Acórdão nº 1019963-96.2020.8.11.0000 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Terceira Câmara Criminal, 28-04-2021

Data de Julgamento28 Abril 2021
Case OutcomeNão-Provimento
Classe processualCriminal - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Número do processo1019963-96.2020.8.11.0000
AssuntoHomicídio Qualificado

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO


TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL


Número Único: 1019963-96.2020.8.11.0000
Classe: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426)
Assunto: [Homicídio Qualificado]
Relator: Des(a).
JUVENAL PEREIRA DA SILVA


Turma Julgadora: [DES(A). JUVENAL PEREIRA DA SILVA, DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). RONDON BASSIL DOWER FILHO]

Parte(s):
[CLAUDIONIR SCARTEZINI - CPF: 423.761.060-87 (RECORRIDO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (RECORRIDO), RAFAEL DOS SANTOS NEVES - CPF: 040.840.231-83 (RECORRENTE), ESTADO DE MATO GROSSO - PROCURADORIA GERAL DA JUSTICA (CUSTOS LEGIS), ESTADO DE MATO GROSSO - PROCURADORIA GERAL DA JUSTICA (RECORRIDO), CLAUDIONIR SCARTEZINI - CPF: 423.761.060-87 (VÍTIMA)]

A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
JUVENAL PEREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO.

E M E N T A

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – HOMICÍDIO QUALIFICADO PELO MOTIVO TORPE E RECURSO QUE IMPOSSIBILITOU A DEFESA DA VÍTIMA E CRIMES CONEXOS (CORRUPÇÃO DE MENORES E INTEGRAR ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA) – PRONÚNCIA – IRRESIGNAÇÃO – 1) PLEITO À DESPRONÚNCIA – ALEGADA INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA – IMPOSSIBILIDADE – PRESENÇA DA MATERIALIDADE E INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA – CONFISSÃO INQUISITORIAL DO ACUSADO – DEPOIMENTOS JUDICIAIS DOS POLICIAIS QUE INVESTIGARAM O CASO – PREVALÊNCIA DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO SOCIETATE – MERO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE DA PRONÚNCIA – DÚVIDAS A SEREM DIRIMIDAS PELO CONSELHO DE SENTENÇA – 2) ABSOLVIÇÃO DOS CRIMES CONEXOS – IMPOSSIBILIDADE – EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA E PROVA DA MATERIALIDADE DOS DELITOS CONEXOS – COMPETÊNCIA PARA JULGAMENTO DO TRIBUNAL DO JÚRI –RECURSO DESPROVIDO.

1) Se as provas produzidas nos autos não permitem um juízo de certeza acerca da ausência de participação do recorrente na prática delitiva, sendo ele apontado por testemunhas como o suposto autor do delito, não prospera o pleito de despronúncia, pois a fase de admissibilidade formal da acusação se contenta com a prova da existência do fato e com a presença de indícios sobre sua autoria, de modo que existindo dúvida quanto à real ocorrência dos fatos, esta deve prevalecer em prol do interesse da sociedade, em observância ao princípio in dubio pro societate, devendo a matéria ser submetida à apreciação da Corte Leiga.

2) É imperiosa a submissão ao plenário dos crimes conexos ao doloso contra a vida, se há nos autos indícios de que um adolescente teria concorrido na empreitada homicida, bem como de que o recorrente pudesse integrar organização criminosa, ao passo que os delitos do art. 244-B, do ECA e do art. 2º, da Lei 12.850/13, possuem, ainda que minimamente, justa causa para o prosseguimento da persecução penal e devem ser analisados pelo Júri Popular, competente que é, por atração, ao julgamento da integralidade dos fatos imputados.

3) Recurso desprovido.

R E L A T Ó R I O

Trata-se de Recurso em Sentido Estrito, interposto por Rafael dos Santos Neves, visando reformar a decisão proferida nos autos nº. 14930-68.2018.8.11.0015, Código 338233, pelo MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Criminal da Comarca de Sinop, que o pronunciou nos termos do art. 121, §2º, I e IV, do Código Penal, submetendo-o a julgamento perante o Tribunal Popular do Júri.

Inconformada com a sentença de pronúncia, a defesa requer a despronúncia do recorrente, ante a insuficiência de elementos mínimos de convicção sobre a autoria delitiva e, quanto aos crimes conexos (art. 244-B, do ECA e art. 2º, da Lei 12.850/13), que seja desde já absolvido, por restar ausente, minimamente, justa causa para o prosseguimento da persecução penal.

Sustenta quanto ao crime de corrupção de menores, que não restou demonstrada a materialidade e indícios suficientes de autoria, pois, o menor, supostamente envolvido no crime, nunca fora efetivamente identificado e encontrado. Por outro lado, aduz que não restaram demonstrados os requisitos configuradores da organização criminosa, ou seja, que o recorrente encontrava-se unido, de forma ordenada e com divisão de tarefas, a fim de perpetrar crimes graves.

Em contrarrazões, o Ministério Público pugna pelo improvimento do recurso (Id. 73134549).

Em juízo de retratação, o magistrado manteve a decisão recorrida por seus próprios fundamentos.

O parecer, da lavra da douta Procuradora de Justiça, Dra. Rosana Marra, é pelo desprovimento do recurso (Id. 78246985).

É o relatório.

Peço inclusão em pauta de julgamento.

V O T O R E L A T O R

O recorrente Rafael dos Santos Neves, qualificado, foi pronunciado a Júri nos termos do art. 121, § 2º, I e IV, do Código Penal c/c art. 244-B do ECA e artigo 2°, da Lei 12.830/2013, porque integrava organização criminosa armada e no dia 05/09/2018, juntamente com o adolescente Jhonatan de Tal, em unidade de desígnios, com manifesto animus necandi, imbuídos de motivo torpe e mediante recurso que impossibilitou a defesa da vítima, desferiram disparos de arma de fogo contra a vítima Claudionir Scartezini, que foram a causa de sua morte.

Consta da denúncia que a vítima era proprietário do estabelecimento comercial denominado Mercado Califórnia, onde era comum policiais militares fazerem paradas no local para comprar algo e conversar com a vítima.

Restou apurado que dias antes do fato, o ofendido recebeu uma ligação telefônica de um presidiário, que se identificou pela alcunha de “Sapão”, e teria lhe cobrado uma “mensalidade” a ser paga em determinada organização criminosa, ocasião em que se negou a efetuar o pagamento.

Na data dos fatos, consta que a vítima cochilava, sentado em frente ao seu estabelecimento comercial, momento em que o recorrente e o adolescente Jhonatan chegaram ao local e sem que o ofendido pudesse esboçar qualquer reação defensiva, desferiram contra ele diversos disparos de arma de fogo, os quais foram a causa determinante de sua morte.

Após regular persecução penal em Juízo, a autoridade judiciária subscritora da decisão de pronúncia assentou a admissibilidade da acusação assinalando que a pronúncia do acusado para julgamento perante o tribunal do júri é a medida mais aconselhável.

A defesa, irresignada com a solução jurisdicional, pontua que não há indícios ou provas suficientes da autoria delitiva por parte do recorrente, ao passo que ele deve ser despronunciado e, quanto aos crimes conexos (art. 244-B, do ECA e art. 2º, da Lei 12.850/13), que seja desde já absolvido, por restar ausente, minimamente, justa causa para o prosseguimento da persecução penal.

Contudo, razão não assiste à defesa.

É cediço que na fase do judicium accusationis basta a demonstração dos indícios da materialidade e autoria delitivas para pronunciar o réu e submetê-lo a julgamento pelo Júri Popular.

Estando a materialidade demonstrada e evidenciando-se prova indiciária de autoria, o julgador singular determina que o acusado seja submetido ao tribunal do júri. A decisão de pronúncia é ato de natureza provisional, onde se realiza mero juízo de admissibilidade da acusação, não se exigindo o juízo de certeza necessário para a condenação.

Nos crimes dolosos contra a vida, o juízo de certeza sobre a autoria, imprescindível apenas para a condenação, é da competência exclusiva do tribunal do júri, sendo vedado ao juízo singular, ao proferir a sentença de pronúncia, fazer longas incursões sobre a prova da autoria, sob pena de incorrer no chamado “excesso de linguagem”, suscetível de influenciar o corpo de jurados, sendo certo que nessa fase do processo despreza-se o in dubio pro reo, sobrelevando o princípio do in dubio pro societate, em face da previsão feita na Constituição Federal (art. 5°, XXXVIII, “d”), com a simetria do disposto no artigo 408 do Código de Processo Penal.

No caso em análise, a materialidade do crime restou comprovada por meio do boletim de ocorrência (Id. 58179451 - Pág. 4/9), Relatórios de Investigação (Id. 58179452 - Págs. 5/8, 58179457 - Págs. 3/9), certidão de óbito (Id. 58179456 - Pág. 8), Laudo Pericial – exame de eficiência de arma de fogo e munições - (Id. 58179459 - Págs. 4/7), Laudo Pericial - Necropsia (Id. 58179464 - Págs. 1/10 e 58179465 - Págs. 1/3), exame em local de crime contra a vida (Id. 58179465 - Págs. 4/9), além da prova testemunhal contida nos autos.

E, no que tange à autoria, encontra-se evidenciada de forma suficiente para a fase da pronúncia.

Isso porque fora levado em consideração na decisão de pronúncia, o depoimento dos Policiais Wilson Cândido de Souza e Thyago Celestino Pereira, que relataram que após o homicídio, passaram a receber informações de que o recorrente seria o autor do delito. Sustentaram que tiveram notícias de onde ele estaria e o encontraram escondido com uma pistola, oportunidade em que teria confessado como se deu o crime e sua motivação.

Relataram, ainda, que ao ouvir a mãe do recorrente, ao lhe ser apresentada as filmagens do local do crime, ela reconheceu a roupa de um dos autores como a roupa que seu filho saiu de casa.

Eis as declarações, transcritas na decisão de pronúncia, verbis:

“A testemunha IPC Wilson Cândido de Souza, durante suas declarações, em Juízo, esclareceu que o homicídio ocorreu no dia 05/09/2018, numa quarta-feira, e começaram a receber informações, no dia posterior ao crime, em que, segundo as informações, quem teria cometido o crime foi o vulgo “Trouxa”, alcunha dada a Rafael dos Santos Neves no meio da criminalidade. Ao intensificar as investigações, chegou ao seu conhecimento que a Delegacia de Roubos e Furtos também fora informada de que o acusado teria sido um dos autores do crime em análise, vez que, ao...

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