Acórdão nº 1606168 Tribunal de Justiça do Estado do Pará, Tribunal Pleno, 01-04-2019

Data de Julgamento01 Abril 2019
Número do processo0004336-17.2013.8.14.0005
Data de publicação10 Abril 2019
Acordao Number1606168
Classe processualCÍVEL - RECURSO ESPECIAL
ÓrgãoTribunal Pleno

APELAÇÃO (198) - 0004336-17.2013.8.14.0005

APELANTE: WALDIANE TEIXEIRA DOS SANTOS

APELADO: NORTE ENERGIA S/A

RELATOR(A): Desembargadora MARIA DO CÉO MACIEL COUTINHO

EMENTA

EMENTA: AGRAVO INTERNO. DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU SEGUIMENTO À APELAÇÃO CÍVEL. AUSÊNCIA DE PROFLIGAÇÃO DA DECISÃO HOSTILIZADA. FALTA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA AOS FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. INOBSERVÃNCIA DO ART. 932, III, “IN FINE” C/C ART. 1.010, III CPC/15. PRELIMINARES DE INAPLICABILIDADE DO CPC/15 E DE FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO. REJEITADAS. REGRA EXISTENTE TANTO NA LEI NOVA QUANTO NA LEI REVOGADA. JULGADOS APLICÁVEIS AO CASO. MÉRITO: OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. EFEITO DEVOLUTIVO EM PROFUNDIDADE QUE NÃO PRESCINDE DO ÔNUS DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA DOS FUNDAMENTOS DE DECISÃO RECORRIDA. NEGATIVA DE EFEITO TRANSLATIVO AO APELO E FATO SUPERVENIENTE NÃO CARACTERIZADOS. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA COOPERAÇÃO. INOBSERVÂNCIA DE PRECEDENTE FIRMADO EM RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. NÃO CARACTERIZADO. “DISTINGUISHING”. AFASTAMENTO DA MULTA POR EMBARGOS DECLARATÓRIOS PROTELATÓRIOS. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO INTERNO CONHECIDO E DESPROVIDO. UNÂNIME.

RELATÓRIO

R E L A T Ó R I O

Vistos etc.

Trata-se de Agravo Interno interposto contra decisão monocrática que não conheceu do recurso de apelação por falta de regularidade formal, consistente na ausência de profligação, em razão de ofensa ao princípio da dialeticidade, nos termos do art. 932, III, in fine c/c art. 1.010, II do CPC/15.

Em suas razões recursais, pugna a parte recorrente pela reconsideração da decisão, eis que teria impugnado especificamente todos os fundamentos da sentença.

Argumenta que seria inaplicável o art. 932, III do CPC/15, uma vez que inexistia regra semelhante no CPC/73. Logo, se a apelação foi interposta na vigência do CPC/73, este deveria ser o diploma aplicado, por força do art. 14 do CPC/15.

Aduz ainda, alternativamente, que o princípio da dialeticidade deve ser interpretado a partir de um vetor teleológico de garantia da imparcialidade do julgador. Ademais, defende que a decisão monocrática agravada transforma a apelação em recurso de fundamentação vinculada, invocando o “princípio da fungibilidade da forma do fundamento” (CPC/15, art. 1.013, § 1º), conhecido pelo efeito devolutivo em profundidade.

Menciona que a decisão agravada apresenta precedentes do STJ inaplicáveis ao caso concreto, sendo nula por falta de fundamentação, nos termos do art. 489, § 1º, V do CPC/15.

Alega que o decisum atacado negou efeito translativo ao apelo, eis que foram suscitadas questões de ordem pública (CR/88, art. 5º, incs. XXXV, LIV, LV c/c art. 284 e 332 do CPC/73), conforme prevê o art. 933 do CPC/15.

Pontua que a decisão agravada e a sentença apelada contrariam jurisprudência do STJ firmada em recurso especial repetitivo (REsp n.º 1114398/PR, Rel. Min. Sidnei Beneti), no que tange à legitimidade ativa do pescador portador da carteira expedida pelo Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA).

Giza que demonstrou o interesse de agir, invocando o dever de cooperação (CPC/15, art. 6º). Ademais, suscita fato novo (CPC/15, art. 933), consistente na morte de mais de 16 toneladas de peixes por causa da hidrelétrica e na autuação da NORTE ENERGIA S/A pelo IBAMA.

Pugna pelo afastamento da multa por embargos declaratórios protelatórios aplicada pelo juízo de piso.

Por fim, requer o provimento do recurso, com a reconsideração da decisão monocrática, para o regular processamento do apelo.

Intimada, a empresa agravada apresentou contrarrazões pugnando pelo desprovimento do agravo interno.

Após redistribuição provocada pela Emenda Regimental n.º 05/2016-TJE/PA, coube-me a relatoria do feito.

É o relatório.

Passo a proferir voto.

VOTO

V O T O

A EXMA. DESA. MARIA DO CÉO MACIEL COUTINHO (RELATORA):

Presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço da insurgência.

Como referido no relatório, trata-se de agravo interno interposto contra decisão monocrática que não conheceu do recurso de apelação por ausência de impugnação específica dos fundamentos da sentença, violando o princípio da dialeticidade, nos termos do art. 932, III, in fine c/c art. 1.010, II do CPC/15.

NEGO PROVIMENTO AO RECURSO.

