Acórdão nº 1022238-18.2020.8.11.0000 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Terceira Câmara Criminal, 03-02-2021

Data de Julgamento03 Fevereiro 2021
Case OutcomeNão-Provimento
Classe processualCriminal - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Número do processo1022238-18.2020.8.11.0000
AssuntoHomicídio

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO


TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL


Número Único: 1022238-18.2020.8.11.0000
Classe: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426)
Assunto: [Homicídio]
Relator: Des(a).
GILBERTO GIRALDELLI


Turma Julgadora: [DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). JUVENAL PEREIRA DA SILVA, DES(A). RONDON BASSIL DOWER FILHO]

Parte(s):
[ESTADO DE MATO GROSSO - PROCURADORIA GERAL DA JUSTICA - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (RECORRIDO), LAUDENIR ALVES DE OLIVEIRA - CPF: 003.014.441-88 (RECORRENTE), ELDON FRANCISCO FELIPE (VÍTIMA), MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO (CUSTOS LEGIS)]

A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
JUVENAL PEREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO.

E M E N T A

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – ART. 121, §2.º, INC. IV, DO CÓDIGO PENAL – PRONÚNCIA – IRRESIGNAÇÃO DA DEFESA1. PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA – ALEGADA A OCORRÊNCIA DE LEGÍTIMA DEFESA [REAL OU PUTATIVA] – IMPROCEDÊNCIA – PRESENTES A PROVA DA MATERIALIDADE DELITIVA E OS INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA – EXCLUDENTE DE ILICITUDE NÃO COMPROVADA CABALMENTE – MERO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE DA ACUSAÇÃO – PREVALÊNCIA DO IN DUBIO PRO SOCIETATE – FATO QUE DEVE SER SUBMETIDO AO JUIZ NATURAL DA CAUSA – 2. REQUERIDA A EXCLUSÃO DA QUALIFICADORA – IMPOSSIBILIDADE – CIRCUNSTÂNCIA QUE NÃO É MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTE E ENCONTRA RESPALDO NO CONJUNTO INDICIÁRIO DOS AUTOS – DECISÃO MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. A decisão de pronúncia constitui mero juízo de admissibilidade da acusação, de modo que, estando presentes a prova da materialidade delitiva e os indícios suficientes de autoria do crime doloso contra a vida, bem assim, não se vislumbrando prova cabal quanto à alegada legítima defesa – como se dá na hipótese – é descabida a absolvição sumária do recorrente, pois, em casos tais, a dúvida deve ser submetida ao Tribunal do Júri, com fulcro no princípio do in dubio pro societate e por força do comando constitucional expresso no art. 5.º, inc. XXXVIII, d, da CF.

2. O decote da qualificadora, nesta fase processual, só é possível quando for manifestamente improcedente, ou seja, sem qualquer arrimo no lastro probatório dos autos, caso contrário, havendo indícios mínimos quanto à possibilidade da presença do tipo penal derivado, este deve ser mantido a fim de que seja apreciado pelo órgão constitucional competente, qual seja, o Conselho de Sentença.

Recurso conhecido e desprovido.

R E L A T Ó R I O

RECORRENTE:

LAUDENIR ALVES DE OLIVEIRA

RECORRIDO:

MINISTÉRIO PÚBLICO


R E L A T Ó R I O

EXMO. SR. DES. GILBERTO GIRALDELLI

Egrégia Câmara:

Trata-se de recurso em sentido estrito interposto por LAUDENIR ALVES DE OLIVEIRA em face da r. decisão de ID 63749194, proferida pelo d. Juízo da Primeira Vara Criminal da Comarca de Rondonópolis/MT, que nos autos da ação penal n.º 0002999-38.2006.8.11.0064 – Código 306074, pronunciou-o como incurso nas sanções do art. 121, §2.º, inc. IV, do Código Penal, a fim de ser submetido a julgamento perante o eg. Tribunal do Júri.

Nas razões recursais de ID 63749203 e ID 63749205, o recorrente, assistido pela Defensoria Pública do Estado, almeja a absolvição sumária com fulcro no art. 415, inciso IV do Código de Processo Penal, ao argumento de que as provas coligidas ao feito demonstraram a presença da excludente de ilicitude da legítima defesa, tanto na modalidade real como na forma putativa; ao que agrega o pedido subsidiário de afastamento da qualificadora referente ao recurso que impossibilitou ou dificultou a defesa da vítima, por ser manifestamente improcedente.

Em contrarrazões vistas no ID 63749206 e ID 63749208, o Ministério Público rechaça as pretensões defensivas e manifesta-se pelo desprovimento do stricto sensu.

Na fase do art. 589 do Código de Processo Penal, o d. magistrado singular manteve o r. édito impugnado, pelos seus próprios fundamentos, consoante se depreende da decisão registrada no ID 63749209.

Instada a se manifestar, a i. Procuradoria-Geral de Justiça, por meio do parecer encartado no ID 67409478, opinou pelo desprovimento da irresignação.

É o relatório.

Não estando o feito submetido à Revisão, inclua-se-o em pauta para julgamento e, da respectiva data, intime-se a Defensoria Pública Estadual, na forma do art. 128, inc. I, da Lei Complementar n.º 80/1994.

V O T O R E L A T O R

VOTO (MÉRITO)

EXMO. SR. DES. GILBERTO GIRALDELLI (RELATOR)

Egrégia Câmara:

Inicialmente, cumpre reconhecer que o recurso em apreço é tempestivo, foi interposto por quem tinha interesse e legitimidade para fazê-lo, e o meio de impugnação empregado afigura-se necessário e adequado à finalidade colimada, razões pelas quais, estando presentes os requisitos objetivos e subjetivos para a sua admissibilidade, CONHEÇO do stricto sensu.

Verte da denúncia que, na data de 12/02/2006, por volta das 14h, em frente ao estabelecimento comercial denominado “Bar da Baixinha”, na cidade de Rondonópolis-MT, o ora recorrente LAUDENIR ALVES DE OLIVEIRA, vulgo ‘Nego’, matou Eldon Francisco Felipe por meio de 3 (três) disparos de arma de fogo, os quais atingiram a vítima nas costas.

Segundo a narrativa do órgão acusatório, os envolvidos no fato delituoso possuíam amizade desde a infância, a qual estava abalada após suspeitas de que a vítima seria a autora do crime de furto ocorrido na residência do ora recorrente.

Nesse contexto, na data do fato, ao se encontrarem no estabelecimento comercial acima referido, as partes iniciaram uma discussão e, quando a vítima se virou de costas para entrar no veículo automotor de um amigo, o recorrente teria sacado a arma de fogo que trazia consigo, efetuando os disparos.

Diante desse fato, LAUDENIR ALVES DE OLIVEIRA foi denunciado e pronunciado pela suposta prática do crime previsto no art. 121, §2.º, inciso IV do Código Penal, contexto este em que ora exsurge inconformado perante esta instância revisora, nos termos já relatados.

Feitas essas breves e pertinentes digressões, passo à análise individualizada das teses recursais.

1. Da pretendida absolvição sumária – tese de legítima defesa:

Como é cediço, a pronúncia constitui decisão de mera admissibilidade da acusação, para a qual basta que haja prova da materialidade do crime e indícios suficientes da autoria ou participação delitivas, consoante dispõe o art. 413, §1.º do Código de Processo Penal.

Ademais, é certo que os crimes dolosos contra a vida se sujeitam, por força de expressa determinação constitucional, a julgamento pelo eg. Tribunal do Júri [art. 5º, inciso XXXVIII, alínea d] e, a despeito desse comando, o procedimento respectivo é fracionado pelo Código de Processo Penal em duas fases principais com funções bem delimitadas (art. 406 e ss), com a finalidade de assegurar a regularidade do processo e impedir que toda pretensão acusatória seja invariavelmente submetida à sorte de um corpo de jurados orientado pela íntima convicção, sem que se evidencie, antes, a provável prática de um delito da sua competência.

O rito bifásico tem início com a instrução preliminar ou iudicium accusationis, que é endereçada a um juiz togado e se restringe, como dito, ao exame da admissibilidade da acusação, mediante um juízo ainda precário sobre os fatos supostamente criminosos e sob a luz do conhecimento técnico do Direito, que poderá culminar na pronúncia do acusado, com o consequente envio da imputação da forma mais simples possível ao Conselho de Sentença; mas também na impronúncia ou na absolvição sumária, ou mesmo na desclassificação da infração penal.

Assim, acaso se convença da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria do crime, o magistrado deverá pronunciar o acusado de forma fundamentada, especificando o dispositivo em que o julgar incurso, inclusive com as qualificadoras e as causas de aumento de pena.

Nesse momento, os “indícios suficientes” devem ser compreendidos como um princípio de prova capaz de situar o réu no contexto criminoso, mesmo que de maneira não plenamente segura, mas o bastante para submetê-lo ao julgamento de seus pares, únicos competentes para sanar eventuais controvérsias.

Nessa conjuntura, deve-se ter em conta que, ao prolatar um juízo fundado de suspeita das imputações, não compete ao magistrado singular a análise aprofundada das provas, devendo contentar-se com razoável apoio nos elementos indiciários e motivar o seu convencimento de...

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