Acórdão Nº 0900527-97.2018.8.24.0018 do Quinta Câmara de Direito Público, 04-04-2023

Número do processo0900527-97.2018.8.24.0018
Data04 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 0900527-97.2018.8.24.0018/SC



RELATOR: Desembargador HÉLIO DO VALLE PEREIRA


APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELADO: VILMAR FOPPA (RÉU) E OUTROS INTERESSADO: MUNICÍPIO DE CAXAMBU DO SUL-SC (INTERESSADO)


RELATÓRIO


Adoto o relatório da sentença:
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA ajuizou a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA contra VILMAR FOPPA, IVAN CARLOS BELLEI, AMÉRICO FRANCISCO PEDROSO, DOUGLAS EVAIR PEDROSO, EDITORA PEDROSO E PEDROSO LTDA. ME e JULIA SCHNEIDER PEDROZO ME, alegando, em síntese, que: o réu Vilmar Foppa, no exercício do cargo de Prefeito de Caxambu do Sul, e Ivan Carlos Bellei, servidor responsável pelo setor de compras do município, em 11-3-2011, iniciaram o processo licitatório n. 16/2011, para contratação dos serviços de divulgação de atos oficiais; foram enviados convites às empresas Editora Gráfica Ltda, Julia Schneider Pedroso ME e Editora Pedroso e Pedroso ME; somente as duas últimas participaram do certame, representadas, respectivamente, por Américo Pedroso e Douglas Evair Pedroso, pai e filho; os réus agiram em conluio visando fraudar a licitação, uma vez que as empresas participantes eram comandadas pelo mesmo grupo familiar; a empresa Editora Pedroso e Pedroso ME (Jornal Diário A Verdade) contratada no ano de 2010, para a publicação dos atos oficiais municipais, concorreu novamente; após a adjudicação da licitação no ano de 2011 para a empresa Julia Schneider Pedroso ME (Jornal da Manhã), a empresa Editora Pedroso continuou a publicar atos oficiais do Município em seu jornal; os requeridos Vilmar e Ivan tinha conhecimento de que as empresas pertenciam ao mesmo grupo familiar; as empresas Julia Schneider Pedroso Ltda e Editora Gráfica Ltda foram cadastradas no Município em ordem sequencial, apenas para formalizar o convite, a fim de favorecer os requeridos, que permaneceram com a veiculação dos atos oficiais, mediante outra pessoa jurídica; o laudo pericial, por ocasião da medida cautelar n. 0000864-79.2013.8.24.0053, revelou que a produção de ambos os jornais era realizada em conjunto; houve dano ao erário por fraude à licitação e frustação do caráter competitivo, além de violação aos princípios da legalidade, moralidade e impessoalidade, caracterizando atos de improbidade administrativa. Requereu a condenação dos réus às penalidades prevista no art. 12, incisos II e III, da Lei n. 8.429/1992, por prejuízo ao erário e violação aos princípios (art. 10, inciso VIII, e art. 11, caput, do referido diploma). Formulou os requerimentos de praxe (evento 1).
Notificados, os réus apresentaram suas defesas (eventos 66 e 67), exceto Vilmar Foppa, embora regularmente intimado (evento 69).
O Município de Caxambu do Sul foi citado e informou que se limitaria a acompanhar a tramitação do feito (evento 68).
Sobreveio manifestação do Ministério Público (evento 73).
Decisão recebendo a inicial e determinando a citação dos requeridos (evento 75).
Citados os réus, somente Vilmar Voppa e Ivan Carlos Bellei ofertaram contestação, argumentando que: o periódico "Diário da Verdade" era o único jornal de circulação no Município de Caxambu; os atos oficiais deveriam ser publicados naquele jornal para que pudessem chegar ao conhecimento da população local; o procedimento licitatório foi realizado por convite, para as três empresas que tinham cadastro no departamento de licitações do Município; Ivan Carlos Bellei era apenas o secretário de administração, de modo que não tinha ingerência na licitação que tramitava em departamento autônomo; Vilmar Foppa, no cargo de prefeito, assinava os documentos que as formalidade do processo exigiam, delegando o cumprimento aos servidores técnicos das pastas; a confusão das publicações é de responsabilidade dos editores dos jornais, sem que tenha causado prejuízo ao Município, pois as publicações ocorreram e os jornais circularam; o valor contratado estava abaixo dos preços praticados na região; não houve ato de má-fé que pudesse caracterizar a improbidade; não há demonstração da individualização da conduta dos réus; o dolo é elemento necessário e não foi apontado pelo Ministério Público; não é cabível a responsabilização objetiva; o procedimento criminal aberto pelo Ministério Público foi arquivado por ausência de elementos incriminadores; não houve a suposta fraude ao certame licitatório, uma vez que não houve conduta dolosa a tal fim; não há irregularidades na licitação, somente a alegação da acusação de que duas das três empresas convidadas eram do mesmo grupo familiar; e não há dolo nem prejuízo ao erário e, portanto, não há ato de improbidade. Por fim, postularam a improcedência dos pedidos iniciais (evento 102).
Decisão substituindo a falecida Julia Schneider Pedroso por seu espólio, representado por Atilio Dias Pedroso (evento 112).
