Acórdão Nº 4001941-73.2020.8.24.0000 do Quarta Câmara de Direito Comercial, 10-11-2020

Número do processo4001941-73.2020.8.24.0000
Data10 Novembro 2020
Tribunal de OrigemCanoinhas
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Comercial
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão




Agravo de Instrumento n. 4001941-73.2020.8.24.0000, de Canoinhas

Relator: Desembargadora Janice Ubialli

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE IMISSÃO DE POSSE EM IMÓVEL ARREMATADO EM LEILÃO EXTRAJUDICIAL. INDEFERIMENTO DA TUTELA DE URGÊNCIA. RECURSO DA AUTORA.

ANÁLISE DA PRETENSÃO SOB A ÓTICA DA TUTELA DE EVIDÊNCIA. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. HIPÓTESE EM QUE COMPROVADA DE PLANO A INADIMPLÊNCIA DOS ANTERIORES PROPRIETÁRIOS, A CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE EM FAVOR DO CREDOR FIDUCIÁRIO E A ARREMATAÇÃO DO BEM COM A CONSEQUENTE TRANSFERÊNCIA DE TITULARIDADE REGISTRAL EM FAVOR DA DEMANDANTE. PROVA DOCUMENTAL SUFICIENTE DOS FATOS CONSTITUTIVOS DO DIREITO SOBRE O IMÓVEL. DISCUSSÃO EM OUTRA DEMANDA QUANTO À REGULARIDADE DOS ATOS EXPROPRIATÓRIOS QUE NÃO POSSUI O CONDÃO DE GERAR "DÚVIDA RAZOÁVEL". INEXISTÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL NO SENTIDO DE SUSPENDER A EFICÁCIA DO PROCEDIMENTO ADOTADO PELO CREDOR FIDUCIÁRIO. REQUISITOS DO ART. 311, IV, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015, E DO ART. 30 DA LEI N. 9.514/1997 SATISFEITOS. DEFERIMENTO DA TUTELA DE EVIDÊNCIA QUE SE IMPÕE. DECISÃO REFORMADA.

"A Lei n. 9.514, de 1997 - que 'dispõe sobre o Sistema de Financiamento Imobiliário, institui a alienação fiduciária de coisa imóvel e dá outras providências' -, assegura 'ao fiduciário, seu cessionário ou sucessores, inclusive o adquirente do imóvel por força do público leilão de que tratam os §§ 1° e 2° do art. 27, a reintegração na posse do imóvel, que será concedida liminarmente, para desocupação em sessenta dias, desde que comprovada, na forma do disposto no art. 26, a consolidação da propriedade em seu nome' (art. 30)" (AI n. 4004773-50.2018.8.24.0000, rel. Des. Newton Trisotto, j. 4-10-2018).

PLEITO FORMULADO EM CONTRARRAZÕES PARA QUE A DESOCUPAÇÃO OCORRA SOMENTE SOBRE A PORÇÃO RESIDENCIAL. REJEIÇÃO. IMISSÃO QUE DEVE COMPREENDER A ÁREA INTEGRAL ARREMATADA PELA DEMANDANTE.

RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. 4001941-73.2020.8.24.0000, da comarca de Canoinhas 1ª Vara Cível em que é/são Agravante(s) Daiane Aparecida Becker Takahashi e Agravado(s) Sirlene Marilin Becker da Cruz e outro.

A Quarta Câmara de Direito Comercial decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e dar a ele provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. José Antônio Torres Marques, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Sérgio Izidoro Heil.

Florianópolis, 10 de novembro de 2020.

Desembargadora Janice Ubialli

Relatora


RELATÓRIO

Cuida-se de Agravo de Instrumento interposto por Daiane Aparecida Becker Takahashi da decisão proferida pelo juízo da 1ª Vara Cível da comarca de Canoinhas que, nos autos da Ação de Imissão de Posse n. 0300027-55.2019.8.24.0015, aforada contra Sirlene Marilin Becker da Cruz e Manoel Pereira da Costa Neto, indeferiu o pleito de desocupação imediata do imóvel pelos réus/agravados.

Em suas razões recursais sustenta que: a) "está estampado nos autos o PREJUÍZO que a agravante (proprietária do bem) vem sofrendo, vez que está impedida há 22 meses de exercer seus direitos legais do bem" (p. 5); b) "tamanha economia foi realizada para a aquisição do bem e sequer pode adentrar no imóvel, inclusive está tendo que arcar com todos os ônus do imóvel, tais como IPTU e demais encargos inerentes ao bem, eis que já está consolidada a propriedade, ao passo que os agravados estão morando gratuitamente no Imóvel" (p. 5); c) "é terceiro de boa-fé, a propriedade definitiva do imóvel já lhe pertence, conforme registro da carta de arrematação constante da matrícula imobiliária" (p. 6).

