Acórdão nº 178.587 Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 3ª TURMA DE DIREITO PENAL, 27-07-2017

Data de Julgamento27 Julho 2017
Número do processo0000687-98.2008.8.14.0076
Acordao Number178.587
Órgão3ª TURMA DE DIREITO PENAL
Classe processualCRIMINAL - Apelação Criminal

ACÓRDÃO Nº

TJE/PA- TERCEIRA TURMA DE DIREITO PENAL

PROCESSO Nº 0000687-98.2008.8.14.0076

COMARCA DE ORIGEM: ACARÁ/PA

APELAÇÃO PENAL

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ

PROMOTOR DE JUSTIÇA: DIEGO LIBARDI RODRIGUES

APELADO: MARCOS FERREIRA DA SILVA

DEFENSORA DATIVA: LUANA MIRANDA – OAB/PA 14.143

PROCURADOR DE JUSTIÇA: LUIZ CESAR TAVARES BIBAS

RELATOR: DES. LEONAM GONDIM DA CRUZ JÚNIOR



EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL – CRIME DE DANO AO PATRIMÔNIO PÚBLICO – PRESO QUE DANIFICA A CELA PARA FUGIR – CONDUTA ATÍPICA – A DESTRUIÇÃO DO PATRIMÔNIO PÚBLICO (BURACO NA CELA) PELO PRESO QUE BUSCA FUGIR DO ESTABELECIMENTO NO QUAL ENCONTRA-SE ENCARCERADO NÃO CONFIGURA O DELITO DE DANO QUALIFICADO (ART. 163, PARÁGRAFO ÚNICO, INCISO III DO CP), PORQUE AUSENTE O DOLO ESPECÍFICO (ANIMUS NOCENDI), SENDO, POIS, ATÍPICA A CONDUTA. PRECEDENTES DO STJ. – APELO MINISTERIAL IMPROVIDO E REFORMA, DE OFÍCIO, DA SENTENÇA A QUO, PARA ABSOLVER O APELADO NA FORMA DO ART. 386, III DO CPP - UNÂNIME.

ACÓRDÃO


Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores componentes da Terceira Turma de Direito Penal, em conformidade com as notas taquigráficas, por unanimidade, em negar provimento ao apelo e, de ofício, reformar a sentença a quo para ABSOLVER o apelado na forma do art. 386, III do CPP, nos termos do voto do Desembargador Relator.


Sala das Sessões do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, aos vinte e sete dias do mês de julho do ano de dois mil e dezessete.


Julgamento presidido pelo Exmo. Sr. Des. MAIRTON MARQUES CARNEIRO.


Belém/PA, 27 de julho de 2017.




Des. LEONAM GONDIM DA CRUZ JÚNIOR

Relator


RELATÓRIO

O EXMO. SR. DES. LEONAM GONDIM DA CRUZ JÚNIOR – RELATÓRIO – O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ, por meio do Promotor de Justiça Diego Libardi Rodrigues, atuante na cidade de Acará, interpôs o presente recurso de Apelação Criminal em face da sentença do D. Juízo de Direito da Vara Única de Acará que, de ofício, extinguiu a punibilidade, pela prescrição da pena in abstrato, de MARCOS FERREIRA DA SILVA, denunciado nas sanções do art. 163, parágrafo único, III do CPC, conforme se extrai das fls. 57-58.

Consta da denúncia que na madrugada do dia 28.05.2008, por volta de 01:00 hora, no interior da Delegacia da cidade de Acará, o preso de justiça, sob acusação de tráfico de drogas, Marcos Ferreira da Silva, apelado neste recurso, teria serrado duas (02) barras de ferro, danificando os vergalhões da cela, para empreender fuga do local.

O fato foi noticiado pelos outros presos de justiça que permaneceram nas celas e o acusado, foragido, foi denunciado por crime de dano qualificado.

A materialidade do delito ficou demonstrada às fls. 11 e 23.

A denúncia foi recebida e, foragido o acusado, foi expedido o mandado de citação por edital, sem êxito, razão pela qual o D. Juízo de Direito da causa suspendeu o processo e o curso do prazo prescricional, na forma do art. 366 do CPP com redação da Lei nº 9.271/96, conforme se extrai da fl. 55.

Inesperadamente, o julgador às fls. 57-58, extinguiu a punibilidade do réu pela prescrição in abstrato, vez que o prazo prescricional é de 08 (oito) anos de reclusão e, desde a denúncia recebida em 08.09.2008, já havia se passado sete (07) anos, onze (11) meses e quatorze (14) dias até aquela data de 22.08.2016.

