Acórdão nº 1003762-49.2022.8.11.0003 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Primeira Câmara Criminal, 23-05-2023

Data de Julgamento23 Maio 2023
Case OutcomeProvimento em Parte
Classe processualCriminal - APELAÇÃO CRIMINAL - CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Número do processo1003762-49.2022.8.11.0003
AssuntoTráfico de Drogas e Condutas Afins

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL


Número Único: 1003762-49.2022.8.11.0003
Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417)
Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins, Associação para a Produção e Tráfico e Condutas Afins]
Relator: Des(a).
MARCOS MACHADO


Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS MACHADO, DES(A). ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, DES(A). PAULO DA CUNHA]

Parte(s):
[DEBORA CRISTIANE DA SILVA LIRA - CPF: 037.232.621-80 (APELANTE), ALCIDINEY DE AMORIM - CPF: 483.475.311-53 (ADVOGADO), MARCOS VAZ DE OLIVEIRA - CPF: 007.843.131-05 (APELANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (REPRESENTANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)]

A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
MARCOS MACHADO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO.

E M E N T A

EMENTA

APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS – SENTENÇA CONDENATÓRIA – IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA – INSUFICIÊNCIA DE PROVAS, ORIGEM LÍCITA DO AUTOMÓVEL APREENDIDO – PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. SUBSIDIARIAMENTE, RESTITUIÇÃO DO BEM APREENDIDO – SEGUNDO APELANTE - INVESTIGAÇÃO POLICIAL ANTECEDENTE – LOCALIZAÇÃO DE BALANÇA DE PRECISÃO E DINHEIRO EM ESPÉCIE – ENUNCIADO CRIMINAL 8 DO TJMT - CRIME DE AÇÃO MÚLTIPLA – MANTER EM DEPÓSITO – ENUNCIADO CRIMINAL 7 DO TJMT - FORMA DE ACONDICIONAMENTO – DESTINAÇÃO MERCANTIL – LIÇÃO DOUTRINÁRIA – TRÁFICO URBANO - JULGADOS DO TJSC E TJSP – QUANTIDADE – COMPATÍVEL COM TRAFICÂNCIA –– CONSUMO PESSOAL – ASSERTIVA – NÃO VEROSSÍMIL – CONDIÇÃO DE USUÁRIO – RESPONSABILIZAÇÃO NÃO ELIDE – ENUNCIADO CRIMINAL 3 DO TJMT – TRAFICÂNCIA DEMONSTRADA QUANTO AO SEGUNDO APELANTE – JULGADO DO TJMT - TRAFICÂNCIA IMPUTADA À PRIMEIRA APELANTE – CONDUTAS QUE SE ENQUADRAM NO TIPO PENAL – INEXISTÊNCIA – COAUTORIA NÃO DEMONSTRADA – ARESTOS DA PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL DO TJMT – ABSOLVIÇÃO IMPOSITIVA – ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO - VÍNCULO ESTÁVEL PARA TRAFICÂNCIA NÃO DEMONSTRADO – PREMISSA DO STF – ENUNCIADO CRIMINAL 5 E ACÓRDÃO DA PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL DO TJMT – ABSOLVIÇÃO DA ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO – MINORANTE DO TRÁFICO PRIVILEGIADO – INAPLICABILIDADE – APELANTE REINCIDENTE – PENA IMPOSTA - CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL DESFAVORÁVEL E REINCIDÊNCIA - REGIME INICIAL FECHADO JUSTIFICADO - ARESTO DO STJ - PERDIMENTO - EXPROPRIAÇÃO DO BEM UTILIZADO EM TRÁFICO DE DROGAS - DECORRÊNCIA DA CONDENAÇÃO - POSIÇÃO DO STF – APLICAÇÃO DO ART. 243, PARÁGRAFO ÚNICO, DA CF E ART. 63 DA LEI DE DROGAS - RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE PARA ABSOLVER A PRIMEIRA APELANTE DO TRÁFICO DE DROGAS E DA ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO E ABSOLVER O SEGUNDO APELANTE DA ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO.