Diante disso, requer "seja revogada a Decisão Interlocutória de fls. 306-309 que indeferiu o pedido de tutela provisória de urgência, determinando-se o imediato cumprimento do mandado de imissão na posse do bem arrematado, autorizando-se desde logo a ordem de arrombamento e requisição de reforço policial, se for o caso, para o cumprimento" (p. 11).

A tutela de urgência recursal foi deferida (p. 65-70).

Com as contrarrazões (p. 74-80), os autos vieram conclusos.


VOTO

Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, conheço do recurso.

O cerne da controvérsia cinge-se em analisar o (des)acerto da decisão vergastada, que indeferiu o pedido de imissão imediata da recorrente sobre a posse do imóvel que adquiriu mediante arrematação em procedimento extrajudicial realizado pelo credor fiduciário (Banco Bradesco).

Adianta-se, o pleito comporta acolhimento, devendo ser reformada a decisão de origem.

Não obstante tenha sido formulado pedido de tutela de urgência, entendo que o é o caso de se analisar a pretensão sob a ótica da tutela de evidência, à luz do princípio da fungibilidade que norteia as tutelas provisórias.

A propósito, já decidiu esta Corte:

[...] Possível a concessão da tutela de urgência ou evidência quando preenchidos os requisitos autorizadores de uma das medidas, independentemente do pedido referir-se a somente um dos institutos, pois possível a aplicação do princípio da fungibilidade. [...] (TJSC, Agravo de Instrumento n. 4007445-65.2017.8.24.0000, de São José, rel. Des. João Batista Góes Ulysséa, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 04-04-2019).

Com efeito, dispõe o art. 311, IV, do CPC/2015, in verbis:

Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando:

(...)

IV - a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável.

A respeito da tutela de evidência, colhe-se da doutrina:

[...] a evidência se caracteriza com conjunção de dois pressupostos: prova das alegações de fato e probabilidade de acolhimento da pretensão processual.

Dispensa-se a demonstração de urgência ou perigo. Por isso, há quem prefira compreender a tutela provisória de evidência simplesmente como aquela para cuja concessão se dispensa a demonstração de perigo.

Seu objetivo é redistribuir o ônus que advém do tempo necessário para transcurso de um processo e a concessão de tutela definitiva. Isso é feito mediante a concessão de uma tutela imediata e provisória para a parte que revela o elevado grau de probabilidade de suas alegações (devidamente provadas), em detrimento da parte adversa e a improbabilidade de êxito em sua resistência - mesmo após a instrução processual.

Por essa razão se diz que o direito fundamental à duração razoável do processo (art. 5º, LCCVIII, CF) exige que o ônus do tempo processual seja gerido com comedimento e moderação, considerando-se não só a razoabilidade do tempo necessário para concessão da tutela definitiva, como também a razoabilidade na escolha da parte que suportará o estorvo decorrente, concedendo uma tutela provisória para aquela cuja posição processual se apresenta em estado de evidência e com mais chances de sucesso.

Por exemplo, se as afirmações de fato e o direito do autor se colocam em estado de evidência, a injustiça que pode decorrer da sua espera por uma cognição exauriente, necessária para a concessão de tutela definitiva, é muito mais provável do que aquela que vitimaria o réu com eventual erro judiciário advindo da apreciação superficial da causa, por uma cognição sumária, que funde uma tutela provisória.

É nesses casos e com esse propósito que se propugna pela concessão de tutela provisória de evidência em favor do autor, desestimulando a resistência do réu para quem se tornará desvantajoso procrastinar o feito e vantajoso cooperar para seu deslinde ou, talvez, partir para mecanismos alternativos de solução do conflito. (grifo no original) (DIDIER JÚNIOR, Fredie Didier; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de; BRAGA, Paula Sarno. Curso de direito processual civil. 10. ed. rev., amp. e atual. Salvador: Jus Podivm, 2015. v. 2. p. 618-619 - grifo nosso).

Assim, tem-se que a aplicação da pretendida tutela provisória exige o preenchimento dos seguintes pressupostos: que a evidência seja demonstrada pelo postulante mediante prova exclusivamente documental, suficiente para comprovar os fatos constitutivos do seu direito, bem como que inexista contraprova documental produzida pelos demandados, que possua o condão de gerar "dúvida razoável". Logo, a tutela de evidência será concedida independentemente de demonstração de...

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