Acórdão nº 1000844-91.2021.8.11.0008 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Terceira Câmara Criminal, 08-02-2023

Data de Julgamento08 Fevereiro 2023
Case OutcomeProcedência em Parte
Classe processualCriminal - APELAÇÃO CRIMINAL - CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Número do processo1000844-91.2021.8.11.0008
AssuntoCorrupção de Menores

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO

TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL


Número Único: 1000844-91.2021.8.11.0008
Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417)
Assunto: [Corrupção de Menores, Crimes de Tortura]
Relator: Des(a).
RONDON BASSIL DOWER FILHO


Turma Julgadora: [DES(A). RONDON BASSIL DOWER FILHO, DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). LUIZ FERREIRA DA SILVA]

Parte(s):
[ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0029-45 (APELADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0029-45 (REPRESENTANTE), RODRIGO DA SILVA JESUS - CPF: 070.817.321-78 (APELANTE), DEFENSORIA PUBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 02.528.193/0001-83 (REPRESENTANTE), EDNILSON ALVES MIRANDA - CPF: 779.626.211-68 (TERCEIRO INTERESSADO), ADELSON VITOR DE OLIVEIRA CARVALHO (TERCEIRO INTERESSADO), LUAN FELIPE NERIS DIAS FONTOURA (TERCEIRO INTERESSADO), DILLAN RAMOS DA LUZ - CPF: 048.786.081-02 (TERCEIRO INTERESSADO), ROGERIO OLIVEIRA DE CARVALHO - CPF: 067.908.461-40 (VÍTIMA), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), ADELSON VITOR DE OLIVEIRA CARVALHO (TERCEIRO INTERESSADO), LUAN FELIPE NERIS DIAS FONTOURA (TERCEIRO INTERESSADO)]

A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
LUIZ FERREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO.

E M E N T A

APELAÇÃO CRIMINAL. TORTURA-PROVA E CORRUPÇÃO DE MENORES EM CONCURSO MATERIAL DE CRIMES. 1. TORTURA-PROVA. ABSOLVIÇÃO. DESCABIMENTO. PROVA DA MATERIALIDADE E DA AUTORIA DO CRIME. PALAVRA DA VÍTIMA. SINTONIA COM O ACERVO PROBATÓRIO. 2. TORTURA-PROVA. DESCLASSIFICAÇÃO. LESÃO CORPORAL DE NATUREZA LEVE. IMPOSSIBILIDADE. DOLO ESPECÍFICO DE ANGARIAR DECLARAÇÃO. 3. CORRUPÇÃO DE MENORES. ABSOLVIÇÃO. INVIABILIDADE. CRIME DE NATUREZA FORMAL. DESNECESSIDADE DE PRÉVIO ENVOLVIMENTO DO ADOLESCENTE EM ILÍCITOS ANTERIORES. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 500 DO STJ. 4. PENA-BASE. MÍNIMO LEGAL. PROCEDÊNCIA. EQUÍVOCO NA DEPRECIAÇÃO DA CULPABILIDADE. 5. CUSTAS E DESPESAS PROCESSUAIS. ISENÇÃO DO PAGAMENTO. DESCABIMENTO. MATÉRIA AFETA AO JUÍZO DAS EXECUÇÕES PENAIS. 6. PROVIDÊNCIA DE OFÍCIO. CONCURSO FORMAL. RECONHECIMENTO. CONDUTAS COMETIDAS MEDIANTE UMA ÚNICA AÇÃO. INTELIGÊNCIA DO ART. 70, DO CP. APELO PARCIALMENTE PROVIDO EM DISSONÂNCIA DO PARECER, APENAS PARA FIXAR A PENA-BASE NO MÍNIMO LEGAL, COM MEDIDA EX OFFICIO.


1. As uníssonas declarações da vítima e os robustos testemunhos colhidos nas duas fases da persecução penal, sempre apontando o apelante como autor do crime de Tortura-prova (art. 1º, inc. I, alínea a, da Lei nº. 9.455/97), impedem o acolhimento do pedido de absolvição por insuficiência probatória.

2. Emergindo dos autos que o apelante não agiu com o mero intuito de ofender a integridade física da vítima, mas de obrigá-la a admitir que fez falsa imputação contra terceiro, afigura-se escorreita a tipificação da conduta como Tortura-prova (art. 1º, inc. I, alínea a, da Lei nº. 9.455/97), cuja configuração, inclusive, prescinde de intenso sofrimento físico ou psicológico, como exigido na Tortura-pena ou Tortura-castigo (art. 1º, inc. II, da Lei nº. 9.455/97).

3. A caracterização do delito de Corrupção de Menores (art. 244-B do ECA), dada a sua natureza formal, reclama tão-somente que o adulto esteja acompanhado de um menor durante a prática do ilícito, pouco importando se o adolescente cometeu atos infracionais anteriores ou já cumpriu medidas socioeducativas. Inteligência da Súmula nº. 500 do STJ.

4. Na falta de fundamentação concreta e idônea que justifique a negativação da culpabilidade (art. 59 do CP), deve ser afastado o juízo depreciativo e fixada a pena-base no mínimo legal.

5. A isenção do pagamento de custas e despesas processuais é matéria afeta ao Juízo das Execuções Penais, único competente para analisar possível mudança da situação econômico-financeira do apenado entre a data da condenação e a execução do título judicial.

6. Tendo o apelante produzido dois resultados criminosos mediante uma única conduta sem o desejo de perpetrá-los de forma autônoma, deve ser aplicada ex officio a regra do concurso formal (art. 70 do CP), em detrimento do concurso material de crimes (art. 69 do CP).

R E L A T Ó R I O

Egrégia Câmara,


Rodrigo da Silva Jesus foi condenado à pena de 4 anos de reclusão em regime semiaberto porque praticou os crimes de Tortura-prova (art. 1º, inc. I, alínea a, da Lei nº. 9.455/97) e Corrupção de Menores (art. 244-B do ECA), na forma do art. 69 do CP (ID 125947710).

Inconformado, pleiteia a absolvição quanto ao crime de Tortura-prova, sob o fundamento de que os autos não contêm provas suficientes de que ele causou as lesões sofridas pela vítima ou contribuiu para a sua ocorrência. De modo subsidiário, pugna a desclassificação da conduta para o delito de Lesão Corporal Leve (art. 129, caput, do CP), alegando que a violência empregada pelos adolescentes tinha como único objetivo se vingar da apreensão de Adelson, que havia sido liberado dias atrás, não causar sofrimento exagerado à vítima.

Na sequência, pretende ser absolvido em relação ao crime de Corrupção de Menores, desta vez por entender que o envolvimento dos adolescentes L.F.N.D.F. e A.V.O. em atos infracionais pretéritos afasta a tipicidade da conduta delitiva.

Caso nenhuma das súplicas seja atendida, requer a fixação da pena-base no mínimo legal e a isenção do pagamento de custas e despesas processuais (ID 125947723).

As contrarrazões são pelo desprovimento do apelo (ID 125947726).

Na mesma linha do órgão acusatório, a ilustrada Procuradoria-Geral de Justiça, embora tenha deixado de sintetizar seu entendimento, lançou parecer pelo desprovimento do recurso (ID 134818698).

É o relatório.

À douta revisão.

Cuiabá, 15 de dezembro de 2022.

Rondon Bassil Dower Filho

Relator

V O T O R E L A T O R

Egrégia Câmara,

O apelante foi condenado à pena de 4 anos de reclusão em regime semiaberto porque praticou os crimes de Tortura-prova (art. 1º, inc. I, alínea a, da Lei nº. 9.455/97) e Corrupção de Menores (art. 244-B do ECA), na forma do art. 69 do CP (ID 125947710).