Inconformado, o dominus litis apelou pedindo, em síntese, a reforma da sentença a quo para prosseguimento da ação, vez que o processo e o prazo prescricional estavam suspensos por força do art. 366 do CPP e o lapso temporal do prazo de suspensão, por orientação jurisprudencial, é o prazo prescricional da pena in abstrato, no caso oito (08) anos, portanto, não havendo prescrição nos autos deve se dar prosseguimento à ação.

Ao final, pede o provimento do recurso.

Contrarrazões às fls. 71-77 pugnam preliminarmente pelo não conhecimento do apelo, por intempestividade e, no mérito, pela manutenção da sentença a quo.

A D. Procuradoria de Justiça opinou pelo provimento do recurso ministerial.

É o Relatório. Sem revisão – art. 610 do CPP.


VOTO

O EXMO. SR. DES. LEONAM GONDIM DA CRUZ JÚNIOR – RELATOR – O recurso de Apelação Criminal do MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ deve ser conhecido, porque tempestivo, vez que o representante ministerial tomou ciência da sentença a quo no dia 30.08.2016 (fl. 58) e interpôs o recurso no dia seguinte, em 31.08.2016 (fl. 59).

Pelo que se extrai dos autos, não vislumbro razão ao recorrente, não em relação à questão processual, mas quanto a natureza do crime e suas circunstâncias, senão vejamos:

Em verdade se fosse uma outra causa, envolvendo outra situação do crime, estaria o apelante com a razão porque realmente o D. Juízo sentenciante não observou que o curso do processo e o prazo prescricional estavam suspensos por força de sua decisão de fl. 55, tanto que não mencionou em sua decisão objeto deste recurso.

Todavia, desponta dos autos um obstáculo que põe fim a todo o debate e, sendo assim, a denúncia nem deveria ter sido oferecida e muito menos recebida, porque verificando as circunstâncias pelas quais ocorreram os fatos, retira do acusado o dolo de sua conduta, afinal ele não quis, por vontade deliberada, causar o dano ao patrimônio público, mas o fez com a intenção de sua fuga. A única intenção não era de causar o dano de propósito para atingir algo ou alguém, mas porque era necessário para sua fuga da prisão.

Em que pese a comprovação da materialidade do delito relativa à ocorrência de dano ao patrimônio público, resultante da conduta do réu, não está demonstrado nos autos o dolo específico de destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia, indispensável à caracterização do delito em análise.

A matéria está consolidada no Superior Tribunal de Justiça, no mesmo sentido, conforme abaixo transcrevo alguns precedentes:

HABEAS CORPUS. PRESO QUE SERRA AS GRADES DA CELA NA TENTATIVA DE FUGA. CRIME DE DANO. NÃO CONFIGURAÇÃO. INEXISTÊNCIA DO ANIMUS NOCENDI. 1. Para a configuração do crime de dano, inserto no artigo 163 do Código Penal, faz-se imprescindível a vontade deliberada de causar prejuízo patrimonial ao dono da coisa (animus nocendi). 2. Não comete crime de dano o preso que destrói as grades da cela movido por exclusivo instinto de fuga. 3. Ordem concedida para absolver o paciente da condenação pelo artigo 163 do Código Penal. (STJ - HC 20.518/SP, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, SEXTA TURMA, Pub. no DJ de 17/02/2003). Negritado.


Os mais recentes daquele sodalício:

HABEAS CORPUS. (...). DANO QUALIFICADO. PATRIMÔNIO PÚBLICO. BURACO NA PAREDE DA CELA. FUGA DE PRESO. DOLO ESPECÍFICO (ANIMUS NOCENDI). AUSÊNCIA. AÇÃO PENAL. FALTA DE JUSTA CAUSA. TRANCAMENTO. ILEGALIDADE PATENTE RECONHECIDA. NÃO CONHECIMENTO. CONCESSÃO DA ORDEM EX OFFICIO. (...). 2. Segundo entendimento desta Corte, a destruição de patrimônio público (buraco na cela) pelo preso que busca fugir do estabelecimento no qual encontra-se encarcerado não configura o delito de dano qualificado (art. 163, parágrafo único, inciso III do CP), porque ausente o dolo específico (animus nocendi), sendo, pois, atípica...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT