Acórdão Nº 0901090-03.2019.8.24.0036 do Segunda Câmara Criminal, 27-07-2021

Número do processo0901090-03.2019.8.24.0036
Data27 Julho 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão










Recurso em Sentido Estrito Nº 0901090-03.2019.8.24.0036/SC



RELATORA: Desembargadora HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO


RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) RECORRIDO: FRANCINI RANIELI POSTAI (RÉU) ADVOGADO: ADEMAR MAASS (OAB SC009655)


RELATÓRIO


Denúncia: o Ministério Público ofereceu denúncia em face de Francini Ranieli Postai, dando-a como incursa nas sanções do art. 1º, inc. II (inserir elementos inexatos em documentos ou livros fiscais), da Lei n. 8.137/90, por pelo menos 41 (quarenta e uma) vezes, na forma do art. 71 do Código Penal, em razão dos seguintes fatos:
[...] A denunciada, nos meses de fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2014, janeiro, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2015, janeiro, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2016 e janeiro, fevereiro, março, abril, maio e junho de 2017, na condição de sóciaadministradora de 'BIOMEDI MATERIAL MÉDICO HOSPITALAR LTDA. ME', CNPJ n. 13.365.644/0001-25 e Inscrição Estadual n. 25.635.320-4, estabelecida na Rua Dorval Marcatto, n. 1.285, Bairro Tifa Martins, em Jaraguá do Sul, promoveu supressão de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS devido ao estado de Santa Catarina mediante inserção fraudulenta de dados inexatos no Programa Gerador do Documento de Arrecadação do Simples Nacional Declaratório - PGDAS-D, quais sejam, classificações indevidas da receita bruta tributável da empresa como de exigibilidade suspensa.
Noticiadas condutas redundaram em prejuízo de R$ 137.922,24 (cento e trinta e sete mil novecentos e vinte e dois reais e vinte e quatro centavos) aos cofres estaduais e foram constatadas por auditagem fiscal, conclusiva de que a denunciada fez constar classificações indevidas de ICMS-Segregação no PGDAS-D nas declarações mensais do Simples Nacional, consignando que o montante referente ao tributo em questão estava com a exigibilidade suspensa nos períodos de apuração citados, quando na realidade não estavam, conforme detalhamento da Notificação Fiscal n. 196030014590, emitida em 30/03/2019, e correlato Anexo "J".
Um exemplo das condutas delituosas: No dia 22 de novembro de 2018 a denunciada realizou a transmissão da Declaração Retificadora n. 13365644201402005, correspondente ao período de apuração de fevereiro de 2014, informando no documento fiscal receita bruta de R$ 70.876,94 (setenta mil oitocentos e setenta e seis reais e noventa e quatro centavos). Todavia, artificiosamente, no campo "Valor devido por tributo (R$)", declarou o ICMSSegregação como zerado, classificando-o de forma inexata no PGDAS-D como de "exigibilidade suspensa", o que foi glosado por auditagem fiscal haja vista inexistir provimento judicial determinando a suspensão da exigibilidade do tributo, gerando assim efetiva supressão ao estado de Santa Catarina de R$ 2.012,90 (dois mil doze reais e noventa centavos) de ICMS. Idêntica situação repetiu-se por pelo menos mais 40 (quarenta) vezes. [...] (evento 2 - PET1).
Sentença: O Juiz de Direito Samuel Andreis rejeitou a denúncia, nos termos a seguir vertidos:
[...] Ao analisar a peça acusatória, constatou-se que esta não atendia integralmente aos requisitos do art. 41 do CPP, sendo determinado o retorno dos autos ao Ministério Público para que, caso entendesse pertinente, aditasse a inicial a fim de que especificasse as diversas condutas a que fez alusão.
O Ministério Público se manifestou à p. 79-82.
É o relatório.
Decido.
Não obstante as ponderações expostas pelo Ministério Público, verifico que a denúncia cumpriria os requisitos do art. 41 do CPP apenas em relação a um crime, que teria sido perpetrado em 22 de novembro de 2018. Apenas quanto a este fato estão esclarecidas "todas as suas circunstâncias", pois além da data, identificou o modus operandi e o quantum de tributo que foi suprimido.
Quando aos outros 40 crimes, verifica-se apenas a descrição genérica do modus operandi, embora aparentemente dispusesse o órgão acusador de todos os detalhes de cada delito na notícia-crime apresentada.
Assim, ainda que as condutas guardem similaridade entre si, há necessidade, imposta pela lei, de sua individualização com suas respectivas especificações.
Ante o exposto, rejeito a denúncia, nos termos do art. 395, I, do CPP. [...] (evento 11).
Recurso em sentido estrito do Ministério Público do Estado de Santa Catarina: o representante Ministerial alegou que inexistente afronta ao art. 41 do Código de Processo Penal e também ao art. 5º, incisos LIV e LV da Constituição Federal, na peça inaugural, motivo pelo qual não há falar em inépcia da denúncia. Referiu, nesse sentido, ausência de prejuízo ao contraditório e à ampla defesa.
Por tais razões, pugnou pelo conhecimento e provimento do recurso, para que seja invalidada a decisão proferida pelo Juízo a quo, determinando-se o recebimento da denúncia e o prosseguimento do feito nos seus ulteriores termos (evento 18).
Contrarrazões de Francini Ranieli Postai: a defesa postulou o conhecimento e desprovimento do recurso, para que seja mantida a decisão impugnada por seus próprios e jurídicos fundamentos (evento 48).
Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça: a Procuradoria-Geral de Justiça, por meio de parecer da lavra do Procurador de Justiça Dr. Luiz Ricardo Pereira Cavalcanti, manifestou-se pelo conhecimento e provimento do recurso (evento 10 dos autos de 2º Grau).
Este é o relatório

VOTO


Cuida-se de recurso em sentido estrito interposto pelo representante do Ministério Público do Estado de Santa Catarina em face da decisão que rejeitou a denúncia, nos termos do art. 395, inc. I, do Código de Processo Penal, oferecida em desfavor de Francini Ranieli Postai, dando-a como incursa nas sanções do art. 1º, inc. II (inserir elementos inexatos em documentos ou livros fiscais), da Lei n. 8.137/90, por pelo menos 41 (quarenta e uma) vezes, na forma do art. 71 do Código Penal.
1 - Do juízo de admissibilidade
O recurso preenche os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido.
2 - Do mérito
Em suas razões, a acusação requereu, em síntese, o recebimento da denúncia e o prosseguimento do feito.
Razão lhe assiste.
Qualifica-se como inepta a denúncia que ignora os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal ou incide nas impropriedades que acarretam sua rejeição, de algum modo prejudicando a compreensão dos fatos e o exercício desembaraçado da ampla defesa e do contraditório.
Esclarece-se que, para se garantir a viabilidade da ação penal, a denúncia não deve limitar-se à descrição do fato criminoso, mas também apontar suas circunstâncias e conferir lastro probatório mínimo sobre a materialidade, autoria e tipicidade de cada conduta.
No presente caso, entende-se que a denúncia ofertada preenche os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, o qual exige que "a denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas".
Basta a leitura da exordial (Evento 1, doc1) para verificar que todos os requisitos listados na norma foram atendidos. O Ministério Público qualificou a Denunciada, indicou o período em que houve a supressão de valores devidos a título de ICMS aos cofres públicos mediante fraude e pediu a oitiva de uma testemunha.
O Parquet narrou que, "na condição de sócia-administrador", a Acusada "promoveu supressão de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS devido ao estado de Santa Catarina mediante inserção fraudulenta de dados inexatos no Programa Gerador do Documento de Arrecadação do Simples Nacional Declaratório - PGDAS-D", especificando que a fraude era consistente em fazer "constar classificações indevidas de ICMS-Segregação no PGDAS-D nas declarações mensais do Simples Nacional, consignando que o montante referente ao tributo em questão estava com a exigibilidade suspensa nos períodos de apuração citados, quando na realidade não estavam".
Foi apontado que as 41 condutas "redundaram em prejuízo de R$ 137.922,24 aos cofres estaduais e foram constatadas por auditagem fiscal, [...] conforme detalhamento da Notificação Fiscal n. 196030014590, emitida em 30/03/2019, e correlato Anexo "J"'.
Na sequência, o Órgão Acusador exemplificou as fraudes minudenciando um dos delitos, mas ressaltando que "idêntica situação repetiu-se por pelo menos mais 40 (quarenta) vezes":
Um exemplo das condutas delituosas: No dia 22 de novembro de 2018 a denunciada realizou a transmissão da Declaração Retificadora n. 13365644201402005, correspondente ao período de apuração de fevereiro de 2014, informando no documento fiscal receita bruta de R$ 70.876,94 (setenta mil oitocentos e setenta e seis reais e noventa e quatro centavos). Todavia, artificiosamente, no campo "Valor devido por tributo (R$)", declarou o ICMS-Segregação como zerado, classificando-o de forma inexata no PGDAS-D como de "exigibilidade suspensa" 2 , o que foi glosado por auditagem fiscal haja vista inexistir provimento judicial determinando a suspensão da exigibilidade do tributo, gerando assim efetiva supressão ao estado de Santa Catarina de R$ 2.012,90 (dois mil doze reais e noventa centavos) de ICMS. Idêntica situação repetiu-se por pelo menos Um exemplo das condutas delituosas: No dia 22 de novembro de 2018 a denunciada realizou a transmissão da Declaração Retificadora n. 13365644201402005, correspondente ao período de apuração de fevereiro de 2014, informando no documento fiscal receita bruta de R$ 70.876,94 (setenta mil oitocentos e setenta e seis reais e noventa e quatro centavos). Todavia, artificiosamente, no campo "Valor devido por tributo (R$)",...

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