Acórdão nº 1006287-76.2023.8.11.0000 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Segunda Câmara Criminal, 24-05-2023

Data de Julgamento24 Maio 2023
Case Outcome214 Concessão em Parte / Habeas corpus
Classe processualCriminal - HABEAS CORPUS CRIMINAL - CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS
Número do processo1006287-76.2023.8.11.0000
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
AssuntoCrime Tentado

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO

SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL

NÚMERO ÚNICO: 1006287-76.2023.8.11.0000

CLASSE: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307)

ASSUNTO: [HOMICÍDIO QUALIFICADO, CRIME TENTADO, NULIDADE, CERCEAMENTO DE DEFESA]

RELATOR: DES. PEDRO SAKAMOTO

Turma Julgadora: [DES. PEDRO SAKAMOTO, DES. JOSE ZUQUIM NOGUEIRA, DES. RUI RAMOS RIBEIRO]

Parte(s):

[RAFAEL RODRIGUES REGO - CPF: 735.579.431-00 (IMPETRANTE), JUÍZO DA 1ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE RONDONÓPOLIS (IMPETRADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (TERCEIRO INTERESSADO), RAFAEL RODRIGUES REGO - CPF: 735.579.431-00 (ADVOGADO), WALDESON PEREIRA DE SOUSA - CPF: 495.525.621-04 (PACIENTE), 1ª Vara Criminal Comarca de Rondonópolis (IMPETRADO), ADRIANA REGINA PIRES DE SOUZA SANTOS - CPF: 934.209.271-34 (VÍTIMA)]

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des. RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR MAIORIA, CONCEDEU PARCIALMENTE A ORDEM, RATIFICOU A DECISÃO LIMINAR, NOS TERMOS DO VOTO DO DOUTO RELATOR, DESEMBARGADOR PEDRO SAKAMOTO, NO QUE FOI ACOMPANHADO PELO DOUTO SEGUNDO VOGAL, DESEMBARGADOR RUI RAMOS RIBEIRO. O DOUTO PRIMEIRO VOGAL, DESEMBARGADOR JOSÉ ZUQUIM NOGUEIRA VOTOU PELA CONCESSÃO DA ORDEM, COM MEDIDAS CAUTELARES. O PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO FOI PELA CONCESSÃO PARCIAL DA ORDEM.

E M E N T A

HABEAS CORPUS – HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTADO – ACUSADO FORAGIDO – PRISÃO PREVENTIVA DECRETADA PARA A GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA E APLICAÇÃO DA LEI PENAL – IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA – EXCESSO DE PRAZO PARA A FORMAÇÃO DA CULPA – INSTRUÇÃO ENCERRADA – PRONÚNCIA PROLATADA – EVENTUAL EXCESSO DE PRAZO SUPERADO – ENTENDIMENTO SUMULADO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – FEITO QUE APRESENTA TRAMITAÇÃO REGULAR – INEXISTÊNCIA DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE – CONSTRANGIMENTO ILEGAL INEXISTENTE – DESENTRANHAMENTO DA PROVA DECLARADA NULA EM JULGAMENTO ANTERIOR – POSSIBILIDADE – PROVAS ILÍCITAS QUE DEVEM SER RETIRADAS DOS AUTOS – ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA.

A aferição acerca de eventual excesso de prazo depende, inexoravelmente, de apreciação prévia da complexidade dos fatos em apuração no processo de origem, e de estudo aprofundado dos andamentos processuais, para, somente, então, diagnosticar se o elastério do lapso temporal necessário para a conclusão do feito está, ou não, albergado pelo princípio da razoabilidade.

Prolatada a sentença de pronúncia, fica superada a alegação do constrangimento ilegal da prisão por excesso de prazo na instrução (STJ, Súmula n. 21).

Devem ser retirados dos autos todos os documentos que façam menção às provas anuladas, tendo em vista o risco de macular o julgamento perante o Tribunal do Júri.


R E L A T Ó R I O

EXMO. SR. DES. PEDRO SAKAMOTO (RELATOR):

Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em benefício de Waldeson Pereira de Sousa, apontando como autoridade coatora o Juiz da 1ª Vara Criminal da Comarca de Rondonópolis/MT.

Conforme relatado na decisão de Id. 163151742:

“O impetrante relata que o paciente foi preso preventivamente em 18.7.2022, em razão da suposta prática do crime de homicídio qualificado, na forma tentada, ocorrido em 17.8.2001, na cidade de Rondonópolis/MT, que é apurado nos autos da ação penal n. 0002518-51.2001.8.11.0064.

Afirma que o paciente não se evadiu do distrito da culpa, mas que não houve tentativa de localização adequada, tanto que quando foi apreendido pelos policiais se encontrava desempenhando trabalho regular em empresa que mantinha vínculo trabalhista desde 2017.

Argumenta que houve pronúncia nos autos principais e foi interposto Recurso em Sentido Estrito pela defesa, o qual não possui prazo para ser julgado, de forma que entende que a prisão do paciente deve ser revogada por excesso de prazo, tendo em vista que se encontra preso há mais de 8 meses.

Além disso, destaca que todas as provas produzidas antecipadamente nos autos principais com fundamento no art. 366 do Código de Processo Penal foram anuladas no julgamento no HC 1018395-74.2022.8.11.0000, no entanto, ao apresentar as contrarrazões ao recurso defensivo, o Ministério Público utilizou as provas anuladas.

Informa que “no dia 11 de outubro de 2022, ou seja, antes do julgamento do Habeas Corpus acima indicado (HC n. 1018395-74.2022.8.11.0000), o Ministério Público apresentou alegações finais, ocasião em que citou expressamente as provas posteriormente anuladas por esse egrégio Tribunal de Justiça. Frise-se, pois, que a referida peça processual, contendo referências às provas anuladas, permaneceu juntada na respetiva ação penal de referência sob o Id. 100253015, mesmo após a anulação das provas.”

Diante de tais asserções, postula a concessão da ordem de habeas corpus, inclusive liminarmente, para que haja “a imediata supressão e desentranhamento dos depoimentos das testemunhas e da vítima, bem como o primeiro interrogatório do paciente, tanto nas primeiras alegações finais juntadas no ID 100253015 – pags. 03/04, quanto na petição de contrarrazões ao recurso em sentido estrito sob ID 111859887 – pags. 13/14, ambos IDs da ação penal de referência, além de todos os atos processuais que façam referência expressa, eis que se tratam das provas declaradas nulas por essa colenda Câmara Criminal no Habeas Corpus 1018395-742022.8.11.0000.”

Além disso, pugna pela revogação da prisão preventiva do paciente ou a substituição pelas medidas cautelares previstas no art. 319 do CPP, pois evidente o excesso de prazo ao qual é submetido.

No mérito, requer a concessão definitiva dos pedidos de liminares (Id. 162929672).

Acostou documentos (Id. 162929677 ao Id. 162929687).”

O pedido de liminar foi parcialmente deferido (Id. 163151742).

Conforme solicitado, a autoridade acoimada de coatora apresentou informações (Id. 164096690).

A Procuradoria-Geral de Justiça opinou pela concessão parcial da ordem (Id. 164677659).

É o relatório.

PARECER ORAL

EXMA. SRA. DRA. SILVANA CORREA VIANNA (PROCURADORA DE JUSTIÇA):

Ratifico o parecer escrito.

SUSTENTAÇÃO ORAL

USOU A PALAVRA O ADVOGADO RAFAEL RODRIGUES REGO OAB/MT 13638-A.

V O T O

EXMO. SR. DES. PEDRO SAKAMOTO (RELATOR):

Preenchidos os requisitos de instauração e desenvolvimento válido do processo, conheço do writ.

Depreende-se dos autos, que Waldeson Pereira de Sousa teve sua prisão preventiva decretada no dia 14.9.2009 pela prática, em tese, do crime de homicídio qualificado tentado (CP, art. 121, § 2º, inciso IV, c/c o art. 14, inciso II), praticado na cidade de Rondonópolis em 17.8.2001, com fundamento na necessidade de garantia da ordem pública e da aplicação da lei penal.

Consta que em razão da ausência do réu, o magistrado decretou a suspensão do processo, nos termos do art. 366 do CPP, expediu mandado de prisão e determinou a produção antecipada de prova, conforme requerido pelo parquet (Id. 162929677 - p. 74).

Todavia, após o cumprimento do mandado de prisão, a defesa do paciente impetrou o habeas corpus n. 1018395-74.2022.8.11.0000 perante este Tribunal, requerendo, dentre outros pedidos, que fossem declaradas nulas as provas produzidas antecipadamente, em razão do evidente prejuízo ao acusado, e a ordem foi parcialmente concedida por esta Segunda Câmara Criminal (Id. 162929680 - p. 15).

Tendo em vista que nem todos os documentos referentes às provas anuladas foram desentranhados dos autos, o impetrante impetrou o presente writ, objetivando, inclusive liminarmente, a retirada dessas informações, o que foi por mim deferido.

Além disso, pugnou pela revogação da prisão preventiva decretada em desfavor do paciente, argumentando estar submetido a constrangimento ilegal em razão do excesso de prazo, o que indeferi em sede de liminar.

Primeiramente, conforme consignado na decisão de Id. 163151742, tendo em vista que as provas produzidas antecipadamente, nos moldes do art. 366 do CPP, foram anuladas no julgamento do HC 1018395-74.2022.8.11.0000, não deve permanecer nos autos de origem nenhum documento que faça menção às informações produzidas naquela ocasião, de forma que o pedido de liminar deferido deve ser ratificado, em razão do risco de macular o julgamento no Tribunal do Júri.

Em relação ao pedido de revogação da prisão preventiva em razão do excesso de prazo, como se sabe, a Carta Magna estabelece como garantia constitucional a duração razoável do processo, impossibilitando que os jurisdicionados padeçam de coação ilegal.

Contudo, os prazos subsumidos à legislação penal não são peremptórios, podendo ser flexibilizados diante de peculiaridades casuísticas e à luz do preceito fundamental da duração razoável do processo, de maneira que não se pode admitir o excesso pela mera soma aritmética dos prazos processuais.

Ademais, conforme orientação do Supremo Tribunal Federal, “a demora para o término da persecução criminal, como circunstância apta a ensejar constrangimento ilegal, somente se dá em hipóteses excepcionais, nas quais a mora seja decorrência de (a) evidente desídia do órgão judicial; (b) exclusiva atuação da parte acusadora; ou (c) situação incompatível com o princípio da razoável duração do processo, previsto no art. 5º, LXXVIII, da CF/88 (RHC 125335/GO-AgR, Rel. Ministro Teori Zavascki, Segunda Turma, julgado em 28.4.2015).

In casu, conforme se dessume dos documentos juntados na impetração, o paciente permaneceu foragido desde a data dos fatos (17.8.2001), razão pela qual foi determinada a suspensão do processo e decretada a prisão preventiva. Todavia, sua prisão só foi cumprida no dia 18.7.2022, e, após a audiência de custódia, a autoridade apontada como coatora decidiu pela necessidade de manutenção da medida, para a garantia da ordem pública e da aplicação da lei penal.

Da minuciosa análise dos andamentos processuais, verifico que no intervalo de tempo em que o custodiado permaneceu preso (9 meses), foi realizada a audiência de instrução e julgamento...

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