Acórdão nº 3397203 Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 1ª Turma de Direito Público, 13-07-2020

Data de Julgamento13 Julho 2020
Número do processo0804487-27.2016.8.14.0301
Data de publicação28 Julho 2020
Acordao Number3397203
Classe processualCÍVEL - APELAÇÃO CÍVEL
Órgão1ª Turma de Direito Público

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0804487-27.2016.8.14.0301

APELANTE: MUNICIPIO DE BELEM

APELADO: MIGUEL GONCALVES TOCANTINS

RELATOR(A): Desembargadora EZILDA PASTANA MUTRAN

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO À SAÚDE. AÇÃO ORDINÁRIA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. PACIENTE APRESENTANDO COLITES UCERTIVAS E DORES ABDOMINAIS. PEDIDO DE REALIZAÇÃO DE EXAMES DE COLONOSCOPIA E TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA. PRESCRIÇÃO MÉDICA. PRELIMINAR DE FALTA DE INTERESSE DE AGIR E DE PERDA DO OBJETO. INOCORRÊNCIA. PRELIMINAR REJEITADA. NECESSIDADE E HIPOSSUFICIÊNCIA DO PACIENTE DEMONSTRADAS. DIREITO CONSTITUCIONAL ASSEGURADO. DIREITO À SAÚDE. ARTIGO 196 DA CF/88. PRESCRIÇÃO MÉDICA DEMONSTRANDO A NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DOS EXAMES DE COLONOSCOPIA E TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA. NECESSIDADE DE DIAGNÓSTICO PARA INÍCIO DO TRATAMENTO MÉDICO. GARANTIA CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. EXISTÊNCIA DE DIREITO SUBJETIVO A SER TUTELADO. DEVER CONSTITUCIONAL DE TODOS OS ENTES FEDERATIVOS. ART. 196 DA CF/88. PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E DA ISONOMIA NÃO VIOLADOS. PEDIDO FORMULADO EM SEDE DE CONTRARRAZÕES. PRETENSÃO DE FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA EM FAVOR DA DEFENSORIA PÚBLICA. NÃO CONHECIMENTO. VIA INADEQUADA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E IMPROVIDO À UNANIMIDADE.

ACÓRDÃO

Acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores componentes da 1ª Turma de Direito Público, por unanimidade de votos, EM CONHECER DO RECURSO, PORÉM NEGAR-LHE PROVIMENTO, tudo nos termos do voto da Desembargadora Relatora.

Belém (PA), 13 de julho de 2020.

Desembargadora EZILDA PASTANA MUTRAN,

Relatora

RELATÓRIO

Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta pelo MUNICÍPIO DE BELÉM, em face da Sentença prolatada pelo Douto Juízo da 3ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Belém que, nos autos da Ação Ordinária de Obrigação de Fazer, ajuizada por MIGUEL GONÇALVES TOCANTINS, assistido pela Defensoria Pública do Estado do Pará, julgou procedente o pedido inicial, determinando ao Município de Belém disponibilize a realização dos exames de colonoscopia e de tomografia computadorizada, confirmando a liminar concedida, extinguindo o processo, com resolução do mérito.

Inconformado, o MUNICÍPIO DE BELÉM interpôs recurso de APELAÇÃO, pugnando pela reforma da sentença. Em suas razões recursais, o apelante, após realizar breve exposição dos fatos, argumenta, em síntese, preliminarmente, a perda do objeto e ausência de interesse de agir, alegando que adotou todas as providências cabíveis para dar cumprimento à decisão mediante a disponibilização de exames ao paciente, assim como alega o cumprimento da liminar satisfativa sem a interposição de recurso, nos termos do art. 304, §1º, CPC, requerendo a extinção do processo.

Sustenta a violação do princípio da impessoalidade e da isonomia, aduzindo o desrespeito a fila instituída pelo SUS para pacientes na mesma situação.

Ao final, requer o conhecimento e o provimento do recurso de apelação para reformar a sentença, julgando improcedente o pedido inicial (id 3023177).

O apelado apresentou contrarrazões, rechaçando os argumentos apresentados e pugnou pelo improvimento do recurso e de forma Adesiva à Apelação requereu a reforma da sentença para que sejam arbitrados os honorários advocatícios em favor da Defensoria Pública (id 3023181).

Encaminhados os autos a esta E. Corte de Justiça, coube-me a relatoria do feito por redistribuição, ocasião que, em juízo de admissibilidade recursal, proferi decisão, recebendo o recurso de apelação no duplo efeito (id 3065612).

A Procuradoria de Justiça Cível do Ministério Público apresentou parecer, manifestando-se pelo conhecimento e improvimento do recurso de apelação, a fim de que seja mantida a Sentença (id 3149854).

É o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de Apelação, pelo que passo à sua análise.

- Da Preliminar de Ausência do Interesse de Agir e de cumprimento da liminar satisfativa:

O recorrente argumenta a preliminar de ausência de interesse de agir, aduzindo a perda do objeto, sustentando que foram disponibilizados os exames de colonoscopia e de tomografia computadorizada ao paciente, assim como alega o cumprimento da liminar satisfativa sem a interposição de recurso, requerendo a extinção, nos termos do art. 304, §1º, CPC

Todavia, a argumentação do apelante não merece prosperar.

Na hipótese dos autos, o interesse de agir se revela presente, pois restou comprovada a necessidade na realização dos exames solicitados, conforme laudo médico, sendo que, apesar do paciente ter solicitado a autorização dos exames desde o dia 21/05/2016 junto à Secretaria Municipal de Saúde de Belém através do sistema SISREG até a data da interposição da ação, ocorrido em 08 de novembro de 2016, o autor não foi atendido pela SESMA, uma vez que não obteve qualquer resposta à solicitação.

