Acórdão Nº 0900997-52.2018.8.24.0011 do Primeira Câmara Criminal, 26-04-2022

Número do processo0900997-52.2018.8.24.0011
Data26 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0900997-52.2018.8.24.0011/SC

RELATORA: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO

APELANTE: MARISE GOMES ZUCCO (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na Vara Criminal da Comarca de Brusque, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia em face de Marise Gomes Zucco, pelo cometimento, em tese, do crime de apropriação indébita tributária (art. 2º, inciso II, da Lei n. 8.137/90, na forma continuada (art. 71 do Código Penal), por onze vezes), em razão dos fatos assim narrados na peça acusatória (Evento 5, dos autos n. 0900997-52.2018.8.24.0011):

Infere-se dos documentos que instruem o procedimento supramencionado, que a denunciada, na época dos fatos, era sócia e administradora da empresa DIAMOND INDÚSTRIA E COMÉRCIO DECONFECÇÕES EIRELI ME (fl. 44), CNPJ n. 01.987.927/0001-20 e Inscrição Estadual n. 25.340.677-3, estabelecida na Rua Azambuja n. 268 a 292, sala 10, Centro Industrial e Comercial Oscar Schulemburg, bairro Azambuja, Brusque/SC, que tem por objeto social a "indústria e comércio de confecções de artigos do vestuário" (Cláusula Terceira da Sexta Alteração Contratual - fl. 43).

Dessa forma, a denunciada era responsável pela direção e gerência da empresa, tendo ciência e controle das transações e negócios realizados, bemcomo responsabilidade legal e fática pela regularidade fiscal.

Além da administração geral da empresa, determinava os atos de escrituração fiscal e era responsável pela apuração e recolhimento do ICMS - Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Prestações de Serviço de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação devido.

Quaisquer vantagens ou benefícios obtidos pela empresa, mesmo os de origem ilícita, eram aproveitados diretamente pela denunciada.

Em procedimento rotineiro, a Fiscalização de Tributos Estaduais constatou que, apesar de ter apresentado as Declarações de Informações do ICMSe Movimento Econômico - DIMEs à Secretaria da Fazenda, a denunciada, no período de fevereiro a dezembro de 2017, não recolheu aos cofres públicos, no prazo determinado pelo art. 60 do RICMS/01, os valores apurados e declarados.

Em razão disso, o Fisco Estadual, em 20-4-2018, emitiu o Termo de Inscrição em Dívida Ativa n. 18001399074, juntado às fls. 12-13, que apresenta o seguinte código da infração: "1018 - Conta Corrente - Falta de Recolhimento de ICMS declarado pelo próprio sujeito passivo - Inscrição Direta em Dívida Ativa".

As Declarações do ICMS e do Movimento Econômico - DIMEs que originaram o mencionado Termo de Inscrição em Dívida Ativa estão juntadas às fls. 14-37 do procedimento anexo.

Em relação a apuração do imposto devido, cabe ressaltar que, nos termos do art. 53 do Regulamento do ICMS/2001, "o imposto a recolher será apurado mensalmente, pelo confronto entre os débitos e os créditos escriturados durante o mês, em cada estabelecimento do sujeito passivo".

O art. 60 do RICMS/2001 determina que, ressalvadas as hipóteses que enumera, "o imposto será recolhido até o 10º (décimo) dia após o encerramento do período de apuração".

O art. 168 do Anexo 5 do RICMS/2001 dispõe que os estabelecimentos encaminharão em arquivo eletrônico, enviado pela internet, a Declaração de Informações do ICMS e Movimento Econômico - DIME, que se constituirá no registro dos lançamentos constantes do livro Registro de Apuração do ICMS, dos demais lançamentos fiscais relativos ao balanço econômico e dos créditos acumulados, referentes às operações e prestações realizadas em cada mês.

Consoante se pode constatar do objeto do Termo de Inscrição emDívida Ativa que, apesar de terem sido devidamente escrituradas as operações tributáveis da empresa, a administradora acima relacionada, ao atuar no comando da empresa, não realizou e nem determinou o pagamento devido dos tributos nas datas de vencimento, ou seja, não adimpliu a obrigação tributária lesando, consequentemente, os cofres públicos.

Como é sabido, o ICMS é pago pelo consumidor, sendo o comerciante simples repassador do imposto gerado ao Estado, razão pela qual é classificado como imposto indireto e seu recolhimento é obrigação acessória do contribuinte.

Importa, ainda, salientar que o ICMS - tido como tributo incidente sobre o consumo - tem seu ônus cobrado pelo consumidor final, verdadeiro destinatário do tributo, sendo delimitado o vendedor como contribuinte de direito por razões de política tributária.

