Acórdão Nº 0900535-45.2016.8.24.0018 do Quinta Câmara Criminal, 13-10-2022

Número do processo0900535-45.2016.8.24.0018
Data13 Outubro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0900535-45.2016.8.24.0018/SC

RELATOR: Desembargador ANTÔNIO ZOLDAN DA VEIGA

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELANTE: ALEXANDRE BERNA (RÉU) APELANTE: LAURO TECCHIO (RÉU) APELANTE: CLEDEMIR GOMES CARNEIRO (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Lauro Tecchio e Alexandre Berna, imputando-lhes a prática dos crimes previstos no art. 90 e no art. 92, caput, por duas vezes, ambos da Lei n. 8.666/1993, na forma do art. 69 do Código Penal, e contra Cledemir Gomes Carneiro, imputando-lhe a prática do crime previsto no art. 90 da Lei n. 8.666/1993 c/c art. 29 do Código Penal, conforme os seguintes fatos narrados na peça acusatória (doc. 2002 da ação penal):

Resumo Fático:

No ano de 2012 o Ministério Público de Santa Catarina instaurou o procedimento investigatório criminal n. 06.2012.00003818-7 que instrui a presente incoativa, a partir de representação recebida nesta Promotoria de Justiça noticiando supostas irregularidades em procedimentos licitatórios realizados no município de Cordilheira Alta/SC, dentre eles, o Pregão Presencial - Registro de Preços n. 30/2011 (Processo Administrativo n. 44/2011), destinado à aquisição de combustíveis (gasolina comum e óleo diesel) para abastecimento da frota de veículos e máquinas daquele município para o exercício de 2012.

Em apertada síntese, apurou-se nas investigações que a supramencionada licitação foi realizada de maneira oculta para beneficiar empresa de propriedade do então vereador e ora denunciado Lauro Tecchio, qual seja, o posto de combustível denominado "Auto Posto Diamante Ltda." (conhecido também pelo nome fantasia "Auto Posto Vitória"), embora registrado em nome de terceiros (a saber, dos denunciados Alexandre Berna e Cledemir Gomes Carneiro).

Aliás, tal conclusão vem corroborada por informações prestadas pelo próprio denunciado Lauro Tecchio, quando de recente registro de Boletim de Ocorrência junto à Delegacia de Polícia de Chapecó, no dia 26 de maio de 2016, ocasião em que afirmou ser seu o posto de combustíveis de nome Auto Posto Diamante (n. 6234, cópia anexa). Ainda, os documentos de fls. 1431-1437 comprovam que o imóvel em que está situado o "Auto Posto Diamante" (matriculado sob o nº 29.464, antes de propriedade de Maria Bernadete Zilio - ME) foi arrematado em leilão pela empresa "Letícia Comércio de Madeiras Ltda. ME", também de propriedade do denunciado Lauro Tecchio.

Fato 1: do crime previsto no art. 90 da Lei n. 8666/93.

Nesse contexto, no decorrer da instrução do procedimento investigatório criminal, apurou-se que o denunciado Lauro Tecchio, eleito vereador no ano de 2008 e reeleito no ano de 2012, ciente de que, por este motivo, estaria impedido de contratar com o órgão público em razão da vedação expressa contida no artigo 20, incisos I, "A", e II, "A", da Lei Orgânica de Cordilheira Alta/SC, que proíbe os vereadores de contratar com o Município1 , constituiu a empresa "Auto Posto Diamante Ltda.", valendo-se de interpostas pessoas ("laranjas"), no intuito de burlar a legislação e participar de procedimentos licitatórios destinados à venda de combustíveis ao município de Cordilheira Alta/SC.

Na ocasião, em data e circunstâncias a serem esclarecidas durante a instrução processual, o denunciado Lauro Tecchio, agindo com plena consciência da ilicitude de sua conduta, e almejando a apropriação indevida de recursos públicos, ajustou com os denunciados Alexandre Berna e Cledemir Gomes Carneiro a criação da empresa "Auto Posto Diamante Ltda.", figurando estes como "sóciosproprietários" da pessoa jurídica, a fim de que a empresa pudesse participar de futura licitação municipal.

Assim foi que, frustrando o caráter competitivo do certame e com o intuito de obter vantagem econômica decorrente da adjudicação do objeto da licitação (consistente na venda/fornecimento do combustível durante todo o ano de 2012 ao ente público municipal), o vereador e denunciado Lauro Tecchio, em unidade de esforços com Alexandre Berna e Cledemir Gomes Carneiro, por intermédio da citada pessoa jurídica, participou do Pregão Presencial Registro de Preços n. 30/2011 (Processo Administrativo n. 44/2011) realizado no município, sagrando-se vencedor na licitação, e celebrando contrato com o Município de Cordilheira Alta (contrato administrativo nº 009/2012), contrariando os dispositivos legais que o impedem de contratar com o ente público municipal, e frustrando mediante ajuste entre os denunciados, o caráter competitivo do procedimento licitatório.