Atilio Dias Pedroso argumentou que: deve ser concedida a justiça gratuita; é idoso e com problemas de saúde; não lhe cabe representar o espólio de Julia, que teve 8 (oito) filhos; não há inventário em andamento; indica Américo Francisco Pedroso para representar ou que sejam incluídos todos os herdeiros de Julia (evento 120).
O Ministério Público manifestou-se pela indicação dos herdeiros que estão na posse e administração dos bens de Julia; se não houver, que Atilio seja mantido, por força do art. 1.797, inciso II, do Código Civil (evento 124).
Despacho determinando que Atilio cumpra a manifestação ministerial (evento 126).
Atilio Dias Pedroso informou que o administrador provisório dos bens é Américo Francisco Pedroso (evento 137).
Américo Francisco Pedroso foi citado (evento 141) e não se manifestou (evento 143).
O Ministério Público manifestou-se pelo saneamento e realização de instrução (evento 147).
As partes foram instadas para se manifestarem sobre as alterações da Lei de Improbidade Administrativa introduzidas pela Lei n. 14.230/2021 (evento 149).
O Ministério Público manifestou-se sobre as alterações na Lei de Improbidade provocadas pela Lei n. 12.230/2021, requerendo: o reconhecimento da proteção deficiente gerada pela nova lei à improbidade administrativa por ofender tratados internacionais incorporados ao ordenamento nacional; o exercício do controle de convencionalidade pelo Poder Judiciário a fim de atribuir efeito paralisante à Lei n. 14.230/2021 e afastar sua aplicação ao caso concreto; a realização de exame de convencionalidade exclusivamente do art. 10, caput, inciso VIII, e do art. 11, caput e inciso I, todos da Lei n. 8.429/1992, com a redação que lhes foi dada pela Lei n. 14.230/2021; sucessivamente, a irretroatividade da Lei n. 14.230/2021 aos fatos ocorridos antes da sua vigência, em respeito ao princípio tempus regit actum, em razão da distinção entre direito administrativo sancionador e direito penal, este último somente alcançado pela retroação benéfica ao réu; o prosseguimento da ação pelas condutas irregulares dolosas praticadas pelos demandados prevista no art. 10, inciso VIII, da Lei n. 8.429/1992 (evento 178).
Ivan Carlos Bellei, Vilmar Foppa, Douglas Evair Pedroso e Américo Francisco Pedroso asseveraram que: a nova lei exigiu a presença do dolo na ação do agente público; o escopo da lei não é responsabilizar o agente que cometa erro por mera inaptidão, mas aquele que tenha a livre vontade de cometer o ilícito; deve ser demonstrado o efetivo dano ao erário; a ação deve ser extinta (eventos 188, 189 e 190).
Decisão reconhecendo a possibilidade de continuidade do feito com base no art. 10, inciso VIII, da Lei n. 8.429/1992, a imprescritibilidade do dano ao erário e intimando as partes para especificação de provas (evento 193).
As partes se manifestaram requerendo a oitiva de testemunhas (eventos 202 e 206).
Adito que o veredicto foi de improcedência.
O recurso, claro, é do autor, que insiste na punição.
Alega que a Lei 14.230/2021 não pode retroagir, pois além de inconstitucional, causando "proteção deficiente à probidade administrativa", nem mesmo a norma esse efeito previu, resultando ainda em ofensa a convenções internacionais de que o Brasil é signatário. Apresenta precedentes nesse sentido.
Quanto aos fatos em si, reitera que houve fraude em licitação. Os réus Vilmar e Ivan, respectivamente prefeito e secretário de administração à época, direcionaram o certame - voltado à contratação de serviços de divulgação de atos oficiais do município -, encaminhando convite a duas empresas (Julia Schneider Pedroso ME e Editora Pedroso e Pedroso Ltda., representadas, respectivamente, por Américo e Douglas, pai e filho) que pertenciam ao mesmo grupo familiar. Houve, com isso, a frustração do caráter competitivo, violando princípios administrativos e causando prejuízos ao erário. Pondera, a partir daí, que não tinha como quantificar, à época da investigação, o dano promovido, o qual muito menos é possível de ser feito agora, anos depois do ocorrido.
"De qualquer forma, ficou demonstrado, no decorrer da ação, que o dano causado pelos apelados, ao fraudarem o Processo Licitatório n. 16/2011 - Convite n. 05/2011, acarretou perda patrimonial efetiva aos cofres públicos, porque o contrato firmado, que consistia na "utilização de espaço mensal em jornal de circulação regional, em até 2.000 cm/coluna mensais, para divulgação dos atos oficiais do Município de Caxambu do Sul", perfazia o valor de R$ 12.555,00 (mil quinhentos e cinquenta e cinco reais e cinquenta centavos). Assim, a "perda patrimonial efetiva", atualmente exigida pelo art. 10, inciso VIII, da Lei 8.429/1992 para que seja caracterizado o ato de improbidade administrativa, está demonstrada pelo próprio fato de os apelados terem fraudado o certame para participação de empresas pertencentes a um mesmo grupo familiar, ou seja, o valor do dano neste caso é exatamente o valor contratado."
Afirma que os agentes públicos tinham ciência dos atos de...

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