Acórdão nº 200918 Tribunal de Justiça do Estado do Pará, Seção de Direito Penal, 02-10-2017

Data de Julgamento02 Outubro 2017
Número do processo0800517-15.2017.8.14.0000
Data de publicação03 Outubro 2017
Número Acordão200918
Classe processualCRIMINAL - HABEAS CORPUS CRIMINAL
ÓrgãoSeção de Direito Penal

HABEAS CORPUS (307) - 0800517-15.2017.8.14.0000

PACIENTE: REGINALDO DA ROCHA CAMPOS

AUTORIDADE COATORA: JUIZ DE DIREITO DA 2ª VARA CRIMINAL DE SANTAREM

RELATOR(A): Desembargador RONALDO MARQUES VALLE

EMENTA

HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO. DELITOS DE ATENTADO CONTRA A SEGURANÇA DE SERVIÇO DE UTILIDADE PÚBLICA. PECULATO. INSERÇÃO DE DADOS FALSOS EM SISTEMAS DE INFORMAÇÕES. ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. AUSÊNCIA DE REQUISITOS AUTORIZADORES DA PRISÃO PREVENTIVA. INOCORRÊNCIA. PLEITO ALTERNATIVO DE RECOLHIMENTO EM CELA ESPECIAL DO BATALHÃO DE POLÍCIA. POSSIBILIDADE.

1. O fato de a denúncia ter sido recebida não pode levar a conclusão de que o paciente não iria continuar perpetrando atos ilícitos ou tentativos de influenciar testemunhas e depoimentos a serem colhidos perante o magistrado de origem – como o fez durante as investigações policiais, daí porque não se pode deixar de entender como concreto o risco a instrução e a aplicação da lei penal caso o paciente seja posto em liberdade.

2. Os tipos penais imputados ao paciente – art. 265, 288, 299, 312, 313, 313-A, e os fatos possivelmente praticados (violação a ordem de atendimento na rede de saúde pública), reforçados pelo amplo acervo probatório existente, bem como a reiteração das condutas mesmo com as investigações em curso, como destacado pelas informações prestadas, deixa claro que, se posto em liberdade, o paciente atentaria contra a ordem pública.

3. Observo que o paciente, de fato, ostenta o direito de permanecer preso no 3º Batalhão da Polícia Militar, uma vez que possui curso superior, sendo militar, sem apresentar eminente ameaça de fuga, de modo a ser dispensável a presença de agentes da SUSIPE, uma vez que ficará sob a guarda do referido batalhão – e que, sendo uma parte da estrutura militar local naturalmente ostenta efetivo necessário para preservar a carceragem do detento.

4. Ordem denegada quanto ao pleito de ser revogada a prisão preventiva decretada, porém concedida quanto ao pleito alternativo de recolhimento em estabelecimento militar de Santarém.

RELATÓRIO

Trata-se da ordem de habeas corpus liberatório, com pedido de liminar, impetrado em favor de Reginaldo da Rocha Campos, objetivando sanar suposto constrangimento ilegal supostamente cometido pelo MM. Juízo de Direito da 2ª Vara Penal da Comarca de Santarém, que decretou a prisão preventiva na data de 10 de julho de 2017, por ter o paciente praticado condutas que, em tese, se amoldam ao tipo penal abstrato dos artigos 32, 317 e 288 c/c o art. 71 do Código Penal.

Informa que o decreto preventivo que restringiu a liberdade do paciente teve como esteio os argumentos de que a medida seria necessária para garantir a ordem pública e a conveniência da instrução criminal, contudo, pontua que as investigações findaram-se, tendo sido ouvidos todos os envolvidos, seja como testemunha seja como acusados – tendo inclusive já ocorrido a oferta e o recebimento da denúncia, bem como que o crime imputado ao paciente é desprovido de violência ou grave ameaça, concluindo que tais fatores levam a conclusão de que os motivos que ensejaram o recolhimento do paciente ao cárcere inexistem.

Pautado em tais argumentos, requereu a revogação da prisão preventiva do apelante em caráter liminar, bem como sua posterior confirmação ao final da demanda.

Em caráter subsidiário, pretendeu que fosse deferida sua transferência para o 3º Batalhão de Polícia de Santarém – uma vez que o paciente é militar e faria jus a uma cela especial, retirando-o do Centro de Triagem de Santarém.

O feito me veio distribuído em 12 de setembro de 2017, oportunidade em que deferi o pleito alternativo do paciente, determinando sua imediata transferência para o 3º Batalhão de Polícia de Santarém, indeferindo o pleito principal e determinei que a autoridade coatora prestasse informações acerca da demanda.

O magistrado a quo prestou as seguintes informações:

- O paciente/acusado foi denunciado pelo Ministério Público pela prática do crime Atentado conta a Segurança de Serviço de Utilidade Pública (art. 265 CP), Peculato, por mais de 10 vezes (art. 312 CP), Falsidade Ideológica (art. 299 CP), Inserção de Dados Falsos em Sistemas de Informação (art. 313-A), Associação Criminosa (art. 288 - CP) com mais 12 pessoas os quais atuavam no setor de regulação do serviço de saúde pública; Associação Criminosa (art. 288 - CP) com mais 21 pessoas os quais atuavam ilicitamente no desvio de recursos públicos, concernente a contratação de servidores fantasmas.

