Acórdão nº 1000519-43.2021.8.11.0000 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Segunda Câmara Criminal, 03-03-2021

Data de Julgamento03 Março 2021
Case Outcome210 Concessão / Habeas corpus
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Data de publicação05 Março 2021
Classe processualCriminal - HABEAS CORPUS CRIMINAL - CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS
Número do processo1000519-43.2021.8.11.0000
AssuntoAusência de Fundamentação

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO


SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL


Número Único: 1000519-43.2021.8.11.0000
Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307)
Assunto: [Ausência de Fundamentação, Contra a Mulher, COVID-19]
Relator: Des(a).
RUI RAMOS RIBEIRO


Turma Julgadora: [DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO, DES(A). LUIZ FERREIRA DA SILVA, DES(A). PEDRO SAKAMOTO]

Parte(s):
[DEFENSORIA PUBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO (IMPETRANTE), 2.
º vARA CRIMINAL DA COMARCA DE BARRA DO GARÇAS (IMPETRADO), JOSE CARLOS PAZ GOUVEIA - CPF: 016.620.291-60 (PACIENTE), JUIZO DA 2ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE BARRA DO GARÇAS (IMPETRADO), DEFENSORIA PUBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 02.528.193/0001-83 (IMPETRANTE), JOSE CARLOS PAZ GOUVEIA - CPF: 016.620.291-60 (PACIENTE), MINISTERIO PUBLICO (TERCEIRO INTERESSADO), JOSEANE MORAES DE OLIVEIRA - CPF: 006.188.981-40 (VÍTIMA)]

A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, CONCEDEU A ORDEM DE HABEAS CORPUS IMPETRADO EM BENEFÍCIO DO PACIENTE JOSÉ CARLOS PAES GOUVEIA, MEDIANTE A IMPOSIÇÃO DAS MEDIDAS CAUTELARES PREVISTAS NO ARTIGO 319, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, COM AS SEGUINTES CONDIÇÕES: 1) COMPARECIMENTO PESSOAL DO PACIENTE EM JUÍZO ATÉ O QUINTO DIA ÚTIL DE CADA MÊS PARA ESCLARECER E JUSTIFICAR SUAS ATIVIDADES; 2)COMPARECIMENTO A TODOS OS ATOS PROCESSUAIS PARA O QUAL FOR INTIMADO;3)COMUNICAR IMEDIATAMENTE AO JUÍZO CRIMINAL A EVENTUAL MUDANÇA DE ENDEREÇO, FORNECENDO O NOVO EM QUE PODERÁ SER NOTIFICADO PARA OS FUTUROS ATOS PROCESSUAIS;4)NÃO SE AUSENTAR DA COMARCA POR MAIS DE 08 (OITO) DIAS SEM COMUNICAÇÃO PRÉVIA AO JUÍZO PROCESSANTE; 5) NÃO SE ENVOLVER EM OUTRO FATO CRIMINALMENTE ILÍCITO. EXPEÇA-SE, O JUÍZO SINGULAR, O COMPETENTE ALVARÁ DE SOLTURA CLAUSULADO, ADVERTINDO, POR DERRADEIRO, QUE O DESCUMPRIMENTO INJUSTIFICADO DAS MEDIDAS CAUTELARES IMPOSTAS PODERÁ ACARRETAR NA DECRETAÇÃO DE SUA PRISÃO PREVENTIVA, NOS TERMOS DO ARTIGO 282,§4º,C/C. ARTIGO312, PARÁGRAFO ÚNICO, AMBOS DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. NOTIFIQUE-SE A OFENDIDA DOS ATOS PROCESSUAIS RELATIVOS AO PACIENTE NOS TERMOS DO ART. 21 DA LEI 11.340/06.

E M E N T A

“HABEAS CORPUS – CRIME DE LESÃO CORPORAL NO ÂMBITO DOMÉSTICO – PRISÃO EM FLAGRANTE E POSTERIOR PREVENTIVA – REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA – VIABILIDADE – AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DOS ARTS. 312 E 313, DO CPP – VIABILIDADE – INOCORRÊNCIA DAS HIPÓTESES DE CABIMENTO DA SEGREGAÇÃO CAUTELAR – INEXISTÊNCIA DE DEFERIMENTO DE MEDIDAS PROTETIVAS – SUFICIÊNCIA DE CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO – INTELIGÊNCIA DO ART.319 DO CPP – CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO – ORDEM CONCEDIDA, COM CAUTELARES

A segregação preventiva é medida extrema e excepcional devendo ser adequada e proporcional ao caso concreto.

