Acórdão nº 1020372-04.2022.8.11.0000 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Segunda Câmara Criminal, 09-05-2023

Data de Julgamento09 Maio 2023
Case OutcomeNão-Provimento
Classe processualCriminal - AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL - CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Número do processo1020372-04.2022.8.11.0000
AssuntoPena Privativa de Liberdade

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO

SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL


Número Único: 1020372-04.2022.8.11.0000
Classe: AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL (413)
Assunto: [Pena Privativa de Liberdade]
Relator: Des(a).
LUIZ FERREIRA DA SILVA


Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ FERREIRA DA SILVA, DES(A). PEDRO SAKAMOTO, DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO]

Parte(s):
[PABLO ROBERTO JARDIM - CPF: 050.499.391-78 (AGRAVANTE), ANA MARIA MAGRO MARTINS - CPF: 086.287.209-01 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO (AGRAVADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (AGRAVADO)]


A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO.


E M E N T A

AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL – IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA – 1. AFASTAMENTO DA HEDIONDEZ DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS – ALTERAÇÕES TRAZIDAS PELA LEI N. 13.964/19 – “PACOTE ANTICRIME” – PRETENDIDA A RETIFICAÇÃO DO ÍNDICE ESTIPULADO PARA A PROGRESSÃO DE REGIME – IMPOSSIBILIDADE – EQUIPARAÇÃO DECORRENTE DE NORMA CONSTITUCIONAL – BENEFÍCIOS PENAIS QUE DEVEM OBSERVAR AS REGRAS APLICADAS AOS CRIMES HEDIONDOS – 2. MODIFICAÇÃO DO CÁLCULO DE PENA – NÃO ACOLHIMENTO – DADOS CORRETOS – FUGA DO AGRAVANTE – EXECUÇÃO SUSPENSA – 3. AGRAVO DESPROVIDO.

1. “A revogação do § 2º do art. 2º da Lei 8.072/90 pela Lei 13.964/2019 não tem o condão de retirar do tráfico de drogas sua caracterização como delito equiparado a hediondo, pois a classificação da narcotraficância como infração penal equiparada a hedionda decorre da previsão constitucional estabelecida no art. 5º, XLIII, da Constituição Federal. (Superior Tribunal de Justiça, Agravo Regimental no Habeas Corpus n. 729.332)

Por força da redação dada ao art. 112 da Lei das Execuções Penais pela lei que criou o “Pacote Anticrime”, deve ser aplicado ao reeducando condenado por crime hediondo ou equiparado, sem resultado morte, e não reincidente em delito dessa natureza, o índice de 40% (quarenta por cento) para o cômputo da progressão de regime; e, caso seja reincidente em crime hediondo ou equiparado, o índice de 60% (sessenta por cento).

2. Deve ser mantido inalterado o cálculo de pena do agravante, porquanto todos os marcos inseridos no sistema estão corretos e há informações de que ele empreendeu fuga do sistema prisional, suspendendo, consequentemente, a execução penal em seu desfavor.

3. Agravo desprovido.


R E L A T Ó R I O

EXMO. SR. DES. LUIZ FERREIRA DA SILVA:

Ilustres membros da Segunda Câmara Criminal:

Trata-se de agravo de execução penal manejado por Pablo Roberto Jardim, contra a decisão prolatada pelo Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá/MT que, nos autos do Processo Executivo de Pena n. 0005480-09.2015.8.11.0015 (SEEU), indeferiu o seu pedido de utilização da fração pertinente aos crimes comuns para o crime de tráfico, para fins de cálculo de cumprimento de pena, ante as modificações decorrentes da Lei n. 13.964/2019 – “Pacote Anticrime” e negou-lhe a progressão de regime.

O agravante, nas razões recursais que estão no ID 146383197, pugna pela reforma da aludida decisão, a fim de que seja afastada a hediondez equiparada do crime de tráfico de drogas, em razão das mudanças trazidas pelo chamado “Pacote Anticrime”, aplicando, por conseguinte, a fração/porcentagem referente aos crimes comuns. Além disso, impugna o cálculo de pena, solicitando: a retificação das datas de prisão e soltura, para constar o período de prisões: 9.4.2014 a 16.7.2014 e 8.8.2014 a 2.2.2017; a fixação da data-base para progressão em 10 de maio de 2017; bem como a inclusão de 8 (oito) dias de remição.

Nas contrarrazões encontradiças no ID 146387652, o Ministério Público postula a manutenção do decisum invectivado, ao argumento de que foi exarado de forma escorreita, esclarecendo que o requisito para a progressão de regime somente será adimplido pelo agravante em 17 de janeiro de 2025.

Em juízo de retratação, o magistrado manteve o édito judicial pelos seus próprios fundamentos, determinando a remessa do presente recurso a este Tribunal, consoante se infere do ID 146387654, p. 471.

Nesta instância revisora, a Procuradoria-Geral de Justiça, no parecer encontradiço no ID 153787152, opina pelo desprovimento deste agravo.

É o relatório.

V O T O R E L A T O R

Conforme se constata das razões recursais, o agravante sustenta que com a edição do “Pacote Anticrime”, materializado no mundo jurídico com a publicação da Lei n. 13.964/19, foi revogado o § 2º do art. 2º da Lei n. 8.072/90, retirando o caráter de equiparação do tráfico de entorpecentes a delito hediondo, motivo pelo qual é possível a aplicação do prazo estabelecido no art. 112, I, da Lei das Execuções Penais, para o cômputo do prazo exigido para progressão de regime.

Além disso, o agravante impugna o cálculo de pena, solicitando a alteração dos períodos de interrupção do cumprimento de pena e a inclusão dos dias de remição referentes aos estudos por ele realizados.

No entanto, a decisão impugnada não merece retoque, haja vista que agiu corretamente a autoridade judiciária da primeira instância, porquanto, induvidosamente, a revogação do § 2º do art. 2º da Lei n. 8.072/90 não tem o condão de retirar do tráfico de drogas a sua equiparação ao caráter hediondo.

Aliás, o tratamento diferenciado e a equiparação do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins às condutas hediondas decorrem da previsão constitucional estabelecida no art. 5º, XLIII, da Constituição Federal, assim redigidos:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

...

XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem; [...]. Destacamos

À vista disso, não resta dúvida, que o crime em questão é constitucionalmente considerado mais gravoso e assimilado às condutas hediondas previstas em lei específica, não perdendo a sua equiparação pela simples revogação de um parágrafo da lei, como pretende o agravante.

Na realidade, a doutrina e a jurisprudência passaram a classificar os crimes de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, tortura e terrorismo, como “equiparados a hediondo”, vez que a Constituição Federal no dispositivo supramencionado estipula o mesmo tratamento para as condutas previstas tanto na Lei n. 8.072/90 quanto para os três delitos descritos expressamente, possibilitando à conclusão de que não há diferença de severidade entre ditas infrações criminosas.

Ademais, a tese do agravante não se sustenta, pois, ainda que tenha sido revogado o § 2º do art. 2º da Lei de Crimes Hediondos, o caput do mesmo dispositivo legal manteve a referência aos delitos constitucionalmente equiparados; bem como manteve o § 4º do art. 2º da referida Lex, que estipula o prazo de 30 (trinta) dias de prisão temporária (Lei n. 7.960/89) para o tráfico de drogas, período, esse, que é exclusivo para os casos de crimes hediondos reforçando, indiscutivelmente, a manutenção da sua equiparação da hediondez.

A propósito, veja-se a redação dos aludidos preceptivos:

Art. 2º Os crimes hediondos, a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo são insuscetíveis de:

I - anistia, graça e indulto;

II - fiança.

[...]

§ 4o A prisão temporária, sobre a qual dispõe a Lei no 7.960, de 21 de dezembro de 1989, nos crimes previstos neste artigo, terá o prazo de 30 (trinta) dias, prorrogável por igual período em caso de extrema e comprovada necessidade. Destacamos

Além do mais, a legislação permanece hígida quanto à equiparação do crime de tráfico de drogas aos hediondos no que diz respeito aos benefícios a que o reeducando faz jus na fase da execução penal, conforme se constata do art. 83, V, do Código Penal, que, com as alterações promovidas pela Lei n. 13.964/19 – “Pacote Anticrime” manteve a exigência de 2/3 (dois terços) de cumprimento de pena do “crime hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, tráfico de pessoas e terrorismo”, para a concessão do livramento condicional, consoante abaixo pode ser inferido:

Art. 83 - O juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado a pena privativa de liberdade igual ou superior a 2 (dois) anos, desde que: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

(...)

V - cumpridos mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, tráfico de pessoas e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza. Destacamos

Acerca da inexistência de margem de discricionariedade no que concerne ao tratamento mais severo ao tráfico de drogas e da sua equiparação à hediondez etiquetada pelo constituinte originário, Renato Brasileiro de Lima, espanca qualquer dúvida ao afirmar que:

[...] A justificativa para o constituinte originário ter separado os crimes hediondos dos equiparados a hediondos está diretamente relacionada à necessidade de assegurar maior estabilidade na consideração destes últimos como crimes mais severamente punidos. Em outras palavras, a Constituição Federal autoriza expressamente que uma simples lei ordinária defina e indique quais crimes serão...

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