Acórdão nº 2734144 Tribunal de Justiça do Estado do Pará, Tribunal Pleno, 03-02-2020

Data de Julgamento03 Fevereiro 2020
Número do processo0005137-84.2014.8.14.0008
Data de publicação07 Abril 2020
Acordao Number2734144
Classe processualCÍVEL - RECURSO ESPECIAL
ÓrgãoTribunal Pleno

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0005137-84.2014.8.14.0008

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO PARA

APELADO: IMERYS RIO CAPIM CAULIM S.A.

RELATOR(A): Desembargadora ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA

EMENTA

PROCESSO N°: 0005137-84.2014.8.14.0008

RECURSO: APELAÇÃO CÍVEL

ÓRGÃO JULGADOR: 1ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO PARA

PROMOTOR: LAERCIO GUILHERMINO DE ABREU

APELADO: IMERYS RIO CAPIM CAULIM S.A.

ADVOGADO: LAERCIO CARDOSO SALES NETO- OAB/PA 17426

RELATORA: DESA. ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL CAUSADO AO MEIO AMBIENTE. FUNDAMENTAÇÃO: LEI Nº 9.605/98. VAZAMENTO DE CAULIM. SUFICIÊNCIA PROBATÓRIA ACERCA DA OCORRÊNCIA DO DANO AMBIENTAL. DANO PRESUMIDO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. REPARAÇÃO. DANO NÃO OCORRIDO NOS MOLDES DA INICIAL. DILIGÊNCIA DA EMPRESA PARA MINIMIZAR OS IMPACTOS. VALOR DA INDENIZAÇÃO DEVE SER ARBITRADO EM LIQUIDAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

I- Cinge-se a controvérsia recursal acerca da existência ou não de dano ao meio ambiente provocado pelo vazamento de caulim, motivado por uma fissura em um dos minerodutos da empresa apelada.

II- A Sentença de mérito julgou improcedente a ação, em razão de não ter sido provado pelo Ministério Púbico a ocorrência de dano ambiental.

III- O dano ambiental é presumido e a responsabilidade é objetiva. Basta o nexo de causalidade entre a lesão ao meio ambiente e a conduta do agente para surgir o dever de indenizar/reparar, independentemente da existência de culpa.

IV- Cabe ressaltar como funciona o processamento do caulim: De acordo com o relatório de fiscalização da Secretaria de Estado do Meio Ambiente, o produto é extraído da mina em Ipixuna-PA, até a unidade fabril, por meio de mineroduto com 158 km de extensão. A empresa possui 5 bacias de rejeitos para o processo de beneficiamento de caulim. O efluente gerado após passar pelos processos de clarificação e correção do PH, vira essencialmente água sendo transportados até o rio. Nesse processamento, houve uma fissura em uma das canalizações subterrâneas de saída da polpa de caulim já beneficiada no vazamento de aproximadamente 3000L de polpa. Este material atravessou a rua de piçarra que fica ao lado da bacia de contenção localizada próximo ao bairro industrial, escorrendo pela sua base por toda sua extensão (aproximadamente 400 metros) e sendo contida por escavação emergencial que acumulou o material, impedindo que o material alcançasse a vegetação e o igarapé Curuperê.

V- No presente caso, o juízo a quo julgou improcedente a ação, fundamentada na ausência de provas da ocorrência do dano ambiental. No entanto, o dano ambiental foi devidamente comprovado através dos documentos produzidos pelos órgãos de proteção ambiental, tais como: relatório de fiscalização ambiental n° 020/2009- secretaria municipal de meio ambiente – SEMMAB; relatório de fiscalização n° 109/2009- GERAD – secretaria de estado do meio ambiente – SEMA; e laudo pericial n° 079/09- centro de perícias científicas Renato Chaves.

VI- Depreende-se dos documentos juntados, que restam dúvidas acerca da ocorrência do dano ambiental e da obrigação em indenizar pelo dano causado. No entanto, o valor de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais) não é proporcional nem razoável, visto que embora haja o dano ambiental, é necessário considerar que a sua extensão é menor do que a mencionada pelo Ministério Público na Ação Civil Pública e é necessário levar em consideração a diligência da empresa apelada em minimizar o impacto ambiental.

VII- No entanto, diante da impossibilidade desta magistrada em averiguar o valor do dano causado, proceda-se a condenação em liquidação de sentença, nos termos do art. 509, II do CPC/15.

VII- Recurso conhecido e provido para reformar a sentença recorrida, no sentido de que haja a condenação pelo dano ambiental. Diante da impossibilidade de averiguar o valor do dano causado, proceda-se a condenação em liquidação de sentença, nos termos do art. 509, II do CPC/15.

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de APELAÇÃO CÍVEL interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, inconformado com a sentença proferida pelo MM. Juízo de Direito da 2° Vara Cível de Barcarena (id n° 891864), que nos autos da Ação Civil Pública, julgou improcedente o pedido inicial.

Historiando os fatos, o Parquet ajuizou Ação Civil Pública, relatando que na madrugada do dia 02 de maio de ano de 2009, houve o vazamento de aproximadamente três mil litros de caulim, motivado por uma fissura em um dos minerodutos que ficam na área da planto de beneficiamento da Empresa Requerida.

Contou que membros da comunidade foram os primeiros a perceberem a ocorrência do referido vazamento de caulim, que se espalhou pelo solo, por mais de 400m (quatrocentos metros) e se misturou com águas pluviais.

Narrou que os órgãos de proteção ambiental foram avisados e fizeram seus respectivos laudos e investigações. Ressaltou os resultados da perícia técnica da Secretaria Municipal de Meio Ambiente do Município de Borcoreno (SEMMAB) e do Laudo Pericial n° 079/2009, do Centro de Periciais Científicas "Renato Chaves”, os quais constataram uma efetiva poluição ambiental e até o risco de poluição dos águas de lençóis freáticos.

Assim, ajuizou a ação e requereu a condenação da Empresa Requerida a pagar indenização, por danos materiais, no valor sugerido de R$ 2.000.000,00 (Dois milhões de reais), ou outro apurado em liquidação de sentença, pelos prejuízos causados ao solo e outros possíveis donos a bens ambientais, decorrentes do vazamento de caulim.

O feito seguiu seu regular processamento, até a prolação da sentença de id n° 891864, que julgou improcedente a ação, nos seguintes termos:

“O Ministério Público no conseguiu demonstrar qualquer perda ou prejuízo sofrido pela comunidade ou meio ambiente (rios, solos, etc), no havendo que se falar em dano ambiental.

Em contrapartida, dos autos se extrai que a atividade exercida pela empresa requerida apresenta riscos e que se a empresa no for eficiente na prevenço de danos, estes podem vir a ocorrer a qualquer momento.

Em face disso, precisamos de um Ministério Público forte e atuante, que efetivamente fiscalize as atividades da empresa a fim de coibir os riscos e, consequentemente, os danos ambientais.

Diante do exposto, julgo IMPROCEDENTE o pleito do autor, com base nos fundamentos supra e, por conseguinte, resolvo o mérito do processo, com base art. 487, I do Código de Processo Civil.”

Inconformado, o Ministério Público interpôs recurso de apelação (id n° 891865).

Em suas razões, aponta que ao contrário do que restou lançado na sentença recorrida, de que não há que se falar em dano ambiental, as provas carreadas aos autos apontam claramente que houve dano ambiental.

Ressalta diversos documentos que comprovam a existência do dano mencionado, tais como o laudo pericial n° 079/2009 do Centro de Perícias Renato Chaves, o qual afirma a ocorrência do dano ambiental, especialmente no solo, onde, inclusive, os peritos transcrevem relato do próprio representante da empresa requerida, que confirma o vazamento de aproximadamente 3.000L de polpa de caulim, atingindo o solo, em aproximadamente, 400m.

Na sequência, também menciona os resultados dos relatórios de fiscalização ambiental n° 020/2009 da SEMMAB e n° 109/2009- GERAD, da Secretaria de Estado do Meio Ambiente., os quais atestam o despejo de caulim no solo, configurando a sua poluição.

Assim, pautado na aplicação da responsabilidade objetiva e diante das provas colacionadas aos autos, requer o conhecimento e provimento do recurso para reformar a sentença e julgar totalmente procedente a ação pública, condenando a empresa apelada a pagar indenização por danos materiais no valor de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais) ou outro apurado em liquidação de sentença.

A empresa apelada apresentou contrarrazões (id n° 891866).

Em manifestação de id n° 1141970, a Procuradoria de Justiça, se manifestou pelo conhecimento e provimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA (RELATORA):

Preenchidos os pressupostos recursais de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.

Cinge-se a controvérsia recursal acerca da existência ou não de dano ao meio ambiente provocado pelo vazamento de caulim, motivado por uma fissura em um dos minerodutos da empresa apelada.

A Sentença de mérito julgou improcedente a ação, em razão de não ter sido provado pelo Ministério Púbico a ocorrência de dano ambiental.

Não havendo questões preliminares, passo a analisar o mérito.

Pois bem. A proteção ao meio ambiente está consagrada tanto pela Constituição Federal quanto por normas infraconstitucionais, dada a sua importância como um bem primordial para o mundo. Em razão da sua relevância, a Constituição Federal dispõe em seu art. 225, caput, in verbis:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Da análise do dispositivo supracitado, percebe-se que o Meio Ambiente é um bem comum, coletivo, essencial à qualidade de vida, cabendo a toda sociedade o dever de preservá-lo e defendê-lo.

O parágrafo terceiro do mesmo dispositivo constitucional prevê que qualquer pessoa, seja física ou jurídica, será responsabilizada tanto na seara administrativa, penal, independentemente da responsabilidade civil pelos danos causados. Vejamos:

Art. 225 (...)

§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

No âmbito infraconstitucional temos...

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