Os depoimentos seguros e coerentes dos agentes policiais, prestados sob o crivo do contraditório, reforçados pelo contexto das apreensões das drogas variadas e apetrecho comumente utilizado na preparação das drogas para venda [balança de precisão], demonstram o envolvimento do segundo apelante no tráfico de drogas e “são idôneos para sustentar a condenação criminal” (TJMT, Enunciado Criminal 8).

O tráfico de drogas constitui crime de ação múltipla ou misto alternativo e, portanto, consuma-se com a prática de qualquer das condutas nele descritas (TJMT, Enunciado Criminal 7), dentre as quais “manter em depósito” substâncias entorpecentes para fins de comercialização.

A forma de acondicionamento [porções individuais], somadas à apreensão de apetrecho comumente utilizados para pesar os entorpecentes [balança de precisão], evidenciam a preparação em porções individuais na residência para posterior venda/distribuição (BARBOZA, Bruna Santos. “Usuário ou Traficante?”. Disponível em: https://brunasbarboza.jusbrasil.com.br).

A guarda e depósito, em residência, de drogas variadas, para preparar e vender conforme a procura de usuários, com o propósito de dificultar a configuração da traficância e, consequentemente, fugir à responsabilidade penal, caso preso, é uma das modalidades de tráfico urbano (TJSC, AP 5025005-95.2020.8.24.0000; TJSP, AP 2082008-68.2021.8.26.0000).

A condição de usuário de drogas não elide a responsabilização do agente pelo delito tipificado no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 (TJMT, Enunciado Criminal 3).

É insustentável a almejada absolvição por insuficiência de provas e, com mais razão, a desclassificação do tipo penal do tráfico de drogas (art. 33, caput, da Lei n.º 11. 343/06) para aquele do art. 28 da Lei n.º 11.343/06, se as circunstâncias da apreensão dos entorpecentes [diversidade de drogas, encontradas juntamente com dinheiro em espécie e caderneta com anotações sobre o comércio malsão], aliadas aos depoimentos dos policiais militares que diligenciaram no ocorrido, revelam a prática da mercancia espúria de narcóticos” (TJMT, AP 1000126-78.2021.8.11.0078).

Para embasar condenação por tráfico de entorpecentes pressupõe-se prova irrefutável da autoria delitiva. Se não há provas de que a primeira apelante concorreu para a infração penal, impõe-se absolvê-la, nos termos do art. 386, V, do CPP (TJMT, Ap 180045/2016; AP N.U 0000984-39.2008.8.11.0028).

Para a configuração do tipo penal previsto no art. 35 da Lei 11.343/06 é indispensável a existência de estabilidade, permanência ou habitualidade dos envolvidos na prática do tráfico de drogas, não bastando para a sua configuração a ocorrência de um evento ocasional. Inexistindo provas substancialmente convencíveis aclarando o envolvimento dos apelados, de forma habitual e convergente, em verdadeira estrutura criminosa voltada ao narcotráfico, inadmissível a condenação no delito de associação para o tráfico” (TJMT, AP Nº 0024157-74.2013.8.11.0042).

A reincidência, seja ela específica ou não, constitui óbice à aplicação da minorante prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06, tendo em vista que um dos requisitos para a incidência do benefício é que o paciente seja primário (STJ, HC nº 393.862/DF).

A pena imposta - superior a 4 (quatro) e inferior a 8 (oito) anos - e a reincidência justificam o regime inicial fechado (CP, art. 33, § 2º, ‘a’, e § 3º; STJ, HC nº 615.004/SP).

É possível o confisco de todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico de drogas, sem a necessidade de se perquirir a habitualidade, reiteração do uso do bem para tal finalidade (STF, RE 638.491/PR).

A expropriação do veículo utilizado em tráfico de drogas decorre de responsabilidade objetiva e todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins [...] será confiscado e reverterá a fundo especial com destinação específica, na forma da lei (CF, art. 243, parágrafo único).

