Acórdão Nº 4013986-46.2019.8.24.0000 do Sexta Câmara de Direito Civil, 03-03-2020

Número do processo4013986-46.2019.8.24.0000
Data03 Março 2020
Tribunal de OrigemCriciúma
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão


Agravo de Instrumento n. 4013986-46.2019.8.24.0000, de Criciúma

Relator: Desembargador André Luiz Dacol

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. FIANÇA PRESTADA EM CONTRATO DE LOCAÇÃO COMERCIAL. PENHORA DE IMÓVEIS DOS FIADORES. INTERLOCUTÓRIO QUE REJEITOU A ARGUIÇÃO DE IMPENHORABILIDADE DOS BENS.

RECURSO DOS DEVEDORES (FIADORES). IMPENHORABILIDADE DE IMÓVEL POR SE TRATAR DE BEM DE FAMILIA. SUBSISTÊNCIA. DÍVIDA CONTRAÍDA DE FIANÇA PRESTADA EM LOCAÇÃO COMERCIAL. PENHORA QUE CONTRARIA O DIREITO À MORADIA E O PRINCÍPIO DA ISONOMIA. PRECEDENTES. REFORMA NO PONTO.

IMPOSSIBILIDADE DE CONSTRIÇÃO DE IMÓVEL OBJETO DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. INSUBSISTÊNCIA. POSSIBILIDADE DE PENHORA DOS DIREITOS AQUISITIVOS DOS RECORRENTES. INTELIGÊNCIA DO ART. 835, XII, DO CPC/2015. MANUTENÇÃO.

RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. 4013986-46.2019.8.24.0000, da comarca de Criciúma 1ª Vara Cível em que são Agravantes Edmilson de Stefani e outro e Agravados Transrover Transportes Ltda.

A Sexta Câmara de Direito Civil decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso.

Presidiu o julgamento, realizado nesta data, a Exma. Sra. Desa. Denise Volpato, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. André Carvalho.

Florianópolis, 3 de março de 2020.


Desembargador André Luiz Dacol

Relator


RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por Edmilson de Stefani e outro em face de decisão que, nos autos da execução de título extrajudicial n. 0305011-38.2017.8.24.0020, proposta por Transrover Transportes Ltda., rejeitou pedidos para cancelamento da penhora dos imóveis matriculados sob nos. 55.560 e 42.959 junto ao 1º Ofício do Registro de Imóveis de Criciúma.

Em suas razões, sustentam, em suma, que o imóvel matriculado sob n. 55.560 é impenhorável, por se cuidar de bem de família, não respondendo por débitos oriundos de locação não residencial, como é o caso dos autos.

Quanto ao imóvel de matrícula n. 42.959, referem se cuidar de bem gravado com alienação fiduciária, razão pela qual pertence à instituição financeira credora, não podendo ser expropriado para beneficiar os agravantes.

Ao final, postularam a concessão de tutela de urgência e, no mérito, o provimento do recurso.

O pedido de tutela de urgência foi deferido às fls. 124-127.

Contrarrazões foram apresentadas (fls. 132-145).

Vieram os autos conclusos.

Este é o relatório.





VOTO

1. Compulsando os autos, observo a presença de todos os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade (intrínsecos: cabimento, interesse recursal, legitimidade recursal, inexistência de fato extintivo do direito de recorrer; e extrínsecos: regularidade formal, tempestividade), razão por que conheço do recurso.


2. Ao analisar o pedido liminar, assim me manifestei:

Na hipótese, na parte em que conhecido, entendo que o agravo reúne os requisitos para deferimento da tutela de urgência.

A impossibilidade de penhora de bem de família para pagamento de fiança prestada em contrato de locação não residencial foi assentada em precedente do Supremo Tribunal Federal, assim ementado:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO MANEJADO CONTRA ACÓRDÃO PUBLICADO EM 31.8.2005. INSUBMISSÃO À SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL. PREMISSAS DISTINTAS DAS VERIFICADAS EM PRECEDENTES DESTA SUPREMA CORTE, QUE ABORDARAM GARANTIA FIDEJUSSÓRIA EM LOCAÇÃO RESIDENCIAL. CASO CONCRETO QUE ENVOLVE DÍVIDA DECORRENTE DE BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR. INCOMPATIBILIDADE COM O DIREITO À MORADIA E COM O PRINCÍPIO DA ISONOMIA.

1. A dignidade da pessoa humana e a proteção à família exigem que se ponham ao abrigo da constrição e da alienação forçada determinados bens. É o que ocorre com o bem de família do fiador, destinado à sua moradia, cujo sacrifício não pode ser exigido a pretexto de satisfazer crédito de locador de imóvel comercial ou de estimular a livre iniciativa. Interpretação do art. 3º, VII, da Lei nº 8.009/1990 não recepcionada pela EC nº 26/2000.

2. A restrição do direito à moradia do fiador em contrato de locação comercial tampouco se justifica à luz do princípio da isonomia. Eventual bem de família de propriedade do locatário não se sujeitará à constrição e alienação forçada, para o fim de satisfazer valores devidos ao locador. Não se vislumbra justificativa para que o devedor principal, afiançado, goze de situação mais benéfica do que a conferida ao fiador, sobretudo porque tal disparidade de tratamento, ao contrário do que se verifica na locação de imóvel residencial, não se presta à promoção do próprio direito à moradia.

3. Premissas fáticas distintas impedem a submissão do caso concreto, que envolve contrato de locação comercial, às mesmas balizas que orientaram a decisão proferida, por esta Suprema Corte, ao exame do tema nº 295 da repercussão geral, restritiva aquela à análise da constitucionalidade da penhora do bem de família do fiador em contrato de locação residencial.

4. Recurso extraordinário conhecido e provido (RE 605709, relatora para acórdão Mina. Rosa Weber, j. 12/06/2018).


Ademais, colho dos autos que, ao menos em princípio, o imóvel de matrícula 55.560, sito à Rua Almirante Barroso, 900, é, de fato, bem de família dos agravantes. A essa conclusão chego pela análise perfunctória da documentação anexada ao pedido de declaração de impenhorabilidade, a qual revela contas de energia elétrica em nome do recorrente Edmilson, desde o ano de 2007 (fl. 238 da origem) – desconsiderada a fatura de 2006, porque não registra consumo. Além disso, deve-se ponderar que a inicial indicou tal endereço para citação (fl. 1 da origem), ato que, de fato, ali ocorreu (fl. 98 da origem).

De outro vértice, a urgência reside no fato de o bem já ter sido levado a leilão, inexitoso (fl. 277 da origem), de modo que novos atos de expropriação poderão ser realizados na sequência de tramitação do feito.

4. Pelo exposto:

A) NÃO CONHEÇO do recurso no tocante à impenhorabilidade do imóvel matriculado sob n. 42.959 perante o 1º Ofício do Registro de Imóveis de Criciúma;

B) no restante, DEFIRO a tutela de urgência recursal para impedir a realização de eventuais atos de expropriação do imóvel matriculado sob n. 55.560 no 1º Ofício do Registro de Imóveis de Criciúma, mantida a penhora até o julgamento definitivo do presente recurso.


Em nova análise, tal entendimento se mantém incólume.

Isso porque, conforme a documentação juntada à exordial e mencionada no trecho acima transcrito, trata-se o imóvel sob matrícula n. 55.560, de bem de família, resguardado na Constituição Federal em observância ao direito à moradia, assim como o princípio da isonomia. Não obstante a hipótese dos autos trate de imóvel pertencente a fiador de contrato locatício, cuida-se de locação comercial, que, "ao contrário do que se verifica na locação de imóvel residencial, não se presta à promoção do próprio direito à moradia" (RE 605709, relatora para acórdão Mina. Rosa Weber, j. 12/06/2018), não se aplicando, portanto, o enunciado do Tema 295 do STF ao caso concreto.

É de entendimento desta Câmara:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. AÇÃO DE DESPEJO C/C COBRANÇA DE ALUGUERES E ENCARGOS LOCATÍCIOS. PENHORA DE IMÓVEL DE PROPRIEDADE DOS FIADORES. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE REJEITOU ARGUIÇÃO DE IMPENHORABILIDADE DE BEM FAMILIAR.

RECURSO DOS EXECUTADOS (FIADORES). PRETENSÃO DE LEVANTAMENTO DO GRAVAME AO ARGUMENTO DE O IMÓVEL ESTAR PROTEGIDO PELA IMPENHORABILIDADE, POR SE TRATAR DE BEM DE FAMÍLIA. SUBSISTÊNCIA. DÍVIDA EXEQUENDA ORIGINÁRIA DE FIANÇA PRESTADA EM CONTRATO DE LOCAÇÃO IMOBILIÁRIA. HIPÓTESE QUE, A PRIORI, CONSTITUIRIA EXCEÇÃO À REGRA DE...

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