Acórdão nº 1009974-45.2017.8.11.0041 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Quarta Câmara de Direito Privado, 16-08-2023

Data de Julgamento16 Agosto 2023
Case OutcomeProvimento em Parte
Classe processualCível - APELAÇÃO CÍVEL - CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Privado
Número do processo1009974-45.2017.8.11.0041
AssuntoIndenização por Dano Moral

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO

QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO


Número Único: 1009974-45.2017.8.11.0041
Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198)
Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material]
Relator: Des(a).
RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO


Turma Julgadora: [DES(A). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, DES(A). GUIOMAR TEODORO BORGES, DES(A). SERLY MARCONDES ALVES]

Parte(s):
[LOTUFO ENGENHARIA E CONSTRUCOES LTDA - CNPJ: 01.318.705/0001-14 (APELANTE), TALITA OLIVEIRA DE SANT ANA - CPF: 026.897.961-80 (ADVOGADO), MEIRE CORREIA DE SANTANA DA COSTA MARQUES - CPF: 594.612.411-00 (ADVOGADO), LOTUFO ENGENHARIA E CONSTRUCOES LTDA - CNPJ: 01.318.705/0001-14 (REPRESENTANTE), JOSE PAULINO DE PADUA - CPF: 683.768.124-91 (APELADO), LUCIANO DE SOUSA REBOUCAS - CPF: 426.158.363-15 (ADVOGADO)]

A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: PARCIALMENTE PROVIDO, UNÂNIME


E M E N T A

APELAÇÃO – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – COMPRA E VENDA DE IMÓVEL NA PLANTA – PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA – ATRASO INJUSTIFICADO E EXCESSIVO NA ENTREGA – DEVER DE REPARAÇÃO CONFIGURADO – LESÃO EXTRAPATRIMONIAL – QUANTIA ARBITRADA COM RAZOABILIDADE – EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE NÃO IDENTIFICADAS – JUROS DE MORA – TERMO INICIAL – DATA DA CITAÇÃO – RECURSO PROVIDO EM PARTE.

A frustração do adquirente com a entrega do imóvel em prazo muito superior ao convencionado caracteriza ato ilícito gerador de danos morais.

O valor da indenização deve ser arbitrado de forma compatível com as especificidades do caso concreto, as exigências do artigo 944 do CC, além de atender ao caráter sancionatório e compensatório, aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade e estar em conformidade com a jurisprudência.

As hipóteses de escassez de produto ou mão-de-obra, bem como o excesso de chuvas e eventuais problemas administrativos, não configuram excludentes de responsabilidade civil, fazendo parte do risco inerente à atividade da construtora, estando, ademais, cobertas pela previsão da cláusula de tolerância.

Os juros de mora incidem a contar da citação, por força do artigo 405 do Código Civil, em se tratando de responsabilidade civil contratual.

R E L A T Ó R I O

Apelação em Ação de Obrigação de Fazer e Indenização por Danos Morais julgada parcialmente procedente para condenar a ré ao pagamento de reparação de R$10.000,00, acrescida de juros de mora desde o evento danoso e correção monetária a partir do arbitramento. Ante a sucumbência recíproca, distribuiu as custas processuais na proporção de 70% a cargo do autor e 30% a cargo da ré, e arbitrou os honorários advocatícios em 15% do valor da condenação, porém suspensa a exigibilidade da obrigação no que tange ao autor, por ser beneficiário da justiça gratuita (art. 98, §3, do CPC).

A apelante aduz que não houve atraso na entrega do imóvel, pois há previsão contratual de prorrogação do referido prazo.

Diz que a ocorrência de situações de caso fortuito ou força maior configura excludentes de responsabilidade civil e que na hipótese dos autos houve falta de cimento, de mão-de-obra e excesso de chuvas, fatores imprevisíveis.

Ressalta que Cuiabá foi sede da copa do mundo, o que deu causa a um verdadeiro apagão do cimento, bem como à ausência de mão de obra. Acrescenta que o cartório competente negou-se em cobrar os valores dos emolumentos do registro contratual da forma prevista em Lei (PMCMV) e passou recusar o recebimento dos contratos para pré-notação e consequente registro. Tanto é que o contrato, assinado em 15-7-2011, só foi registrado em 31-1-2012. Por isso, alega a existência de fato exclusivo de terceiro que ocasionou pedido de reprogramação do prazo de entrega da obra, nos termos dos artigos 12 e 14 do CDC.

Argumenta também que a CAB negou a disponibilidade de água para aquela localidade, e ainda, informou que o compromisso assumido era da SANECAP, não dela, haja vista que aquela localidade não estava contemplada pelo escopo do contrato de concessão, configurando a culpa exclusiva de terceiro.

Afirma que a CAB Cuiabá dificultou todo o processo de saneamento básico (água e esgoto) do empreendimento, o qual já havia sido devidamente aprovado pela SANECAP.

Sustenta que não houve ato ilícito nem nexo de causalidade e dano; e que o mero descumprimento contratual não enseja direito a danos morais, entendimento que tem sido adotado pelo STJ.

Defende que deve ser aplicada a teoria da imprevisão e a regra rebus sic standibu.

Subsidiariamente pugna pela minoração do quantum indenizatório e pela incidência dos juros de mora a partir da citação, e não do evento danoso.

Em contrarrazões, o apelado requer o não provimento do Recurso (ID. 176085205).

É o relatório.

