Acórdão nº 1000540-76.2021.8.11.0078 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Primeira Câmara Criminal, 18-04-2023

Data de Julgamento18 Abril 2023
Case OutcomeProvimento em Parte
Classe processualCriminal - APELAÇÃO CRIMINAL - CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Número do processo1000540-76.2021.8.11.0078
AssuntoEstupro de vulnerável

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL


Número Único: 1000540-76.2021.8.11.0078
Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417)
Assunto: [Estupro de vulnerável]
Relator: Des(a).
MARCOS MACHADO


Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS MACHADO, DES(A). ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, DES(A). PAULO DA CUNHA]

Parte(s):
[ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0029-45 (APELADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0029-45 (REPRESENTANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (REPRESENTANTE), EDILSON DA SILVA - CPF: 037.641.474-07 (APELANTE), RAFAEL EVANGELISTA DA SILVA - CPF: 864.856.871-49 (ADVOGADO), TALLYS AUGUSTO PIOVEZAN - CPF: 017.790.461-54 (ADVOGADO), MARIA JESSICA GOMES DE SOUZA - CPF: 100.487.044-23 (TERCEIRO INTERESSADO), MARIETE DE SOUZA COELHO (TERCEIRO INTERESSADO), REGIANE MARIA DOS SANTOS (TERCEIRO INTERESSADO), L. L. F. G. - CPF: 088.349.501-51 (VÍTIMA), S. B. S. S. - CPF: 141.756.274-99 (VÍTIMA), L. L. F. G. - CPF: 088.349.501-51 (TERCEIRO INTERESSADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0029-45 (TERCEIRO INTERESSADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0029-45 (REPRESENTANTE), KAMILLY REBECA GOMES DA SILVA - CPF: 086.369.511-60 (ASSISTENTE), KEYNNELY VITORIA GOMES DA SILVA - CPF: 092.205.371-50 (ASSISTENTE), JOAO MARCOS VICENTE - CPF: 067.989.834-48 (ASSISTENTE), JAILSON FLORIANO - CPF: 023.996.494-27 (ASSISTENTE), ROSILDA SANTOS OLIVEIRA (ASSISTENTE), LALDIMETE DE SOUZA SILVA (ASSISTENTE), NATALI CINTIA DOS SANTOS (ASSISTENTE), ELIETE R. SILVA (ASSISTENTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)]

A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
MARCOS MACHADO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO.

E M E N T A

EMENTA

APELAÇÃO CRIMINAL - ESTUPRO DE VULNERÁVEL [DUAS VÍTIMAS], EM CONCURSO MATERIAL - SENTENÇA CONDENATÓRIA - INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA, MERA IMPORTUNAÇÃO SEXUAL, CRIME NÃO CONSUMADO - PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO, DESCLASSIFICAÇÃO DAS CONDUTAS, REDUÇÃO DA PENA E ESTABELECIMENTO DE REGIME INICIAL SEMIABERTO - NARRATIVAS DAS VÍTIMAS COERENTES - DECLARAÇÕES DE ASSITENTE SOCIAL E GENITORAS DAS OFENDIDAS - TESTEMUNHA PRESENCIAL DO ABUSO CONTRA A PRIMEIRA VÍTIMA - VALOR PROBANTE DO DEPOIMENTO INFANTIL - ARESTO DO TJMT - ELEMENTOS SUFICIENTES - PRÁTICA DE ATOS LIBIDINOSOS DIVERSOS DA CONJUNÇÃO CARNAL COMPROVADOS - JULGADOS DO TJMT - ABSOLVIÇÃO IMPROCEDENTE - BEIJOS NA BOCA E TOQUE EM PARTES ÍNTIMAS PRATICADO COM MENOR DE 14 (CATORZE) ANOS - ESTUPRO DE VULNERÁVEL CARACTERIZADO - CONTATO FÍSICO ENTRE APELANTE E VÍTIMAS - DESCLASSIFICAÇÃO IMPERTINENTE - ENTENDIMENTO DO STJ - CONDENAÇÃO MANTIDA - DOSIMETRIAS - PENA-BASE - MÍNIMO LEGAL - RECONHECIMENTO DE CONTINUIDADE DELITIVA - POSSIBILIDADE - ESTUPROS PRATICADOS EM INTERVALO INFERIOR A 30 (TRINTA) DIAS - MESMAS CONDIÇÕES DE TEMPO, LUGAR E FORMA DE EXECUÇÃO - JULGADO DO STJ - REGIME INICIAL FECHADO MANTIDO - RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE PARA READEQUAR A PENA DO APELANTE.

A narrativa infantil tem valor probante quando se mostrar consistente e harmônica com outros elementos de provas (TJMT, Ap nº 5553/2010 - Relator: Des. Paulo da Cunha - Primeira Câmara Criminal - 19.1.2012; AP NU 0004804-59.2010.8.11.0040 - Primeira Câmara Criminal - 4.9.2019). Somente deve ser relativizado ou até desconsiderado quando: a) a imaturidade orgânica da criança implicar em imaturidade funcional, ocasionando desenvolvimento psíquico incompleto; b) a imaginação atuar de forma dúplice, como meio de defesa (mentira defensiva ou interesseira) ou de satisfação de desejos (brinquedos fantasiosos); c) houver sugestibilidade acentuada das crianças; d) existir imaturidade moral (TJDFT, AP nº 20090111884089).

Pequenas divergências nos depoimentos de vítimas de violência sexual sobre aspectos circunstanciais/questões periféricas do fato criminoso são plenamente justificáveis, em virtude dos impactos sofridos (TJMT, Ap nº 98484/2007).

Nos crimes contra “a dignidade sexual, a palavra firme e coerente da vítima assume especial relevo no contexto probatório, uma vez que delitos dessa natureza são comumente praticados às ocultas” (TJMT, Enunciado Criminal 10).

“Não se olvida que nos crimes às ocultas, sobretudo nos delitos sexuais, a palavra da vítima possui fundamental importância, como elemento de convicção do magistrado, quando em consonância com as demais provas existentes nos autos. Deve ser valorada a palavra da vítima que [...] se mostrou firme e coerente em todas as oportunidades em que foi inquirida. Não sendo verossímil a versão apresentada pelo réu, não pode ela ser considerada para fins de absolvição” (TJMT, AP NU 0005223-05.2017.8.11.0050)

As condutadas do apelante [beijar a boca e mãos pelo corpo], praticadas contra vítimas de 9 (nove) e 12 (doze) anos de idade, respectivamente, denotam estupro de vulnerável, o qual caracteriza-se por qualquer ato libidinoso praticado com menor de 14 (catorze) anos (STJ, AgRg no REsp 1808319/RS).

O c. STJ possui entendimento de que “não cabe desclassificação para o crime de satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente [art. 218-A do CP], quando o réu não se limitou a praticar atos libidinosos na presença da criança ou induzi-la a presenciar tais atos, mas sim houve contato físico entre agente e vítima” (AgRg no AREsp nº 1.193.002/DF).

Se há provas de que o apelante beijou e tocou o corpo das vítimas, “não faz nenhum sentido o Defensor do réu dizer que o crime não teria ultrapassado a esfera da tentativa” (STJ, AgRg no HC nº 729.724/SP).

Quando os abusos sexuais [atos libidinosos] foram cometidos contra primas, em ambiente familiar [residência comum e veículo do apelante], num intervalo de 22 (vinte e dois) dias [1º.8.2020 e 23.8.2020], ou seja, em semelhantes condições de espaço, tempo e maneira de execução.

Os estupros em face de vítimas distintas não impedem a caracterização da continuidade delitiva, nos termos do art. 71, do CP (STJ, HC nº 483.468/GO).

O c. STJ decidiu que, “em se tratando de aumento de pena referente à continuidade delitiva, aplica-se a fração de 1/6 pela prática de 2 infrações” (STJ, AgRg no HC nº 649.371/SP).

Se “a pena final foi estabelecida em patamar superior a 8 anos de reclusão o regime inicial deve ser o fechado, nos termos do art. 33, § 2º, ‘a’, do Código Penal (STJ, REsp nº 1472027/RS).

