Acórdão nº 1002943-12.2022.8.11.0004 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Terceira Câmara Criminal, 24-05-2023

Data de Julgamento24 Maio 2023
Case OutcomeProvimento em Parte
Classe processualCriminal - APELAÇÃO CRIMINAL - CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Número do processo1002943-12.2022.8.11.0004
AssuntoAmeaça

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO

TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL


Número Único: 1002943-12.2022.8.11.0004
Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417)
Assunto: [Ameaça, Contra a Mulher]
Relator: Des(a).
LUIZ FERREIRA DA SILVA


Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ FERREIRA DA SILVA, DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). RONDON BASSIL DOWER FILHO]

Parte(s):
[DEFENSORIA PUBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 02.528.193/0001-83 (APELANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (REPRESENTANTE), ISRAEL LEITE ARAUJO - CPF: 926.658.531-91 (TERCEIRO INTERESSADO), ANA PEREIRA DA SILVA - CPF: 327.700.141-53 (TERCEIRO INTERESSADO), KASSIA VALERIA DA SILVA PINHEIRO - CPF: 709.007.011-53 (TERCEIRO INTERESSADO), LUCIO FLAVIO KOTHE - CPF: 597.536.098-68 (TERCEIRO INTERESSADO), NADJA DE SOUZA SILVA - CPF: 013.190.611-92 (VÍTIMA), WANDERSON KLEYTON LIMA DE SOUSA (APELANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)]


A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
LUIZ FERREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO.


E M E N T A

RECURSO DE APELAÇÃO CRIMINAL – LESÃO CORPORAL CONTRA MULHER E AMEAÇA – CONDENAÇÃO – IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA – 1. PRELIMINAR: NULIDADE DESTE PROCESSO POR VIOLAÇÃO À AMPLA DEFESA E AO CONTRADITÓRIO – ALEGAÇÃO DE MERA RATIFICAÇÃO PELA TESTEMUNHA DAS DECLARAÇÕES PRESTADAS POR ELA NA FASE ADMINISTRATIVA – AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO OPORTUNO DA DEFESA DO APELANTE E DE DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO SOFRIDO POR ELE – PAS DE NULLITÉ SANS GRIEF – REJEIÇÃO – 2. MÉRITO: PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO DO APELANTE – ALEGADA FRAGILIDADE PROBATÓRIA – IMPOSSIBILIDADE – PREPONDERÂNCIA DAS DECLARAÇÕES DA VÍTIMA AMPARADA PELO LAUDO DE LESÃO CORPORAL E DEPOIMENTO DOS POLICIAIS MILITARES QUE ATENDERAM A OCORRÊNCIA – 3. ALEGAÇÃO DE ATIPICIDADE DA CONDUTA PREVISTA NO ART. 147 DO CÓDIGO PENAL POR AUSÊNCIA DE TEMOR DA VÍTIMA – DESCABIMENTO – VÍTIMA INTIMIDADA COM AS AMEAÇAS PROFERIDAS PELO APELANTE – 4. PEDIDO DE REDUÇÃO DAS PENAS BASILARES – INVIABILIDADE – EXISTÊNCIA DE MAUS ANTECEDENTES – PENAS INICIAIS MANTIDAS – 5. POSTULADO O AFASTAMENTO DA CONDENAÇÃO POR DANO MORAL – IMPOSSIBILIDADE – INCIDÊNCIA DA TESE FIXADA NO TEMA 983 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – 6. REDUÇÃO DO VALOR DA INDENIZAÇÃO – VIABILIDADE – CAPACIDADE ECONÔMICA E ESCOLARIDADE DO APELANTE REDUZIDAS – 7. PRELIMINAR REJEITADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

1. Não ofende os princípios do contraditório e da ampla defesa a ratificação judicial de depoimentos realizados na fase inquisitorial, desde que possibilitada às partes fazerem perguntas e reperguntas. Mas, ainda que assim não fosse, é sabido que à luz de uma interpretação sistemática, somente poderia dar ensejo a uma nulidade de natureza relativa, se fossem cumpridas duas condições: (i) que tivesse havido protesto da parte prejudicada a tempo e modo devidos, sob pena de preclusão; e (ii) que houvesse a demonstração inequívoca do efetivo prejuízo eventualmente suportado, prestigiando-se o aforismo pas de nullité sans grief, previsto art. 563, do Código de Processo Penal. No entanto, essas condições não foram cumpridas no caso em apreciação.

2. É inviável a absolvição do apelante pela fragilidade do elenco probatório, porquanto a materialidade e a autoria delitivas estão comprovadas nestes autos, estando, por conseguinte, a sua condenação fundada no acervo probatório produzido na instrução processual, mormente no depoimento da vítima, que firmemente o apontou como autor da agressão e ameaça sofridas por ela. Além do mais, deve ser destacado que, em delitos dessa natureza, as palavras da ofendida têm valor probatório preponderante, sobretudo quando amparadas por laudo de lesão corporal.

3. Não procede o pedido visando a absolvição do apelante do crime de ameaça, sob o fundamento da atipicidade de sua conduta em razão da ausência dolo e de temor da vítima, mormente porque o delito de ameaça, só pode ser cometido na sua forma dolosa, sob pena de ausência do elemento subjetivo do tipo. Ademais, ficou comprovado nestes autos que o recorrente proferiu ameaças à vítima de ocasionar-lhe mal injusto e grave, situação que lhe causou temor real de concretização do prometido, estando, portanto, presente o elemento do tipo exigido para ensejar o juízo condenatório.

4. Sendo várias as condenações que podem ser reconhecidas como reincidência, o juízo de primeiro grau utilizou uma como agravante da reincidência propriamente dita e as demais para negativar os maus antecedentes do apelante na primeira etapa da dosimetria, de forma que não existe bis in idem na fundamentação da sentença condenatória.

5. Nos termos do julgamento de recurso repetitivo que ensejou a fixação do Tema 983 do Superior Tribunal de Justiça, deixou assentado que: “Nos casos de violência contra a mulher praticados no âmbito doméstico e familiar, é possível a fixação de valor mínimo indenizatório a título de dano moral, desde que haja pedido expresso da acusação ou da parte ofendida, ainda que não especificada a quantia, e independentemente de instrução probatória.”

6. Embora haja gravidade nas ações praticadas pelo apelante, sua diminuta capacidade econômica e reduzida escolaridade, impõe a redução do montante indenizatório, todavia, sem perder de vista o seu cunho pedagógico, de promover a repressão pretérita e prevenção futura de ações desse jaez.

7. Preliminar rejeitada. Recurso parcialmente provido.


R E L A T Ó R I O

EXMO. SR. DES. LUIZ FERREIRA DA SILVA:

Ilustres integrantes da Terceira Câmara Criminal:

Trata-se de recurso de apelação criminal interposto por Wanderson Kleyton Lima de Sousa contra a sentença prolatada nos autos da Ação Penal n. 1002943-12.2022.8.11.0004, pelo Juízo da 2ª Vara Criminal de Barra do Garças/MT, condenando-o pela prática dos crimes de lesão corporal contra mulher e ameaça (arts. 129, § 13º e 147 do Código Penal, com as implicações da Lei n. 11.340/06), às penas de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão e 1 (um) mês e 10 (dez) dias de detenção, no regime inicial semiaberto, além de indenização à vítima no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por danos morais.

O apelante, forte nas razões recursais que se encontram no ID 157443264, formulou os seguintes pedidos:

[...]a) Preliminarmente, por violação à imparcialidade e ao disposto no art. 212 do CPP, e em respeito ao efetivo contraditório, seja reconhecida a NULIDADE ABSOLUTA DA PRODUÇÃO DA PROVA ATINENTE À OITIVA DA TESTEMUNHA PM ISRAEL LEITE neste feito, com ABSOLVIÇÃO em consequência, por falta de provas;

b) Subsidiariamente, seja o apelante ABSOLVIDO, por patente ausência de provas suficientes, nos termos do art. 386, VII, e do art. 155, ambos do CPP, ensejando aplicação do princípio do in dubio pro reo;

c) Caso as teses acima não sejam o entendimento de Vossas Excelências, seja o apelante ABSOLVIDO quanto ao delito do artigo 147 do CP, por atipicidade da conduta, conforme artigo 386, III do CPP;

d) Subsidiariamente, quanto ao crime de lesão corporal seja ABSOLVIDO, pela ausência de comprovação do elemento subjetivo do tipo, com fulcro no artigo 386, III do CPP;

e) Em caso de manutenção da condenação, seja corrigida a dosimetria havida, afastando-se a avaliação inidônea das circunstâncias judiciais, à luz de estrito juízo de razoabilidade no que se refere ao quantum;

f) Seja reconhecido o não cabimento do valor fixado a título de indenização à vítima ou, subsidiariamente, seja retificado o referido por ser desproporcional, com fixação de montante não superior a R$ 1.000,00 (hum mil reais).

Para fim de interposição de recursos à superior instância, PREQUESTIONAM-SE os seguintes dispositivos legais: artigos 155, 156, 158, 212 e 386, incisos III e VII, todos do Código de Processo Penal; artigos 59, 129 e 147 do Código Penal; e artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal. [...]

O Ministério Público, nas contrarrazões encontradiças no ID 157443269, requer o desprovimento do presente recurso. E, nesta instância revisora, a Procuradoria-Geral de Justiça, no parecer que se vê no ID 158376163, opinou pela rejeição da preliminar. E, no mérito, postulou o provimento parcial deste recurso, para redução do quantum indenizatório.

É o relatório. À revisão.

V O T O R E L A T O R

PRELIMINAR

Nulidade do depoimento da testemunha, por violação ao disposto no art. 212 do Código de Processo Penal e aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa.

O apelante suscita, preliminarmente, a nulidade do depoimento colhido judicialmente do policial militar Israel Leite de Araújo, visto que, ao afirmar inicialmente que não se recordava dos fatos, o promotor de justiça leu os termos da denúncia para que assim a testemunha pudesse se lembrar.

Contudo, após a incursão nos elementos probatórios encontradiços nestes autos, é forçoso reconhecer a inconsistência do referido pleito, porque, indiscutivelmente, não houve violação aos princípios constitucionais em alusão. Mas, ainda que assim não fosse, essa matéria não foi arguida pela defesa do apelante a tempo e modo devidos – na ata da audiência de instrução e julgamento – estando, pois, alcançada pela preclusão.

Ademais, nota-se que após questionamentos pela acusação, a testemunha, de forma livre e espontânea, esclareceu a dinâmica da ação criminosa praticada pelo apelante, não tendo havido induzimento em nenhum momento pelo presentante do Ministério Público.

Além disso, a leitura prévia da denúncia, boletim de ocorrência ou, ainda, das declarações extrajudiciais da testemunha policial, durante a oitiva judicial, não conduz à nulidade do processo. Aliás, deve...

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