Des. Rubens de Oliveira Santos Filho

Relator

V O T O R E L A T O R

O autor ingressou em juízo sob a alegação de ter firmado em 15-7-2011 Contrato para compra de imóvel (lote n. 13, Quadra C 17, Residencial Santa Teresinha I – Setor C, Cuiabá/MT), que não foi entregue no prazo combinado. Busca indenização por danos materiais e morais.

O feito foi julgado parcialmente procedente para condenar a ré ao pagamento de reparação de R$10.000,00.

No item B4 e na Cláusula Quarta do Instrumento Contratual consta que o imóvel seria concluído no prazo de 15 meses (ID. 176084780 – págs. 2 e 6), o que, somado à prorrogação de 60 dias, prevista na Cláusula Quinta, Parágrafo Segundo (ID. 176084780 – pág. 6), deveria ser entregue até dezembro de 2012.

Conforme o Termo de Recebimento com ID. 176085166, o imóvel foi entregue ao apelado em 22-7-2013.

É imperioso, então, reconhecer o atraso desde dezembro de 2012.

A arguição de excesso de chuvas, escassez de mão de obra e falta de cimento, bem como problemas relacionados ao cartório e respectivo registro do empreendimento, não autoriza o reconhecimento de caso fortuito ou força que permitam a dilação do prazo por período indeterminado. Tais acontecimentos são inerentes à atividade empresarial da ré e já são suportados pela cláusula de tolerância, que serve justamente para albergá-los.

Nesse sentido:

APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE COBRANÇA DE MULTA POR ATRASO DE ENTREGA DE IMÓVEL. CONTRATO DE COMPROMISSO DE VENDA E COMPRA DE UNIDADE AUTÔNOMA E OUTROS PACTOS. CLÁUSULA PENAL. JUROS DE MORA. INCIDÊNCIA. Inexistem as excludentes da mora alegadas pelas incorporadoras demandadas, porque os eventos totalmente previsíveis na construção civil e que devem ser computados quando da definição do prazo de entrega das unidades habitacionais deixam de caracterizar caso fortuito, força maior ou fato do príncipe, como a existência de um antigo aterro sanitário irregular, em relação ao qual as demandadas tinham ciência prévia, ou a demora para obtenção de licenças do Município, ou mesmo as greves ou acúmulo de demandas dos órgãos licenciadores. Para tais eventos exatamente a jurisprudência consolidou-se acerca da validade da cláusula de tolerância. Assim, justifica-se reafirmar a sentença quanto ao arbitramento da cláusula penal invertida, em consonância com a orientação firmada em recursos repetitivos pelo Superior Tribunal de Justiça, incidente desde o atraso até a entrega da unidade edilícia, com juros de mora e correção monetária no mesmo período, nos termos explicitados na sentença, reformando-se apenas quanto à incidência dos juros de mora derivados da condenação judicial, que incidem da citação. A cláusula penal contratual nos termos em que aplicada é proporcional e razoável para indenizar referentemente ao inadimplemento das demandadas consubstanciado no atraso da entrega da unidade autônoma, sem justificativa para a redução do valor arbitrado. Apelação do demandante parcialmente provida e apelação das demandadas desprovida. (Apelação Cível, Nº 50028514020158210001, Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Lizandra Cericato, Julgado em: 06-10-2021). (Sem destaque no original).

No tocante aos danos morais, o Superior Tribunal de Justiça definiu em Recurso Especial repetitivo que o curto período de demora não legitima essa reparação, mas o excesso sim, pois fere o direito à moradia.

Confira-se:

RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. ADMISSIBILIDADE PELO CPC/1973. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO N. 2/STJ. PROCESSAMENTO PELO CPC/2015. CORRETAGEM. INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA. RITO DOS ARTS. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015. I - RECURSO ESPECIAL DA INCORPORADORA. LEGITIMIDADE PASSIVA 'AD CAUSAM'. TEORIA DA ASSERÇÃO. PRESCRIÇÃO E CASO FORTUITO. ALEGAÇÃO GENÉRICA. ÓBICE DA SÚMULA 284/STF. II - RECURSO ESPECIAL ADESIVO DOS CONSUMIDORES. INOCORRÊNCIA DE DANO MORAL. ATRASO DA OBRA. CURTO PERÍODO. MERO INADIMPLEMENTO. INDENIZAÇÃO POR LUCROS CESSANTES. ÓBICE DA SÚMULA 7/STF. REPETIÇÃO EM DOBRO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. III - TESE PARA OS FINS DO ART. 1.040 DO CPC/2015: 3.1. Legitimidade passiva 'ad causam' da incorporadora, na condição de promitente-vendedora, para responder a demanda em que é pleiteada pelo promitente-comprador a restituição dos valores pagos a título de comissão de corretagem e de taxa de assessoria técnico-imobiliária, alegando-se prática abusiva na transferência desses encargos ao consumidor. IV. RECURSO ESPECIAL DA INCORPORADORA: 4.1. Aplicação da tese ao caso concreto, rejeitando-se a preliminar de ilegitimidade passiva. 4.2. Incidência do óbice da Súmula 284/STF no que tange às alegações de prescrição e de caso fortuito, tendo em vista o caráter genérico das razões recursais. V. RECURSO ESPECIAL ADESIVO DOS CONSUMIDORES: 5.1. Inocorrência de abalo moral indenizável pelo atraso de alguns meses na conclusão da obra, em razão das circunstâncias do caso concreto. 5.2. Incidência do óbice da Súmula 7/STJ, no que tange à pretensão de...

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