Acórdão Nº 0900540-54.2014.8.24.0045 do Quarta Câmara de Direito Público, 14-10-2021
Número do processo | 0900540-54.2014.8.24.0045 |
Data | 14 Outubro 2021 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça de Santa Catarina |
Órgão | Quarta Câmara de Direito Público |
Classe processual | Apelação |
Tipo de documento | Acórdão |
Apelação Nº 0900540-54.2014.8.24.0045/SC
RELATORA: Desembargadora VERA LÚCIA FERREIRA COPETTI
APELANTE: ZELI GONCALVES DA SILVA APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA
RELATÓRIO
Com fulcro nos princípios da celeridade e economia processuais, e por retratar com fidedignidade a tramitação do feito na origem, adota-se, a começar, o relatório elaborado pelo Juízo a quo na sentença apelada (Evento 56, Eproc 1º Grau), in verbis:
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA ajuizou ação civil pública contra MUNICÍPIO DE PALHOÇA e ZELI GONÇALVES DA SILVA, todos devidamente qualificados e representados no feito.
Em síntese, aduziu que ZELI suprimiu vegetação e promoveu construção de uma casa de madeira em área de preservação permanente; que nos fundos da edificação passa o Rio Aririú, com largura aproximada de vinte metros; que parte dos encanamentos de esgoto da residência despejam os resíduos diretamente no rio e o poluem; que no local é desenvolvida atividade comercial, consistente na produção e comércio de lanches rápidos e aves assadas, o qual aumenta o potencial de poluição e contaminação pública no local. Requereu a desocupação da área, a remoção da edificação, dos materiais e a recuperação ambiental. Em relação ao MUNICÍPIO, pediu que concorresse com esforços e maquinário para remoção e recuperação do local. Juntou documentos.
O pedido de tutela de urgência foi deferido, para determinar a interdição de uso, lacre e desocupação da área pela ré ZELI; e que o MUNICÍPIO promovesse os atos administrativos necessários à fiscalização. Contra esta decisão não houve recurso (ps. 29/32).
Citados, os réus apresentaram contestações distintas.
ZELI GONÇALVES DA SILVA invocou a prescrição. No mérito, contrapôs-se aos argumentos e pedidos lançados na exordial. Pleiteou a gratuidade da justiça. Juntou documentos.
MUNICÍPIO DE PALHOÇA não suscitou preliminares. No mérito, defendeu que possui responsabilidade civil subsidiária e pugnou pela improcedência da demanda. Juntou documentos.
O MINISTÉRIO PÚBLICO noticiou que tomou conhecimento por meio de atendimento sigiloso (n.º 05.2018.00006350-0) que além dos danos ambientais, o estabelecimento clandestino promove eventos até altas horas da madrugada, com perturbação ao sossego dos vizinhos e poluição sonora (p. 90).
Na audiência de conciliação (p. 106), não houve acordo.
O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu as derradeiras alegações por memoriais (ps. 111/117). Vieram-me os autos conclusos.
Sobreveio a sentença, de procedência, nos seguintes termos:
Ante o exposto, julgo procedentes os pedidos articulados nesta ação civil pública ajuizada por MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA contra ZELI GONÇALVES DA SILVA e MUNICÍPIO DE PALHOÇA, nos seguintes termos:
a) confirmo a decisão que deferiu a tutela de urgência (ps. 29/32), em seu exato teor;
b) determino que a ZELI GONÇALVES DA SILVA desocupe por completo a área descrita na petição inicial e nos pareceres técnicos (ps. 42/52 e 118/131); remova a edificação e materiais; e abstenha-se de praticar atividade comercial ou qualquer outro ato de degradação ambiental naquele local (nos termos do que requerido às ps. 09/10, item 2, sob pena de multa cominatória diária (no valor já arbitrado às ps. 29/32), a ser revertida em favor do Fundo de Recuperação de Bens Lesados - FRBL do Estado de Santa Catarina (Lei n.º 7.345/85, art. 13), sem prejuízo da intervenção estatal para fazer cumprir a sentença por força própria;
b) determino que o MUNICÍPIO DE PALHOÇA promova os atos administrativos próprios de fiscalização e defesa do meio ambiente, concorra com os esforços e maquinários necessários à remoção da edificação e materiais implantados pela corré na área descrita na inicial.
Condeno a ré ZELI GONÇALVES DA SILVA ao pagamento das custas/despesas processuais, observada a suspensão de que trata o § 3.º do art. 98 do CPC, ante a concessão da gratuidade da justiça (item 1 desta sentença).
O MUNICÍPIO DE PALHOÇA é isento de custas, por força do disposto no art. 35, alínea "h", da Lei Complementar Estadual n. 156/97, com as alterações introduzidas pela Lei Complementar Estadual n. 524/2010.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Após o trânsito em julgado, arquive-se, com as devidas baixas.
