Acórdão Nº 0901635-04.2018.8.24.0038 do Terceira Câmara Criminal, 06-12-2022

Número do processo0901635-04.2018.8.24.0038
Data06 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0901635-04.2018.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador LEOPOLDO AUGUSTO BRÜGGEMANN

APELANTE: FABIO FERNANDES (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na comarca de Joinville, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Fábio Fernandes, dando-o como incurso nas sanções do art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90, por 18 (dezoito) vezes, na forma do art. 71 do Código Penal, pela prática das condutas assim descritas na inicial acusatória:

O denunciado, na condição de titular de 'CIVILLE INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE MÓVEIS EIRELI. EPP.', CNPJ n. 03.425.833/0001-92 e Inscrição Estadual n. 25.396.062-2, estabelecida na Rua Pascoal Filippi, n. 44, Bairro Vila Nova, em Joinville, deixou de efetuar, no prazo legal, o recolhimento de R$ 79.832,48 (setenta e nove mil oitocentos e trinta e dois reais e quarenta e oito centavos) a título de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS cobrado de consumidores, locupletando-se ilicitamente mediante este tipo de apropriação de valores e em prejuízo do Estado de Santa Catarina, conforme declarado pelo sujeito passivo da obrigação em PGDAS-D (Programa Gerador do Documento de Arrecadação do Simples Nacional - Declaratório) dos meses de abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro e novembro de 2012, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro e dezembro de 2013, documentos integrantes da Dívida Ativa n. 16010893810, de 19/12/2016.

É de se registrar que o débito da dívida ativa supracitada foi objeto do Parcelamento n. 001 (Vide planilha que segue anexa - Linha n. 65), o qual foi cancelado, ocorrendo a suspensão da pretensão punitiva do Estado e do curso prescricional no período de 19/10/2012 a 15/02/2015, conforme preceitua o §2º do art. 83 da Lei n. 9.430/96, com nova redação dada pelo art. 6º da Lei n. 12.382/11 (evento 2, DENUNCIA1).

Reconheceu-se a prescrição da pretensão punitiva estatal em relação às condutas praticadas em janeiro, fevereiro e março de 2012, tendo sido extinta a punibilidade do acusado pelas mesmas (evento 14, SENT73).

Concluída a instrução do feito, a denúncia foi julgada procedente para condenar o acusado Fábio Fernandes à pena de 10 (dez) meses de detenção, em regime inicial aberto, bem como ao pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, por infração ao disposto no art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90, por 15 (quinze) vezes, na forma do artigo 71 do Código Penal. A pena privativa de liberdade foi substituída por uma restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade. Foi-lhe concedido o direito de apelar em liberdade (evento 178, SENT1).

Irresignada, a defesa interpôs recurso de apelação, no qual requereu, em preliminar, a nulidade da sentença por ausência de oferecimento da suspensão condicional do processo ou de acordo de não persecução criminal. No mérito, intentou pela absolvição do acusado, ante a insuficiência de provas, ausência de dolo e em razão da inexigibilidade de conduta diversa. Subsidiariamente, pediu a substituição da pena restritiva de direitos consistente em prestação de serviços à comunidade por limitação de final de semana (evento 12, RAZAPELA1).

Juntadas as contrarrazões (evento 16, CONTRAZAP1), ascenderam os autos a esta instância, e a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Rogério A. da Luz Bertoncini, opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso interposto (evento 20, PROMOÇÃO1).

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação contra decisão que julgou procedente a denúncia e condenou o acusado às sanções previstas pelo art. 2º, II, da Lei nº 8.137/90, por 15 (quinze) vezes, em continuidade delitiva (art. 71, caput, do CP).

O recurso é de ser conhecido, porquanto presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade.

Preliminares

Prefacialmente, requer o apelante a declaração de nulidade e cassação da sentença condenatória, ao argumento da ausência de oferecimento da suspensão condicional do processo ou de acordo de não persecução criminal.

Com relação à suspensão condicional do processo, a matéria não merece análise.

Isso porque, em primeiro lugar, verifica-se que a benesse foi concedida ao apelante, com sua aceitação (evento 25, TERMOAUD83), sendo a mesma revogada por responder o denunciado a novo processo pela prática de ato similar (evento 72, DEC133).

Ademais, verbera o art. 571 do CPP:

Art. 571. As nulidades deverão ser argüidas:

[...]

III - as do processo sumário, no prazo a que se refere o art. 537, ou, se verificadas depois desse prazo, logo depois de aberta a audiência e apregoadas as partes;

[...]

