Acórdão Nº 0905059-35.2019.8.24.0033 do Primeira Câmara Criminal, 30-03-2023

Número do processo0905059-35.2019.8.24.0033
Data30 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 0905059-35.2019.8.24.0033/SC



RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI


APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELADO: ROSELI MARIA DO PRADO (ACUSADO) ADVOGADO(A): THIAGO BURLANI NEVES (DPE)


RELATÓRIO


Denúncia: o Ministério Público ofereceu denúncia perante o juízo da comarca de ITAJAÍ em face de Roseli Maria do Prado, dando-a como incursa nas sanções do art. 2º, II, da Lei 8.137/1990, por 13 vezes, na forma do art. 71, caput, do Código Penal, em razão dos seguintes fatos:
Infere-se dos documentos que instruem o procedimento supramencionado, que a denunciada, na época dos fatos, era titular da empresa ROSELI MARIA DO PRADO ME (fl. 56), CNPJ n. 05.267.464/0001-82 e Inscrição Estadual n. 25.466.597-7, estabelecida na Rua Carlos Alberto Mayer n. 99, bairro Barra do Rio, Itajaí/SC, que tem por objeto social "mercado" (Requerimento de Empresário de fl. 56).
Dessa forma, a denunciada era responsável pela direção e gerência da empresa, tendo ciência e controle das transações e negócios realizados, bem como responsabilidade legal e fática pela regularidade fiscal.
Além da administração geral da empresa, determinava os atos de escrituração fiscal e era responsável pela apuração e recolhimento do ICMS - Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Prestações de Serviço de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação devido.
Quaisquer vantagens ou benefícios obtidos pela empresa, mesmo os de origem ilícita, eram aproveitados diretamente pela denunciada.
Em procedimento rotineiro, a Fiscalização de Tributos Estaduais constatou que, apesar de ter apresentado as Declarações de Informações do ICMS e Movimento Econômico - DIMEs à Secretaria da Fazenda, a denunciada, nos períodos de fevereiro e julho de 2015 a janeiro de 2016, maio, agosto e novembro de 2016 a janeiro de 2017, não recolheu aos cofres públicos, no prazo determinado pelo art. 60 do RICMS/01, os valores apurados e declarados.
Em razão disso, o Fisco Estadual, em 20-3-2017, 11-4-2017, 26-4-2017 e 10-5-2017, emitiu, respectivamente, os Termos de Inscrição em Dívida Ativa n. 17000684206, n. 17001060478, n. 17001388449 e n. 17001747864, juntados às fls. 16-17, 28-29, 37-38 e 44-45, que apresentam o seguinte código da infração: "1018 - Conta Corrente - Falta de Recolhimento de ICMS declarado pelo próprio sujeito passivo - Inscrição Direta em Dívida Ativa".
As Declarações do ICMS e do Movimento Econômico - DIMEs que originaram os mencionados Termos de Inscrição em Dívida Ativa estão juntadas, respectivamente, às fls. 19-26, 31-35, 40-42 e 47-51 do procedimento anexo.
Em relação à apuração do imposto devido, cabe ressaltar que, nos termos do art. 53 do Regulamento do ICMS/2001, "o imposto a recolher será apurado mensalmente, pelo confronto entre os débitos e os créditos escriturados durante o mês, em cada estabelecimento do sujeito passivo".
O art. 60 do RICMS/2001 determina que, ressalvadas as hipóteses que enumera, "o imposto será recolhido até o 10º (décimo) dia após o encerramento do período de apuração".
O art. 168 do Anexo 5 do RICMS/2001 dispõe que os estabelecimentos encaminharão em arquivo eletrônico, enviado pela internet, a Declaração de Informações do ICMS e Movimento Econômico - DIME, que se constituirá no registro dos lançamentos constantes do livro Registro de Apuração do ICMS, dos demais lançamentos fiscais relativos ao balanço econômico e dos créditos acumulados, referentes às operações e prestações realizadas em cada mês.
Consoante se pode constatar do objeto dos Termos de Inscrição em Dívida Ativa que, apesar de terem sido devidamente escrituradas as operações tributáveis da empresa, a administradora acima relacionada, ao atuar no comando da empresa, não realizou e nem determinou o pagamento devido dos tributos nas datas de vencimento, ou seja não adimpliu a obrigação tributária lesando, consequentemente, os cofres públicos.
Como é sabido, o ICMS é pago pelo consumidor, sendo o comerciante simples repassador do imposto gerado ao Estado, razão pela qual é classificado como imposto indireto e seu recolhimento é obrigação acessória do contribuinte.
Importa, ainda, salientar que o ICMS - tido como tributo incidente sobre o consumo - tem seu ônus cobrado pelo consumidor final, verdadeiro destinatário do tributo, sendo delimitado o vendedor como contribuinte de direito por razões de política tributária.
Ressalta-se que, quando o fornecedor promove a saída de mercadoria ou serviço tributável pelo ICMS, cobrado do adquirente no preço final - este tributo que deverá ser repassado ao fisco - deve recolher referido tributo ao erário no prazo legal, sob pena de violação do disposto no art. 2º, inc. II, da Lei n. 8.137/1990.
Portanto, considerando que a denunciada detinha os valores, mas optou pelo não repasse ao Estado-SC, resta evidenciado que agiu com manifesto dolo nesta omissão no pagamento do tributo, acarretando na prática do crime de apropriação indébita tributária.
DOS VALORES TRIBUTÁRIOS DEVIDOS
Inicialmente salienta-se que, em 30-1-2018 - após a emissão dos Termos de Inscrição em Dívida Ativa objetos do presente procedimento -, a denunciada procedeu ao parcelamento dos débitos tributários junto à Secretaria de Estado da Fazenda, contudo, após efetuar o pagamento de duas dentre as sessenta parcelas solicitadas, inadimpliu as demais, o que ensejou, em 3-7-2018, no cancelamento do referido parcelamento (fls. 95-96).
Após, em 30-8-2018, a denunciada tornou a parcelar os valores descritos nos termos em comento, porém após adimplir as duas parcelas iniciais, deixou de arcar com as demais, acarretando, na data de 4-2-2019, seu cancelamento (fls. 82-85).
I) Os valores devidos referentes ao Termo de Inscrição em Dívida Ativa n. 17000684206, computando-se a multa e os juros até a data em que foi emitido, totalizam R$16.543,84 (fl. 16).
Os referidos valores foram atualizados em 11-4-2019 e, descontadas as parcelas pagas, correspondem ao total de R$17.403,68 (dezessete mil quatrocentos e três reais e sessenta e oito centavos), conforme consulta extrato S@t de fl. 91
II) Consta do Termo de Inscrição em Dívida Ativa n. 17001060478 que, nos períodos mencionados, os valores apurados pelo Fisco Estadual, os quais não foram repassados aos cofres públicos, computando-se a multa e os juros até a data de sua emissão, totalizam R$3.165,57 (fl. 28).
Ditos valores foram atualizados em 11-4-2019 e, descontadas as parcelas pagas, correspondem ao total de R$3.514,21 (três mil quinhentos e quatorze reais e vinte e um centavos), conforme consulta extrato S@t de fl. 92. III) Extrai-se do Termo de Inscrição em Dívida Ativa n. 17001388449 que os valores levantados no mesmo, computando-se a multa e os juros até a data em que foi emitido, totalizam R$1.526,90 (fl. 37).
Citados valores foram atualizados em 11-4-2019 e, descontadas as parcelas pagas, correspondem ao total de R$1.700,91 (um mil setecentos reais e noventa e um centavos), conforme consulta extrato S@t de fl. 93.
IV) Em relação ao Termo de Inscrição em Dívida Ativa n. 17001747864, constata-se que os valores devidos, computando-se a multa e os juros até a data em que foi emitido, totalizam R$3.396,67 (fl. 44).
Os mencionados valores foram atualizados em 11-4-2019 e, descontadas as parcelas pagas, correspondem ao total de R$3.765,87 (três mil setecentos e sessenta e cinco reais e oitenta e sete centavos), conforme consulta extrato S@t de fl. 94.
VALOR TOTAL ATUALIZADO (ref. aos Termos itens I a IV): R$26.384,67 (vinte e seis mil trezentos e oitenta e quatro reais e sessenta e sete centavos).
DA NÃO QUITAÇÃO DOS DÉBITOS TRIBUTÁRIOS
De acordo com o registro no Sistema de Administração Tributária - S@t, da Secretaria da Fazenda do Estado de Santa Catarina, os valores correspondentes aos crimes ora narrados não foram pagos até o momento (extratos de fls. 91-94 do procedimento anexo).(evento 1, eproc1G, em 15-4-2019).
Sentença: a juíza substituta Francielli Stadtlober Borges Agacci absolveu sumariamente a acusada, com fulcro no art. 397, III, do Código de Processo Penal (evento 44/PG - em 12-1-2023).
Trânsito em julgado: muito embora não certificado nos autos de origem, verifica-se que houve o trânsito em julgado da sentença para a defesa.
Recurso de apelação do Ministério Público: a acusação interpôs recurso de apelação, no qual sustentou que:
a) a conduta da apelada consistiu em relevante ofensa ao bem jurídico tutelado, uma vez que o montante de R$ 50.000,00, fixado pela Procuradoria Geral do Estado de Santa Catarina por meio da Portaria GAB/PGE 58/2021, constitui parâmetro apenas para as ações de cobrança da dívida ativa estadual;
b) no caso de crimes contra a ordem tributária, o entendimento das Cortes Superiores é de que eventual aplicação do princípio da insignificância deve pautar-se em um limite de R$20.000,00 (vinte mil reais), critério esse também adotado pela Fazenda Nacional para a propositura obrigatória de executivos fiscais.
c) não há falar em atipicidade da conduta, uma vez que as quantias apropriadas ultrapassam os valores estabelecidos por parâmetros legais e jurisprudenciais, de modo que, por ora, há elementos denotativos da materialidade, autoria e tipicidade delitivas, devendo o feito prosseguir até seus ulteriores termos, no que se insere, em tese, a ação típica prevista no art. 2º, II, da Lei 8.137/1990.
Requereu o conhecimento e provimento do recurso para reformar a sentença, a fim de que o processamento do feito tenha regular seguimento e a apelada seja submetida a julgamento exauriente perante o juízo a quo (evento 50/PG - em 16-1-2023).
Contrarrazões de Roseli Maria do Prado: a defesa impugnou as razões recursais, ao argumento de que:
a) o valor do débito tributário (R$ 26.384,67) é incapaz de causar lesão ao bem jurídico tutelado e, pelo princípio da insignificância, a conduta imputada na denúncia revela-se...

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