Acórdão nº 3346374 Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 1ª Turma de Direito Público, 13-07-2020

Data de Julgamento13 Julho 2020
Número do processo0020460-67.2016.8.14.0006
Data de publicação23 Julho 2020
Número Acordão3346374
Classe processualCÍVEL - APELAÇÃO CÍVEL
Órgão1ª Turma de Direito Público

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) - 0020460-67.2016.8.14.0006

APELANTE: MUNICÍPIO DE ANANINDEUA
REPRESENTANTE: MUNICIPIO DE ANANINDEUA

APELADO: IVANICE CARVALHO MACEDO

RELATOR(A): Desembargadora EZILDA PASTANA MUTRAN

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. REMESSA NECESSÁRIA DE OFÍCIO. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDORA PÚBLICA MUNICIPAL. LICENÇA SEM REMUNERAÇÃO POR PRAZO INDETERMINADO. TRANSFERÊNCIA DO CONJUGE SERVIDOR FEDERAL EX-OFÍCIO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO NA LEGISLAÇÃO MUNICIPAL. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO POR ANALOGIA DA LEGISLAÇÃO FEDERAL E ESTADUAL. EFETIVAÇÃO DO DIREITO CONSTITUCIONAL DA PRESERVAÇÃO DA FAMÍLIA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1 – Remessa necessária suscitada de ofício, por se tratar de hipótese elencada no artigo 496, inciso I, do Novel Código de Processo Civil, somente produzindo efeitos o julgado de 1º grau depois de confirmada por parte do Egrégio TJE/PA, tratando-se de condição de eficácia da sentença, independentemente de ter sido interposto o apelo voluntário.

2 - A jurisprudência do STJ firmou entendimento pela possibilidade de interpretação analógica em relação à matéria de servidores públicos, quando inexistir previsão específica no diploma normativo do Estado ou do município. Precedentes: RMS 30.511/PE, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Quinta Turma, DJe 22.11.2010; e RMS 15.328/RN, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 2.3.2009.

3 - No caso concreto, o reconhecimento do direito líquido e certo à concessão da licença pretendida justifica-se em razão da analogia derivada do silêncio da lei municipal, aplicando-se a legislação federal e estadual sobre o tema, e da ausência de custos ao erário municipal, porquanto a sua outorga não terá ônus pecuniários ao ente público.

4 – Remessa Necessária e Apelação Cível desprovidas, à unanimidade.

ACORDÃO

ACORDAM os Exmos. Desembargadores que integram a 1ª Turma de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, à unanimidade de votos, conhecer da remessa necessária e da apelação cível, mas negar-lhe provimento, nos termos do voto da relatora.

Belém (PA), 13 de julho de 2020.

Desembargadora EZILDA PASTANA MUTRAN

Relatora


RELATÓRIO

Trata-se de RECURSO DE APELAÇÃO interposto pelo MUNICÍPIO DE ANANINDEUA contra a r. sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da Vara da Fazenda Pública de Ananindeua, nos autos do MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO DE LIMINAR impetrado por IVANICE CARVALHO MACEDO em face de ato supostamente ilegal praticado pelo SECRETÁRIO MUNICIPAL DE SAÚDE DO MUNICÍPIO DE ANANINDEUA e pelo COORDENADOR DE GESTÃO DE PESSOAS DA SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE DE ANANINDEUA.

Em síntese, na exordial, a Impetrante informa que é servidora pública municipal, ocupando o cargo de Enfermeira, tendo requerido, administrativamente, licença sem remuneração, por tempo indeterminado, para poder acompanhar o seu cônjuge, que é Suboficial da Marinha e foi transferido ex-Officio da cidade de Belém para a cidade do Rio de Janeiro, por meio da Circular n° 20-2/2014, do Comando do Pessoal de Fuzileiros Navais.

Relatou que requereu junto a Secretaria Municipal de Saúde, licença sem vencimento por um período de 2 (dois) anos, a qual foi deferida pelo Ofício n° 1739/2014-GAB-SEMAD de 25/08/2014, e autorizado o gozo, mediante Memorando n° 1835/2014-RH/SESAU, de 14/10/2014, pelo período de outubro de 2014 a setembro de 2016. No entanto, no dia 22/08/2016. Antes do término da sua licença sem vencimento, a Impetrante requereu para o Secretário Municipal de Saúde de Ananindeua a concessão de licença para acompanhar cônjuge, por tempo indeterminado e sem ônus, com fundamento no art. 226, §5º, da Constituição Federal, uma vez que ainda está em companhia do cônjuge na cidade do Rio de Janeiro.

Informou que requereu administrativamente a concessão de licença para acompanhar cônjuge, por tempo indeterminado e sem ônus (processo nº 2016.001.303-PMA), contudo seu pleito foi indeferido pelo Secretário Municipal de Saúde de Ananindeua no dia 25/10/2016, sob o argumento de que inexiste a previsão da licença requerida na Lei Municipal (Regime Jurídico Estatutário dos Servidores Públicos do Município de Ananindeua - Lei2177/05).

Sustentou a impetrante que por não haver previsão no Estatuto do Servidor Municipal de Ananindeua para a concessão de licença para acompanhar cônjuge, fundamenta seu pedido no art. 226, §5°, da Constituição Federal e nos Estatutos do Servidor Federal e do Servidor do Estado do Pará, os quais preveem a concessão da mencionada licença nos artigos 84 e 77, respectivamente. Alega que a licença do servidor para acompanhar cônjuge, sem remuneração e por tempo indeterminado, visa a manutenção e proteção da entidade familiar.

Requereu a concessão de liminar, a fim de que a Administração procedesse desde logo à prática dos atos necessários à concessão da licença sem vencimentos para acompanhar cônjuge, por tempo indeterminado, e, no mérito, pugnou pela concessão da segurança, tornando definitiva a liminar deferida nos autos, permitindo que a Impetrante possa ser licenciada sem vencimentos e por tempo indeterminado, para acompanhar seu cônjuge que foi removido ex-offício da cidade de Belém para a cidade do Rio de Janeiro, bem como que seja determinado ao Impetrado abonar as faltas da Impetrante, tendo em vista que foi protocolado requerimento pedindo a referida licença no dia 25 de agosto de 2016, mas que, em virtude da morosidade da administração municipal, somente obteve resposta do requerimento no dia 26 de outubro de 2016, motivo pelo qual requer que seja abonado as faltas compreendido nesse lapso temporal.

Sobreveio sentença, confirmando os termos da liminar anteriormente concedida e concedendo a segurança pleiteada, para determinar ao Impetrado Secretário Municipal de Saúde de Ananindeua que no prazo de cinco dias contados de sua ciência providencie o licenciamento da servidora IVANICE CARVALHO MACEDO, sem vencimentos e por tempo indeterminado, para acompanhar seu companheiro/cônjuge removido ex-officio para a cidade do Rio de Janeiro. Por fim julgou o feito extinto, com resolução de mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC/15.

Irresignado o Município de Ananindeua interpôs o presente recurso de Apelação (id. 1308198) pugnando pela concessão de tutela recursal, para que seja determinada a suspensão da licença sem vencimento da Apelada. No mérito recursal sustentou, em síntese, que a Apelada não possui direito a ter sua segunda licença sem vencimento deferida por ferir a legislação municipal e a soberania do Ente Municipal. Por fim, requereu o provimento da apelação, a fim de suspender os efeitos da sentença e de reformá-la, determinando que a Recorrida retorne imediatamente ao exercício de suas funções, haja vista o interesse público de seu cargo.

A apelada apresentou contrarrazões, pugnando pelo desprovimento do recurso com a manutenação in totum da sentença (Id. 1308200)

Instado a se manifestar o Ministério Público de Segundo Grau pronunciou-se em sede de reexame necessário, pela manutenção na totalidade da sentença e pelo conhecimento e não provimento do recurso de Apelação Cível interposto pelo MUNICÍPIO DE ANANINDEUA, devendo ser mantida na integralidade a sentença proferida pelo Juízo de 1° grau.

É o relatório

VOTO

Inicialmente, suscito de ofício o Reexame Necessário, por se tratar de hipótese elencada no artigo 496, inciso I, do Código de Processo Civil, somente produzindo efeitos o julgado de 1º grau depois de confirmada por parte do Egrégio TJE/PA.

Isto posto, presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço do recurso e do reexame necessário, passando a sua análise.

Preliminarmente, quanto ao pedido de concessão de tutela recursal, entendo ausente os requisitos autorizadores para seu deferimento, qual seja probabilidade do direito e perigo da demora, o que será fundamentado no decorrer da análise do mérito do presente recurso.

O cerne da questão está em averiguar a existência de direito da servidora municipal em ter deferida a licença sem remuneração e por prazo indeterminado para acompanhar seu esposo, Fuzileiro Naval, transferido ex-offício para a cidade do Rio de Janeiro, tendo por fundamento por analogia os dispositivos das Leis nº 8.112/90 (RJU dos servidores federais) e nº 5.810/94 (RJU dos servidores estaduais), que tratam da concessão de licença sem vencimentos para acompanhar cônjuge, para fins de concessão da referida licença para a servidora pública municipal, tendo em vista que no RJU dos servidores municipais do Município de Ananindeua não há previsão de tal licença.

Dispõe os referidos diplomas:

Lei nº 8.112/90:

Art. 84. Poderá ser concedida licença ao servidor para acompanhar cônjuge ou companheiro que foi deslocado para outro ponto do território nacional, para o exterior ou para o exercício de mandato eletivo dos Poderes Executivo e Legislativo.

§ 1o A licença será por prazo indeterminado e sem remuneração. (g.n.)

Lei nº 5.810/94:

Art. 77. O servidor terá direito à licença:

(...) VIII - por motivo de afastamento do cônjuge ou companheiro;

(...) Seção VIII - Da Licença para Acompanhar Cônjuge

Art. 96. Ao servidor estável, será concedida licença sem remuneração, quando o cônjuge ou companheiro, servidor civil ou militar:

I – (omissis);

II - for designado para servir fora do Estado ou no exterior.

Art. 97. A licença será concedida pelo prazo da duração do mandato, ou nos demais casos por prazo indeterminado.

§ 1° A licença será instruída com a prova da eleição, posse ou designação.

§ 2° Na hipótese do deslocamento de que trata este artigo, o servidor poderá ser lotado, provisoriamente, em repartição da Administração Estadual direta, autárquica ou fundacional, desde que para o exercício de atividade compatível com o seu cargo. (g.n.)

Como se vê, a legislação...

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