Acórdão Nº 2015.200134-7 do Segunda Turma de Recursos - Blumenau, 12-04-2016

Número do processo2015.200134-7
Data12 Abril 2016
Tribunal de OrigemGaspar
Classe processualRecurso Inominado
Tipo de documentoAcórdão




Recurso Inominado n.º 2015.200134-7, de Gaspar (2ª Vara)


Relatora: Juíza Cíntia Gonçalves Costi


AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DESCONTOS EFETUADOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO RECEBIDO PELA PARTE AUTORA JUNTO AO INSS. SUSTENTADA INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA ENTRE AS PARTES. RÉU QUE TRAZ AOS AUTOS CONTRATO SUPOSTAMENTE ASSINADO PELA PARTE AUTORA. DOCUMENTO QUE, EM TESE, REVELA A EXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA RECHAÇADA NA INICIAL. INCONSISTÊNCIAS ENTRE O VALOR SUPOSTAMENTE MUTUADO E O NÚMERO DE PARCELAS RESPECTIVAS QUE PERMITEM CONCLUIR, CONTUDO, NÃO SE TRATAR DA MESMA RELAÇÃO JURÍDICA IMPUGNADA NA INICIAL. DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO QUE SE AFIGURA MEDIDA IMPOSITIVA. Não tendo a instituição financeira comprovado que a contratação de empréstimo pessoal foi realizada pela pessoa do autor e, diante da evidência de que o negócio foi efetivado por terceira pessoa mediante fraude, a declaração de inexistência e inexigibilidade do débito é medida que se impõe. (TJSC, Apelação Cível n. 2014.070057-4, de Blumenau, rel. Des. Saul Steil, j. 24-02-2015). DANOS MATERIAIS REPETIÇÃO DO INDÉBITO DOS VALORES INDEVIDAMENTE DESCONTADOS, APLICAÇÃO DA DOBRA PREVISTA NO ART. 42 PARÁGRAFO ÚNICO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE MÁ-FÉ DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. AFASTAMENTO. REPETIÇÃO AUTORIZADA NA FORMA SIMPLES. Interpretando o disposto no art. 42, parágrafo único, do CDC, as Turmas que compõem a Primeira Seção do STJ firmaram orientação no sentido de que o engano, na cobrança indevida, só é justificável quando não decorrer de dolo (má-fé) ou culpa na conduta do fornecedor do serviço (REsp 1.079.064/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 20.4.2009). Nesse sentido, com efeito, Incomprovada a má-fé da instituição financeira, a devolução do débito ao seu cliente deve ser efetivada de forma simples. Majora-se o valor dos honorários advocatícios quando fixados em patamar que não condiz com a natureza da causa, o trabalho realizado pelo causídico e o tempo exigido para sua realização. (TJSC, Apelação Cível n. 2011.063604-3, da Capital - Continente, rel. Des. Monteiro Rocha, j. 13-09-2012). DESCONTOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO RELATIVOS A EMPRÉSTIMO NÃO CONTRATADO. DANO MORAL IN RE IPSA. DEVER DE INDENIZAR CARACTERIZADO. Nos termos do entendimento jurisprudencial e doutrinário consolidado, o desconto indevido de parcelas não autorizadas pelo correntista é fonte de danos de ordem moral, ultrapassando os limites do mero dissabor, porquanto, ainda que não tenha sido seu nome inscrito em órgãos protetivos do crédito, a dedução de valores não contratados de conta bancária gera para o cliente transtornos que fogem à normalidade, tornando-se a instituição financeira responsável pela reparação de tais danos (Apelação Cível n. 2015.001958-6, de Braço do Norte. Relator: Des. Trindade dos Santos).


Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Inominado n.2015.200134-7, da comarca de Gaspar, em que é/são Apelante Banco Itaú BMG Consignado S/A,e Apelado: Maria de Oliveira:


I - RELATÓRIO


Trata-se de ação declaratória de inexistência de débito c/c repetição do indébito e indenização por danos morais interposta por Maria de Oliveira, em face de Banco Itaú BMG Consignado S/A, em que a autora alegou, em síntese, que teve descontadas em seu benefício previdenciário, parcelas relativas a empréstimo consignado efetuado junto a parte ré, do qual desconhece a contratação.


Requereu, por consequência, a declaração de inexistência de quaisquer débitos entre as partes, a repetição do indébito dos valores indevidamente descontados, bem como a condenação da parte ré ao pagamento de indenização pelos danos morais decorrentes da realização dos aludidos descontos.


Deferida antecipação de tutela para cessação imediata dos descontos efetuados (fls. 32-33).


A parte ré apresentou contestação às fls. 43-45 sustentando, em síntese, serem regulares a inscrição e o débito que a ensejou.


Sustentou, em preliminar, a incompetência do Juizado Especial Cível ante a necessidade de realização de perícia.


Houve réplica.


Após, foi proferida sentença julgando procedentes em parte os pedidos da autora, declarando a inexistência de débito e condenando a parte ré ao pagamento de indenização por danos morais no montante correspondente a R$ 10.000,00, determinando a repetição do indébito dos valores indevidamente descontados autorizando, contudo, a compensação em relação aos valores disponibilizados pela parte ré junto a conta corrente da parte autora.