R E L A T Ó R I O

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

APELAÇÃO NU 1000540-76.2021.8.11.0078 - COMARCA DE SAPEZAL

APELANTE: EDILSON DA SILVA

APELADOS: MINISTÉRIO PÚBLICO

R E L A T Ó R I O

Apelação criminal interposta por EDILSON DA SILVA contra sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Sapezal, nos autos de ação penal (PJe NU 1000540-76.2021.8.11.0078), que o condenou por estupro de vulnerável majorado [tio das vítimas], em concurso material [duas vítimas], a 24 (vinte e quatro) anos de reclusão, em regime inicial fechado - art. 217-A c/c art. 226, II e art. 69, todos do CP - (fls. 180/186-ID 153180300).

O apelante sustenta que: 1) não haveria “provas de materialidade e autoria”; 2) “a suposta conduta do apelante teria atingido apenas a esfera da mera importunação ofensiva ao pudor, dada a ausência de caráter lascivo”; 3) “o suposto ato praticado pelo apelante não pode ser concebido como crime consumado”.

Pede o provimento para que seja absolvido. Subsidiariamente, desclassificadas as condutas para “contravenção penal, satisfação de lascívia mediante a presença de criança ou adolescente” ou “para tentativa de estupro”, assim como reduzida a pena e estabelecido regime inicial semiaberto [sem fundamentação correlata] - (fls. 207/240-ID 153180313).

A PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SAPEZAL pugna pelo desprovimento do apelo (fls. 242/254-ID 153180315).

A i. 1ª Procuradoria de Justiça Criminal opina pelo desprovimento, em parecer assim sintetizado:

“APELAÇÃO CRIMINAL - RECURSO DEFENSIVO - ABSOLVIÇÃO (ARTIGO 217-A, CP) - IMPOSSIBILIDADE - DESCLASSIFICAÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - RECONHECIMENTO DA TENTATIVA - IMPOSSIBILIDADE - PENA-BASE NO MÍNIMO LEGAL - AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL - PELO IMPROVIMENTO DO RECURSO” (Jorge da Costa Lana, procurador de Justiça - fls. 260/269-ID 158045682)

É o relatório.

V O T O R E L A T O R

V O T O (MÉRITO)

EXMO. SR. DES. MARCOS MACHADO (RELATOR)

Egrégia Câmara:

O recurso é cabível (CPP, art. 593, I), manejado por quem tem interesse (CPP, art. 577) e não se verifica hipótese de extinção de punibilidade (CP, art. 107).

Consta da denúncia que:

“FATO 01:

No dia 01/08/2020, na residência localizada na Rua Projetada 14, 2205, Bairro Água Clara, nesta cidade, o denunciado EDILSON DA SILVA, consciente e voluntariamente, praticou ato libidinoso com a vítima Letícia Laiane Ferreira Gomes, nascida em 29/06/2011, conforme Boletim de Ocorrência nº 2020.215959 (f. 3 - id. 49310138), Termos de Declarações, Depoimento especial (autos nº 1002132- 92.2020.8.11.0078), Relatório técnico (f. 52/53 - id. 49310138), e demais elementos de informações coligados nos autos.

Apurou-se no incluso caderno investigativo que, o acusado convivia com a tia das vítimas, Sra. Rivoneide e, na data do fato, a menor Letícia estava na casa de sua tia, ocasião em que o acusado, aproveitando-se do momento em que sua esposa havia saído, trancou-se em um quarto com a menor e a beijou na boca, além de ter tirado o short da vítima e passado a mão nas nádegas da criança, praticando com ela ato libidinoso diverso da conjunção carnal, portanto.

Ainda, vale destacar o depoimento da vítima de que em outra oportunidade, o denunciado, aproveitando-se que a menor pegava um celular dentro do carro, o réu tentou beijá-la na boca e passou a mão em sua perna.

FATO 02:

Na noite de 23/08/2020, por volta das 20h50min, na via pública, na Av....

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT