Acórdão Nº 4011367-46.2019.8.24.0000 do Terceira Câmara de Direito Civil, 15-12-2020

Número do processo4011367-46.2019.8.24.0000
Data15 Dezembro 2020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Civil
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão










Agravo de Instrumento Nº 4011367-46.2019.8.24.0000/SC



RELATOR: Desembargador FERNANDO CARIONI


AGRAVANTE: GIOVANI GILBERTO IZCAK AGRAVADO: ASSOCIACAO DOS ADVOGADOS DO BANCO DO BRASIL - ASABB


RELATÓRIO


Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de antecipação de tutela recursal, interposto por Giovani Gilberto Izcak da decisão proferida pelo Magistrado da 1ª Vara Cível da comarca de Palhoça, Dr. Ezequiel Rodrigo Garcia, que nos autos da Ação de Cumprimento de Sentença n. 0010613-18.2011.8.24.0045/02 deferiu o pedido de penhora de 10% (dez por cento) ao mês da verba percebida pelo executado a título de salário na empresa Firenze Multi-Urbanismo para pagamento dos honorários advocatícios de sucumbência sob execução e determinou a expedição de ofício para a referida empresa, determinando o depósito mensal de 10% do salário líquido do executado em subconta vinculada aos autos, até a liquidação integral do débito atinente aos honorários advocatícios de sucumbência.
Inconformado, o agravante requereu, preliminarmente, a concessão do benefício da justiça gratuita.
Sustentou, em apertada síntese, que sua folha de pagamento comprova que seu salário líquido é de aproximadamente R$ 4.300,00 (quatro mil e trezentos reais) e todos os comprovantes de gastos mensais fixos demonstram que ficam menos de R$ 200,00 (duzentos reais) mensais para gerir suas despesas com transporte, lazer, vestuário, saúde, ou seja, impossível pagar o valor de 10% (dez por cento) do salário líquido sem comprometer sua própria subsistência ou de seu filho menor.
Alegou que o simples fato de se tratar de natureza alimentar/honorários advocatícios não é suficiente para se enquadrar no entendimento excepcional seguido pelo Superior Tribunal de Justiça, pois além de se tratar de verba alimentar é necessário a comprovação de que a penhora não comprometerá a subsistência do executado.
Mencionou que existindo conflito entre bens jurídicos, deve ser indeferido o pedido de penhora sobre o seu salário, sob pena de prejudicar a sua subsistência.
Requereu a antecipação da tutela recursal e, no mérito, a reforma da decisão agravada.
Nesta instância foi indeferido o pedido de tutela requerida (fls. 74-76).
Sem contraminuta

VOTO


Trata-se de agravo de instrumento com o desiderato de reformar a decisão interlocutória que deferiu o pedido de penhora de 10% (dez por cento) ao mês da verba percebida pelo executado a título de salário na empresa Firenze Multi-Urbanismo para pagamento dos honorários advocatícios de sucumbência sob execução.
De início, objetiva o agravante a concessão da justiça gratuita por não possuir condições financeiras de arcar com as custas e as despesas do processo sem prejuízo do seu próprio sustento.
É cediço que a prestação da tutela jurisdicional constitui um serviço público remunerado, pois, conforme frisa o artigo 82 do Código de Processo Civil, "[...] incumbe às partes prover as despesas dos atos que realizarem ou requerem no processo".
Entretanto, ressalta Humberto Theodoro Júnior que "exigir, porém, esse ônus como pressuposto indeclinável de acesso ao processo seria privar os economicamente fracos da tutela jurisdicional do Estado" (Curso de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 46. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. v. I, p. 108).
Sobre o tema, Mauro Cappelletti e Bryant Garth, autores da obra "Acesso à Justiça" - preconizaram, já nos idos de 1970, que se deveriam criar efetivos mecanismos, concretos, de acesso à justiça àquelas pessoas consideradas hipossuficientes economicamente, sob pena de marginalizá-las e de negar seus direitos, como bem obtempera Cássio Scarpinella Bueno:
De acordo com Mauro Cappelletti, na exata medida em que o pensamento do direito processual civil passou a ser voltado para a realização de fins alheios ao processo, isto é, a se pensar o processo civil mais como "meio" (instrumento) do que como "fim" em processo civil, colocou-se, no plano social e político, a necessidade de verificar em que condições o direito processual civil tem aptidão concreta, real, de atingir aqueles seus objetivos. Destacou, por isto mesmo, como forma de pensar o direito processual civil, o que ele chamou de "três ondas de acesso à justiça", cada uma delas voltadas a verificar em que medida o direito processual civil e suas técnicas reúnem condições de realização de suas finalidades.
A primeira destas "ondas de acesso à justiça" volta-se à criação de condições para propiciar o acesso à justiça aos pobres. A preocupação aqui espelhada repousa, fundamentalmente, na criação de mecanismos para que todos os cidadãos, independemente de suas condições econômicas ou financeiras, tenham acesso ao "serviço judiciário" no sentido de que tenham condições concretas de requerer a proteção judicial (a tutela jurisdicional) nos casos em que ela se faz necessária e indispensável. É neste contexto que surgem as defensórias públicas, as leis de assistência judiciária gratuita e outras iniciativas similares.
O que importa destacar a este respeito é que a marginalização destas pessoas do sistema judiciário significa, de uma só vez, a marginalização do próprio sistema jurídico considerado como um todo, porque, sem adequada proteção jurisdicional, sem condições efetivas de realização concreta dos direitos, é, até mesmo, difícil distinguir o plano do direito material de meras listas declaratórias de direito. O problema que se põe para o processualista, destarte, é pensar ou, verdadeiramente, repensar o direito processual civil como forma de lidar também com estas realidades sociais e políticas, viabilizando que elas sejam realizadas no sentido de tornadas realidade palpável, concreta, mediante a intervenção e atuação do Estado-juiz.
O norte seguro desta "primeira onda de acesso à justiça" repousa na descoberta dos mecanismos de viabilizar a representação de direitos de pessoas que, de outra forma, ficariam excluídas, por completo,...

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