Acórdão Nº 0902697-43.2016.8.24.0008 do Terceira Câmara Criminal, 13-07-2021

Número do processo0902697-43.2016.8.24.0008
Data13 Julho 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão
Recurso em Sentido Estrito Nº 0902697-43.2016.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador GETÚLIO CORRÊA

RECORRENTE: ALEX FABIANO SILVERIO PRIMACK (ACUSADO) ADVOGADO: ALTAMIR FRANÇA (OAB SC021986) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

O Ministério Público ofereceu denúncia contra Alex Fabiano Silvério Primack (26 anos à época dos fatos) pela prática, em tese, do delito de homicídio qualificado (CP, art. 121, § 2º, II e IV) em razão dos fatos assim narrados:

"No dia 1º de fevereiro de 2014, por volta das 18h30m, o denunciado, ALEX FABIANO SILVÉRIO PRIMACK, encontrava-se no local conhecido como "curva fria", às margens do Rio Jordão, no bairro Progresso, nesta cidade e comarca de Blumenau, juntamente com alguns amigos, dentre eles Jacksiel Antunes e Elvio Zaherebelni, quando os três iniciaram discussão com Tiago Rodrigues, que estava no local com outro grupo de pessoas.

Durante a rusga, ALEX FABIANO inopinadamente sacou uma faca de aproximadamente 40 cm de comprimento e, com evidente animus necandi, desferiu um golpe contra Tiago Rodrigues, atingindo-lhe pelas costas, na parte posterior de seu tórax, abaixo da omoplata esquerda, transfixando pulmão e vasos sanguíneos, conforme laudo pericial de fl. 130.

O denunciado, portanto, utilizou-se de recurso que dificultou a defesa da vítima, porquanto a atingiu pelas costas, bem como agiu impelido por motivo fútil, uma vez que esfaqueou a vitima por causa de uma discussão a respeito do volume do som automotivo.

Após golpear a vítima, ALEX FABIANO evadiu-se do local em um automóvel GM/Kadett Ipanema, de placas LXQ-8277, levando consigo a arma do crime, sendo que nesse ínterim a vítima foi encaminhada ao Hospital Santo Antônio, onde veio a óbito devido ao amplo sangramento causado pelo ferimento, razão bastante de sua morte (fls. 152-155)." (Evento 4).

Recebida a peça acusatória em 26.7.2016 (Evento 3), o denunciado ofertou resposta escrita (Evento 21), por intermédio de defensor constituído.

Após a instrução do feito, as partes apresentaram alegações finais (Evento 130 e Evento 133).

Em seguida, sobreveio decisão interlocutória mista de pronúncia (Evento 136), proferida pelo Magistrado Daniel Leite Seiffert Simões, donde se extrai da parte dispositiva:

"Ante o exposto, julgo admissível a denúncia para o fim de pronunciar o acusado Alex Fabiano Silvério Primack, já qualificado nos autos, como incurso na sanção do art. 121, § 2.º, II (motivo fútil) e IV (recurso que dificultou a defesa da vítima),do Código Penal, submetendo-o a julgamento pelo Tribunal de Júri desta Comarca, em data oportuna.

Tratando-se de acusado que respondeu solto a este processo, não há razões para a decretação de prisão preventiva ou de qualquer cautelar. Ademais, nos termos do artigo 311, caput do Código de Processo Penal, não houve qualquer requerimento em sentido contrário pelas partes. Intimem-se.

Preclusa, intimem-se as partes para fins do art. 422 do Código de Processo Penal".

Opostos embargos declaratórios pelo Ministério Público (Evento 143) para corrigir erro material na fundamentação, o Magistrado acolheu-os e saneou trecho da sentença para passar a constar: "No que tange à motivação fútil do delito, afigura-se possível sua ocorrência diante do que foi relatado em juízo a respeito da briga entre as partes ter se iniciado em razão de disputa quanto a som automotivo."

Irresignado com a sentença de pronúncia, Alex Fabiano Silverio Primack, recorreu em sentido estrito (Evento 144), por intermédio de defensor constituído. Em sede preliminar, arguiu o reconhecimento da nulidade da decisão por violação ao disposto no art. 413, § 1º, do Código de Processo Penal, sob tese de excesso de linguagem na fundamentação do decisum. No mérito, sustentou: a) sua impronúncia, sob argumento de ausência de indícios suficientes de autoria delitiva; e, b) o afastamento das qualificadoras.

Houve contrarrazões (Evento 155) pela manutenção da decisão.

Em 2.6.2021, os autos foram encaminhados à douta Procuradoria-Geral de Justiça, que, por parecer do Procurador de Justiça Paulo Roberto Speck, manifestou-se pelo desprovimento do recurso (Evento 11 destes autos). Retornaram conclusos em 8.6.2021.



Documento eletrônico assinado por GETULIO CORREA, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 1116517v12 e do código CRC e9aedcf9.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): GETULIO CORREAData e Hora: 15/7/2021, às 21:25:39





Recurso em Sentido Estrito Nº 0902697-43.2016.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador GETÚLIO CORRÊA

RECORRENTE: ALEX FABIANO SILVERIO PRIMACK (ACUSADO) ADVOGADO: ALTAMIR FRANÇA (OAB SC021986) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

1. Presentes os pressupostos legais, o recurso é conhecido e desprovido.

2. Preliminarmente, a defesa aventou a nulidade da pronúncia por excesso de linguagem, sob o argumento de que o Magistrado utilizou expressões que certamente influenciarão no entendimento dos jurados, quais sejam: I) "A materialidade delitiva está demonstrada por meio do Boletim de Ocorrência (fls. 09/11), Termo de Apreensão (fl. 12), Laudo Pericial (fls. 118/122), Laudo Necroscópico (fl. 156 e 221/223), Fichas de Atendimento Médico (fls.158/161 e pelos demais documentos constantes nos autos."; II) "Quanto a autoria, há razões suficientes para a sua imputação ao acusado [...] (fl. 420)"; e, III) "De fato, há razões suficientes para imputação da autoria ao acusado se difere, e muito, de há indícios suficientes para submetê-lo ao julgamento popular".