Constatando-se o inadimplemento de qualquer das hipóteses dos artigos 312, parágrafo único, 313 do Código de Processo Penal é inviável a manutenção da prisão preventiva.

Tendo em vista as circunstâncias do delito, não há nos autos elementos que demonstrem que ele confere ameaça à ordem pública ou econômica, à instrução criminal ou à aplicação da Lei Penal, mostrando-se, assim, impositiva a concessão da ordem com aplicação de medidas cautelares diversas da prisão.

R E L A T Ó R I O

Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar manejado pela i. Defensoria Pública com amparo art. 5º, inciso LXVIII, da Constituição Federal e artigos 647 e 648, I, II e IV, do Código de Processo Penal, em benefício de JOSÉ CARLOS PAES GOUVEIA, quem, nos autos da ação penal n.º 1000219-69.2021.8.11.0004, experimentando constrangimento ilegal decorrente de ato da Autoridade Judiciária da 2ª Vara Criminal da Comarca de Barra do Garças/MT, aqui apontada como coatora.

Expõe-se, em síntese, que o paciente foi preso em flagrante no dia 14/01/2021, pela suposta incursão no delito capitulado no art. 129, §9º, do Código Penal, com as implicações da Lei Maria da Penha da Lei n.º 11.340/06, em desfavor da vítima Josiane Moraes de Oliveira.

Sustenta as seguintes teses: 1) impossibilidade de decretação da preventiva porquanto, ausente violação ao art. 313, I e III, do Código de Processo Penal, 2) não atendimento a Recomendação nº 62/2020 DO CNJ, 3) alega infringência ao princípio da homogeneidade, 4) ausência do descumprimento medidas protetivas anteriormente decretadas, 5) possibilidade de concessão das medidas cautelares diversas da prisão [art.319 CPP].

Argumenta, que: “(...)ao paciente foi imputada a prática da conduta de lesão corporal leve.(...) Enfatize-se: não há, na hipótese, o permissivo do art. 313, III, CPP, vez que não houve anterior violação de medida protetiva decretada em favor da ofendida. [...]Aliás, a ausência de medida protetiva no procedimento se deu em razão de declaração da própria ofendida relatando sua desnecessidade. (...)” (Sic.)

Aduz que: “(...)a autoridade coatora, contudo, invocou o disposto no art. 12-C, § 2º, da Lei nº 11.340/2006 para decretar a prisão. Trata-se de trecho formular, repetido em todas as decisões do nobre magistrado, como um “mantra prisional”, independentemente da natureza do caso, eis que a prisão é decretada na imensa maioria deles.”(Sic.)

Consigna que: “(...)não apenas a proporcionalidade, mas a própria legalidade estrita impede a livre aplicação da norma, a qual há que se submeter, por óbvio, aos ditames do art. 312 do CPP, é dizer, imprescindível a configuração dos requisitos da prisão preventiva mesmo na hipótese aventada no art. 12-C da Lei Maria da Penha para que se decrete a custódia cautelar.”(Sic.)

Ressalta que: “(...)o quadro de hiperlotação da Cadeia Pública local, a qual não dispõe de condições mínimas para profilaxia ou tratamento do que quer que seja. [...]Na unidade de alta floresta as mortes já começaram! enquanto isso, a autoridade coatora vem decretando e mantendo prisões indistintamente.(...)A Recomendação nº 62 do CNJ aponta a máxima excepcionalidade de novas ordens de prisão preventiva. ”(Sic.)

Informa ainda, que: “(...)considerando-se a pena prevista no preceito secundário dos tipos penais, as circunstâncias judiciais do art. 59 deste Diploma e o tempo já transcorrido de segregação, é certo que em breve o Indiciado terá cumprido sua pena – ainda não fixada – em regime integralmente fechado.(...)”(Sic.)

Consigna, por derradeiro, o fato de que: “(...)se a suposta vítima, em apuração de delito que envolve violência doméstica, manifesta ausência de risco à integridade física e psíquica, é evidente que a prisão atacada carece de necessidade!” (Sic.)

