Acórdão nº 12107274 Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 1ª Turma de Direito Penal, 29-11-2022

Data de Julgamento29 Novembro 2022
Número do processo0004862-10.2016.8.14.0124
Data de publicação07 Dezembro 2022
Número Acordão12107274
Classe processualCRIMINAL - APELAÇÃO CRIMINAL
Órgão1ª Turma de Direito Penal

APELAÇÃO CRIMINAL (417) - 0004862-10.2016.8.14.0124

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ MPPA

APELADO: EM APURACAO

RELATOR(A): Desembargadora VÂNIA LÚCIA CARVALHO DA SILVEIRA

EMENTA

APELAÇÃO CRIMINAL. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. IRRESIGNAÇÃO. ARQUIVAMENTO EX OFFICIO PELO MAGISTRADO DE INQUÉRITO POLICIAL. ERROR IN PROCEDENDO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME.

1. Cabe exclusivamente ao Ministério Público enquanto titular da ação penal pública a iniciativa de requerimento de arquivamento em inquérito policial em andamento. Na forma do art. 28 do CPP c/c art. 129, inciso I, “a” da CF/88 e art. 251 do CPP.

2. Necessário retorno dos autos à Comarca de Origem para manifestação ministerial que entender necessária.

3. Recurso conhecido e provido, à unanimidade.

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores integrantes da 1ª Turma de Direito Penal do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, à unanimidade, em conhecer do recurso e dar-lhe provimento, nos termos do voto da Desembargadora Relatora.

Sessão do Plenário Virtual do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, realizada no período de 29 de novembro a 06 de dezembro do ano de 2022.

Julgamento presidido pela Excelentíssima Senhora Desembargadora Maria Edwiges de Miranda Lobato.

Belém/PA, 29 de novembro de 2022.

Desembargadora VÂNIA LÚCIA SILVEIRA

Relatora

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Penal interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, inconformado com a sentença prolatada pelo Exmo. Sr. Juiz de Direito da Vara Única da Comarca de São Domingos dos Araguaia/PA, que determinou o arquivamento do Inquérito Policial, revogando medidas cautelares de busca e apreensão, interceptação telefônica e a prisão preventiva eventualmente decretada nos autos.

Consta do inquérito policial, ID 8117056 – Págs. 60/65, que a investigação foi deflagrada na Unidade de Polícia Civil de São Domingos do Araguaia, em razão de morte suspeita do menor D. L. F. DOS S., cumprindo requisição ministerial para apurar os fatos que envolvem a morte da criança.

Alega que prestaram depoimentos as testemunhas, Laiza Ferreira dos Santos - mãe da criança, Patricio Souza Evangelista – padrasto da criança, Maria de Souza Silva – avó da criança, prestaram depoimento, Dr. Jaime Farias de Moraes – médico que atendeu a criança, Valeria da Silva Faria Souza – enfermeira que atendeu a criança.

Assevera que no caderno investigatório consta a declaração proferida pelo Dr. James Farias de Moraes, que narra a inexistência de agressão física e demonstração de carinhos por parte da genitora das crianças.

Concluiu que não foi possível fazer qualquer indiciamento, e remeteu ao Magistrado a quo para abrir vista ao Ministério Público a fim de que este tomasse as devidas providências previstas no Código de Processo Penal Brasileiro, pois não é de competência da Autoridade Policial pleitear o arquivamento do inquérito policial.

Os autos foram remetidos ao Juízo de 1º grau, que em 24.08.2016, abriu vistas ao Promotor de Justiça da Comarca de São Domingos do Araguaia (ID 8117057 – Pág. 67).

Em 29.08.2016, ID 8117057 – Pág. 68, o Ministério Público requereu diligências, tendo sido o inquérito devolvido a Delegacia de Polícia para efetivo cumprimento (ID 8117057 – Pág. 69).

Em sentença (ID 8117058 – Págs. 72/74) prolatada em 18.12.2020 foi determinado o arquivamento do inquérito policial, medida cautelar e/ou pedido de prisão preventiva, sob a alegação de que a persecução criminal já não se justifica.

Em razões recursais, a ID 8117059 – Págs. 76/82, o RMP pugna pela reforma do mesmo, argumentando, como abono de sua tese, que ao Ministério Público cabe entender se é caso ou não de denúncia, pois, o pedido de arquivamento deve ser feito pelo titular da ação penal.

Alega que o Juízo de 1º grau, sem qualquer provocação, arquivou o inquérito policial sob a alegativa de que a investigação não pode se prolongar ao longo dos anos.

Assevera que não há a possibilidade de arquivamento do presente inquérito policial de ofício, sem que haja qualquer manifestação do titular da ação penal.

Não houve apresentação de contrarrazões.

Nesta Instância Superior, a 13ª Procuradora de Justiça Criminal, Dra. Candida de Jesus Ribeiro do Nascimento, pronuncia-se pelo conhecimento do recurso porque atendidos os requisitos para sua admissibilidade, e, no mérito, pelo seu provimento, do Apelo manejado pelo Ministério Público do Estado do Pará.

