Acórdão Nº 2018.900071-0 do Conselho da Magistratura, 14-08-2019

Número do processo2018.900071-0
Data14 Agosto 2019
Tribunal de OrigemLebon Régis
Classe processualRecurso Administrativo
Tipo de documentoAcórdão




Recurso Administrativo n. 2018.900071-0, de Lebon Régis


Relator: Des. Roberto Lucas Pacheco


RECURSO ADMINISTRATIVO. SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA. REGISTRO DE IMÓVEIS DE LEBON RÉGIS. INSTRUMENTO PARTICULAR DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL RURAL LEVADO A REGISTRO. EXIGÊNCIAS PARA A REALIZAÇÃO DO ATO. INSATISFAÇÃO DA SUSCITADA. PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. RECURSO DA SUSCITADA.


COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. REGISTRO DO TÍTULO. DIREITO REAL. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 462, 463 E 1.225, TODOS DO CÓDIGO CIVIL. EXIGÊNCIAS FEITAS PELO OFICIAL REGISTRADOR EM OBSERVÂNCIA ÀS REGRAS E AOS PRINCÍPIOS RELATIVOS AO DIREITO IMOBILIÁRIO.


RECURSO ADMINISTRATIVO NÃO PROVIDO.


Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Administrativo n. 2018.900071-0, da comarca de Lebon Régis, em que é recorrente Malda Empreendimentos e Participações Ltda e recorrido Oficial de Registro de Imóveis de Lebon Régis:


O Conselho da Magistratura decidiu, por votação unânime, negar provimento ao recurso.


O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Rodrigo Collaço e dele participaram os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Carlos Adilson Silva, Altamiro de Oliveira, Júlio César Knoll, Denise de Souza Luiz Francoski, Artur Jenichen Filho, Luiz Neri Oliveira de Souza, Antônio Zoldan da Veiga, Moacyr de Moraes Lima Filho e Henry Petry Júnior.


Funcionou como representante do Ministério Público o Excelentíssimo Senhor Procurador de Justiça Mário Luiz de Melo.


Florianópolis, 12 de agosto de 2019.


Roberto Lucas Pacheco


Relator




RELATÓRIO


Na comarca de Lebon Régis, o Oficial do Registro de Imóveis ingressou com suscitação de dúvida (autuada sob o n. 0000666-97.2014.8.24.0088 - autos eletrônicos), na forma do art. 198 e seguintes da Lei n. 6.015/73, em virtude da discordância por parte da apelante em relação às exigências efetuadas para o registro de instrumento particular de compromisso de compra e venda de imóvel rural (págs. 1 a 3).


A recorrente impugnou as exigências do delegatário alegando, em síntese, que "as exigências são pertinentes em caso de transferência definitiva da propriedade, mas não são em relação à averbação de compromisso de compra e venda". Ainda, sustentou que "o registro do Compromisso de Compra e Venda à margem das matrículas dos imóveis tem por objetivo único e exclusivo dar publicidade a terceiros da existência de um negócio preliminar envolvendo aqueles bens". Por fim, aduziu que "negar o direito de averbação do compromisso à margem das matrículas, e ou submetê-lo às exigências próprias da escritura definitiva constitui medida que atenta contra o princípio da transparência dos atos jurídicos". Dessa forma, postulou a improcedência da suscitação de dúvida, a fim de que seja registrado o referido instrumento particular (págs. 49 a 53).


A magistrada a quo, depois da manifestação do órgão ministerial no sentido de dar parcial procedência aos pedidos deduzidos pelo Oficial de Registro (págs. 54 e 55), julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na suscitação de dúvida, reconhecendo a necessidade do cumprimento das exigências formuladas pelo recorrido, com exceção dos itens 1, 3 e 11 (págs. 56 a 64).


Não resignada, a suscitada interpôs recurso de apelação. Em suas razões recursais reiterou todos os argumentos anteriormente expendidos, requerendo, ao final, a reforma do decisum, a fim de que o documento seja registrado sem a necessidade de cumprimento das exigências (págs. 69 a 77).


O recurso foi recebido no duplo efeito (pág. 81) e os autos ascenderam a esta Corte de Justiça, sendo distribuído ao Des. Vanderlei Romer, integrante da Terceira Câmara de Direito Público (pág. 5 dos autos físicos).


Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Guido Feuser, que opinou pelo não provimento do recurso (págs. 7 a 11 dos autos físicos).


Por decisão monocrática terminativa, o Des. Vanderlei Romer determinou a redistribuição dos autos a uma das Câmaras de Direito Civil (págs. 13 a 14 dos autos físicos).


Realizada a redistribuição (pág. 15 dos autos físicos), o Des. Sebastião César Evangelista determinou a intimação das partes para se manifestarem quanto a eventual prejudicialidade de algumas das exigências diante da verificação da morte de Clementino Dias dos Santos (um dos compromitentes vendedores), ocorrida ainda antes da sentença (págs. 16-v.).


Diante disso, a apelante reiterou o seu interesse recursal, nos termos de págs. 22 a 24.


Na sequência, a Segunda Câmara de Direito Civil, em decisão unânime, não conheceu do recurso e determinou a redistribuição dos autos ao Conselho da Magistratura (pág. 33 dos autos físicos).


Por fim, determinou-se a intimação do Oficial de Registro para, querendo, apresentar contrarrazões (pág. 41 dos autos físicos), o que foi atendido, tendo aquele manifestado pela manutenção de todas as exigências, exceto a de apresentação de Alvará Judicial para representação do condômino interditado Clementino Dias dos Santos (págs. 43 a 44).


Os autos retornaram à Procuradoria-Geral de Justiça, tendo o Exmo. Sr. Dr. Paulo Cezar Ramos de Oliveira reiterado a manifestação de págs. 7 a 11, acrescentando que, embora verificada a morte de Clementino, subsiste o interesse no prosseguimento e enfrentamento do mérito da questão, visto que o espólio sub-roga-se nos direitos e obrigações (págs. 48 a 51 dos autos físicos).


É o relatório.




VOTO


Inicialmente, menciona-se que a análise da questão posta à apreciação foi realizada com consulta ao Sistema de Automação do Judiciário (SAJ), visto que o processo originário (Suscitação de dúvida n. 0000666-97.2014.8.24.0088, oriundo da comarca de Lebon Régis) é digital, sendo desnecessária a juntada de cópia.


Adentrando no mérito, depreende-se que a apelante levou a registro um instrumento particular de compromisso de compra e venda de imóvel rural, tendo o Oficial Registrador expedido nota devolutiva com 11 exigências para a realização do ato, ao que aquela não concordou e solicitou que fosse suscitada dúvida.


No julgamento do referido procedimento de suscitação de dúvida, a magistrada a quo entendeu pertinentes oito exigências feitas pelo registrador, razão pela qual a apelante interpôs o presente recurso.


Primeiramente, cabe destacar que o título apresentado para registro - instrumento particular de compromisso de compra e venda de imóvel rural - é uma modalidade de contrato preliminar, assim conceituado:


Uma avença através da qual as partes criam em favor de uma ou mais delas a faculdade de exigir o cumprimento de um contrato apenas projetado. Trata-se, portanto, de um negócio jurídico que tem por objeto a obrigação de fazer um contrato definitivo.


O exemplo mais comum desse tipo de promessa é a de compra e venda (promessa de compra e venda), a qual, quando devidamente registrada no Cartório de Imóveis, produz eficácia real, facultando ao promitente comprador, se for necessário, recorrer à ação de adjudicação compulsória para a concretização do seu direito (STOLZE, Pablo Gagliano; e PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Manual de Direito Civil. Volume único. São Paulo: Saraiva, 2017. pág. 440).


No Código Civil, vem disposto da seguinte forma:


Art. 462. O contrato preliminar, exceto quanto à forma, deve conter todos os requisitos essenciais ao contrato a ser celebrado.


Art. 463. Concluído o contrato preliminar, com observância do disposto no artigo antecedente, e desde que dele não conste cláusula de arrependimento, qualquer das partes terá o direito de exigir a celebração do definitivo, assinando prazo à outra para que o efetive.


Parágrafo único. O contrato preliminar deverá ser levado ao registro competente.


Acerca do tema, tem-se a lição de Elpídio Donizetti e Felipe Quintella:


Nos termos do art. 462, o contrato preliminar deve conter os mesmos elementos essenciais do contrato definitivo, exceto quanto à forma. Isso porque o contrato promissório é consensual. No entanto, a lei recomenda que o contrato seja levado a registro (art. 463, parágrafo único), o que é imperioso em se tratando de promessa de compra e venda, porquanto somente com o registro surge o direito real de aquisição (art. 1.225, VII) (Curso Didático de Direito Civil. 6.ª ed., rev. e atual., São Paulo: Atlas, 2017. p. 483).


A propósito, veja-se o disposto no Código Civil:


Art. 1.225. São direitos reais:


[...]


VII - o direito do promitente comprador do imóvel;


[...]


Art. 1.417. Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel.


Art. 1.418. O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do promitente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do imóvel.


É conveniente, ainda, mencionar:


Com o advento do atual CC, houve significativa alteração no tratamento legislativo concedido ao contrato de Compromisso de Compra e Venda, a começar por sua inserção no rol dos sacramentados e exaustivos direitos reais, presentes no art. 1.225 da legislação, fazendo gerar para seu titular um direito real denominado expressamente de direito do promitente comprador do imóvel (inciso VII)" (CLÁPIS, Alexandre Laizo. Lei de registros públicos comentada. Coordenação: José Manuel de Arruda Alvim Neto, Alexandre Laizo Clápis, Everaldo Augusto Cambler. Rio de Janeiro: Forense, 2014. pág. 578).


Em outras palavras, se não registrado no Cartório de Registro de Imóveis, o contrato de promessa/compromisso de compra e venda gerará apenas direito obrigacional, e não direito real de aquisição, oponível erga omnes.


Nesse sentido, colaciona-se julgado do Superior...

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