Por sua vez, o art. 537 do CPP, com o advento da Lei n. 11.719, de 20/06/2018, foi revogado, advindo o art. 531 e, quando trata do processo sumário, verbera:

Art. 531. Na audiência de instrução e julgamento, a ser realizada no prazo máximo de 30 (trinta) dias, proceder-se-á à tomada de declarações do ofendido, se possível, à inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, nesta ordem, ressalvado o disposto no art. 222 deste Código, bem como aos esclarecimentos dos peritos, às acareações e ao reconhecimento de pessoas e coisas, interrogando-se, em seguida, o acusado e procedendo-se, finalmente, ao debate.

O processo sumário, sabe-se, é aquele que tem por objeto a apuração de crimes, cuja sanção máxima cominada seja inferior a 4 (quatro) anos de pena privativa de liberdade, ex vi, do art. 394, II, do diploma processual.

No caso vertente, o art. 2º da Lei de Regência, crime imputado ao acusado, prevê sanção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos de detenção, e multa.

Assim, o processo é de rito sumário e a arguição de qualquer nulidade deveria ter sido oposta quando da realização da audiência de instrução e julgamento (evento 136, TERMOAUD1), o que não foi feito, sendo que a própria defesa em suas alegações finais asseverou que o acusado cumpriu a suspensão condicional do processo até sua revogação em decorrência do ajuizamento da ação penal n. 0905866-40.2019.8.24.0038 (evento 143, ALEGAÇÕES1).

Nesse sentido, não fosse sua revogação pelo descumprimento, a quaestio atinente à suspensão condicional do processo estaria tomada pela preclusão consumativa, como dito, na forma do art. 571, III, do CPP.

Logo, não há falar em nulidade pela ausência de oferecimento da suspensão condicional do processo.

Com relação ao acordo de não persecução penal, cabe destacar que sua aplicação somente será possível se não houver denúncia.

A questão não tem aplicação porque ela já foi devidamente ofertada e já houve a prestação da tutela jurisdicional, não cabendo, assim, o acordo de não persecução penal.

Colaciona-se o julgado da Colenda Corte:

PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NA PETIÇÃO. 1. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL. PEDIDO DE APLICAÇÃO RETROATIVA. NÃO CABIMENTO. INSTITUTO PRÉ-PROCESSUAL. DIRECIONADO AO INVESTIGADO. 2. ISOLAMENTO DOS ATOS PROCESSUAIS. RETROATIVIDADE LIMITADA. PROCESSOS SEM DENÚNCIA RECEBIDA. 3. INSTITUTO QUE VISA OBSTAR A PERSECUÇÃO PENAL. PERSECUÇÃO JÁ OCORRIDA. CONDENAÇÃO CONFIRMADA. APLICAÇÃO DESCABIDA. 4. PROJETO DE LEI QUE PREVIA INSTITUTO PARA A FASE PROCESSUAL. NÃO APROVAÇÃO PELO CONGRESSO NACIONAL. ESPECIFICIDADE DE CADA INSTITUTO A DEPENDER DO MOMENTO PROCESSUAL. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA E SISTEMÁTICA. COERÊNCIA E ALCANCE DA NORMA. 5. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.1. O Acordo de Não Persecução Penal consiste em um negócio jurídico pré-processual entre o Ministério Público e o investigado, juntamente com seu defensor, como alternativa à propositura de ação penal. Trata-se de norma processual, com reflexos penais, uma vez que pode ensejar a extinção da punibilidade. Contudo, não é possível que se aplique com ampla retroatividade norma predominante processual, que segue o princípio do tempus regit actum, sob pena de se subverter não apenas o instituto, que é pré-processual e direcionado ao investigado, mas também a segurança jurídica.2. Em observância ao isolamento dos atos processuais, sem perder de vista o benefício trazido pela norma, a possibilidade do acordo deve ser avaliada em todos os processos em que ainda não foi apresentada denúncia, conforme enunciado n. 20 da Comissão Especial denominada GNCCRIM, do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais: "Cabe acordo de não persecução penal para fatos ocorridos antes da vigência da Lei nº 13.964/2019, desde que não recebida a denúncia".3. "Descabida a aplicação retroativa do instituto mais benéfico previsto no art. 28-A do CP (acordo de não persecução penal) inserido pela Lei n. 13.964/2019 quando a persecução penal já ocorreu, estando o feito sentenciado, inclusive com condenação confirmada por acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça no caso em tela" (AgRg no REsp 1860770/SP, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 01/09/2020, DJe 09/09/2020). Precedentes.4. O Projeto de Lei 882/2019 também previa a figura do "Acordo de Não Continuidade da Ação Penal" - não aprovado pelo Congresso Nacional -, o qual apenas poderia ser proposto após o recebimento da denúncia ou queixa e até o início da instrução processual, o que revela a especificidade de cada instituto, a depender do momento processual. Nessa linha de intelecção, não tendo ocorrido a implementação integrada dos institutos, ou mesmo a...

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