É o relatório.

À douta revisão, com intenção de inclusão na pauta de julgamento do plenário virtual.


VOTO

Porquanto presentes os pressupostos recursais objetivos e subjetivos, conheço da presente apelação.

O Ministério Público ingressou com o recurso apelatório, visando reformar a sentença vergastada, posto que cabe ao Ministério Público o pedido de arquivamento do inquérito policial.

No caso em análise, é necessário acolher o pleito recorrido.

Vale registrar que é vedado ao Juiz arquivar inquéritos e termos circunstanciados de ofício, haja vista que, no sistema acusatório, o Ministério Público é o titular da ação penal, conforme preconiza o artigo 129, inciso I, da Constituição Federal, e, portanto, tem a incumbência de promover o arquivamento de procedimentos investigatórios, cabendo à autoridade judiciária homologá-lo ou, se for o caso, proceder conforme previsto no artigo 28 do Código de Processo Penal (com redação anterior à Lei 13.964/19, haja vista a suspensão determinada na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 6298 de relatoria do ministro Luiz Fux do Supremo Tribunal Federal), o qual assim determina:

“Art. 28. Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou peças de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão do Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a atender. ”

Acerca do tema, ensina o doutrinador Guilherme Souza Nucci:

“Somente o Ministério Público, titular da ação penal, órgão para o qual se destina o inquérito policial, pode pedir o seu arquivamento, dando por encerradas as possibilidades de investigação. Não é atribuição da polícia judiciária dar por findo o seu trabalho, nem do juiz, como se pode ver na próxima nota, concluir pela inviabilidade do prosseguimento da colheita de provas. É possível, no entanto, que o representante do Ministério Público requeira o arquivamento, a ser determinado pelo magistrado, sem qualquer fundamento plausível. Ora, sendo a ação penal obrigatória, cabe a interferência do juiz, fazendo a remessa dos autos ao Procurador-Geral de Justiça para que, nos termos do art. 28 do Código de Processo Penal, possa dar a última palavra a respeito do caso. Por outro lado, caso as investigações sejam manifestamente infrutíferas e o promotor deseje prosseguir com o inquérito somente para prejudicar alguém, é possível a concessão de ordem de habeas corpus para trancar a investigação por falta de justa causa. Esta situação, no entanto, deve ser sempre excepcional.” (NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. 19. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 179.)

No mesmo sentido, é o entendimento jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal, senão vejamos:

ARQUIVAMENTO DE INQUÉRITO DE OFÍCIO, SEM OITIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO ACUSATÓRIO. DOUTRINA. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL CONHECIDO E PROVIDO. 1. O sistema processual penal acusatório, mormente na fase pré-processual, reclama deva ser o juiz apenas um “magistrado de garantias”, mercê da inércia que se exige do Judiciário enquanto ainda não formada a opinio delicti do Ministério Público. 2. A doutrina do tema é uníssona no sentido de que, verbis: “Um processo penal justo (ou seja, um due process of law processual penal), instrumento garantístico que é, deve promover a separação entre as funções de acusar, defender e julgar, como forma de respeito à condição humana do sujeito passivo, e este mandado de otimização é não só o fator que dá unidade aos princípios hierarquicamente inferiores do microssistema (contraditório, isonomia, imparcialidade, inércia), como também informa e vincula a interpretação das regras infraconstitucionais.” (BODART, Bruno Vinícius Da Rós. Inquérito Policial, Democracia e Constituição: Modificando Paradigmas. Revista eletrônica de direito processual, v. 3, p. 125-136, 2009). 3. Deveras, mesmo nos inquéritos relativos a autoridades com foro por prerrogativa de função, é do Ministério Público o mister de conduzir o procedimento preliminar, de modo a formar adequadamente o seu convencimento a respeito da autoria e materialidade do delito, atuando o Judiciário apenas quando provocado e limitando-se a coibir ilegalidades manifestas. Precedentes (RHC 96713, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 07/12/2010; HC 103725, Relator(a): Min. AYRES BRITTO, Segunda Turma, julgado em 14/12/2010; HC 106314, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 21/06/2011; RHC 100961, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 06/04/2010). 6. Agravo Regimental conhecido e provido.(STF – Inq: 2913 MT, Relator: Min. DIAS TOFOLI, Data de Julgamento: 01/03/2012, Tribunal Pleno, Data de Publicação: ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-121 DIVULG 20-06-2012 PUBLIC 21-06-2012).

É ainda a orientação jurisprudencial pátria:

ARQUIVAMENTO DE INQUÉRITO POLICIAL DE OFICIO PELO MAGISTRADO. INVIABILIDADE. INICIATIVA PARA PROPOR O ARQUIVAMENTO PERTENCE EXCLUSIVAMENTE AO MINISTÉRIO PÚBLICO ENQUANTO TITULAR DA AÇÃO...

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