Acórdão Nº 4008413-32.2016.8.24.0000 do Grupo de Câmaras de Direito Civil, 09-03-2022

Número do processo4008413-32.2016.8.24.0000
Data09 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoGrupo de Câmaras de Direito Civil
Classe processualAção Rescisória (Grupo Civil/Comercial)
Tipo de documentoAcórdão
Ação Rescisória (Grupo Civil/Comercial) Nº 4008413-32.2016.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador JOSÉ AGENOR DE ARAGÃO

AUTOR: BENEFICÊNCIA CAMILIANA DO SUL - HOSPITAL SÃO FRANCISCO RÉU: SERGIO LUIS ATOLINI RÉU: ANA MARIA KLEIN ATOLINI RÉU: JONATHAN KLEIN ATOLINI

VOTO

Cuidam os autos de ação rescisória ajuizada por Beneficência Camiliana do Sul - Hospital São Francisco contra Sérgio Luis Atolini, Ana Maria Klein Atolini e Jonathan Klein Atolini objetivando, em síntese, a desconstituição de acórdão proferido pela Câmara Especial Regional de Chapecó no julgamento da Apelação Cível n. 0006747-12.2013.8.24.0019 (n. antigo: 2015.024447-1).

Após voto do eminente Desembargador José Agenor de Aragão, solicitei vista dos autos para melhor análise do processo.

1 PRELIMINARES

De início, verifico que, em contestação (evento 104, CONT117), os réus preliminarmente suscitaram a carência de ação por insuficiência do depósito prévio realizado e por inadequação da via processual eleita, bem como impugnaram o valor atribuído à causa, questões sobre as quais passo agora a tratar brevemente a respeito.

Pois bem.

Alegam os acionados a carência de ação por suposta inaptidão da via processual escolhida para o fim pretendido pela demandante, pois, segundo aduzem, o inconformismo com a fundamentação do acórdão deveria ser oportunamente manifestado mediante a interposição de recursos apropriados (recurso especial e recurso extraordinário), sendo descabida a presente ação rescisória.

Entretanto, é cediço ser prescindível o manejo ainda no processo originário de todos os recursos cabíveis contra o provimento jurisdicional objeto da ação rescisória, consoante entendimento sedimentado na Súmula 514 do Supremo Tribunal Federal, in verbis: "Admite-se ação rescisória contra sentença transitada em julgado, ainda que contra ela não se tenha esgotado todos os recursos".

No mais, destaco que este Grupo de Câmaras de Direito Civil já reconheceu o interesse de agir da demandante ao dar provimento ao agravo interno interposto contra decisão monocrática de extinção liminar do processo sem análise do mérito (evento 19). O acórdão, lavrado pelo eminente Desembargador Rubens Schulz, ficou assim ementado (evento 74):

AGRAVO INTERNO EM AÇÃO RESCISÓRIA. AÇÃO FUNDADA EM ERRO DE FATO (DESCONSIDERAÇÃO DE FATOS INCONTROVERSOS) E ERRO DE DIREITO (VIOLAÇÃO DA NORMA JURÍDICA).É, em tese, possível a reanálise do conjunto probatório, quando a rescisória vem fundamentada em erro de fato, e que este seria apto a alteração de premissa, considerada na conclusão do acórdão que se busca rescindir, salvo quando, de pronto, se verifica que a tese não é capaz de alterar a conclusão ou não encontra ressonância na prova coletada.AGRAVO PROVIDO. PROSSEGUIMENTO DA RESCISÓRIA. TUTELA PROVISÓRIA DEFERIDA PARA DETERMINAR A SUSPENSÃO DO CUMPRIMENTO DO ACÓRDÃO.Se o pleito da rescisória aponta situação excepcional, que pode levar a alteração da conclusão lógica, que embasou a fundamentação do acórdão, é de se deferir o pedido de suspensão do cumprimento do acórdão (art. 969 do CPC) .

De outro vértice, apontam os réus haver carência de ação também em decorrência da insuficiência do depósito a que alude o art. 966, II, do Código de Processo Civil, porquanto calculado o respectivo percentual (5%) em relação à importância de R$ 503.590,00 (valor conferido à causa), o que afirmam estar equivocado haja vista que o procedimento de cumprimento do acórdão rescindendo já atingia o montante de 2.686.884,86. Assim, na sua compreensão, o depósito deveria se dar na quantia de R$ 134.344,24, e não de R$ 25.179,50, tal como realizado. Sob os mesmos argumentos, em tópico posterior os acionados impugnam o valor atribuído à causa.

De plano, assinalo que a incorreção do valor da causa e a insuficiência do depósito prévio não conduzem de imediato à extinção da demanda sem resolução do mérito, porquanto deve ser oferecida à parte demandante a oportunidade para adequação e eventual complementação de valores, em consonância com o disposto no art. 292, § 3º, e 321, caput, da Lei Instrumental. Nessa toada, tão somente no caso de o acionante não integralizar o valor devido após devidamente intimado para tanto é que se mostra cabível a extinção prematura do feito.

Sobre o tema, com propriedade anotam Teresa Arruda Alvim e Maria Lúcia Lins Conceição:

Aplicam-se à ação rescisória os arts. 321 e 330, que se referem, respectivamente, ao direito à emenda à petição inicial e às hipóteses de seu indeferimento. Assim, por exemplo, antes de extinguir a ação sem análise do mérito, com base no art. 330, caberá ao relator, se necessário, determinar a intimação do autor para comprovar a realização do depósito prévio ou complementá-lo; [...] (Ação rescisória e querela nullitatis: semelhanças e diferenças. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018, p. 175)

Por outro lado, tratando-se de ação rescisória, o valor da causa deve corresponder ao benefício econômico almejado (em juízo rescindente e em juízo rescisório), não necessariamente coincidindo, assim, com o valor atualizado da demanda originária.