Assim, observa-se que a disponibilização dos exames requeridos decorreu somente em cumprimento da decisão judicial que concedeu a tutela de urgência, a qual possui natureza provisória, desta forma, permanece presente o interesse até o julgamento definitivo mediante a Sentença para que a tutela concedida produza os seus efeitos legais.

Nesse sentido, cito a jurisprudência deste Tribunal de Justiça, senão vejamos:

“EMENTA: REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PACIENTE IDOSO DIAGNOSTICADO COM ANEURISMA DE AORTA ABDOMINAL (CID.73.9). NECESSIDADE DE TRANSFERÊNCIA PARA HOSPITAL ESPECIALIZADO COM CIRURGIÃO. DIREITO À VIDA E À SAÚDE. PRELIMINARES DE FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL, INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DO JUÍZO E DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO DO PARÁ. REJEITADAS. MÉRITO. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE DIREITO SUBJETIVO A SER TUTELADO DE IMEDIATO. AFASTADA. TRATAMENTO INDISPENSÁVEL À SAÚDE DA INTERESSADA. NECESSIDADE COMPROVADA NOS AUTOS. DEVER CONSTITUCIONAL DE TODOS OS ENTES FEDERATIVOS. ART. 196 DA CF/88. PRECEDENTES DO STF. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA RESERVA DO POSSÍVEL. REEXAME NECESSÁRIO CONHECIDO E IMPROVIDO. (2714376, 2714376, Rel. MARIA ELVINA GEMAQUE TAVEIRA, Órgão Julgador 1ª Turma de Direito Público, Julgado em 2020-02-03, Publicado em 2020-02-27)

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM OBRIGAÇÃO DE FAZER. PRELIMINAR DE PERDA DE OBJETO EM RAZÃO DA INTERNAÇÃO DO PACIENTE. INOCORRÊNCIA. MÉRITO – DIREITO À SAÚDE. TRATAMENTO FORA DE DOMICILIO (TFD). PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS PREVISTOS NO ARTIGO 1º, §§ 1º E 2º DA PORTARIA Nº 55/99 DO MINISTÉRIO DA SAÚDE. LEGITIMIDADE DO JUDICIÁRIO EM COMPELIR O ADMINISTRADOR PÚBLICO ADOÇÃO DAS MEDIDAS NECESSÁRIAS À RECUPERAÇÃO DA PACIENTE. AUSÊNCIA DE INFRINGÊNCIA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. DECISÃO UNÂNIME.

1. DA PERDA DE OBJETO. 1.1. Descabe falar em falta de interesse processual por perda superveniente do objeto, quando o cumprimento do pleito ocorre após a concessão da medida liminar, como ocorre na hipótese, uma vez que a realização do procedimento médico perseguido somente foi concretizada após a intervenção judicial, de tal sorte que há de ser rechaçada a preliminar arguida.

2. MÉRITO 2.1. É de se ressaltar que o direito fundamental à saúde faculta ao cidadão obter de qualquer dos entes federativos as medidas necessárias à recuperação do indivíduo, incluindo nesse conceito, a realização de tratamento médico, fornecimento de medicamento e Tratamento Fora de Domicilio (TFD), uma vez que o direito vindicado se encontra positivado em normas constitucionais de eficácia plena. Inteligência dos artigos e 196, da Constituição da República. 2.2. No que diz respeito à matéria de fundo debatida nos autos, tem-se que a paciente é detentora do direito ao Tratamento Fora de Domicilio (TFD), instituído pela Portaria nº 55/1999 do Ministério da Saúde, porquanto se extrai do acervo probatório ser ela atendida pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e pelo fato de o ente agravante não dispor de leito em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) em sua estrutura de saúde. 2.3. revela-se improcedente a alegação do agravante de contrariedade ao princípio da separação de poderes, uma vez que a jurisprudência do Pretório Excelso é assente no sentido de que o julgamento, pelo Judiciário, da legalidade dos atos dos demais poderes não representa ofensa ao princípio da separação dos poderes, especialmente em se tratando de políticas públicas envolvendo o direito constitucional à saúde. 3. Recurso conhecido e improvido. À unanimidade. (2466180, 2466180, Rel. ROBERTO GONCALVES DE MOURA, Órgão Julgador 1ª Turma de Direito Público, Julgado em 2019-11-11, Publicado em 2019-11-20)

No mesmo sentido, também deve ser afastada a alegação do apelante quanto a extinção do feito, sob o argumento de cumprimento de medida liminar satisfativa, com base no artigo 304, §1° do CPC, isto porque não restou configurada estabilidade da decisão, uma vez que o município recorrente interpôs recurso de Agravo de Instrumento contra a decisão (proc. n° 0000473-29.2017.814.0000), distribuído sob a minha relatoria, desta forma, também se mostra necessária a confirmação da decisão que concedeu a tutela de urgência pela sentença.

Assim sendo, rejeito a preliminar perda do objeto, diante da presença do interesse processual e da ausência de estabilidade da decisão, não havendo que se falar, portanto, em extinção do processo, sem resolução de mérito.

Dito isso, superada a preliminar, passo a análise do mérito recursal.

MÉRITO

Compulsando os autos, observo que a sentença hostilizada encontra-se correta em seus fundamentos, assegurando o direito constitucional à saúde, previsto no artigo 196 da Constituição Federal, considerando a determinação ao Município de Belém para que proceda a marcação dos exames de colonoscopia e tomografias computadorizadas do abdômen superior e inferior do paciente Miguel Gonçalves Tocantins, conforme prescrição médica.

Conforme citado anteriormente, em razão do autor...

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