Acórdão nº 1025992-65.2020.8.11.0000 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Terceira Câmara Criminal, 07-04-2021

Data de Julgamento07 Abril 2021
Case OutcomeProvimento em Parte
Classe processualCriminal - AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL - CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Número do processo1025992-65.2020.8.11.0000
AssuntoLivramento condicional

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO


TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL


Número Único: 1025992-65.2020.8.11.0000
Classe: AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL (413)
Assunto: [Livramento condicional]
Relator: Des(a).
GILBERTO GIRALDELLI


Turma Julgadora: [DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). JUVENAL PEREIRA DA SILVA, DES(A). RONDON BASSIL DOWER FILHO]

Parte(s):
[WELLINGTON FIGUEIREDO DE AMIGO - CPF: 057.268.351-07 (AGRAVANTE), MINISTERIO PUBLICO (AGRAVADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO (AGRAVADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO (CUSTOS LEGIS)]

A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
JUVENAL PEREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR MAIORIA, DEU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, VENCIDO O 1º VOGAL.

E M E N T A

AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL – IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA – PRETENDIDO AFASTAMENTO DO CARÁTER HEDIONDO DO CRIME DE PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO – ADVENTO DA LEI N.º 13.964/2019 – FIGURA QUALIFICADA INTRODUZIDA NO ART. 16, §2º, DA LEI N.º 10.826/03 QUE PENALIZA DE FORMA MAIS GRAVE A CONDUTA CRIMINOSA CUJO OBJETO MATERIAL É A ARMA DE FOGO DE USO PROIBIDO – NOVA REDAÇÃO DO ART. 1º, PARÁGRAFO ÚNICO, INC. II, DA LEI N.º 8.072/90 – BROCARDO “VERBA CUM EFFECTU, SUNT ACCIPIENDA” – EXEGESE MAIS FAVORÁVEL AO REEDUCANDO – NOVATIO LEGIS IN MELLIUS – PEDIDO DE APLICAÇÃO DO PECENTUAL DE 16% COMO REQUISITO OBJETIVO PARA A PROGRESSÃO DE REGIME QUE ESBARRA NA REINCIDÊNCIA ATUAL EM CRIME COMETIDO SEM VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA À PESSOA – CIRCUNSTÂNCIA PESSOAL QUE ABRANGE A TOTALIDADE DA PENA EM EXECUÇÃO – PRECEDENTES DO STJ – AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

1. Com o advento da Lei n.º 13.964/2019, houve alterações na Lei n.º 10.826/03 e na Lei n.º 8.072/90, que demonstram a opção do legislador em tornar mais gravoso apenas o delito de portar ou possuir arma de fogo de uso proibido, o qual passou a ser previsto como qualificadora do crime e equiparado a hediondo, pois, embora a redação do art. 1º, parágrafo único, inc. II, da Lei de Crime Hediondos não seja exemplar, de acordo com o brocardo “verba cum effectu, sunt accipienda”, não se presume na lei a existência de palavras inúteis ou tautológicas, impondo-se que sejam compreendidas como tendo alguma eficácia, sentido próprio e adequado, a concluir que o nomen juris do crime, utilizado expressamente na redação da referida norma, admite o caráter hediondo tão somente à conduta criminosa cujo objeto material é a arma de fogo de uso proibido, não abrangendo os demais ilícitos previstos no art. 16 da Lei n.º 10.826/03, ou seja, em que o armamento é de uso restrito ou permitido.

2. Portanto, tratando-se de novatio legis in mellius, mesmo o agravante tendo cometido a infração penal antes da entrada em vigor da Lei n.º 13.964/19, faz jus ao afastamento do caráter hediondo do crime de porte ilegal de arma de fogo de uso restrito pelo qual foi condenado, mas com a aplicação do percentual de 20% (vinte por cento) e não de 16% (dezesseis por cento) como patamar de pena cumprida apto a tornar satisfeito o requisito objetivo para a sua progressão de regime, visto que, atualmente, é reincidente em crime comum cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa, e conforme orientação jurisprudencial do STJ, a reincidência é circunstância de caráter pessoal que, para efeito de cálculo dos benefícios executórios, estende-se sobre a totalidade das penas unificadas.

Recurso conhecido e parcialmente provido.

R E L A T Ó R I O

AGRAVANTE:

WELLINGTON FIGUEIREDO DE AMIGO

AGRAVADO:

MINISTÉRIO PÚBLICO

R E L A T Ó R I O

EXMO. SR. DES. GILBERTO GIRALDELLI

Egrégia Câmara:

Trata-se de recurso de agravo em execução penal interposto pelo agravante acima identificado contra a r. decisão proferida pelo d. Juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Sinop/MT, nos autos do processo executivo de pena n.º 0017961-83.2016.8.11.0042, que indeferiu o pedido de afastamento da hediondez do crime tipificado no art. 16, caput, da Lei n.º 10.826/03 e, por consequência, a pretendida aplicação da fração de 1/6 (um sexto) de pena cumprida como requisito objetivo para a progressão de regime, referente à condenação prolatada na ação penal n.º 1632-51.2018.8.11.0098.

Nas razões recursais disponíveis no ID 69464474, o agravante alega que, embora tenha sido condenado sob a égide da Lei n.º 13.491/17, com a entrada em vigor da Lei n.º 13.964/19 houve modificação substancial na Lei n.º 10.826/03 (Estatuto do Desarmamento) e na Lei n.º 8.072/90 (Lei de Crimes Hediondos), retirando o caráter hediondo do crime de porte ou posse ilegal de arma de fogo de uso restrito, razão pela qual faz jus à incidência da fração de 1/6 (um sexto) para fins de progressão de regime, com a aplicação da nova regra do art. 1º, parágrafo único, inc. II, da Lei n.º 8.072/90, que prevê como delito hediondo apenas o porte ou posse ilegal de arma de fogo de uso proibido, por se tratar de novatio legis in mellius.

Em contrarrazões vistas no ID 69464477, o Ministério Público rechaça a tese defensiva e requer seja negado provimento ao agravo.

Ao exercer o juízo de retratação, o d. magistrado prolator manteve o decisum reprochado, consoante se vê no ID 69464478.

Instada a se manifestar, a i. Procuradoria-Geral de Justiça, por meio do parecer encartado no ID 77142979, opinou pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

Não estando o feito submetido à Revisão, inclua-se-o em pauta para julgamento e, da respectiva data, intime-se a Defensoria Pública Estadual, nos termos do art. 128, inciso I, da Lei Complementar n.º 80/1994.

V O T O R E L A T O R

V O T O (MÉRITO)

EXMO. SR. DES. GILBERTO GIRALDELLI (RELATOR)

Egrégia Câmara:

Inicialmente, cumpre reconhecer que o recurso em apreço é tempestivo, foi interposto por quem tinha interesse e legitimidade para fazê-lo e o meio de impugnação empregado afigura-se necessário e adequado para se atingir a finalidade colimada, motivos por que, estando presentes os requisitos objetivos e subjetivos para a sua admissibilidade, CONHEÇO do agravo em execução penal manejado pela i. defesa.

Depreende-se da prova amealhada aos autos eletrônicos que o agravante WELLINGTON FIGUEIREDO DE AMIGO cumpre pena privativa de liberdade unificada, decorrente, no mínimo, das condenações proferidas nas seguintes ações penais:

i) Ação Penal n.º 0009941-63.2015.8.11.0002 (Comarca de Várzea Grande/MT), na qual foi sancionado com 05 (cinco) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, no regime inicial semiaberto, pela prática do crime tipificado no art. 157, §2º, incs. I e II, do CP, cometido no dia 05/02/2015, com trânsito em julgado para a defesa em 08/11/2016;

ii) Ação Penal n.º 0001632-51.2018.8.11.0098 (Comarca de Porto Esperidião/MT), na qual foi sancionado com 03 (três) anos, 09 (nove meses) e 15 (quinze) dias de reclusão, no regime inicial fechado, pela prática dos crimes tipificados no art. 16, caput, da Lei n.º 10.826/03 e no art. 307, caput, do CP, cometidos em 04/11/2018, com trânsito em julgado para as partes em 18/06/2019;

iii) Ação Penal n.º 0028934-63.2017.8.11.0042 (Comarca de Cuiabá/MT), na qual foi sancionado com 05 (cinco) meses de detenção, no regime inicial aberto, cumulados com medida de prestação de serviços à comunidade pelo prazo de 03 (três) meses, à conta da prática dos crimes tipificados no art. 287, caput, do CP e art. 28 da Lei n.º 11.343/2006, cometidos em 04/08/2017, com trânsito em julgado para as partes em 20/08/2019.

Nesse contexto, a i. Defesa pretende, em relação à condenação proveniente da Ação Penal n.º 0001632-51.2018.8.11.0098, o afastamento da hediondez do delito tipificado no art. 16, caput, da Lei n.º 10.826/03 e, por consequência, para fins de progressão de regime, a incidência da fração de 1/6 (um sexto) prevista para os crimes comuns, ao argumento de que, com as alterações trazidas ao Estatuto do Desarmamento e à Lei de Crimes Hediondos após a entrada em vigor da Lei n.º 13.964/2019, o porte ilegal de arma de fogo de uso restrito deixou de integrar o rol taxativo da Lei n.º 8.072/90, que, com a nova redação de seu art. 1º, parágrafo único, inc. II, passou a prever como delito equiparado a hediondo “o crime de posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso proibido, previsto no art. 16 da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, motivo pelo qual esta norma, por se tratar de novatio legis in mellius, deve retroagir em benefício do reeducando.

O MM. Magistrado a quo indeferiu o pleito em questão, com arrimo nos seguintes fundamentos, in verbis:

“(...) Desse modo, da leitura dos supramencionados artigo, verifica-se que TODAS as hipóteses previstas no artigo 16 da Lei n.º 10.826/2003 estão elencadas como crimes hediondos, visto que o artigo 1º, parágrafo único, inciso II da Lei n.º 8.072/1990, com redação dada pela Lei n.º 13.964/2019, não faz exclusão de nenhuma das condutas previstas no referido artigo, não podendo, portanto, o operador do direito fazer interpretação extensiva, em respeito ao princípio da legalidade” (ID 69464494 - Pág. 63). Destaquei.

Com efeito, antes da entrada em vigor da Lei n.º 13.964/2019, o caput do art. 16 da Lei n.º 10.826/03 previa como figura típica a conduta de Possuir, deter, portar, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob sua guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição de uso proibido ou restrito, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

E, após a vigência da Lei n.º 13.497/17, o aludido tipo penal passou a constar no rol de delitos equiparados a hediondos, previsto no art. 1º, parágrafo único, da Lei n.º 8.072/90, cuja redação era Consideram-se também hediondos o crime de genocídio previsto nos arts. 1o, 2o e 3o da Lei no 2.889, de 1o de outubro de 1956, e o de...

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