Acórdão nº 12695982 Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 1ª Turma de Direito Penal, 06-02-2023

Data de Julgamento06 Fevereiro 2023
Classe processualCRIMINAL - APELAÇÃO CRIMINAL
Órgão1ª Turma de Direito Penal

APELAÇÃO CRIMINAL (417) - 0804413-51.2022.8.14.0401

APELANTE: FRANCIEL MESQUITA DOS SANTOS

APELADO: JUSTIÇA PUBLICA

RELATOR(A): Desembargadora VÂNIA LÚCIA CARVALHO DA SILVEIRA

EMENTA

APELAÇÃO PENAL. ART. 157, §2º-A, I, DO CPB. DESCLASSIFICAÇÃO PARA TENTATIVA. IMPOSSIBILIDADE. EFETIVA INVERSÃO DA POSSE. AFASTAMENTO DA CAUSA DE AUMENTO REFERENTE AO EMPREGO DE ARMA DE FOGO. ARTEFATO NÃO APREENDIDO. IRRELEVÂNCIA. ELEMENTOS DE PROVA SUFICIENTES A DEMONSTRAR SUA EFETIVA UTILIZAÇÃO. SÚMULA 14 DO TJE/PA. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. DECISÃO UNÂNIME.

1. O crime de roubo consuma-se com o mero apossamento da res por parte do agente, ou seja, no momento que a coisa subtraída sai da esfera de domínio de seu dono, mesmo que temporariamente, nada interferindo na consumação do crime a posterior recuperação do bem resultante da atuação da vítima ou de policiais.

2. A assertiva de que se faz necessária a apreensão da arma para a implementação da causa de aumento de pena a ela relativa é totalmente descabida, visto que é entendimento consolidado por este Egrégio Tribunal Estadual Justiça e por nossas Cortes Superiores o fato de que é dispensável a captação de tal artefato ou a realização de perícia para a caracterização da supracitada causa de aumento (prevista no art. 157, § 2º, inciso I, do CPB), quando existem, nos autos, outros elementos de prova que demonstrem sua efetiva utilização no crime.

3. Recurso conhecido e improvido. Decisão unânime.

Vistos, etc.

Acordam os Excelentíssimos Desembargadores componentes da 1ª Turma de Direito Penal, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso interposto e lhe negar provimento, nos termos do voto da Desembargadora Relatora.

Sessão do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, realizada no período de seis a treze do mês de fevereiro do ano de 2023.

Julgamento presidido pela Excelentíssima Senhora Desembargadora Rosi Maria Gomes de Farias.

Belém/PA, 06 de fevereiro de 2023.

Desembargadora VÂNIA LÚCIA SILVEIRA

Relatora

RELATÓRIO

Franciel Mesquita dos Santos interpôs recurso de apelação, irresignado com a sentença proferida pelo Juízo de Direito da 1ª Vara Criminal da Comarca de Belém/PA (ID 11075464), que o condenou às penas de 06 (seis) anos e 08 (oito) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial semiaberto, e de 16 (dezesseis) dias-multa, à razão de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente ao tempo da empreitada delitiva, como incurso no tipo penal inserto no art. 157, §2º-A, inciso I, do Código Penal Brasileiro.

Narra a prefacial acusatória (ID 11075411) que, no dia 16 de março 2022, por volta das 10h00min, a vítima RAPHAEL ALANDER SOARES DA SILVA, que trabalha como motoboy utilizando a motocicleta Honda CB250, havia acabado de realizar uma entrega na Av. Marquês de Herval, com a Trav. Angustura, no Bairro Pedreira, neste Município, e parou para verificar no celular se havia uma nova solicitação. Que, em tal momento, o ofendido foi abordado pelo recorrente, o qual exibiu uma arma de fogo que trazia na cintura, anunciou o assalto, e exigiu que ele lhe entregasse seu telefone celular, um Samsung A20, e a chave da motocicleta, no que foi atendido. Assevera, contudo, que, quando o apelante foi empreender fuga, a motocicleta falhou, oportunidade em que a vítima pulou em cima dele e conseguiu imobilizá-lo no chão. Ato seguinte, policiais militares chegaram ao local e efetuaram a prisão do acusado.

Em razões recursais (ID 11075473), pleiteia a defesa o reconhecimento do crime de roubo na sua modalidade tentada, em face da imediata recuperação da coisa subtraída pela vítima. Roga, ademais, pelo decote da majorante concernente ao emprego de arma de fogo, considerando a inexistência de laudo acerca do potencial lesivo do armamento.

Clama pelo conhecimento e provimento do recurso manejado.

Em contrarrazões (ID 11075476), manifesta-se o Parquet de 1º Grau pelo conhecimento e parcial provimento do esmero defensivo, apenas no tocante à exclusão do uso de arma de fogo, com a manutenção da sentença em seus demais termos.

Nesta Superior Instância, o Custos Iuris, representado pelo Procurador de Justiça Ricardo Albuquerque da Silva, pronuncia-se pelo conhecimento e improvimento do apelo manejado.

É o relatório.

À douta revisão, com intenção de inclusão em pauta da Sessão do Plenário Virtual.

VOTO

Atendidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

1. Do almejado reconhecimento do crime de roubo na sua modalidade tentada:

Reside a irresignação defensiva, inicialmente, no reconhecimento do crime de roubo na sua modalidade tentada, em face da imediata recuperação da coisa subtraída pela vítima.

