Acórdão nº 1022846-16.2020.8.11.0000 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Terceira Câmara Criminal, 17-02-2021

Data de Julgamento17 Fevereiro 2021
Case OutcomeNão-Provimento
Classe processualCriminal - AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL - CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Número do processo1022846-16.2020.8.11.0000
AssuntoPena Privativa de Liberdade

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO


TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL


Número Único: 1022846-16.2020.8.11.0000
Classe: AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL (413)
Assunto: [Pena Privativa de Liberdade]
Relator: Des(a).
RONDON BASSIL DOWER FILHO


Turma Julgadora: [DES(A). RONDON BASSIL DOWER FILHO, DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). PAULO DA CUNHA]

Parte(s):
[MARCOS GARCIA DA SILVA (AGRAVANTE), MINISTERIO PUBLICO (AGRAVADO), MINISTERIO PUBLICO (CUSTOS LEGIS), MINISTERIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO (AGRAVADO), MINISTERIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO (CUSTOS LEGIS)]

A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
RONDON BASSIL DOWER FILHO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, VENCIDO ESTE SOMENTE QUANTO À PROVIDÊNCIA DE OFÍCIO, DEFERIDA PELO 1º VOGAL.

E M E N T A

AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL – PROGRESSÃO DE REGIME – DECISÃO DO JUÍZO A QUO QUE MANTEVE O PATAMAR DE 60% DE PENA CUMPRIDA COMO O REQUISITO OBJETIVO PARA A TRANSFERÊNCIA DO AGRAVANTE AO REGIME PRISIONAL MAIS BRANDO – IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA – PRETENDIDA A APLICAÇÃO DO ÍNDICE DE 40% – ADVENTO DA LEI N.º 13.964/2019 – NOVA REDAÇÃO DO ART. 112 DA LEI N.º 7.210/84 – CRITÉRIO TEMPORAL MAIS GRAVOSO PARA A PROGRESSÃO QUE DORAVANTE EXIGE REINCIDÊNCIA ESPECÍFICA EM INFRAÇÕES HEDIONDAS OU EQUIPARADAS – OMISSÃO LEGISLATIVA QUANTO AO CONDENADO POR CRIME HEDIONDO, MAS CUJA REINCIDÊNCIA SE DÁ POR FORÇA DE CONDENAÇÃO PRETÉRITA DERIVADA DA PRÁTICA DE DELITO COMUM – INTEGRAÇÃO DA LACUNA LEGAL COM BASE NO PRINCÍPIO DO FAVOR REI – EXEGESE MAIS FAVORÁVEL AO REEDUCANDO – AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL DESPROVIDO, COM PROVIDÊNCIA DE OFÍCIO.

Ante a revogação do §2.º do artigo 2.º da Lei n.º 8.072/1990 e da nova redação dada pela Lei n.º 13.964/2019 ao art. 112 da Lei n.º 7.210/1984, devem ser aplicados aos condenados por crime hediondo ou equiparado e não reincidentes em infrações penais dessa específica natureza, ainda que já possuam condenações pretéritas por delitos comuns, os índices de 40% ou 50% de pena cumprida para o cômputo da progressão de regime, a depender da ocorrência ou não do resultado morte, nos termos do art. 112, incisos V e VI, alínea a, da Lei de Execução Penal.

In casu, em se tratando de condenação por delito com resultado morte [homicídio], o acolhimento do pedido defensivo de aplicação do patamar de 40% (quarenta por cento) de pena cumprida esbarra frontalmente com os princípios da especialidade e da legalidade, todavia, a manutenção da fração de 60% (sessenta por cento) fixada pelo juízo a quo também não está correta, tornando de rigor o desprovimento da irresignação, mas com providência ex officio para estipular o percentual de 50% (cinquenta por cento) no que diz respeito ao tempo de pena cumprida apto a tornar satisfeito o requisito objetivo para a progressão de regime.

R E L A T Ó R I O

Egrégia Câmara:

Trata-se de Agravo em Execução Penal, interposto a tempo e modo por Marcos Garcia da Silva, contra a decisão em que foi indeferido seu pedido para cômputo do percentual de 40% para a progressão de regime, no que se refere ao cálculo de pena relativo ao crime hediondo (Ação Penal nº 10756-89.2017.8.11.0002).

Em suas razões, requer seja aplicada a fração de 2/5 (40%) para a concessão de benefícios na execução penal, sob o argumento de ser reincidente genérico e de que as alterações trazidas pela Lei nº 13.964/2019 devem ser interpretadas em seu favor, como norma mais benéfica (Id. 65161452, pág. 232/249).

As contrarrazões ministeriais são pelo desprovimento do apelo (Id. 65161452, pág. 264/268).

Em sede de Juízo de retratação, foi mantida a decisão por seus próprios fundamentos (Id. 65161452, pág. 272/274).

A Procuradoria-Geral de Justiça, adotando per relationem as contrarrazões aduzidas pelo Ministério Público de primeiro grau, manifesta-se pelo desprovimento do recurso (Id. 68590992).

É o relatório.

Em pauta.

Cuiabá, 8 de fevereiro de 2021.

Rondon Bassil Dower Filho

Relator

V O T O R E L A T O R

Egrégia Câmara:

Infere-se dos autos que Marcos Garcia da Silva, em regime fechado, cumpre pena unificada oriunda de seis condenações, apenas uma delas decorre do cometimento de crime hediondo (Id. 65161452, pág. 189).

Durante o curso do processo executivo, o Juízo a quo indeferiu o pedido do agravante para cômputo do percentual de 40% para a progressão de regime, no que se refere ao cálculo de pena relativo ao crime hediondo (Tráfico de drogas – Ação Penal nº 10756-89.2017.8.11.0002).

Neste grau de jurisdição, requer seja aplicada a fração de 2/5 (40%) para a concessão de benefícios na execução penal, sob o argumento de ser reincidente genérico e de que as alterações trazidas pela Lei nº 13.964/2019 devem ser interpretadas em seu favor, como norma mais benéfica.

Apesar da controvérsia instaurada pelas inovações trazidas pelo chamado "Pacote Anticrime" (Lei nº. 13.964/19), entendo que o condenado por crime hediondo ou equiparado, que seja reincidente (específico ou não), deve cumprir 60% (3/5) da pena para fins de concessão da progressão regimental, e não 40%.

A nova redação do art. 112 da LEP se refere apenas à reincidência, ignorando qualquer distinção sobre se ela seria específica ou não!

O art. 112, em seus incisos VI e VII, ao mencionar as expressões “reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado” e “reincidente em crime hediondo ou equiparado com resultado morte”, evidentemente contempla inclusive a reincidência específica, e assim sendo o legislador submeteu condenados reincidentes não específicos às frações de cumprimento de penas, pois, na lei conforme conhecidíssimo e prestigiado princípio basilar de hermenêutica segundo o qual nela não existem palavras inúteis verba cum effectu sunt accipienda – ou seja, as palavras devem ser compreendidas como tendo alguma eficácia. Não se presumem, na lei, palavras inúteis”, como doutrina o relator Paulo Antônio Rossi, nos Embargos de Declaração – ED 1500358-14.2018.8.26.0145 SP 1500358-14.2018.8.26.0145, da 12 Câm. Direito Criminal do TJSP em julgamento de 08.07.2020, publ. 08.07.2020, não havendo que se cogitar, portanto, de interpretação mais favorável ao réu, eis, que dúvida não há!

E não poderia ser mesmo de outra forma porque numa lei, conhecida como “Pacote Anticrime” um criminoso reincidente por crime de outra natureza, não pode invocar interpretação mais favorável se dúvida não houver, como não há neste caso, e ainda, contrariamente à “mens legis”, em debate, pois, o que se pretendeu inicialmente com as alterações legislativas promovidas foi recrudescer a forma de cumprimento das penas em tais casos, e não atenuar a forma de cumprimento, considerando que o motivo que levou às mencionadas alterações foi o convencimento de que as formas existentes até então, revelavam-se ineficazes para prevenir e reprimir o crime, e ainda ressocializar o delinquente.

Outrossim, não há lógica no raciocínio de que num conjunto de alterações legislativas, que visam tornar mais eficaz o cumprimento da pena para que atinja plenamente seus objetivos, que se promovesse diferenciação entre condenados reincidentes e reincidentes específicos.

Admitiu-se, sim, a diferenciação nos casos expressos em lei nos incisos primeiros, sem no entanto fazer qualquer referência à espécie de reincidência, pois, o que se busca é combater a criminalidade como um todo e não apenas a decorrente de crimes mais graves, cobrindo-se com um manto de proteção aqueles condenados por outros crimes não especificados pelo legislador, como se não tivessem contribuído para que fosse exigido o recrudescimento da lei penal quanto ao cumprimento mais rigoroso das penas de todos os delitos.

Reincidência é reincidência, específica ou não, eis, que consequência de execução de pena ineficaz que acarreta em 85% dos casos de egressos do Sistema Prisional, o retorno à atividade criminosa, mercê da ineficácia das leis que vigiam em época anterior ao Pacote Anticrime, incapazes de devolver à sociedade criminosos perfeitamente ressocializados.

Nesses moldes, a interpretação mais adequada é a de que o inciso VII do art. 112 da LEP traz duas exigências: que a pessoa seja reincidente, independentemente dessa reincidência ser comum ou específica; e que tenha sido condenada por crime hediondo ou equiparado.

Outra interpretação, a meu ver, é equivocada, especialmente aquela almejada pela defesa de que seria imperiosa a aplicação ao seu caso da fração de 2/5, destinada ao apenado por crime hediondo ou equiparado, mas que seja primário, situação que não se emoldura ao caso do agravante.

Sobre a questão aqui tratada, consigno pertinente trecho de julgado do TJSC, em que o Relator, Desembargador Antônio Zoldan da Veiga, expõe o entendimento de que “(...) a Lei n. 13.964/2019, especificamente no art. 112, VII, da LEP, trouxe distinções em relação ao crime praticado, mas manteve a não exigência da reincidência ser específica para aplicação do maior patamar para progressão do regime, até porque é público e notório que respectivas alterações propostas pelo Ministério da Justiça e da Segurança Pública sinalizavam, ainda mais, maior repreensão quanto às regras de cumprimento das penas (...) Inclusive, vale anotar que, se o legislador optasse em se referir apenas à reincidência específica no respectivo art. 112 da LEP, certamente o faria expressamente - nesse ponto, cita-se como exemplo o art. 44, § 3º, do Código Penal, no qual há menção expressa à "prática do mesmo crime". (...)” (TJ-SC - EP: 00001966620208240020 Criciúma 0000196-66.2020.8.24.0020, Relator: Antônio Zoldan da Veiga, Data de Julgamento: 07/05/2020, Quinta Câmara Criminal).

De fato, não se pode ignorar que as modificações propostas e levadas a efeito por meio da Lei nº. 13.964/19, também chamada de “Pacote Anticrime”, como o próprio nome sugere, objetivaram reprimir...

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