Acórdão Nº 0901306-95.2018.8.24.0036 do Quinta Câmara Criminal, 15-09-2022

Número do processo0901306-95.2018.8.24.0036
Data15 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0901306-95.2018.8.24.0036/SC

RELATORA: Desembargadora CINTHIA BEATRIZ DA SILVA BITTENCOURT SCHAEFER

APELANTE: TEREZINHA FRANZENER MORA (ACUSADO) APELANTE: GEANFRANCESCO FRANZENER MORA (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

O Ministério Público de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Geanfrancesco Franzener Mora e Terezinha Franzener Mora, imputando-lhes a prática do crime do art. 2º, II, da Lei n. 8.137/1990, na forma continuada (art. 71, do Código Penal), conforme fatos narrados na peça acusatória (evento 1 da ação penal):

Os denunciados, na condição de sócios-administradores de 'TMCOMÉRCIO DE TAPETES E CARPETES LTDA.', CNPJ n. 00.274.824/0001-50 e Inscrição Estadual n. 25.295.885-3, estabelecida na Rua Coronel Procópio Gomes n. 1149, sala 01, Centro, em Jaraguá do Sul, deixaram de efetuar, no prazo legal, o recolhimento de R$ 86.800,98 (oitenta e seis mil oitocentos reais e noventa e oito centavos) a título de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS cobrado de consumidores, locupletando-se ilicitamente mediante este tipo de apropriação de valores em prejuízo ao Estado de Santa Catarina, conforme declarado pelo sujeito passivo da obrigação nas DIMEs (Declarações do ICMS e do Movimento Econômico) dos meses de janeiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro e novembro de 2016, documentos geradores da Dívida Ativa n. 17001472075, de 28/04/2017.

A denúncia foi recebida em 06 de julho de 2018 (evento 6 da ação penal), os réus foram citados (eventos 24 e 28 da ação penal) e apresentaram defesa (evento 116 da ação penal).

A defesa foi recebida e não sendo o caso de absolvição sumária, foi designada audiência de instrução e julgamento (evento 146 da açaõ penal).

Na instrução foram inquiridas testemunhas arroladas pela defesa, bem como foram interrogados os réus (evento 164 da ação penal).

Encerrada a instrução processual e apresentadas as alegações finais pelo Ministério Público (evento 173 da ação penal) e pela defesa (evento 178 da ação penal), sobreveio a sentença (evento 181 da ação penal) com o seguinte dispositivo:

Ante o exposto, julgo procedente a pretensão punitiva deduzida na denúncia para condenar GEANFRANCESCO FRANZENER MORA e TEREZINHA FRANZENER MORA ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 10 meses de detenção, a ser cumprida no regime inicialmente aberto, e ao pagamento de 16 dias-multa, no valor unitário descrito na fundamentação, por infração ao art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90, por 33 vezes, na forma do art. 71, caput, do CP.

Irresignados, os acusados interpuseram recurso de apelação (evento 188 da ação penal). Em sua razões, pugnam preliminarmente pela inépcia da denúncia e a inconstitucionalidade do Art. 2º da Lei 8.137/1990. No mérito, requereram a absolvição suscitando a inexistência de antijuridicidade da conduta, a incidência da causa excludente de culpabilidade da inexigibilidade de conduta diversa e a ausência de dolo.

O Ministério Publico apresentou as contrarrazões (evento 199 da ação penal).

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Humberto Francisco Scharf Vieira manifestando-se pelo conhecimento e desprovimento do apelo (evento 8).

Este é o relatório.

VOTO

O recurso deve ser conhecido, porquanto presentes os pressupostos de admissibilidade.

Cuida-se de recurso de apelação interposto por Geanfrancesco Franzener Mora e Terezinha Franzener Mora contra a sentença que os condenou à pena privativa de liberdade de 10 meses de detenção, a ser cumprida no regime aberto, e ao pagamento de 16 dias-multa, no valor unitário descrito na fundamentação, por infração ao art. 2º, II, da Lei n. 8.137/1990, por 33 vezes, na forma do art. 71, caput, do Código Penal.

1. Preliminares.

1.1 Inépcia da inicial.

O apelante alega nulidade processual por inépcia da denúncia, sob o argumento de que: "(..) A peça inaugural do processo penal descreve fatos genéricos os imputa aos Apelantes sem qualquer nexo causal entre a suposta conduta e o confuso resultado e, sem qualquer respaldo fático de maior robustez inviabiliza a sua defesa".

Todavia, não há qualquer mácula para ser reconhecida.

Com efeito, o tipo penal imputado aos réus vem descrito no artigo 2º, II, da Lei nº. 8137/1990, in verbis:

Art. 2° Constitui crime da mesma natureza:

II - deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos;

Por sua vez, a prática dos fatos delituosos imputados aos réus foi narrada na peça exordial pelo representante do Parquet da seguinte forma (evento 1 da ação penal):

Os denunciados, na condição de sócios-administradores de 'TMCOMÉRCIO DE TAPETES E CARPETES LTDA.', CNPJ n. 00.274.824/0001-50 e Inscrição Estadual n. 25.295.885-3, estabelecida na Rua Coronel Procópio Gomes n. 1149, sala 01, Centro, em Jaraguá do Sul, deixaram de efetuar, no prazo legal, o recolhimento de R$ 86.800,98 (oitenta e seis mil oitocentos reais e noventa e oito centavos) a título de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS cobrado de consumidores, locupletando-se ilicitamente mediante este tipo de apropriação de valores em prejuízo ao Estado de Santa Catarina, conforme declarado pelo sujeito passivo da obrigação nas DIMEs (Declarações do ICMS e do Movimento Econômico) dos meses de janeiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro e novembro de 2016, documentos geradores da Dívida Ativa n. 17001472075, de 28/04/2017.