O perdimento de bens em favor da União pela prática de tráfico ilícito de entorpecentes constitui efeito da condenação (art. 63 da Lei nº 11.343/06).

R E L A T Ó R I O

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

APELAÇÃO Nº 1003762-49.2022.8.11.0003 - CLASSE CNJ - 417- COMARCA DE RONDONÓPOLIS

APELANTE(S): DEBORA CRISTIANE DA SILVA LIRA

MARCOS VAZ DE OLIVEIRA

APELADOS(S): MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL

R E L A T Ó R I O

Apelação criminal interposta por DEBORA CRISTIANE DA SILVA LIRA e MARCOS VAZ DE OLIVEIRA contra sentença proferida pelo Juízo da 5ª Vara Criminal da Comarca de Rondonópolis, nos autos de ação penal (PJE nº 1003762-49.2022.8.11.0003), que os condenou por tráfico de drogas e associação para o tráfico, sendo a primeira a 8 (oito) anos de reclusão e 1.200 (um mil e duzentos) dias-multa, em regime inicial semiaberto e o segundo a 11 (onze) anos e 7 (sete) meses de reclusão e 1.750 (um mil e setecentos e cinquenta) dias-multa, em regime inicial fechado - arts. 33, caput e 35, caput, ambos da Lei nº 11.343/2006 - (ID 161038729).

Os apelantes sustentam que: 1) as provas seriam insuficientes para as condenações; 2) o veículo [Renault Sandero, cor cinza, placas PZV-8239] possui origem lícita e não foi “utilizado na prática de crimes”.

Pedem o provimento para que sejam absolvidos dos crimes pelos quais foram condenados. Subsidiariamente, restituído o automóvel apreendido (ID 148312195).

A 1ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA CRIMINAL pugna pelo desprovimento do recurso (ID 161038770).

A i. 10ª Procuradoria de Justiça Criminal opina pelo desprovimento, em parecer assim sintetizado:

“RECURSO DE APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS – ASSOCIAÇÃO AO TRÁFICO – SENTENÇA CONDENATÓRIA – IRRESIGNAÇÕES DEFENSIVAS – PRETENDIDA A ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS – IMPOSSIBILIDADE – PROVAS COLIGIDAS NOS AUTOS SÃO APTAS A EMBASAR A SENTENÇA CONDENATÓRIA PELO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO AO TRÁFICO – PALAVRA DOS POLICIAIS – DEPOIMENTOS FIRMES E COERENTES – PRETENDIDA RESTITUIÇÃO DE AUTOMÓVEL COM DECRETO DE PERDIMENTO – IMPOSSIBILIDADE – VEÍCULO UTILIZADO NA SENDA CRIMINOSA – CONFISCO DO BEM DE VALOR APREENDIDO EM DECORRÊNCIA DO TRÁFICO DE DROGAS REVERTIDO A FUNDO ESPECIAL COM DESTINAÇÃO ESPECÍFICA – PARECER PELO CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO APELO.” (Amarildo Cesar Fachone, procurador de Justiça - ID 164812175)

É o relatório.

V O T O R E L A T O R

V O T O (MÉRITO)

EXMO. SR. DES. MARCOS MACHADO (RELATOR)

Egrégia Câmara:

O recurso é cabível (CPP, art. 593, I), manejado por quem tem interesse (CPP, art. 577) e não se verifica hipótese de extinção de punibilidade (CP, art. 107).

Consta da denúncia que:

“[...] no dia 24/01/2022, por volta das 08h40min, na residência situada na Rua A 11, n° 3425, Bairro Pedra 90, nesta cidade, os denunciados DEBORA CRISTIANE DA SILVA LIRA e MARCOS VAZ DE OLIVEIRA foram presos em flagrante delito por guardarem e manterem em depósito 03 (três) porções, perfazendo massa de 16,24 g (dezesseis gramas e vinte e quatro centigramas), 01 (uma) porção, pesando 11,40 g (onze gramas e quarenta centigramas), e 01 (uma) outra...

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