Acórdão nº 179.131 Tribunal de Justiça do Estado do Pará, SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO, 18-07-2017

Data de Julgamento18 Julho 2017
Número do processo0013881-24.2016.8.14.0000
Acordao Number179.131
ÓrgãoSEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO
Classe processualCÍVEL - Mandado de Segurança Infância e Juventude Cível


Acórdão n.º

Processo n° 0013881-24.2016.814.0000

Secretaria da Seção de Direito Público

Mandado de Segurança

Impetrante: Marlene Ribeiro Caldas

Advogada: Francistela Torres Caldas (OAB/PA nº 7.840)

Autoridade Coatora: Secretário de Estado de Saúde Pública

Litisconsorte Passivo: Estado do Pará

Procuradora do Estado: Mayra Guedes Paiva (OAB/PA 11.146)

Autoridade Coatora: Presidente do Instituto de Assistência dos Servidores do Estado do Pará - IASEP

Procuradora Autárquica: Alessandra Leão B dos Santos (OAB/PA 14.079)

Procuradora de Justiça: Mariza Machado da Silva Lima

Relator: Des. Roberto Gonçalves de Moura


EMENTA: CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. ATO OMISSIVO. INTERNAÇÃO EM UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA - UTI. ALEGAÇÃO DE PERDA DE OBJETO DA AÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. REJEITADA. RESPONSABILIDADE DO ESTADO. ORDEM CONCEDIDA. Decisão Unânime.

1. Não há que se falar em perda de objeto do “mandamus”, se o pedido não diz respeito apenas ao procedimento de internação em Unidade de Terapia Intensiva já realizado, mas também a todo o suporte clínico necessário pós-internação, até a plena recuperação da paciente.

2. Outrossim, improcede a alegação de ilegitimidade passiva, dado que a saúde é responsabilidade do Estado que, em seu sentido amplo, compreende todos os entes federados (União, Estados e Municípios, além do Distrito Federal), não havendo que se falar, portanto, em fatiamento de atribuições quando se trata dessa garantia constitucional.

3. Sendo a saúde um direito constitucionalmente garantido é dever do Estado assegurar os meios necessários para garanti-la efetivamente a todo cidadão brasileiro, ainda mais se desprovido de recursos financeiros. Comprovada a gravidade do estado de saúde da paciente e a perspectiva plausível de dano irreparável, a demora na realização do tratamento necessário configura ato omissivo da autoridade coatora passível de correção por ação mandamental.

4. Ordem concedida.

Acórdão

Vistos, etc.

Acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores componentes da Seção de Direito Público deste Egrégio Tribunal de Justiça, por unanimidade de votos, em conhecer do MANDADO DE SEGURANÇA e conceder a segurança pleiteada, tudo nos termos do voto do Desembargador Relator.

Julgamento presidido pela Exma. Sra. Desa. Luzia Nadja Guimaraes Nascimento.

Belém/PA, 18 de julho de 2017.


Desembargador ROBERTO GONÇALVES DE MOURA,

Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. DES. ROBERTO GONÇALVES DE MOURA (RELATOR):

Tratam os autos de MANDADO DE SEGURANÇA, com pedido de liminar, impetrado por MARLENE RIBEIRO CALDAS em face do ato omissivo do SECRETARIO DE SAÚDE DO ESTADO DO PARÁ e PRESIDENTE DO INSTITUTO DE ASSISTÊNCIA DOS SERVIDORES NO ESTADO DO PARÁ.

Sustenta a impetrante, em suma, que se encontra internada em estado gravíssimo no Hospital São José, na cidade de Castanhal/PA, apresentando quadro de insuficiência respiratória, hipotensão e respirando com auxílio de aparelhos.

Alega que solicitou à gerência administrativa de leitos do PAS, no dia 12 de novembro de 2016, e reiterado diversas vezes durante o mesmo dia, sua transferência em uma UTI móvel para internamento na UTI de um dos hospitais conveniados ao PAS na capital do Estado, face a gravidade do seu quadro de saúde, contudo até o presente momento não logrou êxito em seu requerimento.

Afirma estarem presentes os requisitos do fumus boni iuris, ante a incontestável necessidade para realização do tratamento adequado e periculum in mora em razão do sério agravamento do seu estado de saúde.

Requer, ao final, a concessão de liminar, inaudita altera pars, para que os Impetrados forneçam, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, o transporte em UTI móvel e internação da impetrante em Unidade de Terapia Intensiva – UTI em um dos hospitais da Capital. No mérito, pleiteia a confirmação em definitivo da liminar.

Requer, ainda, que lhe seja deferido os benefícios da justiça gratuita.

Juntou os documentos de fls. 11/19.

O feito foi impetrado em sede de Plantão Judiciário do Segundo Grau, tendo a Exma. Sra. Desa. Filomena Buarque concedido a liminar pleiteada, deferindo os benefícios da justiça gratuita (fls. 21/22), sendo, após, os autos distribuídos à Desa. Gleide Moura (fl. 26).

O Instituto de Assistência dos Servidores do Estado do Pará – IASEP, apresentou informações à fl. 30, dando conta do cumprimento da liminar desde o dia 15/11/2016, com a transferência da paciente do Hospital São José (Castanhal) para o Hospital Saúde da Mulher (Belém), em UTI móvel, pelo que requer a extinção do processo, com fulcro no art. 485, VI e §3º do CPC, face a perda do seu objeto.

Juntou documentos de fls. 31/33.

O Secretário de Saúde Estadual, por sua vez, apresentou informações às fls. 37/40, sustentando, em suma, a ilegitimidade passiva do Estado do Pará e a extinção do processo sem resolução de mérito, face a impetrante ser beneficiária do PAS, sendo, portanto, do IASEP a obrigação de prestar os serviços materiais de saúde.

Manifestação do Estado do Pará, às fls. 41/42, ratificando os termos das informações prestadas pelo Secretário de Saúde do Estado.

Foram os autos redistribuídos à minha relatoria, em atenção à Emenda Regimental nº 05 (fls. 45/46).

Instado a se manifestar na qualidade de custus legis, o representante do Parquet opinou pelo conhecimento e pela concessão da segurança (fls. 52/54).

É o relatório, síntese do necessário.


VOTO

O EXMO. SR. DES. ROBERTO GONÇALVES DE MOURA (RELATOR):


Presentes as condições da ação, conheço da inicial mandamental, pelo que passo a análise do mérito.


PRELIMINAR DE PERDA DO OBJETO:


Quanto à preliminar de perda do objeto alegada pelos Impetrados, esclareço que o pedido contido na peça mandamental não se refere, apenas, em transferência da impetrante através de UTI móvel para Hospital Especializado com internação em UTI, mas, também, para todo o suporte clínico necessário pós-internação, até a plena recuperação da paciente.

Diante disso, afasto a preliminar de perda do objeto, não havendo que se falar, portanto, em extinção do processo sem resolução de mérito.


PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO DO PARÁ E DO SECRETÁRIO DE ESTADO DE SAÚDE PÚBLICA.


Tal preliminar não merece guarida na medida em que a saúde é responsabilidade do Estado que, em seu sentido amplo, compreende todos entes federados (União, Estado e Municípios, além do Distrito Federal), não havendo falar em fatiamento de atribuições quando se trata da prestação dessa garantia constitucional.

Portanto, rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pelo Estado do Pará e seu Secretário de Saúde.


MÉRITO

Todos os argumentos trazidos à baila pelas autoridades coatoras que prestaram as informações requeridas, em sede meritória, têm como ponto central a atuação do Sistema Único de Saúde, cujas políticas de funcionamento, com amparo na Lei n° 8.080/90 e demais normas infraconstitucionais, limitariam a amplitude que vem sendo dada ao art. 196 da Constituição Federal.

Referem-se também aos limites orçamentários e estruturais e ao princípio da igualdade, todos com o escopo de desvirtuar o direito líquido e certo da interessada, que entendem não existir.

Ocorre que, como bem prevê o art. 196 da CF:

A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem a redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.”

Interpretando a norma constitucional, Alexandre de Morais1 traçou entendimento no sentido de que “o direito à vida e à saúde, entre outros, aparecem como consequência imediata da consagração da dignidade da pessoa humana como fundamento da República Federativa do Brasil. Esse fundamento afasta a ideia de predomínio das concepções transpessoalistas de Estado e Nação, em detrimento da liberdade individual.

Tem-se, desta forma, pela própria disposição literal referida, que o Estado, em sua ampla acepção (incluindo aí a União, Estado, Distrito Federal e Municípios), tem o dever constitucional de fornecer às pessoas os tratamentos necessários à sua sobrevivência e melhoria de qualidade de vida, por se tratar de serviço de relevância pública, fazendo com que toda a argumentação trazida pelos impetrados, como os limites orçamentários, ofensa ao princípio da igualdade e da universalidade do acesso à saúde, caiam por terra diante do amparo constitucional dispensado à questão ora sob exame, conforme se pode auferir da leitura do voto proferido pelo Ministro Celso de Mello, decano de nossa mais alta Corte, a seguir...

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