Acórdão Nº 0903201-15.2017.8.24.0008 do Quinta Câmara Criminal, 08-09-2022

Número do processo0903201-15.2017.8.24.0008
Data08 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0903201-15.2017.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ NERI OLIVEIRA DE SOUZA

APELANTE: CELSON GUERREIRO (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na Comarca de Blumenau, o representante do Ministério Público ofereceu denúncia contra Celson Guerreiro, dando-o como incurso nas sanções do art. 1ª., inciso II (por duas vezes), nos termos do art. 71 do Código Penal, conforme os seguintes fatos descritos na inicial acusatória, in verbis (evento 28):

"O denunciado Celson Guerreiro, na época dos fatos, exercia a função de sócio e administrador da empresa Family Guerreiro Confecções Ltda com endereço comercial na rua Paulo Fischer, n. 66, bairro Velha, nesta cidade.

Na condição de sócio e administrador da referida empresa, o denunciado nominado acima deliberava, entre outras questões, sobre o pagamento, supressão ou redução de tributos devidos ao Estado de Santa Catarina.

Em 2 (duas) diferentes ocasiões, no período de maio/ 2010, a empresa Family Guerreiro Confecções Ltda, a mando do denunciado, fraudou reiteradamente a fiscalização tributária visando o enriquecimento ilícito, dela própria e de seu sócio, mediante a sonegação de tributos.

Para tanto, no período elencado acima, o denunciado determinou que a empresa suso nominada deixasse de estornar créditos de imposto destacados em documentos inidôneos, emitidos por contribuinte cujos documentos fiscais foram declarados nulos pela Administração Tributária, registrando-os ilegalmente na DI ME - Declaração do I CMS e do Movimento Econômico, causando a supressão/ redução de tributo.

Tome-se com o exemplo da fraude a suposta nota fiscal n. 198, emitida em 15/ 05/ 2010 pela empresa Mattos Transportes e Confecções Ltda Me - CNPJ n. 03.761.689/ 0001-65, no valor de R$ 81.541,08. Referido documento fiscal é inidôneo, porquanto a empresa emitente/ remetente foi considerada inexistente, com efeitos retroativos a partir de 17/ 03/ 2009, mediante o Edital n. 1110000000041, publicado no PeSEF n. 756, de 25/ 03/ 2011 (fl. 6), tendo gerado crédito ilegal de I CMS no importe de R$ 13.861,98, o qual restou registrado fraudulentamente na DIME.

Além do exemplo mencionado acima, tal proceder restou realizado pelo denunciado outra vez com a nota fiscal n. 191 da suposta empresa alhures mencionada.

Em assim sendo, o denunciado determinou que a empresa suprimisse/reduzisse tributo inserindo elementos inexatos em documento exigido pela Lei fiscal (DI ME - fl. 5), deixando de estornar créditos ilegais de ICMS e ocasionando, com tais condutas, a ausência de recolhimento do imposto aos cofres públicos, conforme demonstrativo abaixo de créditos de ICMS que o denunciado deixou de estornar:

[...]

Ressalte-se, por fim, consoante extrato acostado aos autos (fl. 12), que não houve o manejo de recurso administrativo por parte da empresa, tendo a constituição do crédito tributário retratado na notificação fiscal n. 156030028738 se mostrado absolutamente regular autorizando, nos exatos termos do que preconiza a súmula vinculante n. 24 do STF, o ajuizamento da denúncia.

Assim sendo, agindo reiteradamente, o denunciado determinou que a empresa fraudasse o Fisco, deixando de recolher aos cofres públicos, com multas e juros, um total de R$ 53.204,65 (cinquenta e três mil, duzentos e quatro reais e sessenta e cinco centavos), recursos estes que deveriam ser aplicados em proveito de toda a sociedade catarinense".

Encerrada a instrução, a magistrada a quo proferiu sentença, nos seguintes termos (evento 187):

"Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido contido na denúncia e, em consequência, CONDENO o acusado CELSON GUERREIRO ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente aberto, a qual substituo por duas reprimendas restritiva de direitos, na forma da fundamentação, sem prejuízo do pagamento de 11 (onze) dias-multa, no mínimo legal, por infração ao art. 1º, II, da Lei n. 8.137/1990, por duas vezes, na forma do art. 71 do Código Penal.

Condeno o réu, ainda, ao pagamento das custas processuais.

Deixo de fixar o valor mínimo da indenização a que alude o art. 387, IV, do CPP, uma vez que inexistem nos autos elementos neste particular. Ademais, não houve pedido expresso do Ministério Público na exordial acusatória, o que violaria os princípios do contraditório e da ampla defesa.

Inexistindo qualquer motivo para a decretação da prisão preventiva, concedo ao réu o direito de recorrer em liberdade (art. 387, parágrafo único, CPP), mormente por ter sido fixado o regime inicial aberto e substituída a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos".

Houve a oposição de embargos de declaração pelo apelante, os quais foram rejeitados em decisão de evento 209.

Inconformado com o resultado da sentença, o réu interpôs recurso de apelação criminal por intermédio de defensor constituído. Nas razões recursais, em síntese, o apelante requereu preliminarmente a nulidade processual por cerceamento de defesa, com a reforma da sentença, ante: a) a falta de citação pessoal do acusado em âmbito administrativo; b) a não suspensão da ação penal com base nos arts. 92, 93 e seguintes do Código de Processo Penal, até o julgamento de demanda em trâmite na esfera cível; c) o indeferimento de perícia grafotécnica; d) a ausência de fundamentação do édito condenatório. No mérito, defendeu a absolvição por ausência de provas em imputar a autoria delitiva ao apelante (evento 55 destes autos).

Em contrarrazões, o Ministério Público manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso de apelação, mantendo-se incólume os termos da r. sentença (evento 60 destes autos).

A Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Sr. Dr. Rogério A. da Luz Bertoncini, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso (evento 64 destes autos).

Este é o relatório que submeto à apreciação do i. Revisor.

Documento eletrônico assinado por LUIZ NERI OLIVEIRA DE SOUZA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 2637523v2 e do código CRC f6ae3372.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): LUIZ NERI OLIVEIRA DE SOUZAData e Hora: 22/8/2022, às 10:58:29





Apelação Criminal Nº 0903201-15.2017.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ NERI OLIVEIRA DE SOUZA

APELANTE: CELSON GUERREIRO (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

Presentes os pressupostos legais de admissibilidade, conhece-se dos recursos e, à luz do princípio tantum devolutum quantum apellatum, passo a analisar unicamente as insurgências deduzidas.

Trata-se de recurso de apelação interposto por Celson Guerreiro, contra a decisão de primeira instância que o condenou à pena privativa de liberdade de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, no regime aberto, tendo sido substituída por duas penas restritiva de direitos consistentes na prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária de um salário mínimo, bem como no pagamento de 11 (onze) dias-multa, pela prática do delito tipificado no art. 1º, inciso II, da Lei n. 8.137/90 (por 02 vezes).

1.Preliminares.

a) Ab initio, alega o apelante nulidade na constituição do crédito tributário na esfera administrativa, porquanto não teria sido devidamente cientificado do processo administrativo fiscal, notadamente porque não houve a sua citação pessoal.

Para isso, sustentou que: "o réu nunca soube da existência do processo administrativo fiscal, devido ao auditor fiscal não ter determinado a sua citação pessoal, conforme a lei", mas sim por intermédio de citação por edital no processo administrativo, contrariando a legislação tributária estadual e culminando prejuízo ao réu "por ter tido cercado sua defesa por falta de conhecimento da demanda em tempo e modo".

Complemente, ainda, "se o auditor fiscal tivesse feito uma única tentativa de citação pessoal, o réu teria obtido ciência em tempo e modo da demanda logo no início, e poderia ter agido para impedir a formação da CDA, simplesmente pagando o débito" antes do oferecimento da denúncia.

Pois bem.

Sem maiores digressões, é consabido que no direito penal impera a independência das esferas. É dizer que as prováveis nulidades relatadas, advindas da ausência de ciência acerca do processo administrativo fiscal na esfera administrativa não possui o condão de refletir seus efeitos na penal, haja vista que a pretensão punitiva estatal labora como meio de coibir a prática do ilícito perpetrado pelo agente e não discutir matéria de procedimento administrativo a qual compete ser pleiteada naquele âmbito.

Como bem justificado pelo togado singular em evento 16, Decisão 66, " Com efeito, no que toca a possíveis nulidades do processo administrativo, seja por ausência de intimação do réu para defesa ou por qualquer outra deficiência, cabe indicar que tal questionamento escapa à competência deste Juízo, ao qual está afeta exclusivamente a verificação do crédito tributário constituído, sem o qual não subsistiria a materialidade necessária à propositura da ação penal. Desse modo, qualquer que seja eventual imperfeição do contencioso administrativo, deve esta ser questionada perante o Juízo cível competente para apreciar as causas afetas ao direito público. [...] De outro vértice, impende ainda registrar que a própria Defesa argumenta que não manejou qualquer recurso administrativo concernente à notificação fiscal. Ou seja, ainda que a Defesa argumente irregularidade, não buscou retratação do fisco na esfera administrativa, tampouco no Juízo Cível, estando, por ora, o crédito devidamente constituído, o que atende à Súmula Vinculante n. 24".

Entrementes, ressoa nos autos a constituição em definitivo do crédito tributário pela Fazenda Pública através da...

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