A respeito, assinala Luiz Dellore:

3. Valor da causa na AR. O CPC/1973 não regulava o tema, e o mesmo ocorre no âmbito do CPC/2015. 3.1. Para evitar debates e divergência, o melhor teria sido regular. Mas, no silêncio legislativo, o tema é definido pela jurisprudência, a partir das regras gerais relativas ao valor da causa, presentes na parte geral do Código (art. 291 e ss.). 3.2. A posição inicial do STJ era no sentido que o valor da causa na AR seria o valor da causa na ação originária, devidamente atualizado. 3.3. Mas, considerando que isso acarretava algumas distorções (como na situação em que se busca desconstituir apenas parte da sentença, ou no caso de decisão ilíquida), a jurisprudência evoluiu e hoje prevalece o seguinte: (i) em regra, o valor da causa na AR é o valor da ação originária atualizado, mas (ii) se o conteúdo econômico debatido da AR for outro, esse será o valor da causa da AR. 3.4. Vale destacar que o assunto é relevante especialmente considerando o depósito prévio de 5% que deve ser feito em todas as rescisórias (Execução e recursos: comentários ao CPC de 2015. Fernando Gajardoni et al. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense / São Paulo: Método, 2018. p. 766).

De igual forma, lecionam Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitdiero:

Levando-se em consideração a regra básica sobre atribuição do valor da causa constante do art. 291, CPC, é possível concluir que deve ser atribuído à ação rescisória o "conteúdo econômico imediatamente" pretendido pela parte. Vale dizer: o valor da causa na ação rescisória corresponde ao valor do pedido nela formulado (Ação rescisória: do juízo rescindente ao juízo rescisório. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017. p. 295).

E, ainda, colhem-se novamente os ensinamentos de Teresa Arruda Alvim e Maria Lúcia Lins Conceição:

De acordo com o STJ, o valor da causa (com base no qual será calculado o valor do depósito prévio), na ação rescisória, deve ser, via de regra, o mesmo atribuído à ação originária, devidamente atualizado, salvo, porém, quando for manifesta a sua discrepância com o benefício econômico pretendido na demanda desconstitutiva, quando então deverá prevalecer o valor da condenação, ou aquele apurado em liquidação (op. cit., p. 174).

Nessa toada, o valor a ser conferido à ação rescisória, in casu, não há de coincidir com aquele indicado no processo originário, pois o benefício econômico que se busca agora na fase de cumprimento do julgado é outro, haja vista que, ao tempo da sua deflagração (em 18 de outubro de 2016), a quantia excutida já chegava a R$ 2.607.376,28 (evento 1 do autos n. 004676-32.2016.8.24.0019).

Não obstante, não se pode desconsiderar também o fato de que, após despacho de encaminhamento dos autos à Contadoria Judicial para apresentação de cálculo do valor exequendo segundo os parâmetros declinados no título executivo judicial (evento 16 do autos n. 004676-32.2016.8.24.0019), apurou-se em 28 de abril de 2017 um valor total de 2.084.267,38 (evento 22), montante esse que, acrescido de correção monetária e de juros a partir daquela mesma data, parece ser o critério mais adequado para balizar o fim ora proposto.

Assim, num primeiro momento manifestei-me pelo respectivo ajuste do valor da causa nos moldes acima referidos, com o consequente recolhimento da importância complementar relativa às custas processuais (se for o caso) e ao depósito previsto no art. 966, II, do Código de Processo Civil.

Mutatis mutandis, já decidiu este Tribunal de Justiça:

AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA EM AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO CUMULADA COM RESCISÃO DE CONTRATO E COBRANÇA DE ALUGUÉIS E DEMAIS ENCARGOS.DEMANDA PROPOSTA PELA RÉ DAQUELA LIDE.IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA. BENEFÍCIO ECONÔMICO PRETENDIDO QUE CORRESPONDE AO MONTANTE EXEQUENDO NO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. RECOLHIMENTO DO VALOR COMPLEMENTAR E REVERSÃO EM FAVOR DO DEMANDADO QUE SE IMPÕE (ART. 968, INC. II, DO CPC).[...] (Ação Rescisória n. 4010060-28.2017.8.24.0000, de Chapecó, rela. Desa. Cláudia Lambert de Faria, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 5-11-2019).

No ponto, o ilustre Relator a priori acompanhou o voto apresentado.

No entanto, após manifestações dos eminentes Desembargadores Luiz Cesar Medeiros e André Dacol - os quais apontaram que o valor atribuído à presente ação rescisória (valor da demanda originária, devidamente atualizado) também estaria de acordo com vasta jurisprudência sobre o tema e cumpriria requisito específico de procedibilidade -, tais questões foram levadas a discussão e votação, e este Órgão Colegiado decidiu por unanimidade afastar as preliminares suscitadas, com a consequente manutenção do valor da causa.

2 JUÍZO RESCINDENTE

O presente processo e seus anexos, somando mais de quatro mil (4.000) páginas, mereceram a percuciente análise do eminente Desembargador Relator, razão pela qual, por primeiro, gostaria de cumprimentá-lo pelo bem fundamentado voto proferido.

Em segundo lugar...

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