Irresignada, a parte ré ofertou recurso inominado às fls. 101/106, postulando pela decretação de improcedência dos pedidos iniciais.


Apresentadas contrarrazões às fls. 114-121.


É o relato.


II - VOTO


Trata-se de Recurso Inominado interposto por Banco Itaú BMG Consignado S/A que incorformado com o pronunciamento de mérito de fls. 90-98, postula pela decretação da improcedência dos pedidos iniciais.


O recurso ofertado comporta conhecimento, porquanto interposto a tempo e modo, tendo sido efetuado o preparo e recolhidas as custas respectivas (fls. 107-108).


O recurso, adianto, não merece ser provido.


Com efeito, andou bem o MM. Juiz prolator da decisão de primeiro grau em julgar procedentes em parte os pedidos iniciais.


Relativamente a aventada incompetência do Juizado Especial para o julgamento da causa, anoto que é de ser afastada.


Em que pese a parte recorrida ter carreado aos autos documento que supostamente materialize a relação jurídica impugnada na inicial cabe verificar que tal fato, por si só, não autoriza o reconhecimento da necessidade de produção de prova pericial para o deslinde do caso que ora se analisa.


Ademais, as inúmeras inconsistências existentes entre os valores supostamente disponibilizados a parte recorrida e os valores trazidos no contrato carreado aos autos permitem concluir, com segurança, versarem sobre relações jurídicas distintas.


Nesse sentido, com efeito, concluiu o magistrado prolator da decisão de primeiro grau:


A consignação no benefício previdenciário da parte autora decorreu de suposto contrato n.º 2315320132 (fl. 27), firmado em março de 2013 (fl. 77). O instrumento contratual juntado pela parte ré (fls. 77-79) dá conta da emissão de cédula de crédito bancário no valor de R$ 2.387,57, pagável em 58 parcelas mensais de R$ 74,54 consignadas nos proventos de aposentadoria, no interregno de 07/05/2013 a 07/02/2018, à taxa de juros efetiva de 2,19% ao mês. Ademais, menciona o desembolso total de R$ 4.323,32 e o valor líquido a liberar no banco 104, agência 1073, conta-corrente 45902-2, de R$ 474,47.


Entretanto, o conjunto probatório indicia não ter sido o negócio jurídico entabulado pela parte autora, mas sim por terceiro de posse de sua documentação.


Com efeito, não é crível que alguém contratasse mútuo feneratício com instituição financeira, comprometendo-se a pagar à última a importância total de R$ 4.323,32, consignada a prazo em folha de pagamento, por contraprestação consistente em depósito em conta bancária própria de apenas R$ 474,47. É dizer, quem pagaria, no prazo de 58 meses, um valor futuro dez vezes maior que o valor inicial emprestado! Ademais, qual a razão de o valor principal contratado ser de R$ 2.387,57 e o valor liberado ser tão somente R$ 474,47?


Não bastassem essas inconsistências, não esclarecidas pela parte ré, a firma constante da Cédula de Crédito Bancário (fl. 79), apresenta traços que ictu oculi denotam não ter sido assinada pela parte autora. Comparando-a com aquelas lançadas nos documentos de fls. 22-23, nota-se total dessemelhança nas letras e traços. Ademais, o valor mensal do consignado representa mais de 10% da renda bruta da parte autora, que consiste em benefício previdenciário no valor de um salário mínimo (fl. 25).


O encadeamento coerente e harmônico desses elementos, associado à inércia da parte ré em trazer no momento oportuno os documentos (comprovante de residência, carteira de identidade etc) que embasaram o negócio jurídico, reforça a conclusão de que não houve manifestação de vontade da parte autora.


E mais adiante ao abordar a questão relativa a aventada necessidade de produção de prova pericial, concluiu:


Muito embora se pudesse cogitar da realização de perícia grafotécnica para o reconhecimento da autenticidade da assinatura, as peculiaridades do caso concreto deixam entrever dois inconvenientes a tal mister. Um de ordem procedimental, pois a realização de perícia imporia a adequação do procedimento (ordinário) e o deslocamento da competência para a Vara Cível Comum. Outro de ordem pragmática.


No ponto, é de se destacar a formulação de pedido genérico de produção de provas na peça defensiva. Fosse de seu interesse a realização da prova pericial, além de formular pedido especifico, a parte ré teria juntado no momento oportuno a via original da Cédula de Crédito Bancário n.º 2315320132 em seu poder (documento esse indispensável à operacionalização do exame).


Converter o julgamento em diligência nesse momento processual, mais que gerar inconveniente procedimental, procrastinaria a resolução da demanda em prestígio à inércia da parte ré, que deixou de providenciar na oportunidade processual adequado os documentos que dariam suporte à sua defesa.


É sabido que o juiz é o destinatário das provas e, para a decisão lidima e justa, cabe ao magistrado, em consonância com o regramento inserto no art. 130 do Código de Processo Civil, ordenar a realização daquelas relevantes e imprescindíveis ao deslinde da quaestio iuris.


Nada obstante, a prova pericial seria reservada para revelar a autenticidade da assinatura na insuficiência da prova documental para o convencimento do magistrado. Não é isso que ocorre aqui, pois como dito acima os elementos são harmônicos e coerentes ao indicar a inidoneidade do instrumento do negócio jurídico. (fl...

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