Não é essa a solução que se extrai dos autos.

Sobre o tema, Guilherme de Souza Nucci ensina:

"Há dois particulares momentos, no procedimento do júri, em que o uso excessivo da linguagem pode prejudicar o processo: a) na decisão de pronúncia; b) durante os debates em plenário. Quanto à pronúncia, tratando-se de juízo de admissibilidade da acusação, sem ingresso no mérito da causa, há limitação para expor os motivos que fundamentam a decisão. O magistrado deve abordar materialidade e os indícios suficientes de autoria, bem como analisar as teses levantadas pelas partes nas alegações finais. Entretanto, não pode exceder-se na adjetivação (ex: o 'terrível crime cometido'; a 'autoria inconteste', 'o famigerado réu' etc), nem tampouco exagerar na avaliação das teses defensivas (ex: 'é óbvio que não ocorreu legítima defesa'; 'absurda é a alegação da defesa')" (Código de Processo Penal Comentado. Revista dos Tribunais. 12 ed. São Paulo, 2013, p. 918).

A matéria foi muito bem abordada pela Promotora de Justiça Roberta Magioli Meirelles, motivo pelo qual se pede vênia para adotar parte das contrarrazões como razões de decidir:

"Não se observou na sentença de pronúncia, mas, especialmente, nos trechos que a defesa transcreveu parcialmente ou fez referências nas razões do recurso, qualquer colocação inadequada que pudesse ser interpretada como prévia formação de juízo de culpa pelo Magistrado de primeiro grau.

Em outros trechos contra os quais a parte recorrente se irresignou (transcritos com destaques das fls. 420), em uma primeira leitura deles já se observa a existência de expressões que denotam o cuidado do Juízo de primeiro grau e, no entender deste Órgão de Execução, sepultam qualquer interpretação de excesso de linguagem.

A teor, citam-se as seguintes: "Quanto a autoria, há razões suficientes para a sua imputação ao acusado, devendo os seus pares apreciarem as peculiaridades da prova testemunhal"; "limito-me, aqui, a traçar um panorama que tenho como válido para a remessa do feito ao Tribunal do Júri [...]; "a existência de contradições entre as testemunhas, bem como o efetivo valor probatório do depoimento destas, é matéria de apreciação dos jurados e não dos juízes togados".

Evidente que não se poderia querer que o Magistrado de primeiro grau deixasse de fazer referência aquilo que as testemunhas ouvidas, sob o crivo do contraditório, narraram acerca dos fatos - pois, daí sim, caso não o fizesse, a sentença de pronúncia não se sustentaria por ausência de fundamentação adequada para levar o caso ao Tribunal do Júri.

Para além disto, convém mencionar que a frase "há razões suficientes para a sua imputação ao acusado [...]", demonstra estritamente um dos requisitos do art. 413, §1º, do CPP. Aliás, a expressão é absolutamente similar aquela utilizada no artigo mencionado, de modo que, o magistrado ainda fez a seguinte ressalva: "devendo os seus pares apreciarem as peculiaridades da prova testemunhal", colocando uma pá de cal sobre alegação defensiva.

Dito isso, importa pontuar que o entendimento exposado encontra respaldo em decisões deste Egrégio Tribunal de Justiça, sendo válido transcrever ementas de julgados recentes deste Órgão Jurisdicional:

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME CONTRA A VIDA. HOMICÍDIO QUALIFICADO PELA FUTILIDADE DO MOTIVO E PRÁTICA MEDIANTE DISSIMULAÇÃO, NA MODALIDADE TENTADA (CÓDIGO PENAL, ART. 121, § 2º, II E IV, COMBINADO COM ART. 14, II, NA FORMA DO ART. 29, CAPUT). DECISÃO DE PRONÚNCIA. INSURGIMENTO DA DEFESA. PREFACIAL DE NULIDADE. HIPOTÉTICO EXCESSO DE LINGUAGEM. INOCORRÊNCIA. ELOQUÊNCIA ACUSATÓRIA NÃO VERIFICADA. JUIZ SUMARIANTE QUE SE RESTRINGIU AO CONTEÚDO TÍPICO DO INTERLOCUTÓRIO VERGASTADO. OBSERVAÇÃO DA ANÁLISE CONCLUDENTE DO TRIBUNAL POPULAR. PRECEDENTES. ALMEJADA IMPRONÚNCIA. IMPOSSIBILIDADE. SUBSTRATOS DE CONVICÇÃO APTOS A INDICAR A VINCULAÇÃO DOS ACUSADOS AOS ILÍCITOS. TESTEMUNHAS QUE REVELARAM A POSSÍVEL DINÂMICA DOS FATOS. VERSÕES CONVERGENTES COM O CONJUNTO PROBATÓRIO COLIGIDO AOS AUTOS. MATÉRIA A SER APRECIADA PELO TRIBUNAL DO JÚRI. PRONUNCIAMENTO MANTIDO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Recurso em Sentido Estrito n. 0002030-02.2019.8.24.0033, de Itajaí, rel. Des. Luiz Cesar Schweitzer, Quinta Câmara...

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