida sentença cuja conclusão é a seguinte:


DIANTE DO EXPOSTO, JULGO PROCEDENTE a presente ação civil pública, para, confirmando a liminar deferida, DECLARAR devido o pagamento de auxílio moradia por parte do Município de Biguaçu à família de Lucas Alves da Silva, desde o termo inicial definido na liminar de pp. 39-42 até 21 de setembro de 2017, data em que a família recebeu as chaves do imóvel referido nesta sentença.

Isento de custas o Município réu.

Descabe, ainda, condenação em honorários. (f. 114/122)


O réu, em apelação, reeditou os argumentos da defesa (f. 138/142).

Com as contrarrazões (f. 148/154), a d. Procuradoria-Geral de Justiça se manifestou pelo desprovimento, em parecer do Dr. Murilo Casemiro Mattos (f. 161/162).


VOTO

O ente público, em síntese, sustentou que o beneficiário do aluguel social perdeu o direito ao declarar no Programa Minha Casa Minha Vida renda de R$ 1.200,00, o que afasta a condição de vulnerabilidade.

A Lei n. 8.742/1993 (Lei Orgânica da Assistência Social – Loas) prevê:


Art. 15. Compete aos Municípios:

I - destinar recursos financeiros para custeio do pagamento dos benefícios eventuais de que trata o art. 22, mediante critérios estabelecidos pelos Conselhos Municipais de Assistência Social;

[...]

Art. 22. Entendem-se por benefícios eventuais as provisões suplementares e provisórias que integram organicamente as garantias do Suas e são prestadas aos cidadãos e às famílias em virtude de nascimento, morte, situações de vulnerabilidade temporária e de calamidade pública.


E a Resolução n. 3/2011 do Conselho Municipal de Assistência Social dispõe:


Art. 2º - O Benefício Eventual é uma modalidade de provisão de Proteção Social de caráter suplementar e temporário que integra organicamente as garantias do Sistema Único de Assistência Social – SUAS, com fundamentação nos princípios da cidadania e nos direitos sociais e humanos.

Art. 3º - O Benefício Eventual destina-se às famílias e pessoas com renda de um salário mínimo ou renda per capita até 1/2 (meio) salário mínimo e com impossibilidades de arcar por conta própria com o enfrentamento de contingências sociais que provoquem riscos e fragilizam a manutenção da unidade familiar, a sobrevivência de seus membros ou a manutenção da pessoa.

[...]

Art. 7º - Serão considerados Benefícios Eventuais:

[...]

f) Auxílio Moradia I, como ajuda de custo para pagamento de aluguel de imóvel, sendo meio facilitador dentro do Plano de Atendimento à Família ou ao indivíduo, destinado às situações de desabrigamento das unidades de acolhimento institucional da Assistência Social ou para evitar o abrigamento nessas unidades.

[...]

Parágrafo Único: O valor máximo repassado para os auxílios moradias I, II e III terá o valor de no máximo R$ 500,00 (quinhentos reais) devendo ser utilizado para pagamento de aluguel de imóvel com apresentação de documento comprobatório desta utilização, através de recibo de pagamento.

[...]

Art. 9º - Os Benefícios Eventuais, por constituir-se em uma prestação temporária, poderão ser concedidos:

[...]

f) Até 03 meses, prorrogada por até 04 vezes, perfazendo o total de 12 meses após avaliação e justificativa técnica para o benefício eventual de auxílio moradia. (grifou-se) (f. 69/74)


Os critérios são objetivos: o núcleo familiar que estiver desabrigado e com renda de até 1/2 salário mínimo per capita fará jus ao aluguel social.

O Município determinou a evacuação da família (f. 27/29) e deferiu o benefício eventual em 31-3-2016 (f. 31) com mais duas renovações (f. 30 e 38).

A Secretaria de Assistência Social e Habitação informou que a quarta e última prorrogação não seria possível, pois "a família modificou sua condição não estando mais em situação de vulnerabilidade".

O Município defende que o indeferimento foi correto porque o beneficiário passou a auferir R$ 1.200,00 por mês.

Em 2017, o salário mínimo era de R$ 937,00. A família, constituída pelo casal e duas filhas, tinha renda per capita de R$ 300,00, ou seja, menor que 1/2 salário mínimo.

Isso, por si só, já torna...

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