Com base em tais considerações, requer seja restabelecido o ius ambulandi do beneficiário, com expedição do competente alvará de soltura, ou pela fixação de medidas cautelares alternativas a prisão. Juntou documentos (Id.72816972)

Postergada a análise da liminar e solicitadas informações (Id.73173956), as quais prestadas pela Autoridade Coatora (Id.74151488).

A liminar foi indeferida (Id. 75017953). Juntou documentos (Id. 72816972)

Nesta instância, a i. Procuradoria Geral da Justiça, no parecer subscrito pelo i. Procurador de Justiça Dr. José de Medeiros, manifestou-se pela denegação da ordem, na ementa assim sintetizada: (Id. 75616997)

“HABEAS CORPUS – LESÃO CORPORAL PRATICADA NO ÂMBITO DOMÉSTICO (ART. 129, §9º, DO CP C/C LEI Nº 11.340/06) – ALEGA DESNECESSIDADE DA CUSTÓDIA CAUTELAR – IMPROCEDÊNCIA – MODUS OPERANDI VIOLENTO – PRISÃO IMPRESCINDÍVEL PARA PROTEÇÃO DA INTEGRIDADE FÍSICA DA VÍTIMA, SENDO DESPICIENDO OS REQUISITOS DESCRITOS NO ART. 313, INCISOS I E III, DO CPP – INTELIGÊNCIA DO ART. 12-C, §2º, DA LEI Nº 11.340/06 – MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS NÃO SE MOSTRAM SUFICIENTES PARA O CASO – MENCIONA HAVER DESPROPORCIONALIDADE ENTRE A CUSTÓDIA CAUTELAR E FUTURO PROVIMENTO JURISDICIONAL PENAL – IMPROCEDÊNCIA – PRESUMIR EVENTUAL SANÇÃO PENAL RETRATA SITUAÇÃO HIPOTÉTICA – PRISÃO PREVENTIVA NÃO SE CONFUNDE COM A PRISÃO DECORRENTE DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE IMPOSTA AO CONDENADO – RECOMENDAÇÃO Nº 62 DO CNJ NÃO ALBERGA DELITOS PRATICADOS COM VIOLÊNCIA E GRAVE AMEAÇA – CONSTRANGIMENTO ILEGAL INEXISTENTE – PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM.”

É o relatório.

V O T O R E L A T O R

Como visto, trata-se de mandamus constitucional impetrado em benefício de JOSÉ CARLOS PAES GOUVEIA, o qual estaria a sofrer constrangimento ilegal oriundo de ato da Autoridade Judiciária 2ª Vara Criminal da Comarca de Barra do Garças/MT.

1) DA ALEGADA IMPOSSIBILIDADE DE DECRETAÇÃO DA PREVENTIVA – DA AUSÊNCIA VIOLAÇÃO AO ART. 313, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.

Tratando-se do crime de lesões corporais praticado no âmbito da violência doméstica e familiar contra a mulher, afigura-se defesa a alegação de que a ofendida expressou o desejo de não dar continuidade ao feito perante a autoridade policial via termo de renúncia encartado nos autos, porquanto se trata de ação penal pública incondicionada.

Assim, a propósito:

“CRIME DE AMEAÇA. LEI MARIA DA PENHA. AÇÃO PÚBLICA INCONDICIONADA. ENTENDIMENTO SUFRAGADO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO JULGAMENTO DA ADI Nº 4.424. DECISÃO MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. 1. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI nº 4.424, sufragou o entendimento de que o ajuizamento da ação penal nos crimes praticados contra a mulher, no âmbito doméstico/familiar, independe de representação. 2. Omissis. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (AgRg no REsp nº 1.339.695/GO, Rel. Ministro JORGE MUSSI, Quinta Turma, DJe 15.2.13)

Ademais, consta que houve o oferecimento da denúncia em desfavor do paciente, sendo a inicial acusatória recebida em 26/01/2021, conforme informações da Autoridade Coatora. (Id.74151488)

Destarte, para a adequada análise da tese de ausência de violação ao art. 313, do Código de Processo Penal para a decretação da prisão preventiva, transcrevo a decisão que em 14.01.2021 converteu a prisão em flagrante do paciente em...

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