Acórdão Nº 0905008-63.2015.8.24.0033 do Primeira Câmara de Direito Público, 27-04-2021

Número do processo0905008-63.2015.8.24.0033
Data27 Abril 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Tipo de documentoAcórdão










Apelação / Remessa Necessária Nº 0905008-63.2015.8.24.0033/SC



RELATOR: Desembargador JORGE LUIZ DE BORBA


APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELADO: MUNICÍPIO DE CAMBORIÚ/SC (RÉU)


RELATÓRIO


Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina à sentença de improcedência do pedido formulado na ação civil pública que move contra o Município de Camboriú (evento 39 na origem) cujo propósito é a condenação da municipalidade ao cumprimento de obrigação de fazer consistente na realização de diagnóstico socioambiental para promover o mapeamento das áreas urbanas consolidadas, áreas de risco e de relevante interesse ecológico.
Nas suas razões (evento 49 na origem), sustentou, em síntese, que o pleito deduzido na exordial não ofende o princípio da separação dos poderes, alegando que há omissão do ente público quanto aos termos dos arts. 182 e 30, VIII, da Constituição Federal. Pontuou que o planejamento urbano é obrigação do município e que o Plano Diretor de Desenvolvimento Territorial de Camboriú (Lei Complementar Municipal n. 55/2013) não especifica qual tipo de estudo foi utilizado para a sua elaboração. Ressaltou que é importante a realização desse diagnóstico com vistas à proteção do meio ambiente, do direito à moradia e do respeito à dignidade da pessoa, tudo para obstar ao crescimento desenfreado e sem planejamento do município.
Sem contrarrazões (evento 53), o feito ascendeu a esta Corte e a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer do Exmo. Sr. Dr. Jacson Correa, opinou pelo provimento do reclamo (evento 8).
Vieram os autos à conclusão para julgamento

VOTO


O recurso preenche os pressupostos de admissibilidade. Passa-se à análise das suas razões.
Dispõe o art. 182 da Constituição Federal de 1988:
A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes.
Por seu turno, cabe aos municípios a função de promover a regularização fundiária sustentável, consoante preceitua o art. 30, VIII, da Constituição Federal:
Art. 30. Compete aos Municípios:
[...]
VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano, sendo clara a imposição legal de que a municipalidade tem o dever de realizar o ordenamento territorial mediante planejamento técnico.
Não se desconhece a orientação da jurisprudência, inclusive do STF, quanto à possibilidade de o Poder Judiciário impor ao Poder Executivo obrigação que tenha como fim resguardar direitos assegurados na Constituição Federal. Por isso, não se pode falar em violação ao princípio da separação de poderes.
Nesse norte:
"O Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar que a Administração Pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure contrariedade ao princípio da separação dos Poderes", ressaltando, ainda, que "a análise da excepcionalidade da situação em concreto, a ensejar a intervenção, ou não, do Poder Judiciário na implementação de políticas públicas cabe ao Tribunal a quo, e não ao Supremo Tribunal Federal" (EDRE n. 700.227/SC, rel. Min. Cármen Lúcia, j. 23-4-2013).
Não obstante, o Poder Judiciário deve intervir na esfera de atribuições de políticas públicas apenas em situações excepcionais, o que demanda análise de cada caso concreto. Na presente situação, a excepcionalidade não se mostra flagrante.
Recentes julgados desta Corte de Justiça, com idêntica demanda, seguem o entendimento no sentido de que a intervenção judicial não se justifica quanto à forma de elaboração de politicas públicas do Poder Executivo. Cita-se:
APELAÇÃO CÍVEL E REMESSA NECESSÁRIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PRETENSÃO DE COMPELIR O MUNICÍPIO DE JACINTO MACHADO A ELABORAÇÃO DE DIAGNÓSTICO SÓCIOAMBIENTAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DO ENTE PÚBLICO. INTERVENÇÃO JUDICIAL QUE NÃO SE JUSTIFICA NO CASO. AUSÊNCIA DE OMISSÃO OU SITUAÇÃO EXCEPCIONAL QUE AUTORIZE A INTERFERÊNCIA DO PODER JUDICIÁRIO NA FORMA DE ELABORAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DO PODER EXECUTIVO MUNICIPAL. SENTENÇA REFORMADA. REMESSA NECESSÁRIA E RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDOS E PROVIDOS. (TJSC, Apelação n. 0900041-69.2017.8.24.0076, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Artur Jenichen Filho, Quinta Câmara de Direito Público, j. 02-03-2021).
No mesmo rumo:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MUNICÍPIO DE SIDERÓPOLIS. OBRIGAÇÃO DE FAZER. REALIZAÇÃO DE DIAGNÓSTICO SOCIOAMBIENTAL. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO AUTORAL. IMPOSSIBILIDADE DE IMPOSIÇÃO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER À MUNICIPALIDADE PELO PODER JUDICIÁRIO. OFENSA AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA HARMONIA, INDEPENDÊNCIA E SEPARAÇÃO DOS PODERES (ART. 2º, CF/88). AUSÊNCIA DE EXCEPCIONALIDADE. INTERVENÇÃO DO JUDICIÁRIO APENAS EM SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECURSO DESPROVIDO. (TJSC, Apelação/Remessa Necessária n. 5005924-37.2019.8.24.0020, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Jaime Ramos, Terceira Câmara de Direito Público, j. 29-09-2020).
Igualmente:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA - MEIO AMBIENTE - DIAGNÓSTICO SOCIOAMBIENTAL - POLÍTICA PÚBLICA - INTERVENÇÃO SOMENTE EM CASOS EXCEPCIONAIS - IMPROCEDÊNCIA.
1. É possível decisão judicial que implique a imposição de obrigação de fazer por parte da Administração. Mas essa não pode ser a...

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