Acórdão nº 12774040 Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 1ª Turma de Direito Penal, 13-02-2023

Data de Julgamento13 Fevereiro 2023
Órgão1ª Turma de Direito Penal
Classe processualCRIMINAL - APELAÇÃO CRIMINAL

APELAÇÃO CRIMINAL (417) - 0000021-02.2020.8.14.0004

APELANTE: S. M. D. O. T.

APELADO: J. P.

RELATOR(A): Desembargadora MARIA EDWIGES DE MIRANDA LOBATO

EMENTA

APELAÇÃO PENAL. 217-A, CAPUT, C/C ART. 226, II, C/C ART. 71, TODOS DO CPB. PRELIMINARES. 1. DA AUSÊNCIA DOS DEPOIMENTOS DAS TESTEMUNHAS E DOS ACUSADOS. TESE REJEITADA. As mídias que a defesa faz menção, já estavam nos autos desde quando tramitavam fisicamente, sendo que, após, sua migração, foram acostadas aos autos de forma eletrônica, mais precisamente, nos ID’S 12043133 a 12043327, contando, assim, com mais de 100 mídias audiovisuais. 2. DA SENTENÇA QUE NÃO ABORDA OS FUNDAMENTOS DA DEFESA. DA FALTA DE REQUISITOS ESSENCIAIS DA SENTENÇA. NÃO ACOLHIMENTO. o magistrado não é obrigado a enfrentar todos os argumentos aventados pela defesa ao proferir decisão no processo, bastando que, pela motivação apresentada, seja possível aferir as razões pelas quais acolheu ou rejeitou as pretensões da parte, tendo em vista o art. 155 do CPP, que disserta sobre o livre convencimento motivado do julgador. MERITO. 1. DA ABSOLVIÇÃO E DA ATIPICIDADE DA CONDUTA POR AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE. INOCORRENCIA. PROVAS DE AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVA SUFICIENTES E COERENTES NOS AUTOS. PALAVRA DA VÍTIMA CONFIRMADA PELOS DEMAIS DEPOIMENTOS DOS AUTOS. Nos presentes autos restaram sobejamente demonstradas a autoria e materialidade dos fatos restaram comprovadas por meio das Cópias das Certidões de Nascimento das vítimas, que atestam que estas possuíam menos de 14 (catorze) anos de idade na data dos fatos (ID 6972595 - Pág. 10 e 6972595 - Pág. 18), pelo Laudo de Exame de Corpo de Delito (ID 6972595 Pág. 16 e ID 6972599 – Pág. 10), onde constam o desvirginamento das vítimas Priscila de Oliviera Toscano, de 08 anos de idade à época dos fatos, e Letícia de Oliveira Toscano, com 11 anos de idade à época dos fatos, bem como pelos depoimentos colhidos durante a instrução processual. 2. DA APLICAÇÃO DE ATENUANTE GENÉRICA. INSUBSISTENCIA. Observa-se dos autos que apesar do alerta das filhas de que estariam sendo vítimas de tal crime, a apelante nada fez para averiguar ou interromper estas práticas, sendo completamente omissa e faltosa com seu dever de proteger suas filhas, bem como quando confrontada, a mesma ainda bateu em suas filhas para defender o acusado, fato que afasta a aplicação da atenuante genérica. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos, acordam o Excelentíssimos Senhores Desembargadores integrantes da Seção Ordinária do Plenário Virtual da 1ª Turma de Direito Penal do E. Tribunal de Justiça do Estado do Pará, à unanimidade de votos, em conhecer do recurso da Defesa e negar provimento, em conformidade com o parecer ministerial.

Belém/PA (assinatura digital)

Desa. Maria Edwiges de Miranda Lobato - Relatora

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação penal interposto por SANDRA MARIA DE OLIVEIRA TOSCANO (ID 11385256), inconformada com a sentença prolatada pelo MM. Juízo de Direito da Vara Única de Almerim, que a condenou à pena de 16 (dezesseis) anos e 03 (três) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado, pela prática do crime previsto no artigo 217-A, caput, c/c art. 226, II, c/c art. 71, todos do CPB, conforme sentença de ID’s 6972588 - Págs. 1/12; 6972589 - Pág. 1/10.

Narra a inicial acusatória que o acusado LEOMAR BENÍCIO ALVES, companheiro da apelante SANDRA MARIA, teria praticado conjunção carnal e atos libidinosos, por diversas vezes, contra as menores Letícia Toscano Brito, de 11 (onze) anos de idade à época dos fatos, e Priscila Oliveira Toscano, de 08 (oito) anos de idade à época dos fatos, que são filhas da presente apelante.

Afirma a denúncia que SANDRA MARIA também foi acusada da prática do crime descrito no art. 217-A do CPB, tendo em vista que, com sua conduta omissiva, permitiu que a prática do crime se perpetuasse, conforme levantado durante as investigações.

Conforme foi apurado, os acusados eram companheiros e residiam juntos quando LEOMAR praticou diversos atos libidinosos e conjunção carnal com as menores.

Depreende-se dos autos que as crianças foram abusadas sexualmente pelo padrasto, por quase três anos e que, por não trabalhar, costumava passar o dia sozinho e trancado em casa com as duas meninas, enquanto a mãe destas, ora apelante, saia para trabalhar.

Foi evidenciado no curso das investigações que a testemunha MARIA HELENA DE OLIVEIRA TOSCANA, tia materna e vizinha das vítimas, relatou que a conduta de seu cunhado era estranha e causava desconfiança, pois na ausência de Sandra, o réu ficava trancado na residência com as duas crianças, não deixando ninguém entrar, sendo que ligava o som em volume muito alto.

Também foi descoberto, por meio do depoimento de JOSIANE DE OLIVEIRA TOSCANA, que também é tia das vítimas, que a menor LETÍCIA contou para a família que, há aproximadamente três anos, sofria abusos por parte de seu padrasto, porém, o caso não foi reportado para as autoridades policiais em razão do comportamento de SANDRA.

Segundo consta na exordial, a genitora das menores era questionada pelos familiares sobre os abusos, porém, defendia o companheiro e dizia que a família estava se intrometendo em sua vida.

Diante de tal situação, MARIA HELENA DE OLIVEIRA TOSCANO resolveu comunicar os fatos a seus irmãos, de forma que JOSIANE DE OLIVEIRA TOSCANO, que reside em Recife/PE, deslocou-se para Almerim com o objetivo de revelar as agressões vividas por suas sobrinhas.

Após chegar a Almerim, mais especificamente no dia 03/12/2019, JOSIANE passou a observar o comportamento de LETÍCIA e, ao ver que a criança não estava bem, pediu a esta que entrasse no banheiro, momento em que constatou a presença de hematomas nas partes íntimas da infante.

Ato contínuo, levou a menor para o quarto e, durante uma conversa, Letícia relatou que há muito tempo estava sendo abusada sexualmente por LEOMAR e que ele fazia penetrações na sua vagina e ânus.

Segundo conta JOSIANE, a vítima demonstrou muito medo e implorou para que a tia não contasse a ninguém, uma vez que o acusado LEOMAR havia ameaçado matar ela e sua mãe.

Além disso, afirmou que a menor disse ter sido abusada por LEOMAR naquele mesmo dia, ou seja, 03/12/2019, ocasião em que ele tocou em seus seios e em sua vagina, e, em troca do seu silêncio, foi oferecido dinheiro.

Em escuta especializada, a menor Letícia relatou que contou para sua mãe sobre os abusos que sofria por parte do padrasto. Todavia, sua genitora não acreditou e, segundo a criança, ainda sofreu agressões por parte da mãe, afirmando: “me deu muita porrada e o Leo falou, ela é uma mentirosa”.

Ainda durante a escuta, Letícia contou que seu padrasto Leo toca em suas partes íntimas com seu “saco”, colocando em sua vagina e em seu ânus, e que o mesmo pede para que ela não conte para ninguém, pois é um segredo deles, e que sempre que abusava da mesma dava um dinheiro para que ficasse calada.

Prossegue narrando a denúncia que, em relação à criança Priscila, também é possível verificar que o acusado Leomar abusou sexualmente desta, sendo que, da escuta especializada desta, extraiu-se que: “seu padrasto Leo toca em suas partes íntimas com seu saco colocando em sua vagina e que coloca também em sua boca, e fica gemendo puxando seu cabelo com força. O mesmo pede para que ela não conte para ninguém, pois é um segredo deles, que sempre abusava da mesma, dava dinheiro para que ficasse calada”.

A vítima Priscila também relatou que os abusos aconteceram sempre que a mãe saía ou estava dormindo, e que o padrasto a levava para dentro do banheiro, onde cometia o ato.

Por último, quanto aos crimes cometidos pela apelante, apurou-se que ela sabia das agressões sexuais sofridas pelas suas filhas e nada fez.

Não bastasse isso, bateu nas crianças e ignorou o sofrimento destas, incorrendo, assim nos mesmos crimes cometidos pelo acusado Leomar, em função de sua conduta omissiva.

Nas razões recursais, a defesa requereu, preliminarmente, a nulidade do processo em razão de não constar nos autos o depoimento das testemunhas e da apelante nos autos do PJE. Além disso, pugna a defesa pela nulidade do processo, tendo em vista que, a seu ver, a sentença condenatória não aborda de forma fundamentada os termos da defesa, não apresentando motivos concretos para condenação, até porque, conforme alega, a apelante não teve qualquer responsabilidade nos atos criminosos, nos termos do art. 13 do CPB. Porém, caso não sejam acolhidas as preliminares acima delineadas, suplica a defesa pela absolvição da apelante, com fulcro no art. 386, III e VII, do Código de Processo Penal, sob a alegação de que as provas carreadas aos autos não estão aptas a embasar a sentença condenatória. Além disso, acolhendo-se o pleito absolutório, requer a apelante a restituição do poder familiar de suas filhas vítimas de estupro. Alternativamente, pugnou pelo redimensionamento da pena para o mínimo legal, com a aplicação da atenuante genérica prevista no art. 66 do CPB.

Em contrarrazões (ID 12043131 - Pág. 1/11), o representante do Ministério Público em primeiro grau pugnou pelo não provimento do apelo, mantendo-se incólume a sentença vergastada.

Nesta Superior Instância, o Custos Legis, representado pelo Procurador de Justiça, Dr. HAMILTON NOGUEIRA SALAME, manifestou-se pelo desprovimento do presente Recurso (ID 12212348).

É o relatório.

A revisão.

VOTO

Presentes os pressupostos processuais subjetivos e objetivos, conheço do presente recurso interposto pela Defesa.

PRELIMINARES

1. DA AUSÊNCIA DOS DEPOIMENTOS DAS TESTEMUNHAS E DOS ACUSADOS

Analisando os presentes autos, temos que a preliminar em tela não merece ser acolhida, pois, as mídias que a defesa faz menção, já estavam nos autos desde quando tramitavam fisicamente, sendo que, após, sua migração, foram acostadas aos autos de forma eletrônica, mais precisamente, nos ID’S 12043133 a 12043327, contando, assim,...

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