Importa destacar que tais "laranjas" são pessoas de confiança de Lauro, conforme se verifica dos termos de declaração que acompanham o presente, dos quais se verifica que o denunciado Alexandre Berna, além de ter sido funcionário da sua empresa (Madeireira Tecchio), reside no pátio da referida madeireira há mais de trinta anos, enquanto o denunciado Cledemir Gomes Carneiro é casado com sua sobrinha Francieli Guolo, filha de sua irmã Celita Salete Tecchio Guolo e de Adenir Alberto Guolo, que não por acaso também é contador da empresa Auto Posto Diamante Ltda.

Dessa forma, o denunciado Lauro Tecchio, com o auxílio de Alexandre Berna e Cledemir Gomes Carneiro, de forma livre e voluntária, cientes da ilicitude e reprovabilidade de suas condutas, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, fraudaram o caráter competitivo do procedimento licitatório, com o intuito de obter vantagem patrimonial (qual seja, adjudicação de objetos por valores bem próximos ao máximo fixado no edital), decorrente da adjudicação do objeto da licitação, visando o benefício pessoal destes em detrimento da Administração Pública.

Fato 2: do crime previsto no art. 92, parágrafo único, da Lei n. 8666/93.

Não fosse o bastante, apenas dois meses depois de assinado o contrato administrativo n. 009/2012, invocando abstratamente o disposto no art. 65, II, d, da Lei n. 8666/93, o já falecido prefeito Ribamar Alexandre Assonalio acabou por alterar o contrato original firmado, majorando o valor do litro do combustível de R$ 1,88 para R$ 1,95, admitindo ou possibilitando modificação contratual em desacordo com a lei, conduta esta plenamente aderida por parte do denunciado Alexandre Berna que, agindo em favor de Lauro Tecchio - este possuidor do domínio do fato - obteve vantagem indevida ou se beneficiou da modificação contratual, feita sem fundamento concreto.

Ainda, passados quatro meses da primeira alteração, o já falecido prefeito Ribamar Alexandre Assonalio acabou por novamente alterar o contrato original firmado, majorando o valor do litro do combustível de R$ 1,95 para R$ 2,09, admitindo ou possibilitando modificação contratual em desacordo com a lei, conduta esta plenamente aderida por parte do denunciado Alexandre Berna, que agindo em favor de Lauro Tecchio - este possuidor do domínio do fato- obteve vantagem indevida ou se beneficiou da modificação contratual, feita sem fundamento concreto.

Assim, a intenção dos denunciados em se locupletar à custa da Administração Pública fica ainda mais evidente quando se analisa os dois Termos Aditivos ao Contrato (contratos administrativos nº 043/2012 e 084/2012), que reajustou o valor pago à empresa contratada, supostamente para manutenção do equilíbrio econômico financeiro do Contrato Administrativo n. 009/2012, sem justificativa plausível para tanto.

Recebida a denúncia (doc. 2001 da ação penal) e encerrada a instrução processual, sobreveio sentença, cuja parte dispositiva segue parcialmente transcrita (doc. 2135 da ação penal):

Ante o exposto, julgo parcialmente procedente a denúncia para:

I. condenar o acusado Cledemir Gomes Carneiro ao cumprimento de pena de 06 meses de detenção, em regime aberto, além do pagamento de R$ 5.510,00 a título de multa, pela prática do crime previsto no art. 93 da Lei n. 8.666/93.

Por preencher os requisitos do artigo 44 do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade aplicada por uma pena restritiva de direito: prestação de serviços à comunidade, na proporção de 1 hora para cada dia de condenação, em instituição a ser indicada na posterior fase de execução.

II. condenar o acusado Alexandre Berna ao cumprimento de pena de 02 anos e 10 meses de detenção, em regime aberto, além do pagamento de R$ 16.530,00 a título de multa, pela prática dos crimes previstos no art. 93 e 92, caput, por duas vezes (CP, art. 71), ambos da Lei n. 8.666/93, nos termos do art. 69 do CP.

Por preencher os requisitos do artigo 44 do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade aplicada por duas penas restritivas de direitos: (i) prestação de serviços à comunidade, na proporção de 1 hora para cada dia de condenação, em instituição a ser indicada na posterior fase de execução; e (ii) limitação de fim de semana, permanecer, aos sábados e domingos, por 5 horas diárias, em casa de albergado ou outro estabelecimento adequado, pelo período da pena privativa de liberdade aplicada.

III. condenar o acusado Lauro Tecchio ao cumprimento de pena de 04 anos e 03 meses de detenção, em regime semi-aberto, além do pagamento de R$ 24.600,00 a título de multa, pela prática dos crimes previstos no art. 90 e 92, caput, por duas vezes (CP, art. 71), ambos da Lei n. 8.666/93, nos termos do art. 69 do CP.

Concedo aos réus o direito de apelar em liberdade por não vislumbrar nenhuma das hipóteses previstas no art. 312 do Código de Processo Penal.

Deixo de fixar valor mínimo para reparação dos danos, tendo em vista a ausência de pedido do Ministério Público e a insuficiência dos elementos fáticos colhidos ao longo da instrução processual (art. 387, IV, do CPP).

Condeno os acusados ao pagamento das custas processuais.

Contra a sentença, os réus Alexandre e Cledemir opuseram embargos de declaração (doc. 2143 da ação penal), os quais foram rejeitados (doc. 2150 da ação penal).

Irresignados, o Ministério Público e os acusados Lauro, Alexandre e Cledemir interpuseram recursos de apelação...

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