I. TORTURA – ABSOLVIÇÃO OU DESCLASSIFICAÇÃO

A prova da existência (materialidade) e a autoria do crime são extraídas do Laudo Pericial (ID 125947658), Mapa Topográfico para Localização de Lesões (ID 125947658), das declarações da vítima, Rogério Dias de Oliveira Carvalho (ID 125946693 e 125947702), e dos depoimentos das testemunhas (ID 125946694, 125946695 e 125947702), exatamente conforme descrito na denúncia.

Em linhas gerais, tais documentos revelam que na noite de 25.2.2021, o apelante e os adolescentes Adelson Dias de Carvalho e Luan Felipe Neris Dias Fontoura agrediram fisicamente a vítima com o objetivo de que ela admitisse que fez falsa imputação contra o menor Adelson.

Segundo consta, o adolescente Adelson e a vítima são primos e alguns dias antes, a vítima comunicou às autoridades públicas que o primo agrediu o próprio pai e danificou o aparelho celular do genitor. Em razão desse episódio, o menor permaneceu cinco dias apreendido.

Assim que foi liberado, Adelson, Luan e o apelante, em prévia unidade de desígnios, foram até a casa da vítima. Ali, confrontaram a vítima e, mesmo após ela negar ter dito a autoridades que o primo agrediu a avó dos dois, os três a agrediram com auxílio de um pedaço de madeira e fios de condução elétrica.

As agressões tiveram fim com a intervenção de um tio da vítima, que afugentou o grupo.

Tanto na sede da autoridade policial como em Juízo, a vítima asseverou que o primo, o adolescente Luan e o apelante não só foram até a sua casa, como se valeram de violência física com o objetivo de obter a declaração de que havia dito que o primo “bateu na avó”. Como a vítima se negou a dar a declaração pretendida, os três a agrediram.

Contextualizando, eis alguns trechos do seu depoimento em Juízo:

“Foi meu primo e amigo do meu primo, o Luan, eu tava mexendo no telefone lá, aí o primeiro que me chamou foi o ‘Girino’, que é o Luan, que mora lá na minha cidade, aí fui lá pra fora pra ouvir o que ele quer, aí fui lá pra fora, aí ele falou assim ‘é verdade que o Adelson bateu na sua avó?’ Falei ‘não, ele só prometeu de bater nela’. Aí chegou na hora e chamou a minha avó, a minha avó foi lá, aí o Luan falou assim ‘é verdade que o Adelson bateu na senhora?’ Aí a minha avó falou que não, aí eu tomei uma balaustrada na cabeça do meu primo primeiro, o meu primo me deu uma balaustrada, aí os dois, o Luan e o Rodrigo me deu com fio de luz nas minhas costas, foi isso que aconteceu (...). Eles usaram um pedaço de madeira e um filtro de luz traçado (...). eles estavam em três (...). Conheço os três, é o Rodrigo, o outro é o Luan e o outro é o meu primo que mora lá no Porto Estrela” (ID 125947702). Destaquei.

Ainda em sintonia com tais declarações, o Laudo Pericial detalha as lesões provocadas na vítima: edema traumático com hematoma em região orbitária esquerda, ferimento saturado de aproximadamente 4cm na região da sobrancelha esquerda, equimose na região torácica direita, equimose em mesogástrio, escoriação em terço inferior do braço direito e escoriação em crosta em região rotuliana esquerda, além de múltiplas equimoses (ID 125947658).

Por sua vez, apesar de ouvida apenas na fase preliminar das investigações, a avó da vítima, Helena Ondina de Arruda, garantiu ter ouvido gritos e, ao checar o que estava acontecendo, encontrou a vítima caída ao solo e sendo agredida pelo primo Adelson Dias de Carvalho e por dois amigos dele, Luan e Rodrigo (ID 125947658).

Mas não é só, nobres colegas.

Ao ser inquirido na fase judicial, o adolescente Adelson confirmou a participação do apelante no episódio criminoso, assegurando que o próprio depoente, o menor Luan e o apelantebateram na vítima...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT