Acórdão Nº 4015571-41.2016.8.24.0000 do Quinta Câmara de Direito Público, 24-11-2020

Número do processo4015571-41.2016.8.24.0000
Data24 Novembro 2020
Tribunal de OrigemFraiburgo
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão


Agravo de Instrumento n. 4015571-41.2016.8.24.0000 Fraiburgo

Relatora: Desembargadora Denise de Souza Luiz Francoski

AGRAVO DE INSTRUMENTO.

AÇÃO CIVIL PÚBLICA AJUIZADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA EM FACE DE SOLDADOS DA POLÍCIA MILITAR, PARA APURAR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA, EM DECORRÊNCIA DE CRIME DE TORTURA PRATICADOS DURANTE O EXERCÍCIO DA FUNÇÃO.

DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE REJEITOU PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM E DE PRESCRIÇÃO.

AGRAVO DE INSTRUMENTO INTERPOSTO PELO DEMANDADO.

(1) ADMISSIBILIDADE

ARGUIDA COMPETÊNCIA DO JUÍZO EM QUE O AGRAVANTE EXERCE DOMICÍLIO.

TESE NÃO CONHECIDA.

NÃO HOUVE PRONUNCIAMENTO SOBRE O TEMA NO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU, E SUA ANÁLISE NESTE RECURSO IMPORTA SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA.

(2) MÉRITO.

(A) SUSTENTADA INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL, HAJA VISTA QUE A JUSTIÇA MILITAR SERIA A COMPETENTE, UMA VEZ QUE HÁ POSSIBILIDADE DE PERDA DA FUNÇÃO PÚBLICA.

TESE AFASTADA.

ENTENDIMENTO ASSENTE DE QUE A JUSTIÇA MILITAR NÃO TEM COMPETÊNCIA PARA AÇÕES CIVIS PÚBLICAS CONTRA ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA, TENDO EM VISTA A NATUREZA CIVIL DESTA ESPÉCIE DE AÇÃO.

PRECEDENTES.

SENTENÇA RATIFICADA.

(B) ALEGADA OCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO QUINQUENAL, CONFORME ART. 23 DA LEI N. 8.429/1992, DE FORMA QUE SE O ILÍCITO SE TORNOU CONHECIDO EM 25-3-2005 E A AÇÃO FOI AJUIZADA EM 20-5-2011, OPERADA ESTÁ A PRESCRIÇÃO.

TESE RECHAÇADA.

ATOS PRATICADOS QUE TAMBÉM CONFIGURAM CRIME DE TORTURA (ART. 1º, ª§ 2º, DA LEI N. 9.455/1997). PRESCRIÇÃO DE ACORDO COM A PENA PREVISTA NO CÓDIGO PENAL (INTELIGÊNCIA DO ART. 23, II, DA LEI N. 8.429/1992 E ARTS. 150, II, E 151 DA LEI ESTADUAL N. 6.745/1985).

PRAZO PRESCRICIONAL INCIDENTE NO CASO DE 8 (OITO) ANOS, CONFORME ART. 109, IV, DO CÓDIGO PENAL.

PRECEDENTES.

DECISÃO CONFIRMADA.

RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO INTERPOSTO PELO DEMANDADO CONHECIDO EM PARTE E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. 4015571-41.2016.8.24.0000, da comarca de Fraiburgo 2ª Vara em que é Agravante Hideraldo Guilherme Kasburg e Agravado Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Quinta Câmara de Direito Público decidiu, por unanimidade, conhecer em parte do recurso de agravo de instrumento interposto pelo demandado Hideraldo Guilherme Kasburg, e negar-lhe provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Hélio do Valle Pereira, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Artur Jenichen Filho e o Exmo. Sr. Des. Vilson Fontana.

Funcionou como representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Procurador de Justiça Américo Bigaton.

Florianópolis, 24 de novembro de 2020.

Desembargadora Denise de Souza Luiz Francoski

Relatora

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso de agravo de instrumento interposto pelo demandado Hideraldo Guilherme Kasburg, contra decisão interlocutória que afastou as preliminares de prescrição e de incompetência da Justiça Estadual, proferida nos autos da ação civil pública n. 0001823-11.2011.8.24.0024, ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina contra o agravante e Albari Lemes da Silva.

1.1 Pronunciamento impugnado

Na decisão interlocutória proferida pelo magistrado de Primeiro Grau Bruno Makowiecky Salles (fls. 481-487), foram rechaçadas as preliminares de prescrição e de incompetência da Justiça Estadual, que ora se transcreve:

"I. SANEAMENTO E ORGANIZAÇÃO DO PROCESSO.

Passo, no momento, ao saneamento e à organização do processo (art. 357 e ss. do CPC), versando, quando for o caso, sobre (a) questões processuais pendentes, (b) delimitação da atividade probatória e dos meios de prova, (c) definição do ônus probante e (d) fixação das questões de direito relevantes, (e) dentre outras temas necessários.

(a) Prescrição.

A pretensão de ressarcimento do dano, em ação de improbidade administrativa, não fenece pelo decurso do tempo (art. 37, §5°, da CF, e cf. TJSC. AI n. 2014.004167-6), caracterizando-se pela imprescritibilidade. Em se tratando, por outro lado, de pretensão punitiva por ato de improbidade, o prazo prescricional é regulado a partir da natureza do vínculo entre o agente e o Estado (cf. José dos Santos Carvalho Filho. Manual de Direito Administrativo. 22 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 1042), contando-se individualmente de acordo com as condições de cada réu (cf. STJ. REsp n. 1185461/PR e REsp n. 1088247/PR). Caso o agente titularize cargo efetivo ou emprego público, a prescrição opera dentro do prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares puníveis com demissão (art. 23, II, da Lei n. 8.429/92). Caso, por outro lado, a relação com a Administração seja gravada com a nota da temporariedade, o prazo prescricional para a propositura da ação é de 05 (cinco) anos contados do término do mandato, cargo comissionado ou função gratificada (art. 23, I, da Lei n. 8.429/92). A jurisprudência, nesses casos, é firme no sentido de que, existindo reeleição, o dies a quo computa-se a partir da expiração do 2° (segundo) mandato do agente indigitado como ímprobo (cf. STJ. REsp 1290824/MG e AgRg no REsp n. 1259432/PB), dada a relação de continuidade no exercício da função. E essa lógica de contagem estende-se aos particulares inseridos no polo passivo da ação (cf. STJ. REsp n. 965340/AM e REsp 704.323/RS). Afinal, se o que justifica a incidência da Lei de Improbidade sobre terceiros estranhos à Administração é a presença, no ato, de agente(s) público(s), é intuitivo que deva ser atribuído a tal terceiro o mesmo prazo prescricional aplicável ao(s) agente(s) (cf., ex, Adriano Andrade, Cleber Masson e Landolfo Andrade. Interesses Difusos e Coletivos Esquematizado. 4ª ed. São Paulo: Método, p. 799), considerando-se, havendo mais de 01 (um) em condições diferentes, o prazo mais favorável ao particular, não se podendo dar-lhe posição mais gravosa em relação a 01 (um) dos agentes. A contagem individual dos prazos tem o objetivo de evitar que certos réus sejam prejudicados pela posição exclusiva de outros, não se podendo, assim, adotar posição gravosa ao particular.

Em tal panorama, não há prescrição punitiva.

Ambos os réus, na data da propositura da ação, exerciam cargos públicos efetivos de Policiais Militares do Estado de Santa Catarina, atraindo a incidência do prazo prescricional de 8 (oito) anos, nos termos dos arts. 23, II, da Lei n. 8.429/92, 150, II, e 151 da Lei Estadual n. 6.745/85, 1º, § 2º, da Lei n. 94.55/97 e 109, IV, do Código Penal.

Consta dos referidos artigos de lei:

Lei Federal n. 8.429, de 2 de junho de 1992

Art. 23. As ações destinadas a levar a efeitos as sanções previstas nesta lei podem ser propostas: I - até cinco anos após o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de função de confiança; II - dentro do prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares puníveis com demissão a bem do serviço público, nos casos de exercício de cargo efetivo ou emprego.

Lei Estadual n. 6.745, de 28 de dezembro de 1985

Art. 150. Prescreve a ação disciplinar: I - em 02 (dois) anos, quanto aos fatos punidos com repreensão, suspensão, ou destituição de encargo de confiança; II - em 05 (cinco) anos, quanto aos fatos punidos com a pena de demissão, de cassação de aposentadoria ou de cassação de disponibilidade, ressalvada a hipótese do art. 151, deste Estatuto.

§ 1° - O prazo de prescrição começa a correr: a) - do dia em que o ilícito se tornou conhecido de autoridade competente para agir; b) - nos ilícitos permanentes ou continuados, do dia em que cessar a permanência ou a continuação.

§ 2° - O curso da prescrição interrompe-se: a) - com a instauração do processo disciplinar; b) - com o julgamento do processo disciplinar. § 3° - Interrompida a prescrição, todo o prazo começa a correr novamente do dia da interrupção.

Art. 151. Se o fato configurar também ilícito penal, a prescrição será a mesma da ação penal, caso esta prescreva em mais de 05 (cinco) anos.

Lei Federal n. 9.455, de 7 de abril de 1997

Art. 1º Constitui crime de tortura: I - constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental: a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa; b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa; c) em razão de discriminação racial ou religiosa; II - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo. Pena - reclusão, de dois a oito anos.

§ 1º Na mesma pena incorre quem submete pessoa presa ou sujeita a medida de segurança a sofrimento físico ou mental, por intermédio da prática de ato não previsto em lei ou não resultante de medida legal.

§ 2º Aquele que se omite em face dessas condutas, quando tinha o dever de evitá-las ou apurá-las, incorre na pena de detenção de um a quatro anos. Código Penal (Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940)

Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto nos §§ 1º e 2º do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se: (Redação anterior à Lei nº 12.234, de 2010) I - em vinte anos, se o máximo da pena é superior a doze; II - em dezesseis anos, se o máximo da pena é superior a oito anos e não excede a doze; III - em doze anos, se o máximo da pena é superior a quatro anos e não excede a oito; IV - em oito anos, se o máximo da pena é superior a dois anos e não excede a quatro; V - em quatro anos, se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede a dois; VI - em dois anos, se o máximo da pena é inferior a um ano. (Redação anterior à Lei nº 12.234, de 2010)

Como a ação foi proposta em 20/05/2011, conclui-se que o exercício da...

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