O ponto fulcral da questão é averiguar o acerto ou desacerto do decisum que concluiu que o ora agravante não se desincumbiu do ônus processual de impugnar especificamente os fundamentos da sentença no apelo.

À partida, adianto que não há falar em reconsideração do decisum, eis que observado o direito intertemporal e as regras de direito processual aplicáveis ao caso concreto.

Inicialmente, cabe referir que se tratam de recursos repetitivos oriundos de feitos conexos, os quais totalizam aproximadamente 1.600 (mil e seiscentos) recursos segundo consulta realizada no Sistema LIBRA.

In casu, as ações originárias que geraram os apelos e agora os agravos internos tirados contra as decisões monocráticas de lavra do então Relator Des. Luiz Gonzaga da Costa Neto, são ações individuais de indenização por danos materiais e morais causados à colônia de pescadores artesanais pela construção da Hidrelétrica de Belo Monte.

Pois bem.

A decisão agravada, cujo teor acompanhou o d. parecer ministerial, foi técnica e processualmente adequada, não merecendo nenhum reparo.

Explicitou o conteúdo jurídico do princípio da dialeticidade e demonstrou – inclusive com a transcrição de excertos do provimento jurisdicional –, a falta de impugnação específica dos fundamentos da sentença no apelo, autorizando o não conhecimento da insurgência, nos termos do art. 932, III do CPC/15.

No particular, a ratio decidendi adotada na sentença terminativa foi a de falta de condições da ação (legitimidade ativa e interesse de agir) e a circunstância inegável de que “da forma como proposta a demanda, o autor trouxe argumento de cunho coletivo a uma ação individual, desconsiderando a suposta ação da empresa recorrida, o nexo de causalidade e o dano suportado pelo recorrente, elementos sem os quais não há como se aferir minimamente a quantificação do que se pleiteia”.

Curioso notar que a recorrente pretende somente agora nesta via do Agravo Interno realizar o que não fez no apelo, isto é, impugnar especificamente os termos da sentença, num esforço dramático para buscar a anulação do decisum.

Ocorre que tal pretensão é incabível, eis que o sistema processual não admite a complementação das razões recursais.

Em todo caso, atenta à advertência contida no art. 1.021, § 3º do CPC/15, passo a analisar as teses erguidas no agravo interno.

1. DAS PRELIMINARES:

1.1. Da inaplicabilidade do art. 932, III do CPC/15:

Sustenta o agravante a inaplicabilidade do o art. 932, III do CPC/15, uma vez que inexistia regra semelhante no CPC/73. Logo, se a apelação foi interposta na vigência do CPC/73, este deveria ser o diploma aplicado, por força do art. 14 do CPC/15.

Todavia, a tese é totalmente descabida, senão vejamos.

Nos termos do art. 14, do CPC/2015, a norma processual não retroagirá, sendo respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada:

Art. 14. A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada.

Ocorre que diferentemente do que advogado, o requisito de regularidade formal exigido na decisão monocrática, qual seja, a chamada “profligação” da sentença, já era previsto no art. 514, II do CPC/73, o qual preconizava, in verbis:

Art. 514. A apelação, interposta por petição dirigida ao juiz, conterá:

I - OMISSIS;

II - os fundamentos de fato e de direito; (GRIFO NOSSO)

Nesse sentido, a remansosa jurisprudência que conduziu ao aprimoramento redacional do inciso III do art. 1.010 do CPC/15.

É ver:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. ENERGIA ELÉTRICA. EXECUÇÃO. MULTA DIÁRIA. TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL QUE FUNDAMENTA A PRESENTE EXECUÇÃO INEXIGÍVEL. EXTINÇÃO. RAZÕES RECURSAIS DISSOCIADAS DOS FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. AUSÊNCIA DE REGULARIDADE FORMAL. INTELIGÊNCIA DO ART. 514, INCISO II, DO CPC. 1. As razões de apelação não atacam os fundamentos da sentença hostilizada, carecendo da necessária regularidade formal, exigida pela norma do art. 514, inciso II, do Código de Processo civil. 2. Deixando a parte apelante de atacar o decidido na sentença que pretende reformar, abstendo-se, do mesmo modo, de impugnar os fundamentos que embasaram a extinção da execução, de rigor o não conhecimento do apelo. Precedentes. APELAÇÃO NÃO CONHECIDA. (Apelação Cível Nº 70065033458, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo Uhlein, Julgado em 30/03/2016)

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE REGISTRO EM BANCO DE INADIMPLENTES. RECURSO INEPTO. AUSÊNCIA DE PROFLIGAÇÃO DA SENTENÇA. ARTIGO 514, INCISO II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. Aplicando-se o artigo 514, inciso II, do Código de Processo Civil, conclui-se que é inepto o apelo, pois as razões não profligaram a sentença.” NÃO CONHECERAM DO RECURSO. (Apelação Cível Nº 70013257977, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Alzir Felippe Schmitz, Julgado em 13/12/2005).

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RAZÕES QUE NÃO IMPUGNAM, ESPECIFICAMENTE, OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO QUE NÃO ADMITIU O RECURSO ESPECIAL. ART. 544, § 4º, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E SÚMULA 182/STJ. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.

I. Incumbe ao agravante infirmar, especificamente, todos os fundamentos da decisão que inadmitiu o Recurso Especial, demonstrando o seu desacerto, de modo a justificar o processamento...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT