Acórdão nº 1005396-05.2021.8.11.0007 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Terceira Câmara de Direito Privado, 27-09-2023

Data de Julgamento27 Setembro 2023
Case OutcomeNão-Provimento
Classe processualCível - APELAÇÃO CÍVEL - CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Privado
Número do processo1005396-05.2021.8.11.0007
AssuntoAdimplemento e Extinção

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO

TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO


Número Único: 1005396-05.2021.8.11.0007
Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198)
Assunto: [Adimplemento e Extinção, Correção Monetária, Compra e Venda]
Relator: Des(a).
CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA


Turma Julgadora: [DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS]

Parte(s):
[MARIA EDINEZ CLARA DOS SANTOS - CPF: 855.471.581-00 (APELANTE), CESAR KARASIAKI - CPF: 020.698.401-40 (ADVOGADO), PENHA DE FATIMA SILVA TORRECILLAS E SILVA - CPF: 328.687.236-91 (APELADO), MARIA HELENA MOREIRA DA SILVA - CPF: 331.146.686-15 (ADVOGADO)]

A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
DIRCEU DOS SANTOS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO.

E M E N T A

AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL C/C CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO – CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL RURAL – PREÇO DO PAGAMENTO DE PARCELAS FIXADO EM CABEÇA DE GADO – PREVISÃO CONTRATUAL – POSSIBILIDADE – COVID-19 – TEORIA DA IMPREVISÃO – ONEROSIDADE EXCESSIVA – INOCORRÊNCIA – EXCEÇÃO DO CONTRATO NÃO CUMPRIDO – INAPLICABILIDADE – SENTENÇA MANTIDA – HONORÁRIO RECURSAL – RECURSO DESPROVIDO.

Não há nulidade quando devidamente pactuado na escritura celebrada entre partes maiores e capazes, sem vício de consentimento, a fixação da cabeça de gado como indexador monetário das parcelas.

A teoria da imprevisão, força maior e caso fortuito, são acontecimentos supervenientes capaz de alterar, de maneira significativa (ou estrutural), o equilíbrio econômico e financeiro da avença, dela decorrendo situação de onerosidade excessiva, de sorte que, se em tais circunstâncias o contrato fosse mantido, redundaria em extrema vantagem para o credor, em contrapartida a um empobrecimento da mesma natureza em relação ao devedor.

A ocorrência de oscilação cambial e a oscilação de preço no mercado (aumento ou diminuição do gado), configuram riscos inerentes ao agronegócio, que são considerados no momento da fixação do preço no contrato, não havendo que se falar em aplicação da teoria da imprevisão.

A situação de pandemia não constitui, por si só, justificativa para o não pagamento das obrigações constituídas, em que pese se tratar de circunstância que, por seu grave impacto na situação socioeconômica mundial, não pode ser desprezada pelos contratantes, tampouco pelo Poder Judiciário. In casu, não demonstrado que a crise gerada pela pandemia tenha afetado a base jurídica contratual, causando desequilíbrio econômico-financeiro imoderado, ou a impossibilidade do exercício da atividade desenvolvida, não há como reconhecer a ocorrência de caso fortuito ou força maior, a afastar o inadimplemento.

A exceção do contrato não cumprido (exceptio non adimpleti contractus) é terreno das convenções sinalagmáticas, pois, só se pode compreendê-la nos negócios jurídicos onde haja prestações recíprocas e simultâneas. A regra não pode servir para justificar a suspensão de prestações, quando não prevista como causa justificante no contrato.

Em razão do trabalho adicional empregado pelo advogado, da natureza e da importância da causa, majoram-se os honorários advocatícios, nos moldes do art. 85, §11, do CPC.

R E L A T Ó R I O

Trata-se de recurso de apelação interposto por Maria Edinez Clara dos Santos em face da r. sentença proferida pela MMª Juíza de Direito da 6ª Vara Cível da Comarca de Alta Floresta, que nos autos da ação de revisão contratual c/c consignação em pagamento ajuizada contra Penha de Fátima Silva Torrecillas e Silva, julgou improcedente os pedidos da inicial, e por consequência, reconheceu o inadimplemento da autora em relação ao pagamento da monta de R$ 310.130,04 (trezentos e dez mil, cento e trinta reais e quatro centavos), devendo o valor ser atualizado quando do vencimento de cada parcela, condenando a autora no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa.

