Acórdão Nº 2015.702245-6 do Sétima Turma de Recursos - Itajaí, 24-10-2016

Número do processo2015.702245-6
Data24 Outubro 2016
Tribunal de OrigemItapema
Classe processualRecurso Inominado
Tipo de documentoAcórdão


ESTADO DE SANTA CATARINA


PODER JUDICIÁRIO


SÉTIMA TURMA DE RECURSOS


Recurso Inominado n.º 2015.702245-6

Sétima Turma de Recursos (Itajaí)


Origem: 2ª Vara Cível da Comarca de Itapema


Relatora: Juíza Alaíde Maria Nolli

Recorrente: Josefina Palacios


Recorrido: Condomínio Edifício Solar Heidelberg


Juíza Prolatora da Sentença: Andréia Régis Vaz


RECURSO INOMINADO - AÇÃO DE COBRANÇA TAXAS CONDOMINIAIS - PARCELAS ORDINÁRIAS DEVIDAS POR SER A RECORRENTE PROPRIETÁRIA DA UNIDADE GERADORA DA DESPESA - TAXA DE LOCAÇÃO DE TEMPORADA EXIGIDA SEM A COMPROVAÇÃO DE EVENTUAL PREJUÍZO CAUSADO AO CONDOMÍNIO - ABUSIVIDADE - NULIDADE RECONHECIDA ANTE A AFRONTA AO DIREITO DE PROPRIEDADE GARANTIDO PELOS ARTIGOS 5º, XXII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1.228 DO CÓDIGO CIVIL E 19 DA LEI N.º 4.591/64 - COBRANÇA DE MULTAS POR INFRAÇÃO À CONVENÇÃO CONDOMINIAL NÃO ANALISADA EM PRIMEIRO GRAU - PLEITO MADURO PARA JULGAMENTO POR ESTA CASA RECURSAL - INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 1.013, § 3º, III, DO CPC/2015 - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO FATO GERADOR E DA DEVIDA NOTIFICAÇÃO DA CONDÔMINA - CONDENAÇÃO AFASTADA - PEDIDO CONTRAPOSTO - DEVOLUÇÃO DOBRADA - INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO DE CONSUMO - PLEITO ANALISADO COM BASE NO ARTIGO 940 DO CÓDIGO CIVIL - INEXISTÊNCIA DE PROVA DE DOLO OU MÁ-FÉ - IMPROCEDÊNCIA MANTIDA COM ALTERAÇÃO NA FUNDAMENTAÇÃO APRESENTADA - RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO - SENTENÇA MODIFICADA.


Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Inominado n.º 2015.702245-6, da 2ª Vara Cível da Comarca de Itapema/SC, em que é Recorrente Josefina Palacios e Recorrido Condominio Edifício Solar Heidelberg.


I - RELATÓRIO


Dispensado o relatório, de acordo com o art. 46 da Lei n.º 9.099/95, artigo 63, §1º, do Regimento Interno das Turmas de Recursos Cíveis e Criminais dos Juizados Especiais do Estado de Santa Catarina e do Enunciado nº 92 do Fórum Nacional de Juizados Especiais - FONAJE.


II - VOTO


Trata-se de ação de cobrança de valores devidos ao condomínio.


Inconformada com a decisão que julgou procedente o pedido exordial, a requerida interpôs recurso inominado argumentando que a "taxa de locação de verão" constante na planilha de débito juntada aos autos é ilegal, pois, além de ferir diretamente o direito de propriedade, não há previsão para a sua exigência na convenção registrada e válida do condomínio.


Menciona que a cobrança de multas impostas por infração à convenção condominial igualmente se afigura ilegal, porquanto não há descrição das infrações supostamente cometidas, o que impossibilita o exercício do direito de defesa.


Por fim, pugna pela reforma da decisão de primeiro grau, com a consequente improcedência dos pedidos iniciais, bem como que seja reconhecida a litigância de má-fé, condenando-se o condomínio recorrido à devolução dobrada dos valores indevidamente cobrados, na forma dos artigos 940 do Código Civil e 42 do Código de Defesa do Consumidor.


Em contrarrazões, o condomínio recorrido assevera que a norma condominial que prevê a cobrança da taxa de locação de verão foi aprovada em Assembleia Geral Ordinária, prevista em convenção e ratificada em nova Assembleia Geral Ordinária posteriormente.


Alega que a referida taxa não se remete ao direito de propriedade, tendo sido instituída em razão de o número de pessoas desconhecidas com acesso às áreas comuns do edifício aumentar significativamente com as locações, o que exige maior atenção com a segurança dos demais condôminos.


Aduz que, a multa imposta à unidade da recorrente era referente à colocação de placa de publicidade na fachada, porém, na data de 08 de março de 2014 (após a propositura da demanda), os condôminos reunidos em Assembleia Geral Ordinária deliberaram e decidiram pela exclusão da citada penalidade, o que foi comunicado na impugnação apresentada aos autos, não sendo necessária nova discussão sobre o assunto.


Alega que não há cobrança indevida capaz de justificar a devolução dobrada, tampouco qualquer fato que caracterize litigância de má-fé, pleiteando, ao final, a manutenção da sentença de primeiro grau.


O recurso merece parcial provimento.


A planilha atualizada de débito acostada aos autos, fl. 20, descreve valores decorrentes de "taxa de locação de verão", "taxa condominial" e "multa por infração à convenção", os quais serão analisados separadamente.


Inicialmente, no que concerne à taxa cobrada da recorrente em razão da locação de seu imóvel na temporada de verão, importante destacar que a Constituição Federal, em seu artigo 5º, caput, e inciso XXII, garante a todos a inviolabilidade do direito à propriedade:


Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:


(...)


XXII - é garantido o direito de propriedade;


(...).


O artigo 1.228, caput, do Código Civil estabelece que "o proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa (...)", o que é corroborado pelo artigo 19 da Lei que dispõe sobre o condomínio em edificações (n.º 4.591/64), o qual prevê que "cada condômino tem o direito de usar e fruir, com exclusividade, de sua unidade autônoma, segundo suas conveniências e interesses, condicionados, umas e outros às normas de boa vizinhança, (...)".


Além disso, a Lei n.º 8.245/91, que disciplina acerca das locações, prevê a possibilidade de locação para temporada, conforme artigo 48, a seguir transcrito:


Art. 48. Considera-se locação para temporada aquela destinada à residência temporária do locatário, para prática de lazer, realização de cursos, tratamento de saúde, feitura de obras em seu imóvel, e outros fatos que decorrem tão-somente de determinado tempo, e contratada por prazo não superior a noventa dias, esteja ou não mobiliado o imóvel.


Portanto, conclui-se que a locação de apartamento para a temporada é legalmente prevista, tratando-se de direito do proprietário, desde que os locatários respeitem as normas de boa vizinhança e as regras de convivência do condomínio.


No caso em tela, o condomínio recorrido afirma que a movimentação de pessoas estranhas no edifício interfere na segurança dos demais condôminos, havendo, muitas vezes, a necessidade de troca das chaves de acesso. Porém, não há nos autos a comprovação de nenhuma despesa suportada pelo recorrido em decorrência de alguma locação de temporada efetuada pela recorrente.


Também não há comprovação de que algum locatário da unidade condominial da recorrente tenha desrespeitado alguma norma condominial, não podendo o condomínio exigir taxa baseada em suposto prejuízo não demonstrado, porquanto tal ato caracterizaria o seu enriquecimento ilícito.


Importante destacar que, ainda que regule as relações entre os condôminos, a convenção condominial deve guardar consonância com o direito posto, não possuindo o condão de se sobrepor à Lei.


Neste norte, independentemente de previsão na convenção condominial, a cobrança de taxa de locação de verão sem a comprovação de eventual prejuízo por ela gerado é manifestamente ilegal e abusiva, na medida em que limita o direito à propriedade e causa enriquecimento ilícito do condomínio, afrontando a legislação pátria vigente.


Nesse sentido, colhe-se da jurisprudência:


AÇÃO DE COBRANÇA. CONDOMÍNIO. TAXA DE LOCAÇÃO DE TEMPORADA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO INICIAL E PARCIAL PROCEDÊNCIA DO PEDIDO CONTRAPOSTO. RECURSO DE AMBAS AS PARTES.(...). 2. APELAÇÃO CÍVEL MANEJADA PELO CONDOMÍNIO/AUTOR. 2.1 NULIDADE DE DECISÃO QUE APRECIOU EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. INOCORRÊNCIA. DECISÃO QUE NÃO ALTEROU A SENTENÇA IMPUGNADA.2.2 TAXA DE LOCAÇÃO DE TEMPORADA. ILEGALIDADE E ABUSIVIDADE. TAXA CRIADA COM O ESPECÍFICO PROPÓSITO DE SER UMA "MEDIDA DE PREVENÇÃO PARA LOCAÇÕES DE TEMPORADA". AFRONTA AO DIREITO À PROPRIEDADE. POSSIBILIDADE DE LOCAÇÃO DO IMÓVEL PARA TEMPORADA. EXPRESSA PREVISÃO NA LEI DE LOCAÇÃO. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE USO INDEVIDO DO IMÓVEL. NÃO ESPECIFICAÇÃO DE CONDUTAS INDEVIDAS PELOS LOCATÁRIOS. COBRANÇA ANTECIPADA POR EVENTUAIS DANOS SUPORTADOS QUE CONSTITUI ENRIQUECIMENTO ILÍCITO DO CONDOMÍNIO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJPR. Apelação Cível n.º 1.319.302-5, da Comarca de Matinhos. Órgão Julgador: 8ª Câmara Cível. Rel.: Guilherme Freire de Barros Teixeira. Data da decisão: 12.03.2015).


Tocante à multa por infração à convenção condominial, tal matéria não restou abordada em primeiro grau, nem mesmo após a interposição de embargos de declaração pela ora...

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