Ressalta-se que, quando o fornecedor promove a saída de mercadoria ou serviço tributável pelo ICMS, cobrado do adquirente no preço final - este tributo que deverá ser repassado ao fisco - deve recolher referido tributo ao erário no prazo legal, sob pena de violação do disposto no art. 2º, inc. II, da Lei n. 8.137/1990.

Portanto, considerando que a denunciada detinha os valores, mas optou pelo não repasse ao Estado-SC, resta evidenciado que agiu com manifesto dolo nesta omissão no pagamento do tributo, acarretando na prática do crime de apropriação indébita tributária.

DOS VALORES TRIBUTÁRIOS DEVIDOS

Os valores devidos referentes ao Termo de Inscrição em Dívida Ativa n. 18001399074, computando-se a multa e os juros até a data em que foi emitido, totalizam R$74.258,70 (fl. 12). O referido valor foi atualizado em 10-10-2018 e corresponde ao total de R$76.113,51 (setenta e seis mil cento e treze reais e cinquenta e umcentavos), conforme consulta extrato S@t de fl. 52.

DA NÃO QUITAÇÃO DOS DÉBITOS TRIBUTÁRIOS

De acordo com o registro no Sistema de Administração Tributária - S@t, da Secretaria da Fazenda do Estado de Santa Catarina, os valores correspondentes aos crimes ora narrados não foram pagos até o momento (extrato de fl. 52 do procedimento anexo).

Encerrada a instrução e apresentadas alegações finais, sobreveio a sentença com o seguinte dispositivo (Evento 43, dos autos originários):

Ante ao exposto, JULGO PROCEDENTE a denúncia para condenar a acusada MARISE GOMES ZUCCO, identificada nos autos, às penas de dez (10) meses de detenção, em regime aberto (art. 33, § 2º, alínea 'c', do CP), e dezesseis (16) dias-multa, no valor de um trinta avos (1/30) do salário mínimo vigente à época dos fatos, por cada dia-multa, corrigidos na forma legal, dando-a como incurso nas sanções do contido no artigo 2º, inciso II, da Lei n.º 8.137/90, por onze (11) vezes, na forma do artigo 71, caput, do Código Penal.

Condeno-a ainda, ao pagamento das custas processuais, que deverão ser pagas juntamente com a multa tipo aplicada, no prazo de dez (10) dias após o trânsito em julgado da sentença (art. 50, CP).

Considerando que diante das circunstâncias judiciais, me apresenta suficiente, para a reprovação e prevenção do crime, a substituição da reprimenda legal por uma pena restritiva de direito, nos termos do art. 59 c/c o art. 43, inciso IV e art. 44, todos do Código Penal, aplico-lhe:

Prestação de serviços à comunidade junto a entidade conveniada a ser estabelecida pelo Setor Social do Juízo, conforme as aptidões da condenada, devendo ser cumpridas à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação, executadas de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho, devendo sujeitar-se as orientações do administrador daquela entidade que acompanhará e fiscalizará a execução, controlando a freqüência e, ao final, enviando relatório sucinto das atividades desenvolvidas ao juízo

Inconformada com o decisum, Marise Gomes Zucco interpôs a presente apelação criminal. Nas suas razões recursais, sustenta, preliminarmente, pelo reconhecimento da atipicidade da conduta, seja por crer que o presente caso se enquadra em prisão civil por dívida - vedada no ordenamento jurídico -, ou pela ausência de comprovação de que a empresa se enquadre no regime de substituição tributária.

No mérito, pugna pela expedição de édito absolutório (art. 386, VII, CPP), ante a fragilidade do acervo probatório angariado nos autos. Pontua que o responsável pela administração financeira da pessoa jurídica é seu marido. Ainda, fundamenta pela ausência de elemento subjetivo do tipo, qual seja, o dolo de supressão do tributo, uma vez que tão somente deixou de arcar com os débitos em razão de dificuldades financeiras.

Na dosimetria, requer a substituição da pena restritiva de direitos aplicada - prestação de serviços à comunidade - por multa, porquanto não pode ser convertida em prisão pelo seu descumprimento, sendo, portanto, mais favorável à parte ré (Evento 51, dos autos originários).

Contrarrazões da acusação pela manutenção incólume da sentença recorrida (Evento 55, dos autos originários).

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Luiz Ricardo Pereira Cavalcanti, que se manifestou pelo conhecimento e desprovimento do apelo interposto (Evento 9).

Este é o relatório.

VOTO

1. Da Admissibilidade

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