- A investigação detalhou que o projeto criminoso funcionava assim: cidadãos procuravam o vereador solicitando o agendamento de consultas ou exames na rede de saúde pública no município ou do Estado. Reginaldo Campos solicitava que Sarah Campinas atendesse aos pedidos. Esta {Sarah Campinas), por sua vez, entrava em contato com os servidores públicos lotados no setor de regulação da SESPA, os quais tem, entre outras atribuições, a responsabilidade de agendar consultas e exames no Hospital Regional do Baixo Amazonas.

- As averiguações, foram além, identificando, que supostamente, servidores da Câmara percebiam remuneração sem praticar efetivamente os trabalhos, ou seja, que havia funcionários fantasmas lotados na câmara municipal de Santarém.

- Com relação aos funcionários fantasmas, a investigação da Polícia é no sentido de que Reginaldo Campos, supostamente orientava sua comparsa, Sarah Campinas, em como deveria proceder, ao ser ouvida pela Policia Civil.

- Trouxe a lume, também, que, aparentemente, o denunciado iria orientar como os registros de frequência de Sarah Campinas seriam preenchidos, demonstrando assim o claro propósito de falsificar documentos para mascarar a verdade sobre os fatos, qual seja que Sarah Campinas também, era servidora fantasma da Câmara Municipal de Santarém.

- Com a terceira fase das investigações, foram colhidos vários depoimentos e recebidas respostas de requisições, bem como as interceptações revelaram que alguns investigados vinham tentando a toda sorte, interferir indevidamente para burlar as investigações e que as práticas delitivas continuavam acontecendo.

- A investigação prosseguiu, com diligências encetadas pela Polícia Civil, incluindo o Núcleo de Apoio à Investigação da Polícia Civil (NAI - W), resultando no relatório de fls.23/49, e, por conseguinte, na instauração de servidores sem a correspondente prestação de serviço público/Câmara de Vereadores.

- Ademais, o relatório da Polícia Civil e Denúncia do Ministério Público, indicam que o paciente seria o líder de várias organizações criminosas que tinham como objetivo desviar valores públicos, notadamente da Câmara dos Vereadores e da Setor de Regulação da SESPA.

- Que tendo em vista as circunstâncias acima expostas de que a ordem pública está sendo diuturnamente abalada com a atuação das diversas associações criminosas apontadas ao logo da representação.

- Identificou-se associação criminosa voltada a fraudar o agendamento de consultas e exames, dando prioridade aos apadrinhados políticos, tornando os serviços de saúde ainda mais escassos no município, em detrimento das demais pessoas que se encontram na fila de espera e que não se valem de meios escusos para burlar tal fila. A atuação da citada associação desvirtua o serviço público, causando ainda ma/s prejuízos à prestação de serviços de saúde, prejuízo este suportado pelos mais desprovidos de recursos financeiros na sociedade, os quais dependem desses serviços.

- Ademais, importa ressaltar, na medida em que diversas pessoas vão a óbito enquanto aguardam tratamento de saúde, a burla ao sistema, perpetrada pelos próprios servidores da regulação, reveste-se de natureza criminosa gravíssima, uma vez que se utilizam do sistema para beneficiar certas e determinadas pessoas, apontadas pelo políticos locais, ou até mesmo em benefício de amigos ou parentes.

- Da mesma forma, a associação criminosa voltada ao enriquecimento ilícito, na inclusão e manutenção de servidores fantasmas no âmbito da Câmara Municipal de Santarém, com patente dilapidação do patrimônio público em proveito próprio ou alheio, considerando que todos os meses são auferidas vantagens indevidas, em continuidade delitiva, também possui o condão de abalar a ordem pública, pela gravidade in concreto da conduta, consistente na vultosa quantia em dinheiro desviada todos os meses, bem como pela reiteração delitiva, uma vez que, mesmo depois das investigações, os representados continuam se apropriando dos recursos públicos, em claro dano ao erário.

- A periculosidade in concreto da conduta de Reginaldo Campos e Sarah Campinas, de acordo com a Polícia, é ainda mais evidente, uma vez que, em virtude dos demais crimes praticados, se utilizam da função pública e prestígios decorrentes, para induzir conclusões equivocadas sobre os fatos em apuração.

- Vejo necessidade de esclarecer, que há fortes indícios de que o denunciado chefiava duas organizações criminosas. A primeira voltada a burlar o sistema de regulação do SUS, na qual utilizavam o setor de regulação daquela instituição como forma de fortalecer o eleitorado do vereador, ora paciente, bem como para favorecer parentes, amigos e pessoas escolhidas ao seu alvedrio.

- A segunda funcionava no âmbito da câmara de vereadores de Santarém, na qual o referido parlamentar utilizava recursos públicos oriundos da câmara dos vereadores, para realizar contratações de servidores sem que estes efetuassem a contraprestação necessária, muito embora recebendo os salários. Em vários casos, ficou identificado que parte dos salários recebidos pelos servidores fantasmas, era repassado ao parlamentar, ora coacto.

- Ademais, durante as investigações restou demonstrado, que o paciente orientava as testemunhas a falsearem a verdade, bem como tentou usar de meios escusos, como valer-se de autoridade e políticos, para tentar frenar a investigação/instrução.

- Logo, há fortes indicativos de que o paciente liderava...

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