Inconformada, a requerida ZELI GONÇALVES DA SILVA interpôs recurso de apelação, alegando, em resumo, prescrição da ação da administração para apurar a prática de infrações contra o meio ambiente, de acordo com o Decreto n. 6.514/2008 e Lei n. 9.873/1999, porquanto transcorridos 5 (cinco) anos sem que houvesse fiscalização pelos órgãos competentes em seu imóvel. Argumentou ser incabível a demolição da edificação, tendo em vista que o adquiriude boa-fé, em 2006, com ela já consumada. Pontuou, também, que o desfazimento da obra ensejará mais prejuízos, assim como que não possui condições financeiras de morar em outro lugar e que não mais subsistem danos ao meio ambiente na área, pois providenciou a construção de fossas para impedir o lançamento de dejetos e esgoto no rio e encerrou as atividades comerciais no local.
Requereu o conhecimento e o provimento do recurso para "que a sentença de primeiro grau seja reformada no sentido de que seja desconsiderada a demolição da construção, tendo em vista que a parte Ré fez manutenção na propriedade construindo fossas para que não seja mais despejados rejeitos no percurso do rio, ou que seja aplicada pena alternativa a de demolição, já que as construções são antigas (Evento 65, Eproc 1° Grau).
Após as contrarrazões (Evento 69, Eproc 1º Grau), os autos ascenderam a este Tribunal, tendo lavrado parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça a Exma. Sra. Dra. Sonia Maria Demeda Groisman Piardi, pelo conhecimento e desprovimento do recurso (Evento 14, Eproc 2º Grau).
É o relatório.
VOTO
No que importa ao juízo de admissibilidade, conhece-se do recurso de apelação, por ser próprio e tempestivo.
A apelante, em linhas gerais, sustenta a ocorrência de prescrição, pela falta de fiscalização no quinquênio, assim como que i) não mais subsistem danos ambientais, pois o curso d´água permanece inalterado, ii) a demolição é excessiva e iii) que agiu com boa-fé, pelo desconhecimento da ocorrência de danos ambientais na propriedade.
A insurgência não comporta acolhimento, adianta-se.
Cumpre, inicialmente, afastar a prejudicial de mérito aventada, porquanto, diversamente da pretensão meramente patrimonial, não há falar em prescrição da reparação de danos ambientais.
Com efeito, o dano ambiental se renova incessantemente pela violação do dever de preservação, que se perpetua no tempo, pela imposição constitucional do...
RELATORA: Desembargadora VERA LÚCIA FERREIRA COPETTI
APELANTE: ZELI GONCALVES DA SILVA APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA
RELATÓRIO
Com fulcro nos princípios da celeridade e economia processuais, e por retratar com fidedignidade a tramitação do feito na origem, adota-se, a começar, o relatório elaborado pelo Juízo a quo na sentença apelada (Evento 56, Eproc 1º Grau), in verbis:
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA ajuizou ação civil pública contra MUNICÍPIO DE PALHOÇA e ZELI GONÇALVES DA SILVA, todos devidamente qualificados e representados no feito.
Em síntese, aduziu que ZELI suprimiu vegetação e promoveu construção de uma casa de madeira em área de preservação permanente; que nos fundos da edificação passa o Rio Aririú, com largura aproximada de vinte metros; que parte dos encanamentos de esgoto da residência despejam os resíduos diretamente no rio e o poluem; que no local é desenvolvida atividade comercial, consistente na produção e comércio de lanches rápidos e aves assadas, o qual aumenta o potencial de poluição e contaminação pública no local. Requereu a desocupação da área, a remoção da edificação, dos materiais e a recuperação ambiental. Em relação ao MUNICÍPIO, pediu que concorresse com esforços e maquinário para remoção e recuperação do local. Juntou documentos.
O pedido de tutela de urgência foi deferido, para determinar a interdição de uso, lacre e desocupação da área pela ré ZELI; e que o MUNICÍPIO promovesse os atos administrativos necessários à fiscalização. Contra esta decisão não houve recurso (ps. 29/32).
Citados, os réus apresentaram contestações distintas.
ZELI GONÇALVES DA SILVA invocou a prescrição. No mérito, contrapôs-se aos argumentos e pedidos lançados na exordial. Pleiteou a gratuidade da justiça. Juntou documentos.
MUNICÍPIO DE PALHOÇA não suscitou preliminares. No mérito, defendeu que possui responsabilidade civil subsidiária e pugnou pela improcedência da demanda. Juntou documentos.
O MINISTÉRIO PÚBLICO noticiou que tomou conhecimento por meio de atendimento sigiloso (n.º 05.2018.00006350-0) que além dos danos ambientais, o estabelecimento clandestino promove eventos até altas horas da madrugada, com perturbação ao sossego dos vizinhos e poluição sonora (p. 90).
Na audiência de conciliação (p. 106), não houve acordo.
O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu as derradeiras alegações por memoriais (ps. 111/117). Vieram-me os autos conclusos.
Sobreveio a sentença, de procedência, nos seguintes termos:
Ante o exposto, julgo procedentes os pedidos articulados nesta ação civil pública ajuizada por MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA contra ZELI GONÇALVES DA SILVA e MUNICÍPIO DE PALHOÇA, nos seguintes termos:
a) confirmo a decisão que deferiu a tutela de urgência (ps. 29/32), em seu exato teor;
b) determino que a ZELI GONÇALVES DA SILVA desocupe por completo a área descrita na petição inicial e nos pareceres técnicos (ps. 42/52 e 118/131); remova a edificação e materiais; e abstenha-se de praticar atividade comercial ou qualquer outro ato de degradação ambiental naquele local (nos termos do que requerido às ps. 09/10, item 2, sob pena de multa cominatória diária (no valor já arbitrado às ps. 29/32), a ser revertida em favor do Fundo de Recuperação de Bens Lesados - FRBL do Estado de Santa Catarina (Lei n.º 7.345/85, art. 13), sem prejuízo da intervenção estatal para fazer cumprir a sentença por força própria;
b) determino que o MUNICÍPIO DE PALHOÇA promova os atos administrativos próprios de fiscalização e defesa do meio ambiente, concorra com os esforços e maquinários necessários à remoção da edificação e materiais implantados pela corré na área descrita na inicial.
Condeno a ré ZELI GONÇALVES DA SILVA ao pagamento das custas/despesas processuais, observada a suspensão de que trata o § 3.º do art. 98 do CPC, ante a concessão da gratuidade da justiça (item 1 desta sentença).
O MUNICÍPIO DE PALHOÇA é isento de custas, por força do disposto no art. 35, alínea "h", da Lei Complementar Estadual n. 156/97, com as alterações introduzidas pela Lei Complementar Estadual n. 524/2010.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Após o trânsito em julgado, arquive-se, com as devidas baixas.
Inconformada, a requerida ZELI GONÇALVES DA SILVA interpôs recurso de apelação, alegando, em resumo, prescrição da ação da administração para apurar a prática de infrações contra o meio ambiente, de acordo com o Decreto n. 6.514/2008 e Lei n. 9.873/1999, porquanto transcorridos 5 (cinco) anos sem que houvesse fiscalização pelos órgãos competentes em seu imóvel. Argumentou ser incabível a demolição da edificação, tendo em vista que o adquiriude boa-fé, em 2006, com ela já consumada. Pontuou, também, que o desfazimento da obra ensejará mais prejuízos, assim como que não possui condições financeiras de morar em outro lugar e que não mais subsistem danos ao meio ambiente na área, pois providenciou a construção de fossas para impedir o lançamento de dejetos e esgoto no rio e encerrou as atividades comerciais no local.
Requereu o conhecimento e o provimento do recurso para "que a sentença de primeiro grau seja reformada no sentido de que seja desconsiderada a demolição da construção, tendo em vista que a parte Ré fez manutenção na propriedade construindo fossas para que não seja mais despejados rejeitos no percurso do rio, ou que seja aplicada pena alternativa a de demolição, já que as construções são antigas (Evento 65, Eproc 1° Grau).
Após as contrarrazões (Evento 69, Eproc 1º Grau), os autos ascenderam a este Tribunal, tendo lavrado parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça a Exma. Sra. Dra. Sonia Maria Demeda Groisman Piardi, pelo conhecimento e desprovimento do recurso (Evento 14, Eproc 2º Grau).
É o relatório.
VOTO
No que importa ao juízo de admissibilidade, conhece-se do recurso de apelação, por ser próprio e tempestivo.
A apelante, em linhas gerais, sustenta a ocorrência de prescrição, pela falta de fiscalização no quinquênio, assim como que i) não mais subsistem danos ambientais, pois o curso d´água permanece inalterado, ii) a demolição é excessiva e iii) que agiu com boa-fé, pelo desconhecimento da ocorrência de danos ambientais na propriedade.
A insurgência não comporta acolhimento, adianta-se.
Cumpre, inicialmente, afastar a prejudicial de mérito aventada, porquanto, diversamente da pretensão meramente patrimonial, não há falar em prescrição da reparação de danos ambientais.
Com efeito, o dano ambiental se renova incessantemente pela violação do dever de preservação, que se perpetua no tempo, pela imposição constitucional do...
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