Salienta que “conforme depreende-se da denúncia e do depoimento da vítima quando da sua oitiva em audiência de instrução e julgamento, o Apelante exigiu a entrega de seu aparelho celular e da chave da motocicleta, mas poucos segundos depois, por falha do veículo e ação da própria vítima, a posse foi frustrada e os bens reavidos.”

Tal tese, todavia, mostra-se absolutamente insubsistente, posto que o acervo probatório é robusto, não havendo qualquer elemento capaz de macular a certeza da consumação do crime de roubo perpetrado.

Observa-se, claramente, dos depoimentos colhidos ao longo da instrução criminal, que o recorrente, após o cometimento do roubo, com efetiva inversão da posse da res furtiva – aparelho celular e motocicleta da vítima - não logrou êxito na sua tentativa de fuga, em virtude da falha no veículo e da ação do ofendido que conseguiu imobilizá-lo no chão.

A vítima Raphael Alander Soares da Silva, declara em audiência de instrução:

“que estava fazendo entrega de uma compra pela Loja Americanas; em seguida, o réu o abordou, puxando uma arma de fogo, provavelmente um calibre 32, e anunciando o assalto; que o réu exigiu o aparelho celular e a chave da moto, e foi atendido; que teve dificuldade de ligar a moto e o depoente resolveu imobilizar o réu; que o depoente entregou o aparelho celular e a chave da moto; que travou luta corporal somente depois de observar que o réu não conseguiu ligar a moto; nesse momento, a arma de fogo do acusado caiu, e alguém que passava pela rua acionou os policiais militares, que logo chegaram e deram voz de prisão; que o aparelho celular foi recuperado; que a arma que o acusado usava era uma calibre 32 e estava municiada; que não sabe informar os detalhes da arma, mas avistou os policiais tirando a munição da arma; que teve poucas escoriações da luta corporal.” (trecho extraído da sentença)

A testemunha Sammy David do Nascimento Barros, Policial Militar que presenciou parte da empreitada criminosa, assim narra em juízo:

“que estavam em ronda pela Marquês, quando, ao chegarem em um sinal, avistaram o acusado levando a moto da vítima e esta iniciou luta corporal contra o réu, que foi imobilizado; que foram até o local para intervir; que a arma de fogo do réu caiu da cintura do réu no momento em que a vítima estava reagindo; que a vítima alegou que estava trabalhando quando foi abordado pela vítima, que resolveu reagir até o momento em que os policiais chegaram.” (trecho extraído da sentença)

Não destoa o depoimento da testemunha Charles Reimão Silva Barros, Policial Militar que também esteve presente na cena delituosa, quando narra:

“que estavam trafegando na Pedreira, quando na Marquês, avistaram a vítima e o acusado em luta corporal; que foram abordar os dois e a vítima informou que o réu estava assaltando e a arma utilizada estava no chão caída; que a arma era um revólver calibre 32; que a arma estava municiada com cinco ou seis munições, tendo sido o próprio depoente quem as retirou.” (trecho extraído da sentença)

O recorrente Franciel Mesquita dos Santos, em interrogatório judicial, afirma:

“que cometeu o assalto descrito; que estava passando por dificuldades; que está arrependido, pois já trabalhava há cinco anos em empresa; que cometeu o crime para pagar suas contas e alimentação; que a arma que utilizou era muito velha; que não reagiu na luta corporal com a vítima; que a arma era utilizada para a sua segurança pessoal e era do seu tio falecido.” (trecho extraído da sentença)

Assim, cumpriu o réu todas as fases do inter criminis, no caso: ação, nexo causal e resultado, sendo incabível, assim o reconhecimento de crime tentado, vez que houve a efetiva inversão da posse da res subtraída.

O crime de roubo consuma-se com o mero apossamento da res por parte do agente, ou seja, no momento que a coisa subtraída sai da esfera de domínio de seu dono, mesmo que temporariamente, nada interferindo na consumação do crime a posterior recuperação do bem resultante da atuação da vítima ou de policiais.

É desinfluente para a consumação do referido delito o fato de ter havido perseguição policial, ou não ter ocorrido a posse tranquila do bem. É ainda, prescindível que o objeto do crime saia da esfera de vigilância da vítima.

Na hipótese sub examine, quando o recorrente foi preso, há muito o crime de roubo já havia sido consumado, em virtude da efetiva inversão da posse da res.

No tocante à tese em voga, bem explana o Juízo sentenciante no decisum vergastado:

“Sobre o momento em que há a consumação do crime de roubo, importante destacar a Súmula 582 do STJ: ‘Consuma-se o crime de roubo com a inversão da posse do bem mediante emprego de violência ou grave ameaça, ainda que por breve tempo e em seguida à perseguição imediata ao agente e recuperação da coisa roubada, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada’. Dessa forma, contata-se que o roubo perpetrado pelo denunciado foi consumado, pois da vítima subtraiu o aparelho celular e a moto, mediante grave ameaça exercida por uma arma de fogo, tendo sido impedido imediatamente após a inversão da posse pela própria vítima, a qual, percebendo que o réu não conseguiu dar a partida na moto, reagiu, imobilizando o acusado e conseguindo reaver...

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