Com isso em mente, tem-se que a correlação entre a descrição fática constante na denúncia e o texto legal que descreve o crime que é imputado aos apelantes leva a conclusão de que inexiste mácula na peça exordial, eis que imputa aos réus, na condição de titular da pessoa jurídica, a conduta de "deixaram de efetuar, no prazo legal, o recolhimento de R$ 86.800,98 (oitenta e seis mil oitocentos reais e noventa e oito centavos) a título de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS".

Em outras palavras, a acusação descreve todas as elementares que configuram o crime contra a ordem tributária objeto do presente processo.

Como se sabe, a denúncia deve ser concisa, limitando-se a apontar os fatos imputados aos agentes. Ou seja, deve indicar o fato pelo qual está sendo processado o agente, para que ele possa se defender da maneira que entender cabível.Esta é a lição de Guilherme de Souza Nucci:

"Diferentemente da área cível, no processo criminal, a denúncia ou queixa deve primar pela concisão, limitando-se a apontar os fatos cometidos pelo autor (denunciado ou querelado), sem juízo de valoração ou apontamento doutrinários jurisprudenciais. A peça deve indicar o que o agente fez, para que ele possa se defender." (Código de Processo Penal comentado , 9º edição, Rev. Tribunais, pág. 156).

No caso em apreço, a denúncia permitiu a exata compreensão do teor da acusação, cumprindo, assim, o objetivo de proporcionar a ampla defesa dos denunciados.

Evidente, portanto, que a peça exordial contém todos os requisitos enumerados no artigo 41 do Código de Processo Penal, pois expõe com clareza os fatos criminosos, as principais circunstâncias que os cercam, qualifica os denunciados e classifica o tipo penal em questão.

Colhe da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. ART. 1º, INCISO I, DA LEI N. 8.137/1990. ART. 337-A DO CÓDIGO PENAL. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA. REQUISITOS DO ART. 41 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. DESCRIÇÃO ADEQUADA. NÃO INDIVIDUALIZAÇÃO DAS CONDUTAS. DENÚNCIA GERAL. POSSIBILIDADE. [...] RECURSO ORDINÁRIO NÃO PROVIDO.1. O trancamento da ação penal somente é possível, na via estreita do habeas corpus, em caráter excepcional, quando se comprovar, de plano, a inépcia da denúncia, a atipicidade da conduta, a incidência de causa de extinção da punibilidade ou a ausência de indícios de autoria ou de prova da materialidade do delito.2. Pela leitura da inicial acusatória, da decisão que analisou a resposta à acusação, bem como do acórdão recorrido, verifica-se que a denúncia é suficientemente clara e concatenada, e atende aos requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, não revelando quaisquer vícios formais. De fato, encontra-se descrito o fato criminoso, com todas as circunstâncias necessárias a delimitar a imputação, encontrando-se devidamente assegurado o exercício da ampla defesa.3. Nos casos de crimes societários e de autoria coletiva, tem-se admitido a denúncia geral, a qual, apesar de não detalhar minudentemente as ações imputadas aos denunciados, demonstra, ainda que de maneira sutil, a ligação entre sua conduta e o fato delitivo, conforme ocorre nos autos.[...]7. Recurso ordinário em habeas corpus improvido.(RHC 149.961/RS, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 17/08/2021, DJe 20/08/2021).

O entendimento desta Quinta Câmara Criminal não discrepa:

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA PRATICADOS EM CONTINUIDADE DELITIVA (ART. 2º, II, DA LEI N. 8.137/1990 C/C ART. 71 DO CP). SENTENÇA CONDENATÓRIA. INSURGÊNCIA DA DEFESA. ALEGADA A INÉPCIA DA INICIAL. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA CONDENATÓRIA QUE TORNA PREJUDICADA A TESE. ADEMAIS, REQUISITOS DO ART. 41 DO CPP VERIFICADOS. INICIAL QUE INDICA LASTRO PROBATÓRIO MÍNIMO ACERCA DA MATERIALIDADE E DA AUTORIA DOS FATOS OBJETOS DA DENÚNCIA. PEÇA QUE APONTA A CONDIÇÃO DE SÓCIO ADMINSITRADOR OCUPADA PELO RÉU, OS VALORES DEVIDOS PELA EMPRESA QUE ADMINISTRAVA E AS DATAS EM QUE OCORRERAM OS FATOS. TESE AFASTADA. [...] RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação Criminal n. 0900006-96.2017.8.24.0242, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Antônio Zoldan da Veiga, Quinta Câmara Criminal, j. 25-03-2021).

E de minha relatoria:

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. ARTIGO 1º, I, II E IV DA LEI N. 8.137/1990 C/C...

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