Acórdão nº 1013053-66.2016.8.11.0041 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, 04-07-2023

Data de Julgamento04 Julho 2023
Case OutcomeProvimento em Parte
Classe processualCível - APELAÇÃO CÍVEL - CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Público e Coletivo
Número do processo1013053-66.2016.8.11.0041
AssuntoIndenização por Dano Material

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO

SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO


Número Único: 1013053-66.2016.8.11.0041
Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198)
Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material]
Relator: Des(a).
MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO

Turma Julgadora: [DES(A). MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, DES(A). HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, DES(A). MARIA APARECIDA RIBEIRO]

Parte(s):
[CARLOS AUGUSTO MACHADO - CPF: 797.718.828-72 (APELANTE), SANDRA PADILLA PEREIRA DA SILVA - CPF: 000.333.171-78 (ADVOGADO), ESTADO DO MATO GROSSO (APELADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0002-25 (APELADO), CASA CIVIL DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0007-30 (REPRESENTANTE), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0020-07 (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)]


A C Ó R D Ã O


Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: A UNANIMIDADE, DEU PROVIMENTO EM PARTE AO RECURSO. (Participaram do Julgamento: Desa. Maria Aparecida Ferreira Fago, Desa Helena Maria Bezerra Ramos (Convocada), Desa. Maria Aparecida Ribeiro.)

EMENTA:


RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO – PRISÃO INDEVIDA – ERRO DE IDENTIFICAÇÃO – AUSÊNCIA DE CAUTELA POR PARTE DOS AGENTES ESTATAIS – RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA – ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – DANO MORAL CONFIGURADO – CONDUTA QUE ULTRAPASSA O MERO ABORRECIMENTO – QUANTUM INDENIZATÓRIO – OBSERVÂNCIA DOS CRITÉRIOS DE RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

1. À luz do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, o Estado responde objetivamente por eventuais danos causados, seja de ordem moral, seja de ordem material, porquanto, na hipótese, incide a teoria do risco objetivo da administração, mesmo que se trate de conduta omissiva pela inoperância estatal no cumprimento de um dever prestacional.

2. Comprovado que o autor foi mantido preso indevidamente, vindo, inclusive, a ser condenado por prática delituosa grave, recai sobre o Estado a responsabilidade por ter dado causa ao dano suportado pela vítima, uma vez que falhou no seu dever de proceder com a correta identificação criminal do verdadeiro transgressor.

3. Não há dúvidas de que uma prisão equivocada gera transtornos, tristeza, frustração, aborrecimentos, além de afetar, indiscutivelmente, a esfera moral do indivíduo inocente, a justificar, portanto, a indenização por dano moral.

4. O quantum indenizatório deve levar em consideração os critérios da razoabilidade, proporcionalidade e equidade, sem olvidar o grau de culpa dos envolvidos, a gravidade do dano, suas repercussões, bem como a função pedagógica do dever de reparar e, ainda, o tempo em que a parte ficou recolhida em cárcere privado, que, in casu, foi de aproximadamente 01 (um) ano.

5. Os lucros cessantes implicam na possibilidade real e concreta de lucros futuros, a qual não se efetivou em virtude do evento danoso.

6. Portanto, para a caracterização dos lucros cessantes, exigida prova cabal, inconteste e inequívoca de realização de negócios jurídicos em andamento. Assim, imprescindível a existência de provas e elementos objetivos a configurar tais lucros cessantes, não sendo admitidas apenas meras conjecturas, possibilidades ou expectativas.

7. Não havendo provas cabais acerca dos alegados danos materiais sofridos, a improcedência é medida que se impõe.

8. Sentença reformada. Recurso parcialmente provido.

RELATÓRIO:

EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO

Egrégia Câmara:

Trata-se de RECURSO DE APELAÇÃO, interposto por CARLOS AUGUSTO MACHADO contra a sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Cuiabá, MT, que julgou improcedentes os pedidos feitos na presente “AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS”, ajuizada em face do ESTADO DE MATO GROSSO, nos seguintes termos (ID. 163492903):

Vistos.

Carlos Augusto Machado propôs ação em face do Estado de Mato Grosso, com pedido de indenização por danos materiais e morais.

Consta da inicial, em síntese, que o demandante foi vítima de erro judiciário ao ser condenado e preso por tentativa de homicídio apesar da ausência de provas e em razão da existência de homônimo integrante de organização criminosa.

Em contestação, o demandado sustenta a inépcia da inicial, a prescrição, a não ocorrência de erro judiciário e ausência de comprovação de dolo, fraude ou culpa grave do julgador.

O demandante impugnou a contestação, de modo a rebater as arguições de inépcia da inicial e de prescrição.

Proferiu-se decisão saneadora e produziu-se a prova testemunhal requerida pelo demandante.

As partes apresentaram razões finais, ratificando os termos apresentados na inicial e na resposta.

É o relato.

Pretende o demandante ser indenizado por erro judiciário em razão de ter sido condenado e preso por tentativa de homicídio, apesar da ausência de provas e em razão da existência de um homônimo que integrava uma organização criminosa.

No que concerne ao mérito da causa, necessário assentar que o erro judiciário compreende uma falha grosseira e flagrante acerca de fatos sub examine judicial, qual seja: um desacerto na aplicação do direito (quando são observados dispositivos inconstitucionais ou revogados), ou ainda um equívoco na hermenêutica jurídica (quando o entendimento do juízo ultrapassa o alcance ou sentido da norma), consistindo em uma anormalidade no provimento jurisdicional.

Dito isso, tem-se que o art. 5°, LXXV, da Constituição Federal preceitua a possibilidade de se imputar o múnus indenizatório estatal a partir da atuação incorreta do Poder Judiciário nos casos acima aventados e, também, para as hipóteses em que o condenado ficar preso além do tempo fixado na sentença.

A partir desse conceito, entende-se que, tendo sido prolatada decisão judicial de modo fundamentado e no bojo de ação devidamente lastreada no devido processo legal, não há responsabilização civil do Estado por mudanças oriundas de interposição de recurso, ajuizamento de ação rescisória, anulatória ou ainda de revisão criminal. Isso porque o ordenamento jurídico brasileiro consagra o princípio do livre convencimento do juiz, que o garante independência funcional no âmbito da realização da justiça.

Dessa forma, mostra-se incongruente com a atividade jurisdicional que o Poder Público seja compelido a compensar financeiramente o administrado em todas as circunstâncias nas quais uma decisão judicial tenha ocasionado danos, haja vista que tal hipótese acometeria a autonomia do magistrado na avaliação e valoração de provas, bem como na interpretação de fatos e normas na medida em que julgar adequado ao caso concreto.

Ademais, a despeito da previsão do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, que preceitua a regra da responsabilidade objetiva do Estado nos casos em que seus agentes causarem prejuízos a terceiros, deve haver comprovação clara e explícita de dolo ou culpa para que seja conformado tal encargo em função de eventuais faltas na prática judicante, em seu sentido mais estrito.

Assim, nas hipóteses de erro judiciário decorrente da atividade jurisdicional propriamente dita, incide a responsabilização estatal no contorno subjetivo. Esse é o entendimento sedimentado no âmbito do Supremo Tribunal Federal.

A propósito:

EMENTA DIREITO CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DO CPC/1973. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO. ART. 37, § 6º, DA MAGNA CARTA. ERRO JUDICIÁRIO. ATO COMISSIVO. PRISÃO ILEGAL. TEMPO EXCESSIVO. CONFUSÃO ENTRE PESSOAS. INDENIZAÇÃO. CONSONÂNCIA DA DECISÃO RECORRIDA COM A JURISPRUDÊNCIA CRISTALIZADA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO QUE NÃO MERECE TRÂNSITO. REELABORAÇÃO DA MOLDURA FÁTICA. PROCEDIMENTO VEDADO NA INSTÂNCIA EXTRAORDINÁRIA. AGRAVO MANEJADO SOB A VIGÊNCIA DO CPC/2015. 1. O entendimento da Corte de origem, nos moldes do assinalado na decisão agravada, não diverge da jurisprudência firmada no Supremo Tribunal Federal. A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal consolidou-se no sentido de que, salvo nos casos previstos no art. 5º, LXXV, da Magna Carta – erro judiciário e prisão além do tempo fixado na sentença –, e daqueles expressamente previstos em lei, a responsabilidade objetiva do Estado não se aplica aos atos jurisdicionais. Precedentes. Compreensão diversa demandaria a reelaboração da moldura fática delineada no acórdão de origem, a tornar oblíqua e reflexa eventual ofensa à Constituição, insuscetível, como tal, de viabilizar o conhecimento do recurso extraordinário. 2. As razões do agravo não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada, mormente no que se refere à ausência de ofensa a preceito da Constituição da República. 3. Majoração em 10% (dez por cento) dos honorários anteriormente fixados, obedecidos os limites previstos no artigo 85, §§ 2º, 3º e 11, do CPC/2015, ressalvada eventual concessão do benefício da gratuidade da Justiça. 4. Agravo interno conhecido e não provido, com aplicação da penalidade prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015, calculada à razão de 1% (um por cento) sobre o valor atualizado da causa, se unânime a votação. (ARE 1069350 AgR-segundo, Relator(a): ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 20/09/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-213 30-09-2019 PUBLIC 01-10-2019)

Agravo regimental em recurso extraordinário. 2. Direito Administrativo. Responsabilidade civil do Estado por erro judiciário. A teoria da responsabilidade objetiva do Estado, em regra, não é cabível para atos jurisdicionais, salvo nos casos do art. 5º, LXXV, da CF e naqueles expressamente declarados em lei. Precedentes. 3. Ausência de argumentos capazes de infirmar a...

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