Acórdão nº 3694642 Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 1ª Turma de Direito Público, 14-09-2020

Data de Julgamento14 Setembro 2020
Número do processo0000017-78.2010.8.14.0015
Data de publicação25 Setembro 2020
Acordao Number3694642
Classe processualCÍVEL - APELAÇÃO CÍVEL
Órgão1ª Turma de Direito Público

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0000017-78.2010.8.14.0015

APELANTE: PROCURADORIA GERAL DO ESTADO DO PARÁ
REPRESENTANTE: PARA MINISTERIO PUBLICO

APELADO: WALDONEI GONCALVES CUNHA

RELATOR(A): Desembargadora EZILDA PASTANA MUTRAN

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. INTIMAÇÃO PRÉVIA DA FAZENDA PÚBLICA, NOS TERMOS DO § 4º DO ART. 40 DA LEI 6.830/80. AUSÊNCIA. NORMA DE NATUREZA PROCESSUAL. APLICAÇÃO IMEDIATA. PRECEDENTE DO STJ. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

1. Em se tratando de execução fiscal, o juiz poderá reconhecer a prescrição intercorrente, desde que ouvida previamente a Fazenda Pública, nos termos do § 4º do art. 40 da Lei 6.830/1980;

2. A prescrição intercorrente foi decretada sem a oitiva prévia da Fazenda Pública, surgindo error in procedendo, trazendo como consequência a anulação da sentença;

3. O art. 40, § 4º, LEF, é norma de natureza processual, portanto tem aplicabilidade imediata, para anular a sentença, inclusive aos processos em curso. Precedente do STJ;

4. Recurso conhecido e provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Apelação Cível nº 0000017-78.2010.8.14.0015.

ACORDAM os Exmos. Desembargadores que integram a egrégia 1ª Turma de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, à unanimidade de votos, conhecer do recurso, dando-lhe provimento, nos termos do voto da relatora.

Belém (Pa), 14 de setembro de 2020.

Desembargadora EZILDA PASTANA MUTRAN

Relatora

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de APELAÇÃO CÍVEL, interposta pelo ESTADO DO PARÁ contra a sentença prolatada (ID. 2773238) nos autos da Ação de Execução Fiscal, ajuizada em desfavor de WALDONEI GONÇALVES CUNHA, que extinguiu o feito com resolução de mérito, ante a ocorrência da prescrição intercorrente do crédito tributário cobrado.

Em suas razões recursais (ID. 2773239), alegou a Fazenda Pública Estadual, inocorrência da prescrição ante a falta de condição de validade para seu reconhecimento, especificamente quanto a inobservância do procedimento previsto no art. 40 e parágrafos, com a oitiva prévia da Fazenda Pública, nos termos do art. 40, §4º, da LEF.

Afirmou que o julgador a quo extinguiu o processo sem oportunizar a Fazenda Pública a se manifestar acerca da suposta prescrição intercorrente.

Teceu comentários quanto ao Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp 1676027/PR, (em 26/09/2017, DJe 11/10/2017), no que se refere a proibição de decisão surpresa.

Sustentou a ausência dos pressupostos para a declaração da prescrição intercorrente, assim como a ausência de morosidade por parte da Fazenda Pública.

Por fim, requereu provimento à apelação para reformar a sentença monocrática.

Não foram apresentadas contrarrazões.

Sem a necessidade de intervenção ministerial, conforme Súmula 189 do STJ.

Coube-me a relatoria do feito.

É o relatório.

VOTO

Conheço do recurso posto que preenchidos os requisitos de admissibilidade.

Cinge-se a questão à análise da prescrição da ação de execução fiscal, visando a percepção de créditos oriundos do AINF nº 022008510001745-8, conforme Certidão de Dívida Ativa nº 2009570055452-7 (ID. 2773232 - Pág. 3)

Pois bem. A Lei de Execução Fiscal, em seu art. 40, § 4º, instituiu a possibilidade de o juiz decretar, ex offício, a prescrição intercorrente, configurada quando, proposta a execução fiscal e decorrido o prazo de suspensão, o feito permanecer paralisado por mais de cinco anos, desde que antes seja intimada a Fazenda Pública.

Art. 40 - O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de prescrição.

(...)

§ 4º Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato.

Sobre o dispositivo transcrito, Leonardo Carneiro da Cunha apresenta seu escólio.

Nos termos do § 4º do art. 40 da Lei 6.830/1980, é possível ao juiz, na execução fiscal, reconhecer de ofício a prescrição intercorrente, desde que ouvida previamente a Fazenda Pública. O contraditório deve, nesse caso, ser instalado para oportunizar à Fazenda Pública demonstrar a eventual existência de alguma causa suspensiva ou interruptiva da prescrição e, enfim, para que possa contribuir com o convencimento do magistrado, instaurando um diálogo entre parte e juiz, no que se asseguram a cooperação (CPC, art. 6º e o contraditório (CPC, art. 10). (A Fazenda pública em Juízo. 13ª ed. Forense. 2016. p. 441).

Acerca das consequências da ausência de intimação prévia da Fazenda Pública para se manifestar acerca da prescrição intercorrente, o Douto professor assim leciona.

Se o juiz decretar a prescrição intercorrente, sem a prévia audiência da Fazenda Pública, será nula a decisão, em razão de um erro in procedendo. Não havendo prévia audiência da Fazenda Pública, exsurgirá manifesto error in procedendo, ou seja, um vício no procedimento ou um equívoco na aplicação de regras procedimentais pelo juízo de primeira instância, cabendo apelação para que se anule a sentença que extinguir a execução fiscal. (Ob. cit.).

Neste sentido é o entendimento pacificado do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO - EXECUÇÃO FISCAL - PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE - RECONHECIMENTO DE OFÍCIO - PRÉVIA OITIVA DA FAZENDA PÚBLICA - NECESSIDADE - PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO - RECURSO PROVIDO.

1. O contraditório é princípio que deve ser respeitado ao longo de todo o processo, especialmente nas hipóteses de declaração da prescrição ex officio.

2. É cabível o reconhecimento de ofício da prescrição intercorrente em execução fiscal desde que a Fazenda Pública seja previamente intimada a se manifestar, possibilitando-lhe a oposição de algum fato impeditivo à incidência da prescrição. Precedentes.

3. Recurso ordinário em mandado de segurança provido.”

(RMS 39.241/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/06/2013, DJe 19/06/2013). (grifo meu)

PROCESSUAL CIVIL. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. NECESSIDADE DE PRÉVIA SUSPENSÃO DO FEITO POR UM ANO, NA FORMA DO ART. 40 DA LEI N.

6.830/80. SÚMULA N. 314 DESTA CORTE. NECESSIDADE DE PRÉVIA OITIVA DO FISCO ANTES DA DECRETAÇÃO DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. ENTENDIMENTO ADOTADO EM SEDE DE RECURSO REPETITIVO, NA FORMA DO ART. 543-C, DO CPC.

1. O Tribunal de origem entendeu, em síntese, que, diante das inovações introduzidas pela Emenda Constitucional n. 45/04 e pela Lei Complementar n. 118/05, não mais seria necessário o respeito ao rito do art. 40 da Lei n. 6.830/80 para se decretar a prescrição intercorrente, de forma que a celeridade processual, a necessidade de atuação diligente do Procurador da Fazenda e a interrupção da prescrição pelo despacho do juiz que ordena a citação, apontam no sentido de que de prescrição intercorrente tem início assim que a prescrição da ação é interrompida, dispensando, portanto, a prévia suspensão do feito por um ano e seu arquivamento para o início do lapso prescricional intercorrente.

2. Cumpre registrar que o fundamento do acórdão recorrido que entendeu pela aplicação da Emenda Constitucional n. 45/04 é de tal forma genérico que não impossibilita o conhecimento do recurso especial por ausência de interposição de recurso extraordinário, o que afasta a aplicação da Súmula n. 126 desta Corte.

3. O acórdão recorrido contrariou o disposto na Súmula n. 314/STJ, na qual este Tribunal consolidou o entendimento no sentido de que a prescrição intercorrente somente tem início após a suspensão do processo por um ano, ainda que desnecessária a intimação da Fazenda da decisão que arquiva o feito, na forma do art. 40 da Lei n.

6.830/80.

4. A Primeira Seção desta Corte, quando do julgamento do REsp 1.102.554/MG, consolidou entendimento no sentido de ser necessária a prévia oitiva da Fazenda Pública antes da decretação ex officio da prescrição intercorrente.

5. Recurso especial provido para afastar a prescrição e determinar o regular processamento da execução fiscal.

(REsp 1230558/PE, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/04/2011, DJe 28/04/2011) (grifo meu).

No caso dos autos, a despeito do expresso comando legal do §4º, do art. 40, da LEF, o digno Juízo a quo proferiu a sentença ora impugnada sem que houvesse a prévia intimação da Fazenda Pública Estadual acerca da declaração da prescrição intercorrente.

Com efeito, quando a lei, seja material, seja processual, determina o reconhecimento de ofício da prescrição, faz referência, tão somente, à dispensa de provocação da parte beneficiada pelo decreto de prescrição, possibilitando a iniciativa do próprio juízo, mas, de forma alguma, dispensa a regular intimação da parte a quem a prescrição prejudica, para que se atenda, desta forma, aos princípios maiores do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal (art. 5º, LV e LV, da CF/88), já que a parte tem o direito de tomar ciência prévia dos atos processuais que concorrem para extinção do seu direito.

Sobre a necessidade previa de intimação da Fazenda Pública para declarar a prescrição intercorrente nos moldes do § 4º do art. 40 da LEF, este E. Tribunal se posiciona.

APELAÇÃO. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. ICMS. MARCO INTERUPTIVO DA PRESCRIÇÃO. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. DECLARAÇÃO DE OFÍCIO. IMPRESCINDÍVEL INTIMAÇÃO PESSOAL DO REPRESENTANTE DA FAZENDA. AUSÊNCIA DE INÉRCIA OU ABANDONO DA CAUSA PELA FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL. OBSERVÂNCIA DA SÚMULA 106 DO STJ. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE NÃO CONFIGURADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. I - Ante o disposto no art. 14, do CPC/2015, tem-se que a norma processual não retroagirá, de maneira que devem ser respeitados os...

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