Acórdão Nº 0902426-07.2014.8.24.0072 do Terceira Câmara de Direito Público, 22-11-2022

Número do processo0902426-07.2014.8.24.0072
Data22 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0902426-07.2014.8.24.0072/SC

RELATOR: Desembargador SANDRO JOSE NEIS

APELANTE: ELMIS MANNRICH (RÉU) APELANTE: IVA MARIA BAIXO FERNANDES (RÉU) APELANTE: TRANSPORTES COLETIVO JULIVA LTDA - EPP (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de recursos de Apelação Cível interpostos por Elmis Mannrich, Transportes Coletivos Juliva Ltda. e Iva Maria Baixo Fernandes em desfavor da sentença proferida nos autos da Ação Civil Pública por Ato de Improbidade Administrativa n. 0902426-07.2014.8.24.0072, a qual foi julgada procedente pela Juíza Titular da 2ª Vara Cível da Comarca de Tijucas, nos seguintes termos (Evento 120, Eproc/PG):

[...] Assim, nos termos do art. 487, I, do CPC, JULGO PROCEDENTE os pedidos formulados pelo Ministério Público de Santa Catarina e, com fundamento no art, 12 , II, da Lei 8.429/92, considerando as pecularidades da questão, o dano presumido causado à administração pública e os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, condeno os réus Elmis Mannrich, a empresa Transporte Coletivo Juliva Ltda e sua representante legal Iva Maria Baixo Fernandes, às seguintes penalidades:

a) Elmis Mannrich: suspensão dos direitos políticos por 05 anos e o pagamento de multa civil de R$ 8.376,73 (oito mil trezentos e setenta e seis reais e setenta e três centavos), correspondente ao valor de 50% (cinquenta por cento) da diferença obtida entre o valor do contrato original firmado com a Adminstração e o valor cobrado em decorrência de cada termo aditivo realizado). O valor deverá ser corrigido pelo INPC, havendo incidência de juros de mora de 1%, ao ano, observando-se: R$ 438,50 a partir de 31/12/2007; R$ 3.812,98 a partir de 31/12/2008 e, R$ 4.125,25 a partir de 31/12/2009;

b) Transporte Coletivo Juliva Ltda e sua representante legal Iva Maria Baixo Fernandes: proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 05 (cinco) anos, e pagamento de multa civil de R$ 8.376,73 (oito mil trezentos e setenta e seis reais e setenta e três centavos), correspondente ao valor de 50% (cinquenta por cento) da diferença obtida entre o valor do contrato original e o valor cobrado em decorrência de cada termo aditivo realizado). O valor deverá ser corrigido com correção monetária pelo INPC e juros de mora de 1%, ao ano, observando-se: R$ 438,50 a partir de 31/12/2007; R$ 3.812,98 a partir de 31/12/2008 e, R$ 4.125,25 a partir de 31/12/2009.

Condeno os réus, solidariamente, ao pagamento das custas processuais.

Elmis Mannrich alegou que os fatos que resultaram na sua condenação pela prática do ato ímprobo previsto no art. 10, inc. VIII, da Lei n. 8.429/1992, versam sobre meras irregularidades, ao passo que não restaram comprovados o efetivo prejuízo ao erário municipal, o enriquecimento ilícito dos envolvidos e o dolo na sua conduta. Nessa toada, asseverou que o mero equívoco na eleição da modalidade de licitação adotada para a contratação da empresa Transportes Coletivos Juliva Ltda. Me para transportar alunos universitários no trecho Tijucas-Itajaí bem como a realização de aditivos contratuais de prorrogação da avença nos anos de 2007, 2008 e 2009 não são suficientes para embasar a condenação ora em discussão.

Também asseverou que não há provas de eventual conluio entre os demandados ou de que os valores pagos pelo Ente Público para o transporte dos alunos estivesse em desacordo com os preços praticados no mercado.

Ao final, pugnou pela reforma do julgado e a improcedência da ação (Evento 134, Eproc/PG).

Transportes Coletivos Juliva Ltda. Me e Iva Maria Fernandes objetivam a reforma integral da sentença e a improcedência da pretensão ministerial. Para tanto, aduziram, em suas razões recursais, que as falhas apontadas pelo Ministério Público não são o bastante para justificar as suas condenações pela prática de improbidade administrativa, pois prestaram os serviços para os quais foram contratadas e não obtiveram qualquer vantagem ilícita (Evento 136, Eproc/PG).

Foram apresentadas contrarrazões (Evento 149, Eproc/PG).

Após a ascensão a esta Corte Estadual de Justiça, os autos foram distribuídos ao Desembargador Francisco José de Oliveira Neto, que determinou a sua redistribuição a este Gabinete em decorrência da prevenção pela distribuição e julgamento pretéritos do Agravo de Instrumento n. 4002262-16.2017.8.24.0000 (Evento 10, Eproc/SG).

Posteriormente, tendo em vista a entrada em vigor da Lei n. 14.230/2021, a qual resultou em significativas modificações na Lei n. 8.429/1992, este Subscritor, em adendo ao disposto no art. 10 do Código de Processo Civil/2015, oportunizou a manifestação das partes e da Procuradoria-Geral de Justiça (Evento 19, Eproc/PG).

O Autor se manifestou pela irretroatividade da Lei n. 14.230/2021 e, a título subsidiário, no caso deste Órgão Fracionário possuir entendimento diverso, requereu o afastamento da prescrição intercorrente e a manutenção das condenações impostas aos Réus, visto que houve dolo em sua conduta (Evento 27, Eproc/SG).

Elmis Mannrich, por seu turno, defendeu a retroatividade da Lei n. 14.230/2021 e pugnou pelo reconhecimento da prescrição intercorrente bem como requereu, caso afastada a prejudicial de mérito, que seja acolhida a pretensão recursal, a fim de reformar a sentença e julgar improcedentes os pedidos do Ministério Público (Evento 29, Eproc/SG).

Transportes Coletivos Juliva Ltda. ME e Iva Maria Baixo Fernandes deixaram transcorrer em branco o prazo para se manifestar (Evento 25, Eproc/SG).

Por fim, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Procurador de Justiça Murilo Casemiro Mattos, manifestou-se pela irretroatividade da denominada Nova Lei de Improbidade Administrativa e pelo conhecimento e desprovimento dos apelos (Evento 33, Eproc/SG).

É o relato necessário.

VOTO

1. Admissibilidade:

De início, defiro o pedido de justiça gratuita pleiteado pelos Apelantes Transportes Coletivos Juliva Ltda. e Iva Maria Baixo Fernandes (Evento 136, Eproc/PG).

Outrossim, os recursos são tempestivos, adequados e preencheem os demais requisitos de admissibilidade recursal, razão pela qual comportam conhecimento.

2. Das alterações promovidas pela Lei n. 14.320/2021:

Antes de adentrar no julgamento do caso em epígrafe, também é necessário tecer considerações acerca da incidência, ao caso em comento, das alterações ocorridas na Lei n. 8.429/1992 após o advento da Lei n. 14.3208/2021, a qual alterou significativamente a redação anterior.

De acordo com o disposto no art. 1º, §4º, da Lei n. 8.429/1992 (redação dada pela Lei n. 14.230/2021):

Art. 1º O sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta Lei.

[...] § 4º Aplicam-se ao sistema da improbidade disciplinado nesta Lei os princípios constitucionais do direito administrativo sancionador.

Tendo em vista a expressa previsão legal acerca da incidência dos princípios do direito administrativo sancionador às ações civis públicas de responsabilidade pela prática de ato de improbidade administrativa, após a entrada em vigor da nova Lei de Improbidade Administrativa, esta Corte Estadual de Justiça, majoritariamente, passou a adotar, na solução dos processos em curso, a redação dada pela Lei n. 14.320/2021.

No intuito de melhor elucidar o tema colacionam-se trechos de precedente desta Corte Estadual de Justiça:

[...] 1. A Lei 14.230/21 alterou substancialmente a Lei 8.429/92 (a Lei de Improbidade Administrativa). As modificações foram tão representativas, alterando-se valorativamente o regramento anterior, que surge, pode ser dito, uma "Nova Lei de Improbidade Administrativa".Há tendência nas instâncias ordinárias de considerar que (a) a atual disciplina tem aplicação retroativa quanto ao direito material, se favorável ao acusado - derivação constitucional, que assim prega quanto ao direito penal, mas que vale identicamente ao direito administrativo sancionador; e

(b) a regulamentação de caráter processual valerá apenas para o futuro, preservando-se o que se deu perante o regramento revogado.Adere-se a esse posicionamento, ressalvando-se que nos casos de pontos de estrangulamento (Cândido Rangel Dinamarco) entre direito material e processual (condições da ação, provas, coisa julgada e regime econômico) a questão mereça maior reflexão.O STF ainda cuidará da aludida retroatividade em repercussão geral, mas não há, por ora, ordem de suspensão. [...] (TJSC, Apelação n. 0900173-21.2018.8.24.0035, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Hélio do Valle Pereira, Quinta Câmara de Direito Público, j. 7-6-2022).

No mesmo norte:

REMESSA NECESSÁRIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. APRECIAÇÃO DA REGULARIDADE DO PROCESSO DE DISPENSA DE LICITAÇÃO N. 21/2013-PMS, QUE ORIGINOU O CONTRATO ADMINISTRATIVO N. 54/2013-PMS. CONTRATAÇÃO DIRETA DE ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA. IMPROCEDÊNCIA NA ORIGEM. AUSÊNCIA DE RECURSO VOLUNTÁRIO. AUTOS REMETIDOS PARA ANÁLISE DA REMESSA OFICIAL. IMPOSSIBILIDADE. MATÉRIA OBJETO DO TEMA N. 1.042 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. SUPERVENIENTE ALTERAÇÃO LEGISLATIVA QUE AFASTOU O DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO OBRIGATÓRIO. INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 17, §19, E 17-C, §3º, DA LEI N. 8.429/1992, COM REDAÇÃO DA LEI N. 14.230/2021.DIREITO INTERTEMPORAL. NORMA PROCESSUAL DE APLICAÇÃO IMEDIATA AOS PROCESSOS EM CURSO. RETROATIVIDADE DA NOVA REDAÇÃO DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA ÀS CONTENDAS EM ANDAMENTO, SE FAVORÁVEL AO RÉU. PRECEDENTES DESTA CORTE DE JUSTIÇA.1. A actio alçou em razão da aplicação, por analogia, do disposto no artigo 19 da Lei n. 4.717/1965 (STJ, EREsp 1220667/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 24/05/2017, DJe 30/06/2017). 2. Contudo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT