Acórdão nº 12098285 Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 2ª Turma de Direito Penal, 06-12-2022

Data de Julgamento06 Dezembro 2022
Número do processo0006605-34.2015.8.14.0401
Data de publicação07 Dezembro 2022
Acordao Number12098285
Classe processualCRIMINAL - APELAÇÃO CRIMINAL
Órgão2ª Turma de Direito Penal

APELAÇÃO CRIMINAL (417) - 0006605-34.2015.8.14.0401

APELANTE: J. M. D. D. N.

APELADO: J. P.

RELATOR(A): Desembargador RONALDO MARQUES VALLE

EMENTA

PROCESSO N.º 0006605-34.2015.8.14.0401

RECURSO: APELAÇÃO PENAL

COMARCA: BELÉM

ÓRGÃO JULGADOR: 2ª TURMA DE DIREITO PENAL

APELANTE: J. M. D. DE N.

ADVOGADO: PEDRO BRAGA GOMES

APELADO: JUSTIÇA PÚBLICA

PROCURADORA DE JUSTIÇA: ANA TEREZA DO SOCORRO DA SILVA ABUCATER

RELATOR: DES. RONALDO MARQUES VALLE

REVISOR: DES. RÔMULO JOSÉ FERREIRA NUNES

EMENTA: CRIMINAL. APELAÇÃO PENAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. PALAVRA DA VÍTIMA. DOSIMETRIA. MÍNIMO LEGAL. DESPROVIMENTO.

1. A palavra da vítima tem peso relevante nos delitos sexuais, sendo suficiente a congruência entre os depoimentos prestados e as demais provas, para legitimar o decreto condenatório.

2. A dosimetria da pena é irretocável, devendo ser mantida a reprimenda fixada em patamar coerente e proporcional ao ato praticado.

4. As condições de tempo e lugar da prática dos atos sexuais contra a mesma vítima indicam a continuidade delitiva – art. 71 do CP.

3. Recurso conhecido e improvido, à unanimidade.

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Excelentíssimos Desembargadores integrantes da 2ª Turma de Direito Penal do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, à unanimidade, em CONHECER DO RECURSO E NEGAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto do Desembargador Relator.

Julgado por videoconferencia na 16ª Sessão Ordinária da 2ª Turma de Direito Penal do Tribunal de Justiçado Estado do Pará, no dia 6 de dezembro de 2022.

Julgamento presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Rômulo Ferreira Nunes.

Belém, 6 de dezembro de 2022.

Des. RONALDO MARQUES VALLE

Relator

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Penal interposta por J. M. D. DE N. contra a sentença proferida pelo MM. Juízo de Direito da Vara de Crimes Contra Criança e Adolescente da Comarca de Belém que o condenou à pena de 16 (dezesseis) anos, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, pela prática do crime do art. 217-A do Código Penal, em regime inicialmente fechado.

Consta dos autos que: Narra o inquérito policial anexo que, a criança V.M.S. de 06 anos de idade à época dos fatos, foi abusada sexualmente por seu pai adotivo, ora acusado JOSÉ MARIA DAMASCENO DA NAZARÉ em sua residência, localizada na Passagem Jorge Bastos, n° 37, bairro da Sacramenta, nesta cidade. Consta nos autos que a vítima foi adotada pelo acusado e sua mulher quando tinha 03 anos de idade, e aos seus 06 anos de idade começou a ser abusada sexualmente pelo seu pai adotivo fato este que ocorreu até os seus 16 anos. A vítima declarou que no início o acusado passava a mão pelo seu corpo, e ficava se masturbando em sua frente, aos seus 14 anos o acusado tirou a sua "virgindade" e ainda obrigava a mesma a tirar fotos sem roupa. No dia 15 de setembro de 2014 a vítima estava na escola em que estuda Dom Pedro l, e neste dia a sua mãe adotiva tinha viajado para Fortaleza e ficou sozinha com o acusado e com seu irmão mais velho, então como ficou aflita por ficar sozinha com o acusado, esta resolveu contar para a diretora da escola que vinha sendo abusada por seu pai adotivo e estava com medo de voltar para a casa, momento em que foi chamada a psicóloga da escola a qual chamou o Conselho Tutelar para acompanhar a vítima até a delegacia do PROPAZ e noticiou os fatos à autoridade policial. Ao noticiar os fatos à autoridade a mesma foi encaminhada para uma casa de passagem na Padre Eutíquio, onde ficou cerca de 04 (quatro) dias e depois foi morar com a sua tia Anadir Moura dos Santos no bairro do Icuí. A mãe adotiva da vítima chegou a ir à casa de passagem para retirar a mesma de lá, mas os conselheiros não permitiram, pois a mesma não acreditava na adolescente. A materialidade e autoria das infrações penais restam demonstradas pelas seguras declarações da vítima e pelo depoimento das testemunhas.”.

No ID 7799636/7799638, sobreveio sentença condenatória, contra a qual o Réu apelou no ID 7799639, onde requer a reforma da decisão, a fim de que seja absolvido do crime sexual, em face da insuficiência de provas.

Constam contrarrazões ao recurso, pelo conhecimento e desprovimento (ID 7799640).

No ID 7799641, a D. Procuradoria de Justiça apresentou parecer pelo conhecimento e desprovimento do recurso de apelação.

Autos revisados, nos termos regimentais.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade do recurso, conheço o apelo manejado.

O Apelante protesta pela reforma da decisão, a fim de que seja absolvido do crime de estupro de vulnerável, em face da insuficiência de provas.

O Recorrente alega, em seu recurso, a ausência de provas do crime, com base na suposta fragilidade da palavra da vítima e no laudo pericial negativo.

Ocorre que sendo a vítima menor de idade, contando com 6 (seis) anos na data que o crime começou a ser praticado, presumida se torna a violência do estupro, ou seja, mesmo que o laudo pericial não ateste a violência, a lei o faz de forma impositiva. Somente por questão de razoabilidade, a jurisprudência pátria tem admitido a relativização de tal norma, em face das demais provas dos autos. E in casu, os autos possuem provas suficientes e contrárias à tese de defesa.

A principal delas é a prova testemunhal, uma vez que houve uma harmonia entre os depoimentos da fase inquisitorial e instrutória, pois a vítima foi clara e precisa sobre os fatos, confirmando desde a fase inquisitorial a mesma versão, apesar do natural abalo psicológico inerente a tais crimes, ao confirmar os fatos narrados na exordial.

Vejamos os depoimentos judiciais:

Vítima – ID 7799642/7799643: A vítima V. M. S. informou que atualmente não possui nenhum contato com o apelante (00:21 - 00:23); que é filha adotiva do apelante e de Ana Conceição Moura Santos; que convivia com a família desde os três (3) anos de idade; que apelante e esposa possuíam outros três (3) filhos legítimos; que era a única menina e com a menor idade (00:31 - 01:04); que tratava o apelante e Ana Santos como pai e mãe; que o apelante lhe batia ocasionalmente; que depois do ocorrido, não consegue tratá-lo como pai (01:06 - 01:35); que os abusos ocorriam quando Ana Santos se ausentava para trabalhar, momento em que ficava sozinha com o apelante para estudar; que os primeiros abusos ocorreram quando possuía seis (6) anos de idade; que o apelante passava as mãos e, em alguns momentos, passava também o pênis nas suas partes intimas; que o apelante ameaçava a vítima afirmando que a mataria caso contasse sobre os abusos (01:37 - 02:13); que um dos abusos ocorreu enquanto estudava matemática com o apelante, em uma das lojas da família; que havia efetuado incorretamente uma operação, momento em que o apelante a bateu com o caderno no rosto; que depois da agressão, foi levada para um aposento nos fundos da loja e ali foi abusada; que naquela ocasião o apelante pôs o pênis para fora das roupas e passou a se masturbar enquanto tocava o seu corpo; que o apelante dizia que aquilo era somente entre os dois (02:27 - 04:03); que os abusos ficaram mais frequentes quando completou quatorze (14) anos (04:22 - 04:27); que nessa época, os abusos aconteciam em um dos quartos da casa; que o apelante a mandava para o quarto; que já possui certo desenvolvimento corporal; que o apelante praticava sexo oral; que o apelante tentava realizar a penetração, no entanto, gritava e o empurrava (04:30 - 05:30); que em outra ocasião, o apelante amarrou uma camisa na sua boca, segurou as duas mãos e pôs seu corpo entre as suas pernas; que nesse momento ocorreu, de fato, a penetração, pois não tinha como gritar ou se defender (07:23 - 07:47); que percebeu sangramento após o ato, mas, por pensar que se tratava de menstruação, utilizou absorvente para conter o sangue (07:51 - 08:07) que conversou sobre o ocorrido com uma amiga de escola; que conversou também com a psicóloga da escola que a encaminhou para diretora da instituição de ensino; que após isso, o Conselho Tutelar foi buscá-la (09:33 - 10:25); que só então a mãe adotiva Ana Santos, tomou conhecimento dos fatos; que o apelante continuou morando na casa e ela passou a morar com a tia; que não teve acompanhamento psicológico, pois não possuía dinheiro para custear o deslocamento até o local (10:38 - 11:10).”.

Informante Anadir Moura dos Santos – ID 7799644/7799645: tia adotiva da vítima, afirmou que mora com a vítima desde que a referida possuía dezesseis (16) anos de idade; que a vítima foi entregue a ela por um Conselheiro Tutelar (00:40 - 01:06); que ao chegar na casa da declarante, a vítima aparentava estar constantemente assustada; que no ano em que chegou, a vítima não teve rendimento escolar satisfatório, que resultou, inclusive, na reprovação (02:24 - 02:55); que a vítima contou que os abusos começaram ainda aos seis (6) anos de idade, na ausência da mãe adotiva; que o apelante apalpava a genitália da ofendida; que a vítima costumava ficar sob os cuidados do apelante; que após isso, os abusos se intensificaram; que o apelante ameaçava a vítima, afirmando que mataria não só ela, mas também a mãe adotiva; que o apelante também olhava a vítima tomar banho (03:28 - 05:16); que a vítima relatou que em certo dia, enquanto ocorria uma festa próximo ao lado da casa da família, o apelante, após consumir bebida alcoólica, chegou e passou a agarrá-la; que nesse dia ocorreu o ato de conjunção carnal (05:19 - 06:49); que a vítima contou sobre o ocorrido para uma colega da escola e, após isso, foi levada a direção da...

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