Inconformada, a apelante recorre aduzindo a existência de abusividade no contrato firmado, pois prevê o aumento da parcela de acordo com a cotação do gado na data do pagamento, contudo, em caso de queda do preço, o valor originário estaria garantido. Assevera a ausência de fundamentação, pois o fato de ser pecuarista não justifica a surpresa de ter que suportar o aumento exorbitante da prestação.

Segue sustentando que deve ser considerado que o custo de produção compromete o lucro do produtor, inexistindo lucratividade satisfatória. Pretende a aplicação da teoria da imprevisão e da onerosidade excessiva, positivadas nos artigos 317 e 478, ambos do C. Civil. Defende a aplicação da exceção do contrato não cumprido como justa causa para realizar o pagamento no valor consignado em juízo. Pugna pela reforma da r. sentença, para que a ação seja julgada procedente.

A apelada apresentou contrarrazões, pugnando pelo desprovimento do recurso (id. 170779303).

É o relatório.

Inclua-se na pauta.

Cuiabá, 27 de setembro de 2023.

CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA

Relator

V O T O R E L A T O R

Cinge-se dos autos que Maria Edinez Clara dos Santos ajuizou ação de revisão contratual c/c consignação em pagamento contra Penha de Fátima Silva Torrecillas e Silva, alegando, em síntese, que em 27.11.2017, firmou com a ré instrumento particular de promessa de compra e venda, bem como, lavraram escritura pública de compra e venda, regularmente registrado, do imóvel rural denominado “Fazenda Nossa Senhora de Fátima”, localizado na Gleba São Benedito, no Município de Jacareacanga/PA, pelo valor de R$ 800.000,00 (oitocentos mil reais).

Firme em seu propósito, sustentou que o valor seria pago mediante uma entrada de R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais), e o restante em cinco prestações anuais de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais), cada. Aduziu que consta no instrumento contratual que as parcelas deveriam ser equivalente a 80 (oitenta) cabeças de bezerro, de acordo com a cotação do dia do pagamento, não podendo ser inferior ao valor cotado na data da contratação, que era de R$ 1.000,00 (mil reais), por cabeça.

Asseverou que as duas primeiras parcelas foram pagas regularmente, contudo, em novembro de 2020, época do vencimento da terceira parcela, o país já estava sofrendo os efeitos da pandemia da Covid-19, o que resultou em uma elevação exorbitante do preço da arroba do gado. Aduziu que a ré exigiu como pagamento da terceira parcela a cotação do bezerro à época - R$ 2.750,00 (dois mil, setecentos e cinquenta reais), de modo que a prestação atingiu o montante exorbitante de R$ 220.000,00 (duzentos e vinte mil reais). Defendeu que procurou solucionar a questão com a ré, visando ajustar a correção monetária, contudo, não obteve êxito, razão pela qual ajuizou a presente demanda, pleiteando a revisão contratual da cláusula segunda, “b”, com a substituição da correção pelo índice IPCA ou INPC, ou outro equivalente, a fim de reestabelecer o equilíbrio das parcelas, evitando a onerosidade excessiva da autora e o enriquecimento ilícito da ré.

Na decisão inicial, o juízo a quo deferiu a consignação em pagamento do montante de R$ 104.000,00 (cento e quatro mil reais), indicado pela autora, referente à terceira parcela (id. 170779873). No decorrer da ação, a demandante depositou, ainda, a quarta parcela, no valor de R$ 112.000,00 (cento e doze mil reais) – id. 170779250), e da última, na quantia de R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais) – id. 170779280, valor esse que entendeu como adequado.

Após a instrução processual, a douta magistrada a quo julgou improcedente os pedidos da inicial, e por consequência, reconheceu o inadimplemento da autora em relação ao pagamento da monta de R$ 310.130,04 (trezentos e dez mil, cento e trinta reais e quatro centavos), devendo o valor ser atualizado quando do vencimento de cada parcela, condenando a autora no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa.

Inconformada, a apelante recorre aduzindo a existência de abusividade no contrato firmado, pois prevê o aumento da parcela de acordo com a cotação do gado na data do pagamento, contudo, em caso de queda do preço, o valor originário estaria garantido. Assevera a ausência de fundamentação, pois o fato de ser pecuarista não justifica a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT