Acórdão nº 1020287-18.2022.8.11.0000 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Segunda Câmara Criminal, 07-02-2023

Data de Julgamento07 Fevereiro 2023
Case OutcomeNão-Provimento
Classe processualCriminal - AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL - CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Número do processo1020287-18.2022.8.11.0000
AssuntoPena Privativa de Liberdade

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO

SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL


Número Único: 1020287-18.2022.8.11.0000
Classe: AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL (413)
Assunto: [Pena Privativa de Liberdade]
Relator: Des(a).
LUIZ FERREIRA DA SILVA


Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ FERREIRA DA SILVA, DES(A). PEDRO SAKAMOTO, DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO]

Parte(s):
[GILSON RODRIGUES DOS SANTOS - CPF: 487.886.431-15 (AGRAVANTE), ARIANE FERREIRA MARTINS CAMARGO - CPF: 711.338.601-68 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO (AGRAVADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (AGRAVADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)]


A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO.


E M E N T A

AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL – IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA – AFASTAMENTO DA HEDIONDEZ DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS – ALTERAÇÕES TRAZIDAS PELA LEI N. 13.964/19 – “PACOTE ANTICRIME” – PRETENDIDA A RETIFICAÇÃO DO ÍNDICE ESTIPULADO PARA A PROGRESSÃO DE REGIME – IMPOSSIBILIDADE – EQUIPARAÇÃO DECORRENTE DE NORMA CONSTITUCIONAL – BENEFÍCIOS PENAIS QUE DEVEM OBSERVAR AS REGRAS APLICADAS AOS CRIMES HEDIONDOS – AGRAVO DESPROVIDO.

“A revogação do § 2º do art. 2º da Lei 8.072/90 pela Lei 13.964/2019 não tem o condão de retirar do tráfico de drogas sua caracterização como delito equiparado a hediondo, pois a classificação da narcotraficância como infração penal equiparada a hedionda decorre da previsão constitucional estabelecida no art. 5º, XLIII, da Constituição Federal. (Superior Tribunal de Justiça, Agravo Regimental no Habeas Corpus n. 729.332)

Por força da redação dada ao art. 112 da Lei das Execuções Penais pela lei que criou o “Pacote Anticrime”, deve ser aplicado ao reeducando condenado por crime hediondo ou equiparado, sem resultado morte, e não reincidente em delito dessa natureza, o índice de 40% (quarenta por cento) para o cômputo da progressão de regime; caso seja reincidente em crime hediondo ou equiparado, o índice será de 60% (sessenta por cento).

Agravo desprovido.

R E L A T Ó R I O

Ilustres membros da Segunda Câmara Criminal:

Trata-se de agravo de execução penal manejado por Gilson Rodrigues dos Santos, contra a decisão prolatada pelo Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá/MT que, nos autos do Processo Executivo de Pena n. 0005695-35.2014.8.11.0042 (SEEU), indeferiu o seu pedido de utilização da fração pertinente aos crimes comuns para o crime de tráfico, ante as modificações decorrentes da Lei n. 13.964/2019 – “Pacote Anticrime”.

O agravante, forte nas razões recursais que estão no ID 146254190, pugna pela reforma da aludida decisão, a fim de que seja afastada a hediondez equiparada do crime de tráfico de drogas, em razão das mudanças trazidas pelo chamado “Pacote Anticrime”, aplicando, por conseguinte, a fração/porcentagem referente aos crimes comuns.

Nas contrarrazões encontradiças no ID 146254195, o Ministério Público postula a manutenção do decisum invectivado, ao argumento de que foi exarado de forma escorreita.

Em sede de juízo de retratação, o magistrado manteve o édito judicial pelos seus próprios fundamentos, determinando a remessa do presente recurso a este Tribunal, consoante se infere do ID 146254198.

Nesta instância revisora, a Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio do parecer encontradiço no ID 151332682, opina pelo desprovimento deste agravo.

É o relatório.

V O T O R E L A T O R

Conforme se constata das razões recursais, o agravante sustenta que com a edição do “Pacote Anticrime”, materializado no mundo jurídico com a publicação da Lei n. 13.964/19, foi revogado o § 2º do art. 2º da Lei n. 8.072/90, retirando o caráter de equiparação do tráfico de entorpecentes a delito hediondo, motivo pelo qual é possível a aplicação do prazo estabelecido no art. 112, I, da Lei de Execuções Penais, para o cômputo do prazo exigido para progressão de regime.

No entanto, assiste razão a autoridade judiciária da primeira instância, porquanto, induvidosamente, a revogação do § 2º do art. 2º da Lei n. 8.072/90 [§ 2º A progressão de regime, no caso dos condenados pelos crimes previstos neste artigo, dar-se-á após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for primário, e de 3/5 (três quintos), se reincidente, observado o disposto nos §§ 3º e 4º do art. 112 da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984] não tem o condão de retirar do tráfico de drogas a sua equiparação a hediondo, porque o tratamento diferenciado e a equiparação do crime de tráfico de drogas a hediondo, considerada a sua gravidade e potencialidade lesiva, decorre da previsão constitucional estabelecida no art. 5º, XLIII, da Constituição Federal, da seguinte forma:

XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem; [...]. Destacamos

Ademais, deve ser salientado que o caput do art. 2º da Lei n. 8.072/90 não deixou de fazer referência ao delito de tráfico de drogas, tampouco o fazendo em relação a sua situação diferenciada e equiparada ao crime hediondo, tendo mantido no § 4º do art. 2º da referida Lex o prazo de 30 (trinta) dias de prisão temporária (Lei n. 7.960/89) para o tráfico de drogas, período, esse, que é exclusivo para os casos de crimes hediondos reforçando, indiscutivelmente, a manutenção da sua equiparação da hediondez.

A propósito, veja-se a redação dos aludidos preceptivos:

Art. 2º Os crimes hediondos, a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo são insuscetíveis de:

I - anistia, graça e indulto;

II - fiança.

[...]

§ 4o A prisão temporária, sobre a qual dispõe a Lei no 7.960, de 21 de dezembro de 1989, nos crimes previstos neste artigo, terá o prazo de 30 (trinta) dias, prorrogável por igual período em caso de extrema e comprovada necessidade. Destacamos

Além disso, a legislação permanece hígida quanto à equiparação do crime de tráfico de drogas aos hediondos no que diz respeito aos benefícios a que o reeducando faz jus na fase da execução penal, conforme se constata do art. 83, V, do Código Penal, que, com as alterações promovidas pela Lei n. 13.964/19 – “Pacote Anticrime” manteve a exigência de 2/3 (dois terços) de cumprimento de pena do “crime hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, tráfico de pessoas e terrorismo”, para a concessão do livramento condicional, consoante abaixo pode ser inferido:

Art. 83 - O juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado a pena privativa de liberdade igual ou superior a 2 (dois) anos, desde que: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

I - cumprida mais de um terço da pena se o condenado não for reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes

II - cumprida mais da metade se o condenado for reincidente em crime doloso;

III - comprovado: (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019)

a) bom comportamento durante a execução da pena; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

b) não cometimento de falta grave nos últimos 12 (doze) meses; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

c) bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído; e (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

d) aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

IV - tenha reparado, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo, o dano causado pela infração; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

V - cumpridos mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, tráfico de pessoas e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza. (Incluído pela Lei nº 13.344, de 2016)(Vigência)

Parágrafo único - Para o condenado por crime doloso, cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, a concessão do livramento ficará também subordinada à constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinquir. Destacamos

Acerca da inexistência de margem de discricionariedade no que concerne ao tratamento mais severo ao tráfico de drogas e da sua equiparação à hediondez etiquetada pelo constituinte originário, Renato Brasileiro de Lima, espanca qualquer dúvida ao afirmar que:

[...] A justificativa para o constituinte originário ter separado os crimes hediondos dos equiparados a hediondos está diretamente relacionada à necessidade de assegurar maior estabilidade na consideração destes últimos como crimes mais severamente punidos. Em outras palavras, a Constituição Federal autoriza expressamente que uma simples lei ordinária defina e indique quais crimes serão considerados hediondos. No entanto, para os equiparados a hediondos, o constituinte não deixou qualquer margem de discricionariedade para o legislador ordinário, na medida em que a própria Constituição Federal já impõe tratamento mais severo à tortura, ao tráfico de drogas e ao terrorismo. [...].

Todo esse raciocínio acaba sendo corroborado a partir da leitura do art. 44, caput, da Lei de drogas, que, à semelhança das restrições previstas na Lei nº 8.072/90 para os crimes hediondos e equiparados, estabelece uma série de vedações para os crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1 º, e 34 a 37 da Lei 11.343/06 (v.g., insuscetibilidade de graça, indulto, anistia, etc.), a significar, portanto, que tais delitos seriam equiparados a hediondos, ou seja, ao tráfico de drogas (CF, ...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT